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3.2 VER-O-PESO: O ESPAÇO DO SENSÍVEL

3.2.2 A Visualidade: um caleidoscópio de cores e formatos

Todos os sentidos cercam o Ver-o-Peso e estão em ação, principalmente o da visão. Nesse espaço, as formas das barracas no Complexo se distinguem em barracas padronizadas (brancas) e barracas improvisadas, feitas de lona de plástico na cor azul. Opõem-se aos prédios do Mercado de Peixe, todo em ferro, e do Mercado de Carne, cuja estrutura interna é de ferro e a externa, de alvenaria, com detalhes arquitetônicos em estilo art nouveau. A utilização do ferro importado marca o período áureo da borracha (século XIX) no cenário urbano de Belém.

No interior do Mercado de Peixe podem-se ver cartazes de divulgação do Círio de Nazaré, além da imagem da santa e a réplica da berlinda. No lado de fora, as frutas, as hortaliças e os temperos dão colorido à feira, como um caleidoscópio de cores e formatos.

Entre o mercado e as barracas certos produtos são depositados no próprio chão sobre um pedaço de lona de plástico, a exemplo do camarão, que fica exposto ao sol para secar, assim como as frutas, o cheiro verde e a chicória.

Os barcos (figura 22), reunidos no cais do porto, complementam a visualidade do local, pela forma e cores diferentes. É o “Ver-o-Peso manchado de velas de todas as cores, com suas barcaças que trazem, dos mais diversos pontos do estado, peixe e frutas para a vida da cidade” (MORAES, 1997, p. 218). Moraes refere-se, em suas crônicas, ao colorido das embarcações dos mais variados tipos, que continuam enfeitando a paisagem da feira e, para

Loureiro (2001, p. 181) representam uma espécie de “pinacoteca flutuante”.

Figura 22 - Barcos no cais do porto.

Fonte: David Oliveira Júnior, 2009.

A imagem acima revela, no primeiro plano, os barcos aportados no cais para o desembarque de mercadorias; ao fundo, o Mercado de Peixe, na cor azul, com suas torres, uma em cada canto. As embarcações ocupam o espaço do cais, atracando, proa com popa, proa com proa.

Mesmo predominando a cor azul do mercado e dos barcos, outras cores como o vermelho e o verde aparecem nas letras dos nomes das embarcações e nos traçados em linha reta que compõem a simetria dos desenhos.

A função principal das embarcações é o transporte de alimentos, mas também o de moradia. É o “barco-casa” que, nessa funcionalidade, abriga, transformando-se em residência flutuante.

As embarcações, segundo Loureiro (2002, p. 137), são “objetos plásticos, boiando, bubuiando, rearranjando continuamente a paisagem, imprimindo a marca da criatividade do homem, no horizonte dos rios e baías vazantes e preamares”. O barco visualizado como objeto plástico ganha contornos estéticos pelo seu colorido, pelos enfeites como flores, bandeiras, balões e outros detalhes poderão compor o seu visual, destacados, principalmente, nas procissões fluviais.

Barcos chegam e saem constantemente do porto do Ver-o-Peso. Funcionam como elemento de ligação entre a cidade e as ilhas, no transporte dos produtos e como meio de

locomoção da população ribeirinha.

Essas embarcações vão de barcos de pesca até pequenas canoas (popopôs)70, as quais trafegam nas águas dos rios percorrendo caminhos entre furos, entrelaçados pela vegetação característica da região amazônica. Sublinho que a segunda cena do espetáculo faz referência a essas embarcações.

Nas peças do artesanato paraense são utilizados todos os tipos de materiais retirados da própria região: o barro, a palha, as sementes e até escamas de peixe. Destacam-se as cores marrom, bege, preto, mas também o colorido em diferentes peças como vasos de cerâmica, colares e brincos de sementes e penas, e nas cuias pintadas com paisagens e desenhos com motivos marajoaras71, vendidos nas barracas de artesanato da feira.

Em diversos espaços da feira vendedores ambulantes trafegam pelos setores oferecendo produtos, criando, assim, uma estética visual em constante transformação, por não terem um lugar fixo. Esses sujeitos acabam construindo formas criativas de transportar o seu produto utilizando carrinhos de supermercado e carros de mão de madeira, ressignificando a relação espacial do local.

Na feira do Ver-o-Peso, muitas cores atravessam a visão, como o amarelo vivo do tucupi, vendido em garrafas pet, o verde da maniva moída, os diversos tons das frutas (figura 23), a cor laranja dos cachos de pupunha, o roxo do açaí, dentre outras frutas.

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Popopô é uma onomatopeia, cuja formação está relacionada ao som do motor de pequenas embarcações que apresentam baixa rotação e são assim denominadas na região.

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Marajoaras: os desenhos marajoaras também aparecem em bordados de diferentes peças de roupas e em utensílios domésticos. Esses desenhos estão relacionados com a história do povoamento da ilha do Marajó, no estado do Pará, mais precisamente com as sucessivas guerras das tribos indígenas, que deixaram suas marcas nas cerâmicas localizadas nos sítios arqueológicos.

Figura 23 - O colorido das frutas.

Fonte: David Oliveira Júnior, 2011.

Nessas barracas, como mostra a imagem, as frutas que se apresentam em cachos são penduradas, outras ficam depositadas em cestas ou nos paneiros72, conforme a quantidade, mostrando a variedade de produtos ofertados.

A visualidade das barracas foi analisada pela intérprete-criadora Rose Marques no comentário feito em seu relatório73 da visita de campo: “o colorido no setor das frutas, apesar de ser múltiplo, tem harmonia. Lindo era, bem próximo daquele colorido todo, as garrafas de tucupi com as pimentas de cheiro”. Nos diversos setores, os feirantes arrumam suas barracas distribuindo os produtos em diferentes formas, tamanhos e nuances de cores, tornando este espaço espetacularmente vivido.