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Capítulo 3 – Abordagem Empírica

3.2. Mudanças institucionais e Terapeutas da Fala

3.2.2. Abertura do Mercado Profissional

No que se refere ao mercado de trabalho, os profissionais entrevistados denotam três mudanças na contratação dos Terapeutas da Fala: uma maior contratação em privados da área da saúde pelo incremento do financiamento dos serviços através de seguradoras; uma maior contratação em privados da saúde na área da Medicina Física e Reabilitação em instituições com convenções com o Ministério da Saúde para prestação de serviços de Terapia da Fala; uma maior contratação em IPSS que são Centro de Recursos para a Inclusão (CRI) aos quais os agrupamentos de escolas passam a recorrer no âmbito das parcerias instituídas para recrutarem os Terapeutas da Fala de que necessitem em cada ano letivo. Esta pode considerar-se como uma estratégia de externalização característica da NGP (Evetts, 2012).

Assim, quanto às mudanças no mercado profissional, é identificado um incremento da contratação em IPSS, no quadro das parcerias estabelecidas pelo Estado e aquelas organizações. Com efeito, parece evidenciar-se nos discursos que “a natureza contratual da cooperação entre o Estado e as Instituições Particulares (…) tem vindo a acentuar uma forma mercadorizadora (ainda que não lucrativa) da prestação dos serviços de ação social” (Hespanha et. al., 2000, p. 142).

“Eu acho que a procura tem aumentado para Terapeutas da Fala nas IPSS porque, lá está, tem sido essa passagem…não e da gestão… da gestão dos técnicos das ELI e dos CRI está da responsabilidade das IPSS, não é? (…) No entanto, acaba por ser também um trabalho precário porque o contrato acaba em julho e só inicia novamente em setembro. Acho que tem aumentado a procura no entanto as condições de trabalho dos Terapeutas da Fala mantêm-se precárias”(e1).

Por outro lado, é percecionada uma diminuição de procura de Terapeutas da Fala nos centros terapêuticos por uma retração da atribuição de subsídios aos apoios especializados prestados por essas instituições e o aumento de procura em estabelecimentos privados da área da saúde. Desta forma, há a perceção de que a retração do apoio através de subsídios de educação especial transferiu a procura para instituições privadas da área da saúde com convenções com o Ministério da Saúde.

“Especificamente, aqui no contexto de Gondomar, identifico uma menor procura por parte privada, muito justificada pela diminuição de subsídios que auxiliem a procura privada. E ao mesmo tempo por um aumento da resposta ao nível da saúde, seja para que sítio for, através de P1”(e4)

Pela tardia contemplação dos apoios especializados em Terapia da Fala no desenvolvimento do Estado-Providência Português, 1975/80 na cronologia de Mozzicafreddo (1994), parece evidenciar-se, tal como postulado pelo autor uma “tendência para a diversificação, no sentido de instituir, na esfera social, esquemas

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complementares, pluralistas e privados” que parece estar presente desde o início do processo de profissionalização dos Terapeutas da Fala. Com efeito, esta parece ser uma especificidade, tal como proposto por Gonçalves (2007), que os processos instituídos pela NGP têm nos diferentes grupos profissionais e países.

Para além dos privados em que é possível o cofinanciamento público, os seguros de saúde são uma forma de financiamento deste tipo de serviço que não existia mas que é percecionado como crescente. Parece consubstanciar-se uma abertura do mercado profissional dos Terapeutas da Fala pela reconfiguração do Estado em particular nas áreas da saúde e educação (Gonçalves, 2007).

“Eu acho que sim, que se tem diversificado o tipo de ofertas a que as pessoas podem recorrer em

termos de serviços de terapia da fala. Procuram quer particularmente, quer em termos de seguros de saúde. O que eu tenho sentido ao longo dos tempos é que as pessoas que podem têm seguros de saúde e tentam que eles contemplem apoios terapêuticos como opção e acabam por recorrer a eles(…) que é uma coisa que antigamente não se via. As crianças tinham apoio do Estado a nível hospitalar ou através da segurança social através de clínicas particulares. Não havia o seguro como uma opção para a maior parte das famílias e isso é agora relativamente frequente…” (e6)

Assim, do ponto de vista do mercado de trabalho dos Terapeutas da Fala, a perceção das Terapeutas da Fala é a de que as restrições financeiras do Estado decorreram num incremento da contratação destes profissionais em contextos de prática financiadas por seguradoras privadas em hospitais privados, um incremento da contratação em contextos privados na área da Medicina Física e Reabilitação com protocolos com o Ministério da Saúde e por IPSS na lógica da descentralização e flexibilização no âmbito das lógicas da NGP. Nos discursos dos Terapeutas da Fala é identificada uma relação entre a retração do financiamento pela tutela da Segurança Social através dos subsídios por frequência em estabelecimentos de educação especial e o incremento da prestação de serviços em clínicas de Medicina Física e Reabilitação. Neste caso, há um retorno ao um modelo médico de intervenção, centrado na criança/jovem com deficiência ou incapacidade e com redução dos tempos de sessão, particularmente nas clínicas de Medicina Física e Reabilitação, dificultando, inclusive, o contacto com a família, prática contrária ao sentido da evolução das políticas públicas.

Por outro lado, é sentida uma maior abertura do mercado profissional e uma deterioração das condições de trabalho das Terapeuta da Fala. Essas condições são inferiores às expectativas de remuneração dos profissionais, promovendo sentimentos de desvalorização.

“Eu acho que têm aberto mais clínicas. Respostas privadas, eu acho que tem havido mais…Há mais espaços que nós passamos na rua e diz, terapia da fala. Isso antes não havia tanto e agora

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as pessoas começam a procurar mais. No entanto, as ofertas começam a ser, para o técnico que está a concorrer, cada vez piores e qualquer pessoa aceita qualquer coisa e torna-se uma posição um bocadinho complicada porque uma pessoa estuda tantos anos para depois aceitar ofertas que digamos que, até a empregada de limpeza consegue receber mais (…)É tudo abaixo daquilo que nós estávamos…que nós merecemos e que estudamos para trabalhar” (e9)