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CAPÍTULO I | INTRODUÇÃO

1. ÂMBITO

1.2. Abordagem

Tendo em consideração o contexto descrito nos pontos anteriores, acreditamos ser pertinente desenvolver uma investigação dentro do âmbito do design que permita a esta actividade contribuir para um sistema de produção e consumo sustentável. A investigação focar-se-á nos métodos de design sustentável, na sua vertente de produto, para que seja possível contribuir para apetrechar os designers, e industriais, com conhecimento e ferramentas necessárias para o desenvolvimento de produtos da forma mais integrada e em consonância com as actuais exigências de sustentabilidade. Ao centrarmo-nos no design sustentável, esperamos conseguir avançar para além do ecodesign, onde o foco estava nas questões ambientais e não na envolvente global da sustentabilidade.

Contributos para uma Metodologia de Design Sustentável Aplicada à Indústria do Mobiliário: O Caso Português 12

O design sustentável tem dois objectivos: por um lado, deve facilitar a integração sistemática de informação sobre sustentabilidade no processo de design contribuindo para um processo de design mais eficiente e eficaz e, por outro, deve promover a criação de informação que permita perceber a carga para a sustentabilidade de um determinado produto ou serviço (Bakker, 1995).

Tendo em consideração a necessidade de nos focarmos num objecto de estudo mais concreto, propõe-se trabalhar informação e ferramentas de design sustentável dirigidas à indústria de mobiliário em madeira, usando o caso português como referência, contribuindo assim para o fortalecimento metodológico do processo de design e para a organização de informação de base, útil para os designers utilizarem no seu dia a dia com as empresas deste sector.

Relativamente à pertinência de fazer um estudo com estas características, nesta altura, pensamos que todas as razões relacionadas com a sustentabilidade, que já foram referidas, só por si justificariam tal empreendimento. No entanto, é possível adicionar ainda o facto de ser vital para a economia portuguesa desenvolver ferramentas que lhe permitam estar à altura dos desafios da actualidade, inovando, crescendo e internacionalizando-se de forma conscienciosa. É, também, essencial para a actividade do design conseguir criar um corpo sólido e estruturado em fundamentos científicos, ajudando assim a definir e clarificar a sua própria imagem e área de intervenção (Bürdek, 2005). A área do design precisa de estar preparada para apoiar e fomentar desenvolvimento industrial e Humano, de forma positiva, duradoura, permitindo manter o equilíbrio com o ecossistema planetário onde habitamos.

Acreditamos também que é importante ligar a realidade académica de investigação com a prática industrial e comercial, pois só assim será possível desenvolver e solidificar conhecimentos dos dois lados de forma mais eficaz e com benefícios acrescidos para ambos.

Conseguir resultados relevantes em termos ambientais, pela actividade do design, é uma tarefa complexa, em que a relevância das diferentes abordagens depende, em larga medida, do tipo de indústria para que estamos a trabalhar. Portanto, previsivelmente, a melhor forma para conseguir uma ligação benéfica que traga resultados positivos, é centramo-nos num tipo específico de produto, para assim sermos mais eficazes na redução do seu impacte ambiental e, por consequência, caminharmos para uma via de produção e consumo sustentável.

Uma das recomendações feitas por Hemel na sua tese de doutoramento (1998) foi a de se poder estudar a formulação de estratégias específicas para um determinado grupo de empresas, baseadas numa avaliação de ciclo de vida do grupo de produtos desse sector. Prossegue dizendo que o seu estudo mostra que certos sectores industriais estão mais orientados para determinadas formas de actuação do que outros e que iniciativas sectoriais já têm provado ser um estímulo influente na direcção do design, o que a leva a recomendar promover uma abordagem orientada para um sector específico (Hemel, 1998). Também Bakker (1995) nas suas conclusões e recomendações reforça que se deve criar informação específica para os grupos de objectos, baseando essa informação em avaliações de ciclo de vida.

Iremos, portanto, centrar a actividade de investigação e do design sustentável num sector industrial específico esperando assim conseguir encontrar as suas particularidades e entender como podem estas ser potenciadas de forma a conduzir-se a graus mais elevados de eficiência, inovação e, consequentemente, a uma maior sustentabilidade dos seus produtos. Esta abordagem irá cruzar

informação prática do sector, e do ciclo de vida dos seus produtos, e informação da área do design e da sustentabilidade.

1.2.1. Mobiliário doméstico em madeira

Os motivos que levam a realizar esta investigação direccionada para a indústria do mobiliário em madeira para a casa são de várias ordens e naturezas.

Em primeiro lugar, surge a necessidade de nos focarmos nos produtos, pois são eles que carregam, directa ou indirectamente, os efeitos ambientais de toda cadeia de produção (Bakker, 1995).

Num plano geral surge a necessidade de se desenvolver uma abordagem mais sustentável ao nosso ambiente doméstico. Uma parte importante e significativa das nossas actividades é desenvolvida no interior das nossas casas, para as quais fomos criando, ao longo dos tempos, diversos objectos que tornam o nosso espaço mais confortável, funcional e humano. Estes objectos reflectem a necessidade do Homem satisfazer um crescente número de funções e desejos e apresentam, pela sua quantidade e utilização, um aumento do impacte ambiental da nossa vivência doméstica. Tendo em mente a necessidade, inerente a um processo de doutoramento, de se abordar uma problemática numa área restrita do conhecimento, impunha-se uma selecção de entre as várias gamas de objectos que povoam as nossas casas. Essa escolha recaiu sobre as peças de mobiliário pelas seguintes razões: são os objectos com maior peso na definição do ambiente doméstico e porque dentro deste espaço a relação comportamental com este grupo de objectos tem evoluído significativamente na sociedade moderna. Nas gerações anteriores a relação com o mobiliário era muito mais duradoura, hoje o ritmo de uso destes produtos é muito mais elevado, influenciado por factores de moda (EGP, 2007), obsolescência e fragilidade dos próprios produtos. Por outro lado, a preocupação com os problemas ambientais do mobiliário também têm aumentado devido ao crescimento da preocupação sobre a qualidade do ar que respiramos no interior dos nossos edifícios, onde passamos 90% do tempo das nossas vidas (CSM, 2006), e para a qual os móveis contribuem significativamente. O conteúdo das nossas casas é, assim, um elemento fundamental na definição de padrões de consumo e produção sustentáveis (EEA, 2008).

De entre a família de objectos de mobiliário centrámo-nos nos que têm na madeira (e seus derivados) o seu principal material. Esta escolha foi feita por diversas razões: porque este material corresponde à maioria das peças de mobiliário doméstico; porque a desflorestação está classificada como o segundo factor, logo depois da queima dos combustíveis fósseis, que mais contribui para as emissões de gases de efeito de estufa (IPCC, 2007); e porque este é um recurso renovável, considerado por alguns como o único recurso renovável passível de ser gerido pelo Homem (CEIBOIS, 2007b) devendo, portanto, a sua utilização sustentável ser apoiada e promovida.

É um material natural que tem crescido na Europa e em Portugal. Segundo números da FAO, a Europa é a única zona do mundo onde a área de floresta está a crescer e Portugal, juntamente com outros 4 países europeus, está na dianteira deste crescimento com mais de 1% entre 2000 e 2005 (FAO, 2007). Portugal está também acima da média europeia em termos de área florestal do país: 40%. A madeira é um excelente material, pois, para além de ser renovável, a sua abundância na Europa está a aumentar (CEIBOIS, 2007b). A Europa está também a liderar o processo de gestão sustentável das florestas (CEIBOIS, 2007a), sendo que através dele pode contribuir-se para a redução dos níveis de CO2, principal causa das alterações climáticas (Stern, 2006), através de três factores: efeito de absorção de carbono na floresta; armazenamento de carbono nos produtos;

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substituição de materiais que sejam intensivos em termos de carbono pela madeira (CEIBOIS, 2007a). Isto demonstra que a madeira tem a rara capacidade de contribuir para a mitigação do CO2 através das duas únicas vias possíveis: reduzir as emissões e armazenar carbono. Uma árvore absorve cerca de 1 tonelada de carbono por cada metro cúbico de crescimento, libertando 727 kg de oxigénio. No entanto, sem uma gestão sustentável, este ciclo de carbono atinge um equilíbrio em que o crescimento é compensado pelas perdas naturais, não trazendo benefícios na redução do carbono (CEIBOIS, 2007a).

O armazenamento do carbono nos produtos de madeira depende do tempo de vida desses produtos, pois só quando a madeira é queimada ou decomposta na terra é que o carbono é novamente libertado. No caso do mobiliário, o tempo médio de vida é de 20 anos (10 anos para os móveis mais baratos e 30 anos para os móveis mais caros e duradouros) (CEIBOIS, 2007b), mas pode e deve ser alargado.

Para aumentar a eficiência desta gama de produtos, CEIBOIS (2007a) definiu também que seria necessário aumentar a cota de mercado através da substituição de outros produtos/materiais e da inovação técnica, reciclando mais produtos de madeira para aumentar o tempo de armazenamento de carbono e recuperar energia pelos produtos em fim de vida.

A utilização da madeira no mobiliário atribui, portanto, a estes produtos, e respectivos ciclos de vida, características particulares com as quais os designers têm que trabalhar. Cada tipo de produtos caracteriza-se por ter impactes ambientais mais marcados em fases específicas do seu ciclo de vida. No caso do mobiliário o maior impacte no ambiente é causado pela extracção das matérias-primas e pelo fim de vida (Lewis e Gertsakis, 2001).

1.2.2. Indústria de produtos de madeira

Outro factor bastante importante para nos centrarmos neste grupo de objectos prende-se com o facto de existir um sector industrial específico para estes produtos que tem ampla representatividade em Portugal, e que é passível de ser identificado, isolado e trabalhado.

Todo o sector da madeira tem um peso significativo na actividade portuguesa e tendo sido considerado estratégico pelas autoridades políticas, pois representa 5% do VAB total da economia, 14% do PIB industrial, 5% do emprego industrial e 11% das exportações (AIMMP, 2009), ou seja está entre os três sectores mais importantes para a economia nacional. Neste sector, o mobiliário representa 54% e tem uma importância significativa para a actividade do design.

É um sector que definiu recentemente um plano estratégico para o seu desenvolvimento sustentado e internacionalização, no qual um dos vectores principais é a inovação, o aumento de eficiência e a redução do impacte ambiental dos materiais e tecnologias usados (AIMMP, 2008) e recebeu do estado o Plano de Apoio ao Sector das Indústrias da Madeira e do Mobiliário (PASIMM) (MEI, 2009). Em ambos a utilização do design é vista como elemento estratégico para o desenvolvimento do sector.

Para além do factor económico e do factor ambiental, discutidos anteriormente, analisando da perspectiva da sustentabilidade, a indústria do mobiliário de madeira tem uma importância social relevante. Em muitas zonas rurais são os principais empregadores, contribuindo para a riqueza local e trabalhando, de uma maneira geral, em conformidade com a legislação, incluindo a de segurança e bem-estar dos trabalhadores (CEIBOIS, 2007b).