• Nenhum resultado encontrado

3 POLO TEÓRICO

3.3 Teorias da competência

3.3.2 Abordagem européia

Nas décadas de 1980 e 1990, estudos e modelos desenvolvidos por autores ingleses e franceses introduziram termos como ação, resultados e realizações individuais aos conceitos e modelos de competência, ou seja, o debate a respeito de competência originou-se na necessidade de aumentar a capacitação e empregabilidade dos empregados e, para questionar o processo de formação profissional tradicional, principalmente o técnico, que ainda era baseado em qualificações (FLEURY; FLEURY, 2004a).

Zarifian (2001, p. 42) afirma que “o trabalho é ação competente do indivíduo diante de uma situação de evento, não podendo separá-los”. O autor justifica a emergência da noção de competência a partir de grandes alterações na compreensão do trabalho, retratadas

na concepção da situação, da comunicação e do serviço. Neste contexto, a situação tem referência à imprevisibilidade, onde o indivíduo deve se antecipar as situações, para tanto, o mesmo não deve ter apego nenhum às rotinas de trabalho.

Outro pressuposto de Zarifian (2001) é a concepção de trabalho como comunicação, ou seja, trabalhar é em parte comunicar-se. Assim, a comunicação é fundamental para o entendimento das partes envolvidas, onde é possível cada um avaliar os efeitos da própria ação sobre os outros. Por fim, o autor também destaca a noção de serviço, onde trabalhar consiste em produzir um serviço com valor, traduzindo no atendimento final ao cliente.

Zarifian (2001, p. 68-74) caracteriza a definição de competência em três dimensões: (i) a competência é o “o tomar iniciativa” e o “assumir responsabilidade” do indivíduo diante de situações profissionais com as quais se depara; (ii) a competência é um entendimento prático de situações que se apóia em conhecimentos adquiridos e os transforma na medida em que aumenta a diversidade das situações e (iii) a competência é a faculdade de mobilizar redes de atores em torno das mesmas situações, é a faculdade de fazer com que esses atores compartilhem as implicações de suas ações, é fazê-los assumir áreas de co- responsabilidade.

Fundamentado, então, na mudança de comportamento das pessoas em relação ao trabalho e sua organização, Zarifian (2001, p. 68) caracteriza competência como capacidade individual de assumir um trabalho, envolvendo-se nele; de tomar iniciativas, buscando respostas adequadas aos eventos emergentes, indo além do repertório existente; de responsabilizar-se pela execução de forma a atender às especificações e expectativas dos clientes. De acordo com ele, o conhecimento técnico e a qualificação do indivíduo, tratados isoladamente, não representam a competência. Para um indivíduo ser considerado competente, é preciso que suas atitudes e o conhecimento social reflitam o seu conhecimento técnico e suas habilidades.

Lê Boterf (2003), outro famoso autor francês desta abordagem, define competência como: (i) um saber agir e reagir com pertinência: a competência apenas se evidencia na ação, implicando, portanto, saber o que fazer no ato, ultrapassando os conceitos existentes, escolhendo alternativas, encadeando ações adequadamente e tomando iniciativas em situações de urgência e instabilidade; (ii) saber combinar recursos e mobilizá-los em um contexto profissional: competente não é o profissional que possui os conhecimentos e habilidades necessárias, mas o que sabe organizá-los e empregá-los de modo eficaz em uma atividade profissional; (iii) saber transpor: o profissional competente não repete fórmulas de

sucesso passado, mas utiliza as competências de forma recombinada ou revista para diferentes situações. Deve ter capacidade para resolver diferentes tipos de problemas; (iv) saber aprender e aprender a aprender: saber extrair as lições de experiências passadas por meio de reflexão profunda, não se contentando somente em agir, mas transformando sua ação em aprendizado constante e (v) saber envolver-se: pressupõe o total comprometimento do profissional, sua

personalidade e ética mobilizadas no “querer agir, para poder e saber agir” não se omitindo de

posicionamentos na estrutura e nos procedimentos de trabalho. Essa definição pode ser observada na Figura 6 a seguir.

Este mesmo autor também propõe a revisão da noção e classificação de competências, pois para ele a competência não seria um estado de formação educacional ou profissional, nem tampouco um conjunto de conhecimentos adquiridos ou de capacidades apreendidas, mas seria a mobilização e aplicação de conhecimentos e capacidades numa situação específica, na qual se apresentam recursos e restrições próprias à sua especificidade.

Para Lê Boterf (2003), a competência não é um estado ou um conhecimento que se tem e nem é o resultado de um treinamento. A característica do indivíduo é a base para a

Figura 6 – Conceito de competência Lê Boterf

Fonte: Lê Boterf (2003, p. 92). O profissional: aquele que sabe administrar uma situação profissional complexa

Saber agir e reagir com pertinência

- saber o que fazer; - saber ir além do prescrito; - saber escolher na urgência; - saber arbitrar, negociar, decidir;

- saber encadear ações de acordo com uma finalidade.

Saber combinar recursos e mobilizá-los em um contexto Saber transpor Saber aprender e aprender a aprender Saber envolver-se

- saber construir competências a partir de recursos; - saber tirar partido não somente de seus recursos incorporados (saberes, saber-fazer, qualidades), mas também dos recursos de seu meio.

- saber memorizar múltiplas situações e soluções-tipos; - saber distanciar-se, funcionar em “dupla-direção”. - saber utilizar seus metaconhecimentos para modelizar; - saber determinar e interpretar indicadores de contexto; - saber criar as condições de transponibilidade com o auxílio de esquemas transferíveis.

- saber tirar lições da experiência; saber transformar sua ação em experiência;

- saber descrever como se aprende;

- saber agir em circuito duplo de aprendizagem.

- saber envolver sua subjetividade; - saber assumir riscos;

- saber empreender; - ética profissional. O profissional: aquele que sabe administrar uma situação profissional complexa

Saber agir e reagir com pertinência

- saber o que fazer; - saber ir além do prescrito; - saber escolher na urgência; - saber arbitrar, negociar, decidir;

- saber encadear ações de acordo com uma finalidade.

Saber combinar recursos e mobilizá-los em um contexto Saber transpor Saber aprender e aprender a aprender Saber envolver-se

- saber construir competências a partir de recursos; - saber tirar partido não somente de seus recursos incorporados (saberes, saber-fazer, qualidades), mas também dos recursos de seu meio.

- saber memorizar múltiplas situações e soluções-tipos; - saber distanciar-se, funcionar em “dupla-direção”. - saber utilizar seus metaconhecimentos para modelizar; - saber determinar e interpretar indicadores de contexto; - saber criar as condições de transponibilidade com o auxílio de esquemas transferíveis.

- saber tirar lições da experiência; saber transformar sua ação em experiência;

- saber descrever como se aprende;

- saber agir em circuito duplo de aprendizagem.

- saber envolver sua subjetividade; - saber assumir riscos;

- saber empreender; - ética profissional.

competência, porém também é fundamental a ação, ou seja, assumir responsabilidades diante de situações de trabalho complexas.

Enfim, nessa abordagem o conceito evoluiu e passa a compreender, além dos conhecimentos, habilidades e atitudes, os recursos fisiológicos e ambientais.