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5 AVALIAÇÃO PÓS-OCUPAÇÃO – APO

5.1 Abordagem multimétodo

Villa (2013) afirma que a adoção de multimétodos – qualitativos e quantitativos – apresenta- se como uma possibilidade metodológica para a compreensão dos complexos problemas de pesquisa na área do ambiente-comportamento. A abordagem multimétodo (GÜNTHER, ELALI, PINHEIRO, 2008; ELALI, PINHEIRO, 2013) combina métodos e técnicas com os seguintes objetivos:

a) aprofundar as possibilidades de análise do fenômeno estudado;

b) ampliar o repertório de informações do pesquisador durante o processo analítico; c) complementar e equilibrar as eventuais distorções ou vieses de cada abordagem; d) possibilitar a elaboração de um diagnóstico consistente, minimizando a existência de

Elali e Pinheiro (2013, p. 22) afirmam que a escolha do método e das técnicas de pesquisa está relacionada aos objetivos da proposta, ao tempo e à tecnologia disponíveis para o processo coleta-sistematização-análise dos dados. A opção metodológica também depende da facilidade de abordagem dos interlocutores e de acesso às informações e à disponibilidade de recursos financeiros e humanos. O conjunto de métodos e técnicas deve ser utilizado e combinado de acordo com os objetivos, os prazos e os recursos humanos e materiais disponíveis a partir das possibilidades e limitações intrínsecas a cada um dos instrumentos com os quais pretende-se trabalhar. Os instrumentos se complementam e podem, portanto, ser considerados mais ou menos adequados ao contexto, ao prazo e à disponibilidade; são as condições que determinam os instrumentos, e não o contrário.

A principal vantagem do uso de múltiplas fontes de evidência é a possibilidade de desenvolvimento de linhas convergentes de investigação, cujas conclusões são mais convincentes e acuradas quando possibilitam corroborar fatos ou fenômenos a partir da triangulação dos dados. Contudo, a utilização de múltiplas fontes de evidência impõe maior carga de trabalho ao pesquisador e torna necessária a sua familiarização com diferentes procedimentos de coleta, análise e interpretação dos dados (YIN, 2010). A abordagem multimétodo exige a integração dos resultados na etapa de análise e assegura uma importante convergência informacional sobre o ambiente em questão, impondo um considerável esforço de síntese (GÜNTHER, ELALI, PINHEIRO, 2008).

A seleção dos instrumentos aplicados nesta pesquisa foi precedida de uma análise das vantagens e desvantagens de cada um deles. O instrumento central foi o questionário aplicado aos usuários com deficiência visual, que permitiu a coleta de dados primários junto às pessoas que utilizam o sistema metroviário de forma habitual. A opção por esse instrumento permitiu, desde o início, assegurar a correta definição do problema sob a ótica das pessoas com deficiência visual, abordando suas necessidades, seus problemas e sua realidade.

Os aspectos abordados nos questionários aplicados aos usuários com deficiência visual deveriam ser objeto de pelo menos um instrumento adicional, aplicado junto às pessoas-chave e especialistas. Tal procedimento possibilitaria a coleta simultânea ou sequencial de dados quantitativos e qualitativos, relacionados aos serviços oferecidos pelo Metrô de São Paulo, o que permitiria uma visão abrangente da situação experimentada pelas pessoas com deficiência

visual a partir da perspectiva de fontes adicionais, por meio de entrevistas individuais ou em grupo realizadas com pessoas-chave e especialistas.

Os aspectos abordados nos questionários e nas entrevistas foram complementados com dados qualitativos e quantitativos coletados em instrumentos adicionais aplicados nos ambientes do sistema metroferroviário – estações, interface trem-estação e trens, o que favoreceu os seguintes aspectos:

a) obtenção de evidências por meio de pesquisa documental em legislação, normas técnicas, publicações, desenhos, procedimentos operacionais e manifestações dos usuários;

b) elaboração de checklist a partir da análise de desenhos, projetos e normas técnicas; c) realização de walkthrough nos percursos de embarque e desembarque;

d) elaboração de ficha ambiente;

e) observação de fluxo, de comportamento e de capacitação dos usuários com deficiência visual e dos demais usuários;

f) identificação das melhores práticas (benchmarking) verificadas em outros sistemas de transporte.

Para Sellitz et al. (1974), a etapa de concepção da coleta de dados é o momento em que são introduzidas medidas que impedem o viés e a imprecisão. A elaboração do protocolo consistiu na definição de procedimentos de campo e regras gerais a serem seguidas na coleta de dados das pessoas e da instituição, incluindo o acesso à organização objeto de estudo, aos entrevistados e respondentes, aos recursos materiais necessários à investigação e à programação das atividades relacionadas à disponibilidade das pessoas envolvidas (YIN, 2010). Além de identificar os dados que deveriam ser coletados, o protocolo estabeleceu requisitos para cada um dos instrumentos aplicados, tais como a forma de abordagem, o horário de observação e a forma de registro. Depois de construídos, os instrumentos de coleta de dados foram aplicados em caráter de pré-teste para validação, possibilitando ajustes dos conteúdos ou das condições de aplicação ou de registro.

A análise teve como objetivo organizar os dados de forma a possibilitar o fornecimento de respostas ao problema da investigação. Para proceder à análise das evidências e informações provenientes de cada um dos instrumentos aplicados, foram observados os seguintes passos:

(a) estabelecimento de categorias; (b) codificação; (c) tabulação e (d) análise estatística dos dados (GIL, 2010).

Na etapa de interpretação dos resultados, buscou-se conectar os resultados dos dados coletados com as referências teóricas anteriormente obtidas. Para proceder à interpretação dos resultados, foram observados os seguintes passos: (a) avaliação das generalizações; (b) inferência das relações causais e (c) interpretação dos dados (GIL, 2010).

5.2 Considerações sobre o capítulo

Neste capítulo foram abordadas as justificativas para adoção de uma abordagem metodológica baseada em multimétodos como forma a possibilitar a compreensão dos complexos problemas de pesquisa na área do ambiente-comportamento a partir de métodos centrados na relação entre a pessoa e o ambiente – cujo foco está na interação – e de métodos centrados no ambiente – considerando o foco de sua utilização por pessoas com deficiência visual.

O desenho do protocolo de coleta, análise e interpretação dos dados será apresentado no próximo capítulo. Por ora, pode-se afirmar que a abordagem multimétodo e a seleção dos instrumentos aplicados deveriam possibilitar a obtenção de dados sobre a sequência e as interações realizadas na jornada do usuário, apresentadas no capítulo anterior, e a comprovação de fatos ou fenômenos a partir da triangulação dos dados, incluindo os seguintes aspectos:

a) as ações realizadas pelo usuário com deficiência visual relacionadas à utilização de equipamentos e instalações;

b) os contatos realizados com demais usuários; c) os relacionamentos entre usuários e funcionários;

d) os papéis desempenhados pelos funcionários durante o auxílio nos deslocamentos; e) as ações dos funcionários na linha de frente;

f) os relacionamentos entre funcionários das diferentes áreas, na retaguarda; g) os processos, as rotinas, as regras, os procedimentos e os roteiros de serviço;

h) as evidências físicas dos ambientes (configuração, informação das estações, dos trens e da interface entre eles.).

Dessa forma, a abordagem multimétodo possibilitaria a elaboração de diagnósticos consistentes e completos, fundamentando recomendações para os objetos de estudo e, quando sistematizados, possibilitaria eventual incorporação de requisitos normativos em futuras revisões dos textos relacionados à acessibilidade, atendendo as necessidades das pessoas com deficiência visual durante seus deslocamentos na rede metroferroviária, seja pela adequação das instalações como pela adequação dos serviços prestados.

Considerando que as experiências na utilização de um mesmo ambiente, produto ou serviço por pessoas com deficiência resultam em contribuições diferenciadas – face às habilidades e limitações durante a interação ou experiência de uso – (PREISER, 2005), entende-se que a abordagem multimétodo e a triangulação dos dados representou uma oportunidade de corroborar e complementar as informações obtidas a partir de diferentes fontes. Dessa forma, a quantificação dos relatos dos usuários sobre eventuais dificuldades durante as interações permitiria apurar dificuldades comuns às várias pessoas com deficiência visual, portanto mais críticas.

A utilização de múltiplas fontes de evidência impôs uma elevada carga de trabalho nas diferentes fases – coleta, análise e interpretação dos dados (YIN, 2010). Porém, o maior impacto se deu na etapa de análise e interpretação dos dados, onde foi dispendido tempo além do previsto inicialmente, pois exigiu esforço adicional para a integração dos resultados na etapa de análise, de forma que pudesse assegurar a convergência das informações sobre as diferentes etapas da jornada, impondo um considerável esforço de síntese (GÜNTHER, ELALI, PINHEIRO, 2008).

No próximo capítulo, serão apresentados os métodos e as técnicas utilizados para o desenvolvimento desta tese, a partir da justificativa de seleção de cada um dos instrumentos, da explicitação do protocolo de coleta e a forma de análise e interpretação dos dados.