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CONDIÇÕES MATERIAIS COLETIVAS

1.3.5. Acessibilidade Urbana

A localização e a configuração física, bem como a forma de mobilidade das pessoas, são fatores que influenciam na facilidade ou na dificuldade de alcance de pontos intraurbano. A qualidade de vida de um local e da própria população está diretamente ligada à acessibilidade física que, por sua vez, relaciona-se com o sistema operacional e a infraestrutura básica utilizada ao longo do trajeto a ser tomado.

A realização de diversas atividades e a aquisição de bens e serviços depende dos deslocamentos diários das pessoas dentro de uma cidade, necessários para alcançar um determinado lugar, seja o trabalho, casa, ou espaços de lazer, e realizados a partir de determinadas rotas físicas.

Segundo Silveira et al. (2007), esses percursos podem constituir, além de uma linha no espaço e no tempo descrita pelo movimento que define a direção de fluxos de circulação cotidianos, uma indicação de vetor de expansão intraurbana. Tais vetores podem assinalar uma região que pode ser vista como polarizada, no que diz respeito à sua atratividade e desenvolvimento, e está associada à densidade de oferta de infraestrutura básica e de atividades desenvolvidas, ao longo da sua área de influência. Conforme os autores, o percurso pode se concretizar como linha ordenadora do traçado intraurbano e modelador da morfologia da urbe, a partir dos espaços livres e, sobretudo, a partir da acessibilidade e da mobilidade, com efeitos sobre a produção de espaços segregados.

Villaça (2000, p. 23) explica que “a acessibilidade é mais vital na produção de localizações do que a disponibilidade de infra-estrutura. Na pior das hipóteses, mesmo não havendo infra - estrutura, uma terra jamais poderá ser considerada urbana se não for acessível”. Assim, de

53 certa forma, consoante Silveira e Ribeiro (2006. p.173), “a produção do espaço intra-urbano não será satisfatoriamente compreendida se não for explicada a acessibilidade, considerando-se as formas e as localizações”.

A acessibilidade urbana, como atributo urbano, pode ser, portanto, relacionada à capacidade de alcance e contato com outras pessoas e atividades urbanas, aos recursos materiais, aos serviços, ao lazer e às informações. Segundo Odoki et al. (2001), acessibilidade pode ser entendida como a facilidade com que um indivíduo pode realizar as atividades que deseja, a partir de um determinado local, por meio de um determinado modo de transporte.

Também pode ser definida como uma das propriedades do espaço intraurbano que pode ser medida pela disponibilidade de espaços viários ou de sistemas adequados à circulação (LINHARES, 1988; NIGRIELLO, 1977 apud RIBEIRO et al., 2007).

Silveira e Ribeiro (2006) também explanam que a acessibilidade pode ser mensurada pelo número, natureza e maneira que os destinos desejados por uma pessoa podem ser alcançados. Estes autores citam como uma das formas de medida, a densidade de espaços livres, sobretudo das vias urbanas, para pedestres e usuários de automotores, ou ainda a densidade de linhas de transporte coletivo.

Gomide et al. (2006, p.9) enfatizam a relação entre acessibilidade e a qualidade de serviços urbanos e de transporte coletivo:

“a acessibilidade física diz respeito à facilidade da utilização dos

serviços pelos usuários, entre eles a distância a ser percorrida a pé até o ponto, terminal ou estação mais próxima, a disponibilidade de informações sobre os serviços (horários e itinerários), e a existência de

vias pavimentadas que possibilitem a entrada de veículos nos bairros.”

Outra análise conceitual subdivide a acessibilidade em macroacessibilidade e microacessibilidade. A macroascessibilidade se refere à facilidade relativa de atravessar a cidade e atingir as construções e equipamentos urbanos desejados, abrangendo o sistema viário e o sistema de transporte em geral. Já a microacessibilidade refere-se à facilidade relativa do pedestre de obter acesso direto aos veículos ou aos destinos desejados, como pontos de ônibus ou estacionamentos (VASCONCELLOS, 1996).

Um importante conceito associado à acessibilidade é a mobilidade, que pode assumir diversas conotações. Esta pesquisa se deterá apenas a compreender a mobilidade urbana, entendida como o conjunto dos deslocamentos que as pessoas efetuam para atingir seus destinos e realizar as mais variadas atividades, com base no locus urbano, ou seja, no espaço livre público

54 (MCIDADES, 2004). Também pode ser vista como a facilidade de movimento, seja de indivíduos, bens, capital ou informações (SAGER, 2006). A mobilidade urbana, enquanto ação que permite a realização de outras atividades cotidianas, é permeada pelas condições de localização no espaço urbano e acessibilidade às redes de transporte.

Categoricamente, a acessibilidade de um local em relação aos setores de atividades econômicas, sociais e culturais é um dos condicionantes que determinam o valor do solo, o seu uso e a intensidade de desenvolvimento. Para Silveira et al (2007), o tecido urbano desenvolve-se com base em linhas diferenciadas de acesso e movimento, contribuindo na formação de percursos e vetores de expansão distintos. A articulação entre os elementos da morfologia (espaços livres), da ocupação (localização urbana), do uso do solo e das práticas dos agrupamentos sociais é também determinada pelas condições de acessibilidade e mobilidade. Isso significa que a acessibilidade, enquanto atributo do espaço urbano, pode se revelar como uma questão de atrito entre a atratividade de um ponto e as dificuldades de acessá-lo (NIGRIELLO, 1977 apud RIBEIRO 2007).

Cardoso e Matos (2007) ressaltam tal influência, evidenciando também a relação entre a acessibilidade, a dinâmica socioespacial e a qualidade de vida:

A acessibilidade urbana é condicionada pela interação entre o uso do solo e o transporte e se constitui como um importante indicador de exclusão social, ao lado, entre outros, da mobilidade, da habitação, da educação e da renda . Nesse sentido, a acessibilidade, ao ser parte integrante e fundamental da dinâmica e do funcionamento das cidades, passa a ser um elemento que contribui para a qualidade de vida urbana, na medida em que facilita o acesso da população aos serviços e equipamentos urbanos, além de viabilizar sua aproximação com as atividades econômicas.

Consoante Haddad (2012, p.2), o processo de urbanização e a dinâmica de crescimento das cidades colocam a acessibilidade como fator relevante na qualidade de vida da população.

“[...] argumentam CARRUTHERS e LAWSON (1995), as cidades deveriam ser

planejadas de forma que toda a população tivesse acesso a todos os lugares. Entretanto, o crescimento descontrolado das grandes cidades ocasionou a segregação socioeconômica da população no espaço urbano, sendo as camadas mais pobres deslocadas para as áreas periféricas, onde existem menos oportunidades e maiores custos relacionados ao deslocamento. Estes fatores determinam prejuízos significativos à qualidade de vida da maior parcela da

população. (VASCONCELOS, 1993).”

Estudos sobre desenvolvimento urbano sustentável, apontam a acessibilidade urbana como uma das questões primordiais para otimizar a eficiência de uma cidade e consequentemente o

55 aumento da sua qualidade de vida. Segundo a Fundação Getúlio Vargas, devido aos congestionamentos diários, os usuários de veículo particular da capital de São Paulo, debitam um custo adicional de R$ 930,00 (novecentos e trinta reais) por ano. Em média, os carros se locomovem a 15 quilômetros por hora e consomem mais combustível que os carros que vão a 50 quilômetros em pista livre. Essa situação é, sem dúvida, resultado do crescimento desordenado da cidade e do substancial aumento da frota de veículos particulares. Para Raia (2000), a acessibilidade cresce quando os seus deslocamentos apresentam um custo menor e a propensão para interação entre dois lugares cresce com a queda do custo dos movimentos entre eles.

Assim, menores distâncias entre pólos podem acentuar e destacar um eixo de crescimento da cidade, além de representar oportunidades urbanas para o indivíduo ou grupo de indivíduos (SILVEIRA et al, 2007) e revelar uma das facetas da qualidade de vida local.

A acessibilidade é, portanto, um conceito/medida imprescindível para o entendimento da função, forma e distribuição espacial, assim como para a ponderação da qualidade de vida de uma dada região, como ratifica Hanson (1995, p.5) “a acessibilidade deveria ser um tópico central de uma

medida de qualidade de vida”6 .

Kralich (1996) desenvolveu um estudo utilizando a acessibilidade como indicador de nível de qualidade de vida. Aplicou sua metodologia na Região Metropolitana de Buenos Aires, considerando os lugares ofertados nas diversas linhas radiais de transporte público por ônibus e ferroviário, e indicadores demográficos quantitativos e qualitativos.

Por sua vez, os estudos de Januario e Campos (1996) utilizam variáveis voltadas para a eficiência da acessibilidade por transporte público, desenvolvendo um indicador de natureza

qualitativa, conhecido como “facilidade de deslocamento”, a partir de medidas como tempo,

custo e distância a ser percorrida. Carrera (2002) analisa a acessibilidade a partir de cinco pontos: (a) a separação, física ou temporal, de um ponto a outro, ou de um ponto aos demais; (b) o custo de deslocamento das viagens; (c) a oportunidade de um indivíduo de um determinado local em acessar uma atividade; (d) a oportunidade média do total de moradores de uma região em acessar uma atividade; e (e) o excedente dos consumidores usuários do sistema de transporte.

6O conceito acessibilidade tem sido objeto de estudo de vários campos científicos, assumindo distintas perspectivas

e interpretações, por vezes complementares, bem como diferentes utilizações e métodos de avaliação de acordo com cada área temática - localização urbana; localização industrial e de negócios; distribuição da população; expansão das redes de transporte; estudo sobre equidade urbana; acesso ao emprego; qualidade de vida; sustentabilidade urbana; entre outras. Não obstante, este tópico se deterá às linhas de estudos que exploraram variáveis que relacionam a acessibilidade à qualidade de vida.

56 Haddad (2012) também elaborou um índice de acessibilidade para a Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), que pondera o número de oportunidades acessíveis a cada região pela impedância em atingi-las. Nesse índice, as oportunidades são definidas pela quantidade de empregos nos principais centros de atração, e a impedância, como tempo de deslocamento a esses centros. Para obtenção dos índices foram observados os deslocamentos via veículo particular e por transporte público.

Em geral, a maioria dos estudos relativos à ênfase da acessibilidade sobre a qualidade de vida utiliza os parâmetros “tempo” (tempo gasto entre a origem/ponto de embarque e o destino/ponto de desembarque) e “custo de viagem”, utilizando matrizes, onde se pondera tais parâmetros para cada modal.

Os estudos sobre qualidade de vida urbana, que consideram a acessibilidade com um dos principais indicadores, complementam os parâmetros supracitados, avaliando também a articulação entre uso do solo e oportunidades, a qualidade do sistema de circulação e de transporte (Ribeiro et. al, 1998), e as despesas com transporte (IQVU-BH; IDU-Salvador; IQVU- JP, entre outros).

O indicador de acessibilidades urbanas que compõe a metodologia IQVU-JP, tem como objetivo indicar os níveis de facilidade de acesso físico à oportunidades de trabalho, estudo, compras e lazer, promovido ou pela articulação entre as diversas opções e o uso residencial ou ainda pelos elementos facilitadores de deslocamento e mobilidade). Para tanto, adota-se uma graduação espaço temporal, tomando como referência principal a distância ao centro (pólo gerador de emprego, renda, escolas e oferta de bens e serviços); a distância a centros secundários ou áreas de oferta de escolas e ofertas de bens e serviços e, por fim, a distância a espaços públicos de lazer (praias e parques públicos).