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CONDIÇÕES MATERIAIS COLETIVAS

1.3.6. Ambiência Urbana

O termo “ambiência” que comumente é compreendido como meio material ou moral onde se

vive, pode ser entendido também, segundo o dicionário Caldas Aulete, como “o espaço arquitetonicamente organizado e animado que constitui um meio físico e, ao mesmo tempo, meio

estético ou psicológico, especialmente preparado para o exercício de atividades humanas”. A palavra “urbano”, por sua vez, assume diversas conotações a depender do seu emprego, porém, como colocado no termo “ambiência urbana”, entende-se “urbano” como tudo aquilo que é

57 relativo à cidade, em oposição ao rural. Portanto, “ambiência urbana” é apreendida como o

ambiente alterado pela ação antropomórfica, onde o homem urbano exerce suas atividades.

Como a literatura pertinente ao tema emprega, de forma recorrente, o termo “ambiência urbana”

para abordar a qualidade ambiental urbana ambiência urbana, será apresentado a seguir um debate sobre como emergiu a importância, a conceituação e as formas de avaliação da qualidade ambiental urbana.

Este tópico trata de uns dos temas que atentaram a consciência humana para a reflexão do bem estar do planeta e da sua influência direta no modo de vida das pessoas. Tal consciência não foi despertada graças aos avisos de “socorro” dados pelo conjunto harmonioso dos ecossistemas naturais, mas esse sentimento de reparo (pseudo-consciência) foi ativado pelo risco em que a humanidade se encontrava face ao esgotamento das matérias primas que satisfazem as suas necessidades. Neste sentido, é interessante fazer um breve comentário sobre a influência da ocupação do homem moderno em um sistema ecológico até então equilibrado. O documentário

“Home”, produzido pelo jornalista e ambientalista francês Yann Arthus-Bertrand, retrata essa situação ao descrever a exploração desenfreada do homem sob o planeta Terra:

“o ‘homem inteligente’ se beneficia de um fabuloso legado com quatro bilhões de anos doado pela Terra. Apareceu no cenário há 200 mil anos, mas já alterou a face do mundo. Apesar da sua vulnerabilidade apoderou-se de todos os habitats e conquistou fatias de territórios como nenhuma outra espécie antes de si”.

A maioria dos artigos relacionados à ambiência urbana, à qualidade urbana e a temáticas afins retratam a problemática ambiental, sobretudo, a partir do século XIX, quando houve um acelerado avanço da urbanização. No entanto, é interessante ilustrar essa história, incluindo também a ação do ego humano se sobrepujando ao sistema ecológico (com mais de 8,6 milhões de espécies de seres vivos) desde as primeiras civilizações.

Não é objetivo desta pesquisa se aprofundar como o ‘homem inteligente’ (homo sapiens) divide o planeta com as espécies de plantas e animais existentes, mas atentar que os problemas ambientais são consequências de um comportamento embrionário e como cita o biólogo Robert

May, “narcisista da humanidade” 7

. As primeiras civilizações surgiram nas margens dos Grandes Rios (Tigres e Eufrates, Nilo, Amarelo e o Indo) e logo se apoderaram de recursos naturais para

7 Comentário feito pelo ex-presidente da Sociedade Real Britânica para um artigo publicado na revista científica

inglesa "PLos Biology", em 2011. May RM (2011) Why Worry about How Many Species and Their Loss? PLoS Biol 9(8): e1001130. doi:10.1371/journal.pbio.1001130.

58 satisfazer além das necessidades de sobrevivência, as necessidades de poder político e domínio social com suntuosas e monumentais construções e comportamentos extravagantes.

Porém, sem dúvida, como apontam os estudiosos Leite e Awad (2012), Mazzeto (2000) e Ribeiro (2001), o agravamento da “questão ambiental” assumiu posto emergencial depois da cidade pós-liberal e da Era Industrial e com o crescimento exponencial da população urbana, observado a partir do século XIX. Leite e Award (2012) atenta para a explosão urbana contemporânea e expõe em números a inversão do perfil populacional mundial – de rural para urbano.

“Desde 2007 o mundo presencia uma realidade nova, historicamente radical: há mais gente nas cidades que no campo. Há cem anos, apenas 10% da população vivia em cidades. Atualmente, somos mais de 50%, e até 2050 seremos mais de 75%. [...] Em 1800, apenas 3% da população vivia em cidades. Em 1950, 83 cidades tinham mais de 1 milhão de habitantes. E, 1990, mais da metade da população dos Estados Unidos já viva em metrópoles com mais de 1 milhão de habitantes. Em 2007, eram 468 as metrópoles desse porte

no mundo.” (LEITE & AWARD, 2012, p. 20)

Com esse intenso incremento populacional, observou-se uma série de fatores que agravaram

significativamente a “questão ambiental”, dentre eles - o acelerado grau de urbanização; o

intenso processo de degradação do meio ambiente e dos recursos naturais, provocados pela intensificação do crescimento econômico; o aumento da produção industrial; a explosão demográfica; a produção e o consumo em massa; a modernização agrícola; e o aumento da utilização de combustíveis fósseis que elevou os índices de poluição.

Diante deste contexto, o homem urbano contemporâneo começou a sentir interferências no seu habitat e passou a se preocupar tanto com a degradação ambiental, como com a qualidade ambiental urbana – ambas compreendidas como elementos integrantes da qualidade de vida do homem urbano-.

“É exatamente nesse contexto que a vida nas cidades se torna importante e

ganha destaque tendo em vista as condições do meio físico urbano que adquiriu características peculiares decorrentes da ação antr ópica intensificada bruscamente com o avanço das técnicas no decorrer do século XX e, conseqüentemente com a aquisição de novos padrões de vida decorrentes

também da urbanização.”

“a humanidade enfrentará os efeitos negativos dos últimos duzentos anos de

crescimento populacional e econômico que provocaram o desequilíbrio

ecológico e a degradação do meio ambiente físico e social” (MAZZETO, 2000,

p.29).

Esse cenário realça a atual importância de se investigar a qualidade ambiental urbana, como enfatiza Nogueira e Claro (2012):

59 “[...] a qualidade ambiental urbana constitui objeto de bastante relevância

haja vista a importância do termo para o século XXI que entra em cena aliando um forte incremento demográfico a uma sociedade de consumo exacerbado, onde a degradação ambiental ganha escopo como uma das mais graves

consequências do atual sistema econômico mundial”.

O conceito de qualidade ambiental urbana está intimamente associado ao de qualidade de vida urbana, uma vez que vida e meio ambiente são inseparáveis (OLIVEIRA, 1983) -, e, além disso, o conceito também corresponde à capacidade e às condições do meio urbano em atender às necessidades de seus habitantes.

Borja (1997, p.4) explica que o conceito de Qualidade Ambiental Urbana refere-se às condições ambientais do meio urbano natural e cultural resultante da ação antrópica e que o mesmo pode ser percebido de forma diferenciada por indivíduos e grupos de indivíduos em função de aspectos socioculturais: “cada grupo social tem demandas específicas em relação ao meio ambiente urbano, respaldadas em concepções de vida, desejos e necessidades culturalmente construídos.”

Outros estudos, como os de Nasar (1991) e Ribeiro (2001) também tratam o conceito de qualidade ambiental urbana como produto da percepção da população. Nestes estudos foram apontados uma série de atributos urbanos que interfeririam na qualidade ambiental. Os atributos considerados negativos são, por exemplo, comércio caótico, sinais, placas, letreiros, sujeira, pontes estreitas, degradação de postes e cercas e, indústrias. Já, os atributos que interfeririam de forma positiva são relacionados às belas paisagens, à presença de vegetação, à prédios novos, à topografia ou à organização, à ausência de ruídos, entre outros.

Damiani (2011) complementa que para se obter um ambiente com boa qualidade ambiental,

deve-se levar em consideração a satisfação pessoal nas diversas dimensões da vida humana. De acordo com esta perspectiva e de forma consensual, vários estudos (RIBEIRO, 2009; NASAR, 1991; BORJA, 1997) consideram como fatores degradantes de um ambiente, os seguintes: sujeira; trânsito; concentração populacional demasiada; construções desordenadas; ausência de elementos naturais como solo permeável, água e vegetação; os diversos tipos de poluição; além dos gargalos sociais presentes nesse meio.

Apesar da dimensão e da avaliação qualitativa subjetiva, existem diversos estudos dedicados à elaboração de indicadores que meçam a qualidade ambiental urbana de recortes territoriais específicos. Por exemplo, o Índice de Qualidade Ambiental aplicado à cidade de Salvador-BA avalia uma compilação de aspectos que ultrapassam à questão ambiental, incluindo também aspectos gerais da qualidade de vida (ver tópico 1.3.3 Qualidade de Vida Urbana). Já a dimensão das condições ambientais urbanas do Índice de Bem-Estar Urbano (IBEU) foi concebida por

60 apenas três indicadores: arborização do entorno dos domicílios, esgoto a céu aberto no entorno dos domicílios e lixo acumulado no entorno dos domicílios. Por sua vez, o Índice de Ambiência Urbana (Iaam) do IQVU-JP JP abrange uma gama maior de aspectos específicos à qualidade perceptiva ambiental, incluindo as condições físicas do ambiente natural e antrópico e sociais.