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Capítulo 3 A aprendizagem das operações aritméticas

3.2. Adição e subtração

3.2.1. Adição e subtração com números-dígito

Os psicólogos e os educadores matemáticos foram, durante muitas décadas, bastante influenciados pelos estudos realizados por Piaget, partindo do pressuposto que a aprendizagem se faz através de estádios sequenciais com determinadas características. Em particular, para desenvolver a compreensão sobre o conceito de número, as crianças teriam de passar pelo estádio pré-operatório, onde as operações lógicas tais como a classificação, a seriação e a conservação das quantidades ainda não foram assimiladas e apenas no estádio das operações concretas, por volta dos 6-7 anos, estas teriam condições para compreender aspetos relacionados com o conceito de número natural. No entanto, foram surgindo algumas críticas à teoria de Piaget em termos gerais: a objeção ao estruturalismo, a dificuldade de articulação da teoria com a influência do contexto social, a demasiada rigidez entre os estádios e a caracterização do estádio formal. No que diz respeito ao desenvolvimento do conceito de número natural, a sua teoria também foi posta em causa por alguns investigadores, apesar de haver outros que se basearam em alguns aspetos que consideraram relevantes evoluindo para teorias próximas das piagetianas mas considerando, nomeadamente, as interações socioculturais no desenvolvimento dos conceitos (Verschaffel et al., 2007).

3.2.1.1. Estruturas conceptuais

Nos anos 90 do século XX, começam a surgir alguns estudos associados ao desenvolvimento dos conceitos numéricos e das operações, colocando em causa a ideia que caracterizava, de um modo geral, a aprendizagem das operações com números com

um só dígito como “aprendizagem de factos matemáticos” (Fuson, 2003a). Destes, destaco os que relacionam as estratégias e os procedimentos usados pelas crianças na resolução de tarefas simples de adição e de subtração com o seu desenvolvimento conceptual, começando por apresentar o modelo de desenvolvimento das estruturas conceptuais para a adição, proposto por Fuson (Carpenter, Franke, Jacobs, Fennema & Empson, 1998; Fuson, 1992a, 1992b; Fuson et al., 1997a; Fuson, Smith & Cicero, 1997b; Sherin & Fuson, 2005).

Uma caracterização de estruturas conceptuais é proposta por Fuson et al. (1997b) “Nós entendemos as estruturas conceptuais como categorias hipotéticas de atividade quantitativa que parecem ser úteis na compreensão do ensino e aprendizagem de um domínio” (p. 740). Numa outra publicação (Fuson et al., 1997a) a expressão “estrutura conceptual” é entendido, de uma forma geral, como uma interpretação mental do mundo que nos rodeia. Mais especificamente, “uma estrutura conceptual em uso indica/reflete os aspetos de uma situação matemática considerada pelo utilizador num dado momento: ela capta quais os que aspetos que são focados e como são interpretados” (p. 133).

O modelo de desenvolvimento das estruturas conceptuais respeitantes às operações adição e subtração inclui três níveis progressivos, que variam em termos das unidades e operações conceptuais e dos métodos9 usados pelas crianças para adicionar e subtrair.

3.2.1.2. Estruturas conceptuais e métodos usados

No primeiro nível do modelo de desenvolvimento das estruturas conceptuais relativo à operação adição, denominado por Itens de unidade percetual (perceptual unit

itens), as crianças são capazes de construir situações de adição usando objetos físicos de

vários tipos. Estes objetos são usados para modelar a operação, que encaram como a junção de unidades simples. As crianças veem apenas uma representação de cada vez,

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Fuson usa o termo método (method) em alguns dos seus artigos, preferindo-o aos termos procedimentos (procedures) e estratégias (strategies). No entanto, em outros artigos mais recentes e em colaboração com outros investigadores, são

seja ela a correspondente a uma das parcelas ou à soma, o que tem consequências em termos dos procedimentos que usam. Os métodos associados a este primeiro nível são denominados por contar tudo, pois as crianças começam num dos conjuntos de objetos ou na sua representação e contam tudo a partir do um, usando o mesmo procedimento para todos os conjuntos, até chegar ao total (Sherin & Fuson, 2005).

No segundo nível, denominado por Integração inclusa (embedded integration), as três quantidades (relativas às parcelas e à soma na adição correspondente) podem ser, simultaneamente, vistas e representadas enquanto entidades incluídas e relacionadas entre si, o que permite a aplicação de métodos de contagem mais abreviados e eficientes do que os usados no primeiro nível. Os procedimentos associados a este nível de desenvolvimento conceptual são denominados por contagem a partir de, pois as crianças partem da contagem de uma das quantidades e continuam a partir daí, até chegar ao total (Fuson, 1992b).

Finalmente, no terceiro nível, Itens de unidade ideal (ideal unit itens), as crianças já criaram estruturas que lhes permitem construir, simultaneamente, representações mentais dos números que correspondem às parcelas e à soma. Neste nível as parcelas não estão contidas na soma, são vistas separadamente e podem ser comparadas com ela. “Os números são encarados como unidades que incluem tríades numéricas – duas parcelas e uma soma conhecidas” (Sherian & Fuson, 2005, p. 351). Assim, as crianças são capazes de transformar uma adição noutra recompondo os números, de modo a usar números conhecidos ou, ainda, a recorrer a estratégias derivadas de factos conhecidos associados a esta operação. Por exemplo, podem apelar ao uso dos dobros para determinar 3+4, calculando 3+3+1 ou utilizar composições dos números usando o 5, para determinar 6+3, calculando 5+4. As estratégias associadas ao terceiro nível são denominadas por factos

conhecidos e factos derivados (Fuson, 1992b).

No que diz respeito à subtração e partindo do mesmo modelo de desenvolvimento das estruturas conceptuais, Fuson (2003a) associa cada um dos seus níveis à utilização de métodos de subtração diferentes, apesar de não considerar essa associação tão explícita como na adição. Os métodos iniciais inventados pelas crianças no primeiro nível estão

relacionados com situações de partir do total de objetos, retirar alguns de acordo com a situação e contar os restantes para obter a diferença.

Na subtração, os métodos associados ao segundo nível de desenvolvimento das estruturas conceptuais são de contagem, podendo variar o modo como esta se processa. Em alguns casos, as crianças podem fazer contagens decrescentes (contar para trás), partindo do aditivo e chegando ao resto e, em outros casos, partindo do número antes do aditivo e chegando ao resto. Qualquer um destes métodos, muito usados nos Estados Unidos e no Canadá, é difícil para as crianças, apesar de, muitas vezes, estas usarem os dedos das mãos como recurso. Um outro método considerado mais fácil, é contar até, partindo do subtrativo e chegando ao aditivo e que é usual, sobretudo, em alguns países da América Latina e da Europa (Fuson, 2003a).

Associados ao terceiro nível de desenvolvimento conceptual da subtração estão outros métodos relacionados com factos conhecidos ou derivados, como por exemplo,

recorrer ao 10. Apesar de Fuson (2003a) reconhecer que há muito menos investigação

sobre a subtração envolvendo números com um dígito, quando comparada com a que existe sobre a adição, dá o exemplo do Leste da Ásia onde são trabalhados dois tipos de métodos associados ao número dez. Ilustrando um dos métodos com a subtração 15−9, adiciona-se um ao número nove (até ao 10) e depois mais cinco (até ao 15), logo 15−9=6 porque (1+5=6). Usando um outro método para efetuar a mesma subtração 15−9, tira-se cinco do quinze, e tira-se mais um do dez até ao nove, e ficam seis (5+1).

Muitos destes métodos inventados pelas crianças podem ser trabalhados na sala de aula e Fuson (2003a) refere mesmo que, no final do primeiro ano, os alunos deveriam progredir em termos dos métodos que usam associados tanto à adição como à subtração com números-dígito, recorrendo a estratégias rápidas e apropriadas, sobretudo as relacionadas com a contagem a partir de e a contagem até.