• Nenhum resultado encontrado

Capítulo 3 A aprendizagem das operações aritméticas

3.2. Adição e subtração

3.2.2. Adição e subtração com números multidígitos

3.2.2.3. Estratégias de adição e subtração com números multidígitos

Para além dos estudos referidos na subsecção anterior, relacionando estruturas conceptuais e métodos usados, salientam-se outras investigações cujo propósito é identificar as estratégias inventadas e usadas pelas crianças na adição e subtração quando os números envolvidos são menores que 20 ou estão entre 20 e 100 (Carpenter & Moser, 1984; Thompson, 2003b; 2003c).

No que respeita aos números até 20, são caracterizadas diferentes estratégias de cálculo mental usadas pelas crianças quando resolvem problemas de adição e subtração. Um dos estudos a realçar é realizado por Thompson, que agrupa as estratégias utilizadas pelos alunos na resolução de problemas de adição e subtração com números até 20. Estas são organizadas em estratégias de contagem e estratégias que envolvem o uso de factos numéricos, conhecidos ou derivados (Thompson, 2003b). As estratégias de contagem identificadas por este autor são: contar a partir do primeiro número, contar a partir do número maior, contar para trás a partir de, contar para trás até e contar para a frente a partir de. As estratégias de cálculo que envolvem o uso de factos numéricos conhecidos ou derivados são: usar os dobros (na adição), usar os “quase dobros” na subtração ou na adição, usar a subtração como inversa da adição, usar a estrutura do cinco e do dez, compensar e redistribuir. As estratégias de contagem com números até 20 identificadas por Thompson (2003b) são muito semelhantes às já referidas por Fuson et al. (1997a) e Fuson (2003a), a propósito dos números-dígito, apesar das denominações usadas não serem totalmente coincidentes.

No caso da resolução de problemas de adição e subtração com números entre 20 e 100, Thompson (2003b) identifica quatro tipos de estratégias mais usadas pelos alunos: estratégias de decomposição, por “saltos”, mistas e de compensação.

Nas estratégias de decomposição, as dezenas e as unidades são operadas separadamente. Este é o tipo de estratégia mais utilizado no Reino Unido. Por exemplo, para adicionar 23+35, calcula-se separadamente 20+30 e 3+5. Esta é, também, conhecida por partição ou 1010 (dezdez), sobretudo na Holanda (Beishuizen, 1997).

Um segundo tipo de estratégias é “saltar”, sendo referido, por vezes, como estratégias cumulativas ou sequenciais, muito usadas na Holanda. Para calcular 25+33 recorrendo a esta estratégia, parte-se do 25 e dá-se um salto de 30, adicionando, chegando ao 55. Depois dá-se um salto de três e chega-se ao 58.

O terceiro tipo de estratégias identificado por Thompson (2003b) é uma mistura dos dois anteriores e, por isso, denominado por estratégias mistas ou “decompor e saltar”. Recorrendo ao mesmo exemplo, do cálculo de 23+35, utilizando esta estratégia, parte-se do 20, dá-se um salto de 30, obtendo 50 e depois saltos de cinco e de três, obtendo sucessivamente 55 e 58.

Finalmente, o quarto tipo de estratégias é o de compensação ou de “saltar para além de”. Exemplificando com o mesmo cálculo, parte-se do 25 e dá-se um salto de 30, mais um salto de cinco, obtendo 60. Mas como é necessário adicionar apenas 33, compensa-se depois, dando um salto de duas unidades para trás.

A categorização das estratégias apresentada por Thompson (2003b) tem algumas semelhanças com os métodos usados pelos alunos descritos a propósito das investigações associadas às estruturas conceptuais, já referidas.

Para além da categorização das estratégias usadas pelos alunos coloca-se também a questão do modo como são desenvolvidas e do seu papel na compreensão dos conceitos e procedimentos associados às operações adição e subtração. Nesse âmbito, Carpenter et al. (1998), desenvolvem um estudo longitudinal, ao longo de três anos, que envolveu 82 crianças do 1.º ao 3.º ano, cujo propósito foi investigar o papel das estratégias inventadas pelas crianças na compreensão dos conceitos e procedimentos de adição e subtração com números multidígitos. Neste estudo são usadas, como ponto de partida, as categorizações definidas por Fuson et al. (1997a) para as estratégias inventadas pelas crianças na resolução de problemas de adição e subtração, tal como acontece em muitas outras investigações.

Carpenter et al. (1998) referem que, à semelhança de Fuson (1992a, 1992b) e de Fuson et al. (1997a; 1997b), frequentemente, as estratégias inventadas pelas crianças estão interligadas com as conceções subjacentes que estas têm sobre os números e as suas

relações. Assim, uma estratégia sequencial está relacionada com uma conceção de posição na sequência numérica, uma estratégia de decomposição com a estrutura do sistema decimal e uma estratégia de compensação com uma conceção que relaciona e interliga as conceções anteriores. No decorrer do estudo mencionado são identificadas as seguintes estratégias: modelação ou contagem um a um, modelação usando materiais estruturados em dezenas e unidades, estratégias sequenciais (ou de saltos), estratégias de combinação de unidades, estratégias de compensação, outras estratégias inventadas e algoritmos (Carpenter et al., 1998).

Os investigadores supramencionados chamam a atenção para o facto de as crianças envolvidas no estudo referido não inventarem as estratégias no “vazio” e individualmente, não sendo esse o propósito da investigação. Estas são construídas no contexto social da sala de aula, onde há partilha e discussão das estratégias inventadas pelos vários alunos. Apesar de estes apresentarem, fundamentarem e compararem as suas estratégias com as de outros, nenhum dos professores das turmas envolvidas, deliberadamente, realça alguma dessas estratégias nem as tenta ensinar. Em alguns casos, e considerando pressões curriculares, há professores que ensinaram os algoritmos tradicionais no 2.º ou 3.º ano. No entanto, os autores do estudo mantiveram-se neutros relativamente a esta decisão dos professores e consideram que, para além das vantagens na utilização de algoritmos há, atualmente, outras formas de calcular, nomeadamente, recorrendo à calculadora, quando se trata de efetuar, rápida e eficazmente, cálculos complexos.

Relacionado com a utilização dos algoritmos tradicionais, o estudo realizado por Carpenter et al. (1998), em análise, permite identificar que os alunos que cometem mais incorreções no uso dos mesmos são aqueles em cuja sala de aula se introduz mais precocemente esse modo de calcular, em comparação com crianças, de outras turmas, que inventaram estratégias de cálculo mental antes e/ou durante a introdução dos algoritmos. Além disso, os alunos que inventam estratégias de cálculo antes do trabalho com os algoritmos mostram uma compreensão mais profunda sobre aspetos do sistema de numeração, assim como são melhor sucedidos em situações novas. Como conclusão a

estratégias inventadas podem fornecer a base do desenvolvimento da compreensão das operações com multidígitos, mesmo quando são ensinados os algoritmos” (p. 19).

A maior parte das investigações sobre estratégias usadas na resolução de problemas de adição e subtração com números multidígitos diz respeito a números com dois algarismos. Efetivamente, existem poucos estudos que associem e efetuem a extensão dos métodos usados pelas crianças na adição e subtração com números a partir de quatro dígitos, provavelmente, porque os estudos realizados em profundidade acompanham apenas alunos até ao terceiro ano (Fuson et al., 1997a). No entanto, considerando as características do nosso sistema de numeração, decimal e posicional, os métodos de decomposição ou recomposição utilizados para adicionar e subtrair com números com dois dígitos são facilmente generalizáveis para números maiores.

Associada aos métodos e estratégias usados pelos alunos quando resolvem problemas de adição e subtração com números com mais de dois algarismos há a realçar a investigação produzida por Selter (2001). Este investigador realiza um estudo com cerca de 300 alunos, inicialmente no 3.º e até ao início do 4.º ano, que resolvem doze problemas, seis de adição e seis de subtração, envolvendo números com três dígitos com o propósito de descrever o sucesso, os métodos e as estratégias usados na sua resolução. Os problemas são propostos às crianças na sala de aula, antes e depois da introdução dos algoritmos, no 3.º ano e, pela terceira vez, no início do 4.º ano. Os métodos usados pelos alunos e descritos por Selter (2001) são de três tipos: padronizados escritos (algoritmos), informais escritos (por exemplo, notas não padronizadas) e aritmética mental (sem escrever quaisquer notas). Na classificação e caracterização destes métodos o investigador usa como referência investigações já citadas, como as de Fuson (1992a, 1992b) e de Fuson e Smith (1997).

Sobre o sucesso dos alunos na resolução dos problemas Selter refere que, no início do 4.º ano, a maior parte dos problemas é resolvido correctamente havendo, no entanto, uma diferença entre os problemas de adição e de subtração. Menciona ainda que os resultados da investigação são condicionados pelo tipo de dados recolhidos, sobretudo pelas produções escritas dos alunos. A diferença verificada entre adição e subtração pode ser explicada considerando o modo confuso, para algumas crianças, como o algoritmo da

subtração é trabalhado e o menor tempo e atenção dedicado a esta operação, quando comparado com o destinado à adição (Selter, 2001).

Relativamente à frequência e dificuldade associadas aos métodos utilizados pelos alunos constatou-se que, depois de ser introduzido, o algoritmo é o método mais usado, tendo os outros quase desaparecido, sobretudo os informais escritos. No que se refere à diferença entre os métodos escolhidos, quer se trate de adição ou de subtração, esta não é significativa, verificando-se que, no terceiro momento de recolha de dados, três quartos dos alunos usam o mesmo método para todos os problemas. As estratégias informais mais usadas são as associadas à decomposição em centenas, dezenas e unidades, operando separadamente ou partindo do primeiro número e ir adicionando ou subtraindo centenas, dezenas e unidades. As estratégias associadas à resolução dos problemas propostos, previstas por Selter (2001), e quase todas flexíveis aparecem mais raramente.

Selter (2001) conclui, ainda, que as conceções acerca do ensino e aprendizagem, veiculadas através dos manuais e dos livros didáticos, contribuem para uma certa “inflexibilidade de pensamento” dentro da sala de aula, considerando que os resultados deste estudo não contradizem aqueles que evidenciam as capacidades dos alunos na criação e utilização de estratégias próprias e produtivas de resolução de problemas, desde que lhes seja dada oportunidade continuada para as inventar. Assim, os resultados desta investigação estão de acordo com outros identificados nesta secção, nomeadamente, os dos estudos realizados por Carpenter et al. (1998), Fuson et al. (1997b) e Thompson (2003b).

Em suma, a investigação produzida ao longo das últimas décadas sobre a adição e a subtração com números multidígitos e sobre as estratégias usadas pelos alunos sugere que estes são capazes de inventar as suas próprias estratégias, desde que o contexto de sala de aula seja favorável. Os resultados dos estudos que envolveram abordagens não tradicionais da adição e da subtração indicam que estas auxiliam os alunos a compreender e a explicar as estratégias utilizadas e referem a importância das experiências iniciais serem suportadas por materiais de contagem e por representações (desenhos) elucidativas da estrutura do sistema decimal. É realçada, também, a

métodos e estratégias usados pelos alunos, de modo a tornar a sua aprendizagem significativa e duradoura (Fuson, 2003a). Ainda assim, a mesma autora chama a atenção para o facto da investigação sobre estas temáticas não ser suficientemente esclarecedora sobre os recursos, as metodologias utilizadas pelo professor e as características do trabalho em sala de aula que possam maximizar a aprendizagem sobre as operações adição e subtração com números multidígitos.

Referindo-se às investigações sobre estratégias de cálculo com números multidígitos, Verschaffel et al. (2007) afirmam:

Esta investigação [relacionada com elementos conceptuais e estratégias de cálculo] tem-nos ajudado a ilustrar um outro significado de “aritmética mental” quando comparado com o tradicional, onde a aritmética mental é vista (meramente) como fazer somas de cabeça em vez de ser com papel e lápis. (Verschaffel et al., 2007, p. 575)

Os autores anteriores destacam, também, aspetos semelhantes aos já identificados por Fuson (2003a) e realçam os progressos efetuados na caracterização de elementos conceptuais e das estratégias usadas pelas crianças e no seu contributo para as questões associadas ao cálculo mental.