• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO III: CIVILIZAÇÃO E CRIME: CRIMINOSOS ESTRANGEIROS E NACIONAIS DOS TEMPOS MODERNOS

2. Histórias de criminosos dos novos tempos

2.2. Albino Mendes

83 Rio, João do. A alma encantadora das ruas. Rio de Janeiro: Organizações Simões, 1952, pp. 213-4. 84Segundo o historiador Jury Dall’Agnol, Dr. Antônio era um jovem rico de uma boa família da capital do Rio Grande do Sul, “um bon vivant dos pampas” que, depois de um malogrado roubo contra seu pai, ato que foi descoberto logo em seguida, parte fugido para o Rio. Optamos aqui por não fazer uma análise mais detida de sua figura, pois de certa forma Dr. Antônio foi representado de maneira semelhante aos criminosos Afonso Coelho e Albino Mendes. Além disso, comparativamente a esses dois personagens, a imprensa explorou menos sua figura ao longo dos anos.Dall’Agnol, Jury. “História, memória e ficção: o caso Dr. Antônio”. Cad. Pesq. Cdhis, Uberlândia, v. 23, n. 1, jan./jun. 2010.

85 “Mais um roubo”, Correio da Manhã, 11/06/1911, 4.

86 “Larápio engenhoso: a quadrilha de Dr. Antônio”, Jornal do Brasil, 7/05/1908, 12. 87 Rio, João do. “O representativo do roubo inteligente”, A Notícia, 20/08/1911. 88

Albino Mendes, de origem portuguesa, foi considerado pela imprensa como um discípulo de Afonso, por ter sido também protagonista de casos astuciosos de falsificação e fuga. Desde que a polícia descobrira que Albino, em seu primeiro crime, comandava uma fábrica de notas falsas no Rio, em 190789, ele passou a ser um personagem constante no noticiário da imprensa carioca. Apesar desse criminoso não ter sido um ladrão propriamente dito, já que não cometia crimes contra a propriedade, o selecionamos para análise, por ser justamente, como já assinalado, uma figura bem representativa dos criminosos dos novos tempos modernos.

Na ocasião de uma das fugas empreendidas pelo falsário, uma reportagem da

Gazeta de Notícias em 1915 recapitulava o primeiro crime que Albino teria cometido no

ano de 1907.90 Segundo a matéria, em companhia de alguns indivíduos, Albino havia mantido uma fábrica de moeda falsa em Santa Tereza. Mas acabaria sendo capturado pela polícia. Na detenção, Albino mantinha, na opinião do repórter do jornal, “sempre um comportamento exemplar, atraindo as simpatias de todos os visitantes”.91 O jornalista considerava que esse “movimento de simpatias” do criminoso teria influído “extraordinariamente” para que na revisão de seu processo tivesse a sua pena reduzida e fosse posto em liberdade.92

Em 1913, quando a polícia descobrira novamente que havia uma fábrica de notas falsas num subúrbio carioca, sob o comando de Albino, uma reportagem do

Correio da Manhã salientava que o falsário quando esteve na detenção se tornara um

literato, um artista93. Orestes em seu livro “Na prisão” dizia mesmo que Albino se inscrevera num concurso do Jornal do Brasil e que tirara o primeiro lugar, tal era a sua genialidade94. Além disso, Albino teria escrito sonetos dedicados às autoridades superiores e uma espécie de novela que ofertara a ministros. Sobre tais escritos, uma matéria do Correio comentava que, nas costas de um selo, escreveu com “habilidade”

89

“Notas falsas”, Jornal do Brasil, 9/12/1907, 8.

90 “Evasão rocambolesca. Albino Mendes, o hábil fabricante e audacioso passador de notas falsas, fugiu ontem da Casa de Detenção”, Gazeta de Notícias, 3/12/1915, 5.

91

Idem, ibidem. 92 Idem, ibidem.

93 “Como se falsifica o dinheiro: A polícia prende numerosa quadrilha de falsários”, Correio da Manhã, 26/08/1913, 3.

94

14 versos de um soneto que dedicara ao então ministro da interior, Esmeraldino Bandeira, no governo de Nilo Peçanha95.

O repórter da matéria, logo depois de assinalar que o verso teria sido enviado ao ministro, sugeriu que Albino fora solto por proteção de alguém, embora não dissesse quem o teria protegido. Mas pode ser que o jornalista estivesse se referindo às autoridades políticas influentes na época, já que mencionava os escritos que Albino Mendes teria dedicado a ministros e autoridades superiores da época.

Em liberdade, comentava o jornalista acima, Albino continuava a “faina de comércio de dinheiro falso”. Tinha se aliado a outros criminosos para resolverem, todos juntos, montar no Rio uma fábrica de moeda falsa. O repórter da matéria considerava que a fábrica fora montada “com todo o capricho em lugar afastado, na rua Barão, na Praça Seca, em Jacarepaguá”. Montada a fábrica, a primeira remessa, segundo o jornalista, agradou aos meliantes que viviam desse comércio.96

O repórter da matéria, ao considerar “perfeitas as notas” fabricadas pelos criminosos, salientava que os mesmos “se encarregaram de esparramar o dinheiro no comércio”.97

Mas nessa ocasião Albino acabara sendo preso. No entanto, dois anos depois conseguia, segundo os jornais, evadir-se da prisão com sucesso. Tal fuga foi alvo de inúmeras matérias policiais nos jornais. Nessas reportagens, a figura de Albino foi retratada como “o novo Rocambole, discípulo de Afonso, o homem do cavalo branco”.98

Era chamado de Rocambole devido às “condições arriscadíssimas” e misteriosas em que fora efetivada a sua fuga. Segundo a imprensa, não se sabia explicar como o criminoso conseguira empreender tal ato, pois o presídio onde ele estava era considerado seguro. Os jornalistas policiais, ao relatarem de forma minuciosa tal fuga, reforçavam e valorizavam a esperteza e inteligência de Albino Mendes, como se o criminoso fosse de fato o próprio Rocambole:

(...) Albino Mendes, no silêncio de muitas noites, com uma calma e segurança absolutas, conseguira limar a grade, aguardando o primeiro

95 “Como se falsifica o dinheiro: A polícia prende numerosa quadrilha de falsários”, Correio da Manhã, 26/08/1913, 3.

96 Idem, ibidem. 97 Idem, ibidem.

98 “Chegou o dia! Depois de várias tentativas, o famoso falsário Albino Mendes conseguiu pôr-se ao fresco”, Correio da Manhã, 30/01/1915, 3.

momento para fugir. Viam-se na parede marcas dos pés do falsário numa fuga temerária, porque não só poderia ter despertado a atenção dos guardas como ainda pela iminência de um desastre.

Pelas pegadas deixadas, averiguou-se que o novo Rocambole desceu do telhado pelo cano de cobre condutor de águas pluviais até o pátio interno que atravessou livremente, apesar da vigilância constante de uma praça de polícia com arma embalada.

Desse pátio se descortinavam as galerias todas, e Albino Mendes se encaminhou para a grande muralha que separa a Detenção da rua Frei Caneca, galgou-a sem obstáculos, passando por outra sentinela também de armas embaladas e daí, num ato de audácia incrível, com o risco da própria vida, alcançou um poste de iluminação elétrica, ganhando a rua. E o falsário desapareceu, para deixar depois pasmada toda a gente.99

Dias depois dessa fuga, ficou elucidado como Albino teria conseguido se evadir da detenção em 1915. Ele teria passado aos soldados da guarda da detenção cédulas de cem mil-réis para possibilitar sua fuga. 100

Dois anos depois dessa evasão, os jornais noticiavam que Albino foi para a República Argentina e depois para o Uruguai, em cuja capital, como salientou um repórter, passou a habitar, certo de que a polícia brasileira não poderia “perturbar o sossego”.101 Mas a imprensa informou que as autoridades brasileiras, ao saberem que Albino se achava em Montevidéu, haviam pedido a polícia daquela localidade a sua prisão, que acabou sendo feita. Contudo, não havia o tratado de extradição entre os dois países, o que teria dificultado a vinda de Albino para o Brasil. Durante os meses nos quais se buscou realizar um tratado de extradição do criminoso, este teria fugido de Montevidéu, mas acabou voltando à prisão. Tempos depois, regressara ao Brasil quando obteve a extradição solicitada.

Quando Albino chegara ao Brasil, em 1917, os jornais publicaram extensas matérias com grossos títulos a respeito do regresso do criminoso ao país. Nessa ocasião, a polícia informava que o criminoso teria tentado fugir durante a viagem de regresso ao Brasil. Alegava que Albino teria limado as algemas, o que foi negado pelo falsário em entrevista dada aos repórteres.102

Um cronista da Gazeta, ao comentar essa suposta tentativa de fuga, parecia acreditar na versão da polícia. Salientava que Albino tinha “uma maliciosa ironia risonha” pelo fato de dizer que não tinha limado as algemas, sob a alegação de que era

99 Idem, ibidem.

100 Sant’ Anna, Marilene Antunes. A imaginação do castigo. Op.cit. 101 “Albino Mendes volta ao cárcere”, Gazeta de Notícias, 13/03/1917, 1-2. 102

impossível fazê-lo, pois havia dois agentes policiais vigiando-o.103 Segundo o cronista, tal caso o fazia lembrar de um episódio envolvendo Afonso Coelho. Este teria ido um dia à redação do jornal A Notícia para pedir a retificação de uma matéria que o classificava como “gravateiro”, ou seja, como um criminoso que laça a vítima pelo pescoço, com objetivo de roubar. O cronista salientou que Afonso repudiou tal notícia, já que ele negou ser um gravateiro. Afonso, segundo ainda o cronista, até tolerava ser chamado pelos jornais de vigarista, estelionatário, pois alegava que não adiantava desmentir a imprensa. No entanto, não aceitava de forma alguma ser chamado de gravateiro, uma vez que considerava isso um “insulto, uma injuria”.104

O cronista, ao ler a declaração de Albino na qual negava ter tentado fugir na viagem de regresso ao Rio de Janeiro, lembrara desse episódio envolvendo Afonso, pois para ele ambos criminosos eram irônicos ao buscar negar o que eles faziam. Nota-se que enquanto a imprensa e Orestes Barbosa consideravam Afonso Coelho como gatuno que não recorria aos meios violentos para perpetrar seus crimes, o cronista tinha uma opinião bem diferente, já que acreditava que ele era um criminoso violento.

Em relação ao episódio envolvendo Albino, salientava que o criminoso não tinha “dignidade ofendida”, mas sim ironia, pois negava ter tentado fugir durante a viagem, e de pretender trazer para bordo máquinas de fabricar dinheiro.

Perguntado se era verdade que tentara limar as algemas e desparafusar a cama, respondeu:

- Dizem os meus guardas que é... Veja se um homem algemado, tendo sido revistado ao entrar no camarote, de onde só agora acaba de sair e com dois dos mais vivos agentes de polícia carioca montando guarda, pode conseguir fundir ferro, fabricar uma lima com as mãos presas e limar uma algema.

- E o suborno?

- Eu pretendia trazer para bordo umas máquinas de fabricar dinheiro....

Como se vê, todos eles são inteligentes, simpáticos, irônicos e trocistas. E esse Albino é até poeta. 105

Como vimos, o autor acima ao chamar Albino de trocista e irônico se aproximou mais da versão dada pela polícia. Já uma reportagem do Jornal do Brasil se distanciava da versão da polícia, ao considerar que ela agia de forma exagerada ao ver

103 “Boas-vindas”, crônica assinada por Antônio, Gazeta de Notícias, 13/03/1917, 2. 104 Idem, ibidem.

105

no falsário a todo instante uma fuga sua, pois para a matéria os seus planos de fuga eram “romanescos e irrealizáveis”.106

Salientava que a polícia exagerava em adotar medidas para prevenir que Albino fugisse, já que ele apesar de ser um criminoso não era um facínora.

(...) Nos anais da polícia notava-se, desde as primeiras horas da manhã, verdadeira azáfama nos aprestos para a recepção de tão conspícuo personagem tristemente célebre: ordens eram dadas e transmitidas a todo momento, da Central para a polícia marítima, providências eram tomadas, precauções sugeridas e adotadas, parecendo tratar-se não de um mas de uma verdadeira quadrilha de facínoras da pior espécie. E afinal, Albino não é um facínora, sendo embora um criminoso.107

O repórter parecia mesmo defender a ideia de que Albino merecia a liberdade, ao alegar que o criminoso tinha “uma mania natural e humana da liberdade” que procurava “conquistar a todo transe”, não podendo “resignar-se a passar na prisão a dúzia de anos a que o condenaram”.108

Apesar dessas divergências de opiniões entre os jornalistas sobre o episódio da suposta fuga de Albino na viagem de regresso ao Brasil, ao longo dessas inúmeras narrativas na imprensa, os jornais e suas reportagens convergiam em procurar compreender a figura do falsário, considerando-a uma figura curiosa. Alegavam que ele era um caso único na “galeria da degeneração mental”, pois que “toda a série da criminologia moderna” não tinha uma só classe onde se podia “encaixar o tipo de criminoso” que reunia os “dons de um Albino Mendes”109. O falsário era visto nesse sentido como uma figura singular no mundo criminal, já que, segundo as reportagens e jornalistas policiais, ele chegara ao ponto de escrever sonetos, poemas e prosas com uma “ousadia imaginosa” que punha a “inteligência a serviço da habilidade”. Segundo os jornais, era por isso que ele havia se tornado um falsário.

De forma semelhante ao noticiário policial, Orestes Barbosa em seu livro de crônicas “Na prisão” considerava Albino como uma “figura fora do comum” no mundo do crime110. Para o cronista, Albino era “um português inteligente” e não apenas um “audacioso esperto”. O jornalista alegava que não era apenas esperto quem escrevia um “soneto nas costas de uma estampilha comum”; quem se inscrevia num concurso do

106

“Albino Mendes voltou para a Detenção”, Jornal do Brasil, 13/03/1917, 5. 107 Idem, ibidem.

108 Idem, ibidem.

109 “Evasão rocambolesca”, Gazeta de Notícias, 3/12/1915, 5. 110

Jornal do Brasil e tirava o primeiro lugar, quem fugia “várias vezes de vários presídios,

em vários países”, e quem, por fim, montava “uma fábrica de dinheiro falso num cubículo da Correção!...”.111

Ao considerar Albino como um criminoso genial e quase que fazendo uma defesa aguerrida do falsário, Orestes salientava que na ocasião em que fora descoberta a falsificação do dinheiro fabricado pelo criminoso na prisão, o delegado estava “visivelmente despeitado pela superioridade mental do falsário”112. O delegado teria dito que Albino fizera dinheiro no cubículo da prisão pois conseguiu subornar os guardas que lhe forneceram os meios para tal. Mas Orestes, vendo em Albino um indivíduo destemido, salientou que ele teve “a coragem para subornar os guardas”113. Para reforçar a ideia de que Albino era genial na arte de fabricar dinheiro falso, dissera ainda que ele próprio tinha visto a máquina fotográfica que o falsário teria feito para fabricar o dinheiro, além das prensas e as notas de 50$000”.114

Mesmo Albino estando preso, Orestes considerava que o criminoso continuava a planejar crimes mirabolantes e extremamente audaciosos: “(...) Albino disse que estava trabalhando para poder requerer um privilegio de “grande vantagem para o

Brasil”. Queria ser o impressor da moeda nacional!”.115

Mas se a imprensa e Orestes Barbosa consideravam extraordinário o fato de Albino fabricar dinheiro, o jornalista Lima Barreto chegava a dizer que receberia de muito boa vontade as moedas feitas por Albino. “Eu de muito boa vontade receberia a (moeda) que fosse estampada pelo Albino Mendes. Dizem que são bem feitas, artísticas, bem acabadas, por que não circulam?”.116

Ao falar da figura de Albino, o jornalista defendia que todas as pessoas deveriam ter “a faculdade de emitir moeda” e que somente a “confiança no emissor deveria regular o recebimento da mesma”.117 Ao defender que tal negócio fosse uma atividade inteiramente livre no país, criticou diretamente o Estado, sob alegação de que o mesmo condenava os indivíduos que fabricavam dinheiro, citando o caso de Albino. Argumentava que o Estado era contra o indivíduo, já que se julgava “no direito de

111 Idem, ibidem, p. 205. 112 Idem, ibidem, p. 205. 113 Idem, ibidem, p. 206. 114 Idem, ibidem, p. 206. 115 Idem, ibidem, p. 207.

116 “Ao senhor Lucas do Prado”, Correio da Noite, 22/01/1915. 117

fabricar dinheiro”, mas contestava “semelhante faculdade nos indivíduos”.118 Lima Barreto descrevia o Estado com adjetivos depreciativos, como “tirano” e “monopolizador”, ao dizer que ele concentrava as riquezas para si, sem beneficiar o povo. No final da crônica o jornalista chegava mesmo a sugerir que a casa da moeda fosse extinta: “Abaixo a Casa da Moeda”.119

Mas diferentemente de Lima Barreto, o noticiário policial se mostrava contra a fabricação de dinheiro pelos indivíduos, ainda que enaltecesse a inteligência de Albino por praticar esse tipo de crime. Inclusive os repórteres policiais e Orestes chamavam Albino de criminoso, falsário e passador de notas falsas, ao contrário de Lima Barreto que nenhuma vez o chamou de um indivíduo fora da lei.

Tratava-se do famoso falsificador Albino Mendes, o habilíssimo criminoso, inteligente, sagaz, que após ser preso e condenado, quando falsificava dinheiro em Santa Tereza, obteve reforma da sentença e deixou de cumprir a pena de sete anos, sendo posto em liberdade.120

Mas embora o noticiário considerasse Albino como um criminoso, retratava-o como uma espécie de herói do crime, tal como Afonso Coelho fora representado.121 Além disso, como vimos, os jornalistas da época utilizavam repetidamente personagens da literatura policial para buscar reforçar a ideia de que os crimes e fugas de Albino e Afonso eram astuciosos e espetaculares. A nosso ver, os personagens de romances policiais eram aí citados não só como uma maneira de atrair a atenção do público, mas também como uma forma de mostrar que a criminalidade dos novos tempos tinha uma inspiração nessa literatura. Afinal, como vimos, as reportagens associavam intrinsecamente a literatura policial ao crime na sociedade.

Além dessa influência da literatura, a imprensa parecia retratar as figuras de Afonso e Albino como personagens intimamente inseridos numa sociedade onde os valores materiais estavam em expansão na época, pois via os seus crimes como um meio de enriquecimento. 2.3. Carleto 118 Idem, ibidem. 119 Idem, ibidem.

120 “Evasão rocambolesca”, Gazeta de Notícias, 3/12/1915, 5.

121 “Evasão rocambolesca: Continua o mistério em torno da fuga de Albino”, Gazeta de Notícias, 4/01/1913, 1.

As imagens de Albino Mendes e Afonso Coelho contrastavam com as imagens de determinados criminosos da época tidos como vilões, cruéis, celerados e feras. O caso mais representativo dessa imagem de criminoso foi sem dúvida o do bandido italiano Carleto, que em 1906 roubou uma joalheria famosa da rua da Carioca e estrangulou duas pessoas.

Tal crime, como observou Ana Porto, deu ensejo a diversas notícias nos periódicos, que relatavam os eventos sob o título bastante atraente para os leitores ávidos por sensações – “A quadrilha da morte”122. As reportagens chamavam atenção que o crime era considerado o delito que naquele momento teria mais “emocionado, prendido a atenção (do público), desviando-o dos faits divers, de outras coisas que o poderiam interessar”123.

Nessa ocasião, a imprensa fez várias coberturas policiais que relembravam o início da carreira criminosa de Carleto. Os jornalistas a todo instante informavam que Carleto teria roubado um crucifixo de sua própria mãe quando menino:

Desde cedo Carleto revelou-se criminoso, pois aos 12 anos cometeu o seu primeiro delito.

Da própria casa paterna subtraiu uma imagem da imaculada Conceição, esculpida em ouro, e que constituía uma tradição de família.

Por mais violenta que fosse a punição que recebeu Carleto de nada lhe valeu, pois tinha inoculado no sangue o germe do crime, que com o evoluir dos anos progredia assombrosamente.124

Depois desse evento com a mãe, Carleto teria sido expulso de casa aos 16 anos. Emigrou então para a América do Sul, “aportando primeiramente em Buenos Aires , onde aumentou a sua série de crimes, filiando-se a um grupo de bandoleiros, que traziam assaltada a população da capital platina”125. Depois disso, Carleto teria conseguido “chegar ao ponto de assumir a posição de chefe de uma quadrilha de ladrões e assassinos”.126

122 Porto, Ana. Novelas sangrentas. Op. cit., p. 177. 123

“Estranguladores do Rio”, Jornal do Brasil, 27/10/1906, 3.

124 “Estranguladores do Rio: o crime da Rua da Carioca”, Jornal do Brasil, 29/10/1906, 3.

125 “Estranguladores do Rio: o crime da Rua da Carioca. Carleto está preso!”, Jornal do Brasil, 29/10/1906, 2.

126

A imprensa conta que, entretanto, Carleto “ao ver que sua liberdade ali corria perigo”, pois estava sendo perseguido pela polícia platina, teria emigrado para o Rio de Janeiro, onde “procurou antigos companheiros conhecidos de Buenos Aires”.127

Mas segundo as reportagens policiais, Carleto veio para o Brasil não somente porque era perseguido pelas autoridades da capital platina, mas também porque estava “sequioso por conhecer novos horizontes, que lhe oferecessem maior campo de ação, principalmente o Brasil, cujas riquezas o enchiam de inveja”.128

Essa trajetória da vida do bandido foi amplamente explorada pela imprensa