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4 CULTURA ORGANIZACIONAL

4.1 Definições Conceituais

4.1.1 Alguns entendimentos sobre o conceito de Cultura

Discutir sobre o conceito de cultura é importante porque esse é um dos eixos analíticos desta tese. Devido à variedade de definições atribuídas ao termo, apresentaremos a definição utilizada especificamente em nosso trabalho, mas também outras definições apresentadas ao longo do tempo pela Psicologia, Antropologia e Sociologia.

Com base no referencial teórico que utilizamos para identificar as características de uma cultura organizacional, temos em Edgar Schein (2004) a compreensão de que a cultura de uma organização é endógena, surgindo no interior mais profundo dos seus pressupostos básicos para chegar à superfície e influenciar as normas, valores e constituição dos artefatos da organização.

Para Schein, a cultura se caracteriza essencialmente pelos pressupostos e crenças estabelecidos, sendo o nível das assunções básicas determinante para a constituição e reconhecimentos dos valores a serem mantidos e reproduzidos. Por sua vez, os valores, as

normas e crenças influenciam o comportamento e as ações dos membros da cultura, os quais, por sua vez, irão determinar a composição e formas dos uniformes, estrutura física, material de trabalho e outros exemplos de artefatos.

Uma vez constituída e estabelecida a cultura do grupo, Schein percebe que os novos membros que venham a fazer parte dela serão selecionados com base na congruência dos valores dos novos integrantes com os valores preexistentes na cultura. Caso não se estabeleça uma identificação prévia, os novos membros serão selecionados, se apresentarem predisposição para aceitarem os valores da cultura.

Nesse sentido, Schein percebe que a cultura pode vir a mudar, mas somente se novos valores forem apresentados à cultura de maneira exógena, ou seja, apenas se esses valores vierem de fora da cultura para o seu interior por meio de novos membros. Ressaltamos que esse não será um processo simples e rápido, pois esses novos valores precisarão ser incorporados às assunções básicas, as quais, como já vimos, são mais profundas e enraizadas na cultura.

Assim, se a mudança de fato vier acontecer, ela terá ocorrido por conta do reconhecimento dos membros da cultura de aquela mudança trará benefícios para a organização, sendo os novos valores incorporados aos pressupostos básicos de maneira gradativa e inconsciente.

Como Schein é um referencial teórico forjado da Psicologia Social, destacaremos, agora, outras definições para o conceito de cultura. A Antropologia se mostra como principal campo acadêmico para definição do que é cultura. Com base nos trabalhos de seus primeiros representantes, inferimos que cultura pode significar todo o complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros hábitos e capacidades adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade (TYLOR, 1920). Também pode significar a soma total de ideias, reações emocionais condicionadas a padrões de comportamento habitual que seus membros adquiriram por meio da instrução ou imitação e de que todos, em maior ou menor grau, participam (LINTON, 1973).

Enquanto ciência que também passou por processos de especialização, a Antropologia pode apresentar-se por meio de correntes acadêmicas que atribuem significados e interpretações para o conceito de cultura. Dentre essas correntes, as principais são o Evolucionismo Cultural, o Funcionalismo e o Estruturalismo.

A corrente evolucionista surge entre os séculos XVIII e XIX, e sofre forte influência do colonialismo europeu. Ela toma o padrão de cultura europeu como superior, estabelecendo uma hierarquia entre aquela cultura e as outras com as quais os colonizadores mantiveram

contato e por eles foram analisadas. Essa corrente reforçou o etnocentrismo de tal forma que deu margem à criação de um método de classificação das diferentes culturas segundo uma lógica investigativa de evolução linear. Esse método classificava as culturas em estágios de selvageria, barbárie e civilização. Pautada no darwinismo, essa corrente considera a existência do determinismo biológico sobre a espécie humana, que se expressa por meio da raça do indivíduo e das condições geográficas às quais ele estivesse submetido.

Por sua vez, a corrente funcionalista é formada a partir da influência do Positivismo e dos trabalhos de seus principais representantes, Spencer e Durkheim. O célebre trabalho de Malinowsky, Argonautas do Pacífico Ocidental (1975), marca a inovação dessa corrente ao desenvolver trabalhos antropológicos com base na utilização do princípio indutivo. Basicamente, sugeria-se a criação de hipóteses científicas para posterior coleta de evidências das realidades sociais pesquisadas, evitando-se, assim, a análise baseada em deduções ou senso comum.

Também norteada pela prática da etnografia, o Funcionalismo compreende a cultura como resultado das necessidades humanas. Embora tenha se apresentado mais profícua do que a corrente anterior, sobre a corrente funcionalista ainda pesavam os valores do etnocentrismo e colonialismo europeu. De todo modo, com essa corrente, o contexto sociocultural passou a ter mais relevância para a compreensão daquilo que compõe as relações sociais de cada grupo cultural.

O advento do Estruturalismo tem nos trabalhos de Claude Lévi-Strauss importantes referências. Nesse sentido, Antropologia Estrutural (1967) apresenta-se como obra importante para o entendimento de como as estruturas sociais preexistentes ao indivíduo poderiam determinar a compreensão que ele teria de mundo bem como de comportamento. O Estruturalismo apresenta um método para análise de expressões simbólicas que eram representadas na forma de parentesco, mitos, alimentos e linguagem, por exemplo, e guiavam a vida dos indivíduos em sociedade.

Lévi-Strauss destacou que todas as mentes humanas, independentemente de tempo e lugar, funcionam segundo as mesmas operações lógicas. O que poderia variar entre elas seriam os materiais utilizados pelos indivíduos para a construção dos significados. Como o comportamento humano sofre a influência dos aspectos socioculturais aos quais está vinculado, em especial a linguagem, o Estruturalismo busca identificar e compreender o sistema de significados próprios de cada cultura.

A função simbólica desenvolvida pelos indivíduos na atribuição de significados a materiais e símbolos é o foco da análise estruturalista. Essa função seria um estruturador

inconsciente para a definição dos indivíduos. Para o Estruturalismo, a cultura se constitui como resultado do pensamento coletivo, fruto do funcionamento do cérebro humano – visão que supera a compreensão sobre a cultura como algo determinado por processos biológicos ou evolutivos.

Ainda no campo da Antropologia, identificamos em Clifford Geertz uma definição mais específica sobre cultura. Em sua obra A interpretação das Culturas (1989), o autor defende que cultura é um padrão de significados transmitido historicamente, incorporado em símbolos; um sistema de concepções herdadas expressas em formas simbólicas por meio das quais os homens comunicam, perpetuam e desenvolvem seu conhecimento e suas atividades em relação à vida.

Geertz é um dos primeiros a propor que a análise de culturas se desse a partir do contato, aproximação e, principalmente, da vivência das realidades estudadas – daí seu entusiasmo com a etnografia, instrumento metodológico imprescindível aos seus trabalhos. Além disso, Geertz era um crítico da exacerbada quantidade de definições atribuídas ao termo cultura (mais de 160 catalogadas), sendo mais coerente e propositivo, para ele, o debate interno no campo e a procura por uma definição mais abrangente.

Por sua vez, Leslie White, em O conceito de Cultura (2009), diferencia cultura de comportamento. Para ele, cultura se faz quando coisas e acontecimentos dependentes de simbolização são considerados e interpretados num contexto extrassomático, isto é, face à relação que têm entre si, ao invés de com os organismos humanos. Já sobre comportamento, White entende que ele se apresenta quando coisas e acontecimentos dependentes de simbolização são considerados e interpretados face à sua relação com organismos humanos, isto é, em um contexto somático.

Para o trabalho de White, fazia-se importante essa distinção por ele entender que o estudo sobre o comportamento humano deveria ser de responsabilidade da psicologia, enquanto que o estudo sobre a cultura humana deveria ser um campo de análise específico da antropologia, já que essa se encontraria livre das abstrações intangíveis da psicologia, constituindo-se como uma ciência forte, ou hard, tal qual as ciências naturais.

Para além dessas disputas comuns ao campo acadêmico, Robert Brym e demais autores do livro Sociologia: sua bússola para um novo mundo (2015) apresentam uma definição mais objetiva para o termo em análise. Para esses autores, cultura significa a soma das ideias, das práticas e dos objetos materiais compartilhados que as pessoas usam para se adaptar aos seus ambientes. Além de ser classificada com base nos aspectos socioculturais das diversas culturas com as quais inúmeros indivíduos precisam e podem conviver, a cultura é

compreendida como uma forma de resolver problemas e conflitos que envolvem diferenças culturais.

Mesmo se apresentado como um ser etnocêntrico e de fortes tendências egocêntricas, na medida em que conhece aquilo que caracteriza sua cultura, o ser humano torna-se capaz de relativizar a cultura que o forjou em relação a culturas diferentes. Ao realizar esse processo, o ser humano apresenta-se, então, predisposto a não só compreender como também respeitar as diferenças culturais.

Essa característica do ser humano chama a atenção dos autores, já que os seres humanos obtiveram êxito na sua adaptação aos mais diversos ambientes exatamente pela capacidade que desenvolveram de pensar de maneira abstrata, de construir ferramentas, mas, principalmente, de cooperar uns com os outros.

Apresentadas essas definições para o conceito de cultura, analisaremos, no próximo tópico, o que caracteriza a cultura organizacional escolar.