• Nenhum resultado encontrado

Alienação de bens após a inscrição de crédito tributário como dívida ativa

2. FRAUDE DE EXECUÇÃO: TERMINOLOGIA, PREMISSAS CONCEITUAIS E HIPÓTESES

2.3. As hipóteses da fraude de execução na legislação atual

2.3.3. Outras hipóteses expressamente previstas em lei

2.3.3.3. Alienação de bens após a inscrição de crédito tributário como dívida ativa

indica como inserida no artigo 593, III, do CPC está prevista no artigo 185 do Código Tributário Nacional, que, após a alteração pela Lei Complementar n.º 118, de 9 de setembro de 2005, passou a ter a seguinte redação:

"Art. 185 – Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa. Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida inscrita."

A alteração da Lei Complementar n.º 118/2005 consistiu em suprimir, da parte final do caput e do parágrafo único do artigo 185 do CTN, a expressão "em fase de execução", que deixava clara a exigência de já haver execução fiscal proposta para que se configurasse tal hipótese de fraude de execução. Assim, atualmente, basta a inscrição do

crédito tributário na dívida ativa para que se presuma em fraude de execução a alienação dos bens do devedor.81

Embora já antes da alteração houvesse autores que defendessem a simples inscrição na dívida ativa como marco inicial da fraude de execução nesse caso,82 prevalecia o entendimento, inclusive no Superior Tribunal de Justiça, de que o CTN exigia o ajuizamento da execução fiscal,83 alterando-se depois para a citação do devedor84 e, mais recentemente, passado a exigir o registro da penhora ou prova da ciência do terceiro.85

Ao prever hipótese de fraude de execução antes mesmo do ajuizamento de demanda, a alteração do artigo 185 do CTN foge ao modelo do artigo 593 do CPC.

Além disso, como será visto no item 4.3, infra, a hipótese também já possuía existência independente das previstas no Código de Processo Civil, já estando disciplinada no artigo 2º do Decreto n.º 22.866, de 28 de junho de 1933,86 antes de o código de 1939 prever no inciso IV de seu artigo 895 que se consideraria em fraude de execução outras hipóteses previstas em lei.

81Com essa alteração, pode-se dizer que a abrangência do artigo 185 do Código Tributário Nacional se

sobrepôs à do artigo 47 da Lei n.º 8.212, de 24 de julho de 1991, que prevê que a alienação de bens sem a obtenção de Certidão Negativa de Débitos seria ineficaz em relação ao Intituto Nacional de Seguridade Social. Muito embora a lei preveja a alienação seria "nula para todos os efeitos" (cf. artigo 48), prevalece o entendimento de que tal consequência tratar-se-ia de mera ineficácia (nesse sentido, cf. STJ, 4ª T., REsp. 140.252/SP, rel. Min Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 09.12.97: “em interpretação teleológica dos arts. 47/48 da Lei 8.212/91, a falta de apresentação da certidão negativa de débito com o INSS faz o ato de alienação do imóvel ineficaz em relação à Seguridade Social, não impondo, entretanto, a sua nulidade" e STJ, 3ª T., REsp 92.500/AM, rel. Min. Eduardo Ribeiro, j. 04.02.97: "Alienação do imóvel. Contribuições Sociais. Certidão negativa. A falta de apresentação dessa certidão faz o ato ineficaz frente à Previdência, podendo proceder-se à penhora do bem como se alienação não tivesse havido").

82Cf. BÚRIGO, Vandré Augusto. A garantia do crédito tibutário: a presunção de fraude à execução. Revista

Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 92, p. 83, maio 2003.

83Cf. STJ, 1ª T., REsp. 74.021/SP, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 13.12.95; STJ, 1ª T., REsp.

119.979/MA, rel. Min. José Delgado, j. 25.09.97.

84Cf. STJ, 1ª Seção, ERsp. 31.321/SP, rel. Min. Milton Luiz Pereira, j. 22.09.99.

85Cf. nesse sentido: "ficou superado o entendimento de que a alienação ou oneraçao patrimonial do devedor

da Fazenda Pública após a distribuição da execução fiscal era o bastante para caracterizar fraude, em presunção jure et de jure. 3. Afastada a presunção, cabe ao credor comprovar que houve conluio entre alienante e adquirente para fraudar a ação de cobrança. 4. No caso de alienação de bens imóveis, na forma da legislação processual civil (art. 659, § 4º, do CPC, desde a redação da Lei 8.953/94), apenas a inscrição da penhora no competente cartório torna absoluta a assertiva de que a constrição é conhecida por terceiros e invalida a alegação de boa-fé do adquirente da propriedade. 5. Ausente o registro da penhora efetuada sobre o imóvel, não se pode supor que as partes contratantes agiram em consilium fraudis. Para tanto, é necessária a demonstração, por parte do credor, de que o comprador tinha conhecimento da existência de execução fiscal contra o alienante ou agiu em conluio com o devedor-vendedor, sendo insuficiente o argumento de que a venda foi realizada após a citação do executado." (STJ, 2ª T., REsp 625.843/RS, rel. Min. Eliana Calmon, j. 23.05.06) e outros acórdãos da 1ª e 2ª Turmas do Superior Tribunal de Justiça que serviram de precedentes para a elaboração da súmula 375.

86Assim dispunha essa norma: “art. 2º Consideram-se feitas em fraude da Fazenda Pública as alienações ou

A alteração da Lei Complementar n.º 118/2005 pode, portanto, ser considerada como retrocesso em relação à evolução do instituto da fraude de execução, que acabou por fixar seu marco inicial na pendência de ação e não em atos anteriores a ela.87

Se comparada com artigo 2º do Decreto n.º 22.866/1933, contudo, uma vantagem que pode ser observada na redação atual do artigo 185 do CTN diz respeito à expressa previsão de presunção, o que já serviu para permitir a discussão sobre a presença do elemento subjetivo nessa hipótese de fraude de execução, conforme visto acima.

No tocante aos tributos federais, atualmente é fácil para eventual interessado saber da existência de débito tributário do alienante inscrito na dívida ativa, sendo até mesmo praxe a obtenção de certidão negativa de débitos federais, o que não torna de todo irrazoável a alteração aqui apontada. No entanto, o mesmo já não se pode dizer quanto às possíveis inscrições nas dívidas ativas estaduais e municipais, pois podem se dar em local diverso do domicílio do alienante ou do local do bem, o que deve ser analisado quando da aferição da presença do elemento subjetivo para a configuração dessa hipótese de fraude de execução.