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Alternativas para viabilizar a logística reversa das embalagens de vidro

SUMÁRIO

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3.4.7 Alternativas para viabilizar a logística reversa das embalagens de vidro

O vidro é um material com baixo valor no mercado, cuja logística reversa em muitos casos, é inviável economicamente. Considerando que atualmente as parcerias com a indústria para viabilizar a logística reversa desse resíduo são raras, outras soluções devem ser consideradas para superar esse obstáculo. Uma delas envolve a geração de escala de material (LAMPERT, 2016; RICCHINI, 2016), e para isso algumas alternativas podem ser adotadas. A mais evidente implica na ampliação e melhoria dos sistemas de coleta seletiva oficiais (LAMPERT, 2016), que atualmente beneficiam em torno de 29% da população urbana do país pelo sistema porta a porta (em especial a do Sul e Sudeste), recuperando apenas 7% dos resíduos recicláveis, com os 93% restantes sendo dispostos em aterros ou lixões (BRASIL, 2018).

Em se tratando da coleta seletiva realizada por catadores, a contratação das organizações de catadores como agente formais do sistema de gestão de resíduos municipais pode ser benéfica, uma vez que tende a aumentar o volume e a qualidade do material reciclável coletado, reduzir os custos operacionais do sistema, e motivar os cidadãos, que reagem positivamente ao reconhecer que os seus recicláveis apoiam os catadores e suas famílias. Deve se atentar, contudo, que para implantar esse tipo de coleta é preciso levar em consideração a disponibilidade de mão-de-obra especializada na gestão de RSU, a qual deve ter competência

para organizar e supervisionar a logística, o desenvolvimento das MRFs, bem como o planejamento financeiro e orçamentário da coleta seletiva (RUTKOWSKI; RUTKOWSKI, 2015).

O arranjo das organizações de catadores em redes de comercialização solidárias, pelas quais estas passam então a atuar em conjunto para comercializar os materiais como um único lote (RUTKOWSKI; RUTKOWSKI, 2015), também é uma opção que pode favorecer a venda de materiais que necessitam de grandes volumes para tal. É importante ressaltar, contudo, que tal prática de comercialização é complexa, e requer alto grau de organização, sendo necessário ter disponível meios de comunicação (computadores, telefones), infraestrutura específica (caminhões, espaço para armazenamento), bem como estruturas organizacionais bem articuladas dentro das organizações. Além disso, os custos de transporte e manutenção de caminhões são altos, podendo ser um impedimento para a comercialização coletiva (GUTBERLET, 2015).

A gestão compartilhada dos RSU entre municípios também pode ser uma opção. De acordo com Pohlen e Farris (1992), iniciativas conjuntas com outras localidades fornecem um meio para consolidar recicláveis, evitar duplicação dispendiosa de esforços e gerar volume suficiente para atrair mercados. A PNRS inclusive prevê que, os municípios que optarem por soluções consorciadas intermunicipais para a gestão dos resíduos sólidos, serão priorizados no acesso aos recursos da União (BRASIL, 2010).

Por fim, outra saída para viabilizar a logística reversa dos resíduos de embalagens de vidro, segundo a gerente de Projetos de Embalagem da ABIVIDRO, seria o desenvolvimento de soluções integradas de logística de transporte. Tal iniciativa depende, contudo, da existência de uma agência gerenciadora que coordene a logística reversa desse material, a qual deve ter como atribuições, além da coordenação do serviço envolvendo prefeituras, organizações de catadores e empresas de beneficiamento, a responsabilidade pelas operações de compra e venda do vidro (FRANÇA, 2012; LAMPERT, 2016).

DISCUSSÃO E CONSIDERAÇÕES FINAIS DO CAPÍTULO A caracterização dos principais canais reversos disponíveis para retornar as embalagens de vidro pós-consumo à cadeia produtiva permitiu identificar que há poucos canais reversos organizados para esse resíduo no Brasil. Entre os diversos canais, o que se destaca em relação à sua

organização e controle, é o canal voltado para o reúso de garrafas pela indústria cervejeira, com destaque para os canais nos quais os bares estão inseridos, uma vez que nesse tipo de estabelecimento predominam as garrafas retornáveis de cerveja. No canal de autosserviço (supermercados), por sua vez, há uma resistência maior em se armazenar as embalagens vazias e consequentemente, de comercializar a bebida em garrafas retornáveis, sendo vantajoso nesse caso, o uso de máquinas de coleta, tal como vem sendo praticado pela Ambev. Tal prática é benéfica tanto à cervejaria, que já possui competência para realizar a logística reversa de garrafas retornáveis, conseguindo aumentar suas vendas, quanto ao consumidor, que consegue um preço menor na compra da bebida.

No caso da indústria cachaceira, embora também seja verificada uma organização do canal reverso voltado para o reúso, a prática da empresa líder do setor, de inserir logomarcas em relevo nas garrafas, encarece e dificulta o processo de reúso entre as concorrentes. Ficando claro nesse caso, a importância da cooperação entre fabricantes no contexto da logística reversa.

Ao contrário dos canais reversos voltados para o reúso na indústria de envase, os canais voltados para a reciclagem são bem mais complexos. Isso porque existem diversos membros atuando simultaneamente na cadeia de reciclagem, entre eles atores formais e informais, que operam de forma independente, sem que haja algum tipo de organização dos canais por parte da indústria ou do poder público, sendo estes estabelecidos, em sua maioria, autonomamente. Não há um membro líder nesses canais, e os membros que atuam na cadeia de reciclagem do vidro o fazem tendo em vista interesses distintos, sejam eles legais, econômicos ou sociais, ou ainda por questões de imagem ou conveniência.

Na legislação é estabelecido que os municípios devem priorizar no cumprimento de suas atribuições, a inclusão dos catadores. Em contrapartida, não foram definidas diretrizes de como efetuar tal inclusão, razão pela qual se observa práticas distintas de inclusão dos catadores nos sistemas de gestão de resíduos municipais. Dentre as alternativas de inclusão identificadas, a menos favorável para o caso específico do vidro é aquela em que as organizações de catadores executam a coleta sem uma fiscalização e controle por parte da municipalidade pois, como se pôde observar, a participação dos catadores nos canais reversos das embalagens de vidro parece se estabelecer mais em função desse resíduo ser descartado junto aos demais recicláveis na coleta seletiva, do que pelo interesse dos catadores em manipular e comercializar o mesmo, dado o seu baixo valor agregado e os riscos em seu manuseio. Portanto, quando

a própria administração pública realiza a coleta, as chances do material que não tem valor no mercado, como o vidro, ser desviado do aterro são maiores do que quando essa operação é delegada aos catadores.

Tendo em vista isso, parece evidente que é preciso pensar em alternativas do vidro não ser rejeitado pelos catadores, principalmente quando a coleta compete a esses. A contratação das organizações de catadores como agentes formalizados do sistema de gestão de resíduos municipal é vantajosa nesse sentido, pelo fato de existir uma fiscalização por parte da municipalidade, das atividades desempenhadas por esses, e o controle de qualidade do serviço prestado. Além disso, como muitas vezes o pagamento pelos serviços se dá pela quantidade de material comercializado, há um estímulo para se triar uma quantidade maior de materiais e buscar novos mercados. Ressaltando que, neste caso, as chances das embalagens de vidro serem comercializadas para fins ilícitos, como a falsificação de bebidas, são menores.

Não se pode deixar de mencionar, que a responsabilidade pela estruturação e implementação dos canais reversos é da cadeia de embalagens, em especial dos fabricantes de produto comercializados em embalagens, os quais, a princípio, deveriam ser os líderes dos canais reversos em função do poder legítimo estabelecido a eles pela legislação. Algumas iniciativas voltadas para a organização do canal reverso podem ser verificadas entre alguns fabricantes de produtos comercializados em embalagens de vidro, mas estas são pontuais e incipientes.

O programa Glass is Good da Diageo, por exemplo, embora apresente diversas vantagens, tem uma abrangência extremamente limitada, beneficiando atualmente um número ínfimo de municípios, mesmo o programa estando quase completando oito anos. É compreensível que num primeiro momento, quando na fase piloto do programa, se buscasse implementar o projeto nos municípios onde as fábricas da Owens-Illinois estão instaladas. No entanto, o programa não deve se limitar à apenas esses municípios ou regiões, uma vez que os resíduos de embalagens das empresas fabricantes de bebidas estão presentes em todo o País, sendo aconselhado, portanto, sua expansão, inclusive para atender as exigências da PNRS.

Por sua vez, algumas estratégias adotadas no programa podem vir a ser replicadas nos municípios e nas organizações de catadores, entre elas, a coleta exclusiva das embalagens de vidro nos grandes geradores desse tipo de resíduo, como bares, restaurantes e casas noturnas. Tal prática é favorável pois pode reduzir o tempo de triagem nas organizações e os acidentes causados pelo vidro. Mas, assim como no programa, deve

se buscar estabelecer parcerias com esses estabelecimentos, bem como oferecer treinamento, para que a separação do material ocorra de forma adequada.

Quanto ao SLR de embalagens em geral sendo implementado pela Coalizão, este carece de organização. Há uma maior preocupação em se estruturar um sistema de coleta e apoiar as organizações de catadores nos galpões de triagem, do que realizar atividades voltadas para o controle do canal, que garantam a reintrodução dos materiais recicláveis no processo produtivo. Não há um controle de como as atividades estão sendo executadas, das quantidades e tipos de materiais processados, nem é feito o direcionamento do material processado pelas organizações de catadores ao mercado. Além disso, embora a Coalizão tenha atendido as metas propostas no Acordo Setorial, estas estão longe de serem satisfatórias. Nas cidades sede, por exemplo, foram implantados apenas 790 PEVs, num período de cinco anos, para recolher os resíduos de embalagens gerados por mais de 35 milhões de pessoas (de acordo com o último censo de 2010), ou seja, há 1 PEV para cada 44.300 habitantes, aproximadamente.

Cabe ressaltar que, embora o ideal seria que os municípios se encarregassem de coletar apenas rejeitos, como destaca Cavé (2014), enquanto os itens valorizáveis deveriam ser deixados aos operadores do mercado, não se pode deixar de observar, que alguns municípios já dispõem de estrutura para executar a coleta seletiva, bem como experiência na área. Nesses casos, portanto, a estratégia mais conveniente e vantajosa à Coalizão seria a de manter tal função a cargo destes, os quais, por sua vez, deveriam ser devidamente remunerados por esse serviço, o que não ocorre atualmente. A inclusão da administração pública como agente responsável pelo monitoramento das operações executadas pelas organizações de catadores também é uma opção válida para viabilizar o controle dos canais reversos a serem organizados pela Coalizão.

Quanto à triagem e classificação, estas nem sempre poderão ser atribuídas às organizações de catadores, pois com a ampliação dos programas de logística reversa, a tendência é que o volume de embalagens a serem processadas aumente e, portanto, poderá não haver pessoal suficiente ou capacidade nas MRFs operadas pelos catadores, para processar os resíduos gerados nos municípios, em especial nos grandes centros. Em função disso, pode ser necessária a introdução na cadeia, de empresas privadas que disponham de equipamentos para a triagem automatizada, como já ocorre em São Paulo, ou mesmo a instalação de MRFs automatizadas pela própria Coalizão.

Quanto às organizações de catadores, para que possam ser os principais fornecedores de material reciclável da indústria, como se sugere no Acordo Setorial, é necessário que haja maior empenho da Coalizão em formalizar, estruturar e capacitar as mesmas e, em alguns casos, organizá-las em redes, para viabilizar comercialização dos materiais que necessitam de escala, como o vidro.

No caso das embalagens de vidro, no entanto, há um impasse, pois embora uma parcela dos fabricantes de produtos comercializados em embalagens de vidro tenha assinado o Acordo Setorial, a indústria vidreira não o fez. Não é de competência da Coalizão, portanto, garantir que os resíduos de vidro cheguem à mesma, uma vez que essa não se comprometeu a participar do SLR em andamento, embora possa se beneficiar indiretamente pelas ações da Coalizão. Em vista disso e levando em consideração que a mesma pode estar dificultando a reciclagem dos resíduos de vidro, parece evidente que a indústria vidreira deverá, mais cedo ou mais tarde, assinar o Acordo Setorial, ou então estruturar um canal distinto para recolher as embalagens de vidro, para que não venha a ser pressionada pelos fabricantes de produtos comercializados em embalagens de vidro, ou sofrer penalidades.

Quanto ao reúso informal, em que as embalagens de vidro retornam por outros canais que não os organizados pela indústria, prevalece a participação de pequenos produtores, pois a própria agência nacional de vigilância sanitária limita a prática no setor, proibindo o reúso de embalagens de vidro para produtos em conserva, por exemplo. O motivo para tal proibição pode estar relacionado a incerteza quanto à origem da embalagem, e é por isso que o controle e o monitoramento do canal reverso no caso de reutilização é importante.

Por fim, pôde-se verificar neste estudo o que foi constatado por Pohlen e Farris (1992), que a configuração dos canais varia de acordo com a capacidade dos membros de executar as atividades relacionadas à reciclagem, bem como com o volume, o tamanho, a experiência, e a proximidade dos membros do canal, dos mercados finais. No caso específico do Brasil, pôde-se verificar ainda que, a configuração dos canais também depende da relevância de se processar ou não determinados recicláveis, pois como ocorre no caso do vidro, não há estímulos para se agregar valor ao material a partir das atividades de classificação e beneficiamento, uma vez que a execução de tais atividades são mais vantajosas para os demais recicláveis, o que de certa forma, acaba prejudicando a reciclagem das embalagens de vidro, uma vez que estas irão passar por vários atores na cadeia, sendo os catadores o elo que

receberá a menor remuneração na venda desse material, o que desestimula a coleta e manuseio do vidro por esses, estando a cadeia de reciclagem das embalagens de vidro pós-consumo, portanto, em um círculo vicioso.

4 LOGÍSTICA REVERSA DE RESÍDUOS DE EMBALAGENS