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2. Assembleia de escola órgão de “ornamentação” da escola ou órgão de direcção?

2.1. Ambiguidades nas competências

O decreto-lei n.º 115-A/98 refere que, no quadro dos princípios definidos e no desenvolvimento da autonomia da escola, se deve considerar

“A integração comunitária através da qual a escola se insere numa realidade social concreta, com características e recursos específicos”

“a iniciativa dos membros da comunidade educativa, na dupla perspectiva de satisfação dos objectivos do sistema educativo e da realidade social e cultural em que a escola se insere”

“A diversidade e a flexibilidade de soluções susceptíveis de legitimarem opções organizativas diferenciadas em função dos graus de desenvolvimento das realidades escolares” (art. 4º, ponto 2, alíneas a), b) e c)).

Todas estas intenções do normativo apontam para uma escola verdadeiramente autónoma e onde tem um papel decisivo a comunidade que a integra. Ora, o órgão com representantes da comunidade educativa é a assembleia pelo que seria congruente ser este órgão a tomar as grandes opções para a escola, isto é, ao qual deveria caber a elaboração do projecto educativo da escola, devendo ser explicitado neste documento “os princípios, os valores, as metas e as estratégias segundo os quais a escola se propõe cumprir a sua função educativa” (art. 3º, ponto 2, alínea a)). Dado que essa função está afecta ao conselho executivo, como é que os membros da comunidade podem tomar iniciativa para satisfazer a realidade sócio-cultural em que a escola se insere? Como parece óbvio, esta finalidade só será conseguida se a elaboração do projecto educativo for da exclusiva responsabilidade da assembleia, desde que este órgão tenha o cuidado de não sobrepor qualquer outro critério aos de natureza pedagógica. Só neste contexto é que fará também sentido a assembleia verificar a conformidade do PAE com o projecto educativo, o que faria parte do acompanhamento à concretização desse projecto. Como está definido no decreto-lei, dá a entender que a assembleia só é o fiscal do desempenho da escola, pois verifica a conformidade do PAE com o PE e aprecia os relatórios de execução do PAE e de avaliação interna/externa. Todas as outras competências ou são meramente

instrumentais (eleição do presidente, acompanhamento ao acto eleitoral do CE) ou são pouco substantivas para o desempenho da escola (aprovar/apreciar documentos e propostas de contratos de autonomia, definir linhas orientadoras para o orçamento) por se revelarem com pouco conteúdo em termos de envolvimento da comunidade. Além disso, a assembleia de escola é o órgão que deve promover a integração comunitária, contudo, não tem competências para alcançar esse objectivo porque não define o PE, não tem intervenção directa no PAE e não faz parte das suas atribuições a dinamização de projectos articulados com a comunidade. Essa integração limita-se a juntar na mesma reunião actores escolares com outros actores da comunidade mas onde não se podem tomar grandes decisões visando a articulação escola - comunidade. De salientar ainda a desvalorização da assembleia, ou pelo menos do seu presidente, no exterior da escola. De facto, a representação da escola, o estabelecimento de protocolos, parcerias e outros contratos não fazem parte das atribuições deste órgão. Esta situação é de alguma forma estranha pois não se pode promover a integração no meio se não se criam condições para que o presidente da assembleia, pelo menos, estabeleça contactos com o próprio meio.

Se o objectivo do modelo consignado no decreto-lei n.º 115-A/98 era tornar gradualmente as escolas como verdadeiros loci de decisão onde, tendo em conta as directrizes nacionais, se definiam políticas educativas locais adequadas à realidade, parece óbvio que a direcção da escola tinha que estar centrada na própria escola e, neste caso, tendo em conta os princípios orientadores definidos no próprio modelo que visam a democraticidade e participação de diferentes intervenientes, que o órgão mais apropriado para exercer essa direcção é de facto a assembleia de escola. Contudo, pelas competências que lhe são atribuídas estará longe de exercer essas funções, e, porventura, a nível de cada escola também não haverá essas pretensões por condicionantes que anteriormente referimos (poder reconhecido aos professores, pouca sensibilidade dos sectores sociais, dependência hierárquica de alguns elementos e outros).

Este sentido dúbio com que foi criada a assembleia de escola pode não ter sido ocasional, pois transferir poderes para um órgão constituído só por professores - conselho executivo - é mais fácil e menos perigoso pois o Ministério nunca deixa de ter controlo sobre esse órgão. Se o acréscimo de competências se registasse mais para a assembleia, este órgão por ter 50% de elementos (com direito a voto) que não estão na dependência do Ministério, podia constituir um risco de a assembleia poder vir a tomar decisões não

convergentes para as pretensões do Ministério e, se estas assumissem um carácter irreversível, o Ministério poderia perder o controlo directo sobre determinadas comunidades educativas, sendo que dificilmente haveria força política que resistisse a uma nova centralização de poderes.

Assim, o modelo do decreto-lei n.º 115-A/98 apresenta um organograma da administração escolar suficientemente aberto ao fortalecimento da autonomia, mas afunila significativamente essa abertura com a definição das competências dos órgãos que de facto podiam tornar os processos de autonomia uma realidade. Por outro lado, a atribuição de competências de pseudo-direcção limitadas pode gerar nos actores alguma satisfação por poderem participar nas decisões da escola (dentro dos limites da lei), o que poderá ser mais acentuado nos elementos exterior à escola. Isso pode inibi-los de procurar alcançar mais poderes, pois, como diz M. Sarmento (1993: 10), “a concessão de poderes de direcção concreta, sem atribuição de poderes de definição genérica” em qualquer dos âmbitos da autonomia (política, administrativa, financeira, científica e pedagógica) “constitui um factor inibidor do seu exercício pleno”. Além disso, a assembleia não tem forma de negociar mais poderes pois a sua participação nos contratos de autonomia é praticamente nula.

Com a nova legislação sobre os conselhos municipais parece-nos quase certo que as mínimas competências afectas à assembleia de escola vão-se esvaziar completamente, pois os poderes descentralizados estão a ser canalizados para esses conselhos e as organizações escolares ficarão, inevitavelmente, limitadas à mera gestão corrente.