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Amplitude, até que ponto o exercício deve seguir, em termos de amplitude?

No documento Bases Cientificas Do Treinament - Paulo Gentil (páginas 177-179)

Considerações práticas

6.8 Amplitude, até que ponto o exercício deve seguir, em termos de amplitude?

Com o passar do tempo é comum ver alunos afoitos para levantarem maiores cargas na sala de musculação, pois é difícil, para atletas e professores, desvincular o aspecto visível da quantidade de peso de um invisível aspecto qualitativo, que é o estímulo fisiológico. Isto é muito evidente em praticantes de musculação do sexo masculino, que geralmente abrem mão da técnica correta para utilizar cargas maiores, sendo a amplitude um dos fatores mais afetados. Além da visão quantitativa tem outro aspecto que é muito mais obscuro: o famoso ângulo de 90°. Esta angulação é usada como limite para praticamente todos os exercícios, desde agachamento até rosca tríceps, sem que nenhuma evidência científica suporte conclusivamente esta prática.

Dentre os estudos de laboratório que verificaram os maiores níveis de hipertrofia, facilmente encontramos vários que utilizam descargas elétricas em fibras alongadas, ou seja, contrações musculares a partir de grandes amplitudes, até porque o alongamento por si só, já é um importante estímulo para hipertrofia (Yang et al., 1996; James et al., 1997; Yang et al., 1997; Goldspink, 1999; Mitchell et al., 1999). Pelo que

sugerem os estudos de McCully & Faulkner (1986), Hunter & Faulkner, (1997), Lynch & Faulkner (1998) e Armstrong et al (1991), a contração dos músculos a partir da posição alongada causa alongamento irregular dos sarcômeros, aumentando o potencial de ocorrência das microlesões.

Isso foi comprovado em 2001, quando Nosaka & Sakamoto publicaram um estudo no qual foram testados os efeitos da amplitude angular durante a fase excêntrica da flexão do cotovelo. Os participantes realizavam o movimento em uma máquina isocinética, sendo que um dos braços trabalhava entre 50° e 130°, e o outro entre 100° e 180°. Os dados obtidos revelaram que o membro treinado em encurtamento realizou mais trabalho mecânico (força x deslocamento), porém houve mais microlesões no trabalho alongado. Este resultado comprova que devemos ter cuidado com aplicação de conceitos lineares em sistemas complexos, pois, por mais que o trabalho mecânico tenha sido maior em uma situação, as mudanças fisiológicas foram mais evidentes em outra.

Assim, se o objetivo do treino é um maior trabalho fisiológico, deve-se esquecer a quantidade de peso utilizada e concentrar-se na qualidade do movimento. Este fato é corroborado por diversos estudos que encontraram relações lineares entre o estresse fisiológico e amplitude, mas não com a força exercida (Newham et al., 1988; Hunter & Faulkner, 1997; Talbot & Morgan, 1998). Neste livro, quando se fala em favorecer o uso de cargas altas, significa que isto deve ser feito respeitando os demais aspectos qualitativos, como velocidade e amplitude.

Além dos benefícios estéticos, executar movimentos com amplitude completa é mais seguro e mais sensato. Vamos supor que se faça doze séries semanais de exercícios para um determinado grupamento muscular, com cada série durando cerca de um minuto. Veríamos então que se passa 12 minutos por semana executando os movimentos. Ao invés de tentar poupar as articulações durante estes meros 12 minutos, deveríamos treiná-las para as situações imprevisíveis dos 6.720 minutos restantes (já descontadas as 8 horas diárias de sono). Uma pessoa que usa amplitudes muito curtas pode facilmente se lesionar em um movimento cotidiano pelo simples fato de haver se “destreinado” para o dia a dia, tendo em vista que os ganhos de força são específicos aos ângulos treinados (Graves et al., 1989). Jamais devemos negligenciar as atividades que realizamos fora da academia, a musculação não deve proteger o aluno do mundo externo, mas sim treiná-lo para viver com o máximo de qualidade possível.

Inclusive o treino com amplitudes completas pode ser importante para a manutenção e até mesmo ganhos de amplitude articular. Em um estudo de Morton et al. (2011), 42 jovens universitários foram divididos em dois grupos, um grupo treinando musculação com amplitudes completas e outro fazendo alongamentos estáticos. Antes e após as cinco semanas de intervenção a flexibilidade de joelho, quadril e ombro foi avaliada e comparada. De acordo com os resultados, o treino de musculação em amplitudes completas promoveu os mesmos ganhos de flexibilidade que o treino específico de alongamento.

Apesar das amplitudes completas favorecerem a funcionalidade e a hipertrofia, alguns atletas e treinadores acreditavam, no entanto, que a utilização de amplitudes parciais poderia favorecer os ganhos de força, por possibilitar o trabalho com cargas mais altas. Essa hipótese foi testada em alguns estudos. Em 2000, Weiss et al. compararam os ganhos de força em um grupo treinando agachamento e leg press com amplitude parcial e outro com amplitude completa, de acordo com os resultados o grupo que treinou com amplitude completa obteve maiores ganhos de força tanto no movimento completo quanto no movimento parcial (Weiss et al., 2000). Massey et al. (2005) dividiram mulheres treinadas em três grupos que realizavam três séries por exercício: um treinando com amplitudes parciais; outro treinando com duas séries de amplitudes parciais e a última com amplitude completa; e outro treinando com amplitude completa. Os resultados revelaram ganhos de força mais de 50% superiores para o grupo que treinou com amplitudes completas em relação aos demais.

Mais recentemente, o grupo de Ronei Pinto (2012) dividiu homens não treinados em dois grupos, um treinou flexão de cotovelo com amplitude de 50 a 100º e outro que treinou de 0 a 130º, apesar do volume total ser 36% menor para o trabalho em grandes amplitudes, os tamanhos-efeito das alterações de força e massa muscular foram maiores para esse grupo. Posteriormente, o grupo de Bloomquist (2013) comparou os efeitos de 12 semanas de treino com agachamento parcial (0-60º) e completo (0-120º) nos ganhos de força e massa muscular de homens jovens e verificou que o movimento parcial promoveu menores ganhos de força, além de menores resultados nos testes de saltos. Além disso, as análises de seção transversa e da massa magra revelaram ganhos superiores para o movimento completo, sendo que os movimentos parciais promoviam ganhos reduzidos e até tendências de perda em alguns segmentos dos músculos avaliados.

Seguindo essa mesma linha, em um estudo de 8 semanas com homens e mulheres, McMahon et al (2014) verificou que exercícios de leg press, agachamento e cadeira extensora com 0-50º de amplitude promovem resultados piores do que sua realização com amplitudes maiores, tanto em massa muscular e força, quanto da redução da gordura subcutânea. O músculo aumentou 59% com os treinos em amplitudes maiores, contra 16% nos movimentos mais encurtados, já a gordura subcutânea reduziu 22% contra 5%, respectivamente! Nesse estudo se relata que, apesar das cargas nos exercícios com amplitudes reduzidas serem de 11 a 23,75% maiores, o estresse muscular nas maiores amplitudes é 32% mais alto, reforçando, assim, que olhar para a carga utilizada não traz informações precisas sobre a sobrecarga imposta à musculatura.

Portanto, o uso de amplitudes completas é recomendável por questões de estética, funcionalidade e performance. Desse modo, a menos que se esteja empregando métodos específicos, é recomendável se fazer os movimentos com a maior amplitude possível, pois será bom para a saúde e para estética. Muitas vezes será necessário diminuir a carga, mas tenha em mente que isto não atrapalhará em nada seu treino, pelo contrário. Jamais esqueça que quantidade não é qualidade.

No documento Bases Cientificas Do Treinament - Paulo Gentil (páginas 177-179)