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Análise das orações com ordem VS no PB quanto ao traço de foco

Capítulo 2 Análise de propostas apresentadas para a derivação de orações com ordem VS em outras línguas românicas

F) A ordem VSCP

II) VOS também é aceitável com acento contrastivo no sujeito, como em (92):

3.1 O tipo de foco das orações com ordem VS

3.1.3 Análise das orações com ordem VS no PB quanto ao traço de foco

Para analisar as orações com ordem VS no PB. quanto ao tipo de foco que apresentam, a presente pesquisa irá se basear nas análises de Zubizarreta e Kiss. Porém

utilizaremos a forma elaborada por Mioto (2003) para compatibilizar os tipos de foco apresentados nessas duas propostas. Isso porque, como visto, Zubizarreta (Z) trabalha com os traços [+/- contrastivo] enquanto Kiss (K) faz uso dos traços [+/- contrastivo] e [+/- exaustivo]. A proposta de Mioto é a de que a compatibilização desses tipos de traços traz as seguintes possibilidades de informação de foco:

(9) Tipos de foco segundo Mioto (2003)

a. [- contrastivo, - exaustivo] Foco da informação para K, não- contrastivo para Z

b. [- contrastivo, + exaustivo] Foco de identificação para K c. [+ contrastivo, - exaustivo] *

d. [+ contrastivo, + exaustivo] Contrastivo para Z e K

Uma primeira pergunta que se coloca frente à tabela acima é: Qual o conjunto de traços que está presente quando se tem uma oração com interpretação de lista? (pergunta 1). Relembrando a análise de Nascimento, interpretação de lista ocorre quando há “uma relação de [+/- inclusão] num dado grupo de referência. Um dos termos dessa relação, o elemento [+] ou [-] incluído, deve ser dado pelo NP que aparece na posição pós-verbal.” Considero que o tipo de foco veiculado por orações com interpretação de lista não é compatível com o foco da informação porque, como visto na tabela em (12), esse tipo de foco traz os traços de [- contrastividade e - exaustividade], Se há uma relação de [+/- inclusão], como defendido por Nascimento, pode-se inferir que as orações com ordem VS apresentam o traço de exaustividade, pois, como afirma Kiss, “a exaustividade está presente quando o elemento com foco identificacional identifica o subgrupo de um grupo relevante para o qual o predicado se aplica, excluindo o subconjunto

pesquisa considerará que o traço de exaustividade está presente nas orações com interpretação de lista.

O traço de contrastividade, por sua vez, parece nào ser significativo para que ocorra a interpretação de lista. Isso porque, como mostrado por Zubizarreta, uma oração com interpretação [+ contrastiva] é usada quando se deseja substituir os valores atribuídos às variáveis pré-existentes por outros (cf. exemplo (4), acima). A interpretação de Kiss para orações que contêm foco [+ contrastivo] também não é compatível com a interpretação de lista. Para essa autora, o traço [+ contrastivo] ocorre quando a relação semântica do foco identificacional opera num conjunto fechado de entidades, cujos membros são conhecidos dos participantes do discurso. A identificação do subconjunto do dado conjunto também identifica o subconjunto complementar contrastivo. Como na interpretação de lista a identificação de um dado subconjunto não implica a identificação do subconjunto complementar, conclui-se que o traço de contrastividade não está presente.

A conclusão a que se chega é a de que a interpretação de lista ocorre quando o foco da sentença traz informações de [+ exaustividade e - contrastividade]. Em outros termos, quando o foco da sentença é identificacional.26

A segunda questão a ser respondida é “se as orações com verbos transitivos também veiculam interpretação de lista, já que Nascimento (1984), em sua análise, levou em consideração apenas os verbos inacusativos e inergativos do português”.

“6 Votre & Naro (1999) apresentam uma análise funcionalista para as orações com ordem VS no PB. A proposta dos autores é a de que orações com ordem VS são usadas em contextos discursivos em que o S não veicula uma informação relacionada ao tópico do discurso e é, portanto, uma oração que traz elementos que estão fora do fluxo informacional do discurso. Já as orações com ordem SV seriam utilizadas quando o S faz parte do fluxo informacional e, portanto, faz parte do referente considerado o tópico do discurso. Essa análise descritiva feita pelos autores pode ser compatível com a análise apresentada no presente trabalho. Isso porque o que está sendo defendido aqui é que a ordem VS não traz informação nova na sentença, e sim serve para listar com exaustividade os membros de um dado conjunto.

Como visto no Capítulo 1, as orações com sujeitos pós-verbais a verbos transitivos ocorrem em construções como as em (10) e (11):

(10) a. Tomou posse o novo presidente dos Estados Unidos. b. Hoje participará do debate o senador Cristovam Buarque. c. Pega fogo a disputa eleitoral na cidade de São Paulo. d. Merece destaque o item (d).

e. Também faz parte do CD o cantor Leonardo. f. Tem a palavra a Senadora Heloísa Helena.

(11) a. Pega a bola o goleiro do Flamengo.

b. Vence a gincana a equipe que fizer mais pontos.

c. Se o governador for cassado, assume automaticamente o governo o senador Benício Tavares.

d. Pela primeira vez, assume a presidência um operário.

Como também visto no Capitulo 1, as orações com ordem VOS ocorrem em contextos pragmáticos específicos. Por isso, a seguir será feita a análise desses contextos, para verificar se eles são compatíveis com uma oração com foco [+ exaustivo, - contrastivo], Um dos contextos em que ocorrem orações com predicados previsíveis são as narrações de partidas de futebol, por exemplo. Nessa situação, o locutor está a narrar “Qual jogador (ou quais jogadores) está (estão) dominando a bola naquele dado momento”. Isso porque, pelo menos em narrações de jogos de futebol pela televisão, a principal função do narrador é a de identificar quem é o jogador que está com a bola

identificar os jogadores envolvidos em cada lance da partida, como defende esta pesquisa, pelo menos o contexto pragmático contribui para que se interprete essas orações com ordem VOS como contendo foco identificacional.

Em relação às orações com verbos leves, essas orações estão presentes em jornais televisivos. Nos noticiários, o jornalista também está interessado em transmitir para o seu interlocutor quais foram os participantes de determinado evento. E essa informação também tem de ser exaustiva, para que a notícia seja veiculada com fidelidade aos fatos. Por essa razão, as orações com verbos leves e ordem VOS presentes nesse contexto também parecem veicular informação [+exaustiva, -contrastiva], Além desses contextos, foram encontradas orações com predicados previsíveis em textos com instruções, como em (12) e (13) (correspondentes aos exemplos (11) e (12) do Capítulo

1):

(12) a. Vence a partida o jogador que obtiver mais pontos. b. Ganha o jogo a equipe que fizer mais pontos.

(13) a. Podem fazer o saque pessoas com mais de 60 anos.

b. Podem participar do concurso candidatos com mais de 18 anos.

Nessas orações também pode haver argumentação a favor da presença de foco identificacional. Um fato que mostra isso é que o sujeito, que é um nome comum, é modificado por uma oração relativa, para que sua referência seja mais específica. Além disso, como sem vê em (14), abaixo, orações como (15) e (16) ficam agramaticais sem a relativa modificando seus sujeitos, quando proferidas em contextos em que não seja possível.

(14) a. *Vence a partida o jogador. b. *Ganha o jogo a equipe. c. *Podem fazer o saque pessoas.

d. *Podem participar do concurso candidatos.

Um argumento que pode ser usado a favor da existência de foco identificacional na língua é o comportamento do PB em relação ao encalhamento de quantificadores, como tocfo25. Como visto nas seções acima, defendo que as orações com ordem VS são usadas quando o sujeito envolvido na sentença veicula informação de exaustividade. A idéia básica é que existe uma configuração que codifica esse tipo de informação veiculada pelo sujeito. Uma estrutura da língua que parece poder ser explicada por essa hipótese é a de quantificadores encalhados na posição final da sentença, como em (15):

(15) Os amigos da Bruna vieram todos para a festa.

Uma oração como (15) tem um conteúdo informacional diferente de uma como (16), em que não há o encalhe do quantificador:

(16) Todos os amigos da Bruna vieram pra a festa.

A interpretação que dou para uma oração como (15) é a de que o falante deixou o quantificador encalhado, na mesma posição onde o foco identificacional de sujeitos em VS é checado, para sinalizar ao ouvinte que estava dando uma informação exaustiva, de

que “realmente todos os amiguinhos foram à festa, não faltou nenhum”. Já interpretação de uma oração como (16) não estaria comprometida com a informação de exaustividade relacionada ao DP sujeito.

Mais precisamente, a proposta é a de que no PB parece existir uma posição sintática especial para sujeitos com foco identificacional, e que é por esse motivo que um quantificador como todos pode ficar encalhado26 nessa posição.