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CAPÍTULO II – A PESQUISA E SEUS COMPONENTES

2.3.4. Análise de conteúdo

A análise e interpretação de dados numa pesquisa qualitativa, conforme explica Gomes, R., (2009), tem como foco a exploração de opiniões e representações sociais relativas ao fenômeno investigado consideradas em seu conjunto. Para o autor, não é necessário que falas e expressões dos participantes sejam analisadas e interpretadas em sua totalidade. O importante é ir além do que foi descrito, decompondo e relacionando, o que resulta em interpretações. É o momento em que se chega ao sentido das falas e das ações, alcançando uma compreensão que ultrapassa a mera descrição e análise.

Utilizou-se a análise de conteúdo nesta pesquisa qualitativa e exploratória, delineada como estudo de campo, porque se buscou desenvolver ideias sobre determinado tema – o desenvolvimento humano, estudado da perspectiva da articulação entre informar e formar. Segundo Marconi e Lakatos (2010), essa modalidade de análise se constitui em recurso do qual a investigação exploratória se vale quando o objetivo é desenvolver ideias, extraindo generalizações que levam à montagem de categorias conceituais passíveis de utilização em estudos posteriores.

A análise de conteúdo, de acordo com Bardin (2009), se aplica a discursos diversificados, sendo um conjunto de técnicas de análise das comunicações que diferem nos procedimentos, dependendo dos objetivos a serem alcançados. Enquanto em pesquisas quantitativas, o que serve de informação é a frequência com que aparecem as características do material analisado, na pesquisa qualitativa importa mais a presença ou ausência de uma característica, ou de um conjunto delas, identificadas em determinado trecho da mensagem. Noutras palavras, embora a análise de conteúdo possa focalizar frequências, em princípio ela remete o olhar do pesquisador para o que está presente ou ausente (BAUER; GASKELL, 2008). Finalmente, enquanto os números possibilitam apanhar parcialmente a significação do conteúdo, por intermédio de frequências e outros índices, a abordagem mais qualitativa conserva a forma literal dos dados (LAVILLE; DIONNE, 1999).

Baseando-se no desmonte da estrutura e dos elementos do conteúdo, esse tipo de análise esclarece diferentes características ao extrair significações (LAVILLE; DIONNE, 1999). Por intermédio de procedimentos sistemáticos e

descrição do conteúdo das mensagens, obtêm-se indicadores quantitativos, ou não, que possibilitam a inferência de conhecimentos (BARDIN, 2009).

Diante do fato de que qualquer comunicação parece ser suscetível de análise, Bardin (2009) elaborou um quadro demonstrativo dos domínios de aplicação potencial das técnicas da análise de conteúdo (ver Quadro 1). Uma aplicação que inclui documentos, transcrições de entrevistas e protocolos de observação.

Código e suporte

Quantidade de pessoas envolvidas na comunicação

Monólogo Diálogo Grupo restrito Comunicação de massa LINGUÍSTICO

Escrito: Agendas [...] Cartas, respostas a

questionários [...] Ordens de serviço numa empresa,

todas as comunicações escritas trocadas dentro de um grupo. Jornais, livros [...]

Oral: Delírio do doente

mental [...] Entrevistas conversas de e

qualquer espécie.

Discussões,

entrevistas [...] Exposições, discursos [...]

ICÔNICO Garatujas grafitos, sonhos. [...], Respostas testes projetivos [...] aos [...] icônicos símbolos numa

sociedade secreta.

Sinais de

transito, cinema [...]

OUTROS CÓDIGOS

SEMIÓTICOS (i.e., tudo o que não sendo linguístico pode ser portador de significações; ex.: música, código olfativo, objectos diversos,

comportamentos, espaço, tempo, sinais patológicos, etc.).

Manifestações

histéricas da

doença mental [...]

Comunicação não verbal com destino a outrem (posturas, gestos, distância

espacial, sinais olfactivos, manifestações emocionais, objectos quotidianos, vestuário, alojamento...), comportamentos diversos, tais como rituais e regras de cortesia.

[...] sinalização urbana,

monumentos, arte [...]

Quadro 1 – Domínios de aplicação da análise de conteúdo. Fonte: Bardin (2009, p. 36).

Obs.: os grifos são do autor da pesquisa.

De acordo com Bauer e Gaskell (2008), embora a análise de conteúdo trabalhe tradicionalmente com material escrito, outras fontes podem ser analisadas. Segundo os autores, tanto textos tais como memorandos de corporações, como os construídos no processo de pesquisa, a exemplo de entrevistas e protocolos de observação, podem ser manipulados.

A análise de conteúdo se desenvolve, conforme Bardin (2009), a partir de três polos cronológicos: a pré-análise, momento em que é feita uma leitura flutuante de textos, a qual é seguida pela escolha de documentos, formulação das hipóteses (se

houver), objetivos e elaboração de indicadores (quando houver hipótese) e preparação do material; a exploração do material, quando é feita a codificação e decomposição, ou enumeração; o tratamento dos resultados, inferência e interpretação.

Na exploração do material, optou-se nesta pesquisa pelo recorte em temas, que são elementos a fazer parte de um conjunto previamente constituído pela diferenciação e, momento contínuo, reagrupados de acordo com o gênero e os critérios já definidos. Estando reunidos, os temas são as unidades de registro que compõem as categorias. Portanto, estas são classes que agrupam itens com características comuns sob um título genérico (BARDIN, 2009).

Para Bardin (2009), a escolha do tema como unidade de registro corresponde a uma regra de recorte do sentido (e não da forma) que não se encontra pronta, pois o recorte depende do nível de análise e não de manifestações formais. Segundo Laville e Dionne (1999), o recorte do conteúdo em temas é rico, mas torna a análise mais delicada. Na prática, o conteúdo é recortado em fragmentos que correspondem a ideias particulares, podendo ser um conceito ou a relação entre conceitos. Bauer e Gaskell (2008), por sua vez, explicam que as unidades temáticas, ou semânticas, são definidas como características textuais que implicam um juízo humano e que consideram certos fundamentos teóricos, possibilitando a estratificação.

Ao tratar os resultados, utilizaram-se quadros de resultados e figuras, pondo em relevo e descrevendo informações decorrentes da análise temática. Buscou-se seguir, com rigor, as orientações de Bardin (2009) com relação à trajetória do processo de análise de conteúdo, representada pela Figura 3, a seguir:

Figura 3 – Da descrição à interpretação. Fonte: Bardin, 2009, p. 41.

A inferência, a qual consiste em obter uma conclusão a partir de provas, em alcançar certas crenças e opiniões a partir de outras (SALMON, 1993), constitui a intenção da análise de conteúdo. Ela é, conforme Bardin (2009), uma interpretação controlada. Assim, inferir é deduzir de maneira lógica. Neste processo, o analista

age como um arqueólogo, valendo-se de vestígios. Portanto, busca provas. Considerando que numa inferência a pessoa que inferiu é quem deve ter a prova (SALMON, 1993), o analista do conteúdo é o sujeito que, detendo informações por ele desveladas, chega às conclusões de inferências.

Ao inferir, um analista busca o entendimento dos sentidos implícitos na comunicação, assumindo o papel de um receptor normal. No entanto e, principalmente, altera o seu olhar, buscando significações, outras mensagens, alcançadas por intermédio ou paralelo à mensagem inicial (BARDIN, 2009). Desse modo, trata-se de ler as mensagens não se restringindo à letra, mas ampliando a leitura na busca de sentidos localizados num segundo plano, até se obter as variáveis inferidas. A Figura 4 demonstra dois tipos de leitura possíveis:

Figura 4 – Tipos de leitura. Fonte: Bardin, 2009, p. 43.

Como se observa, cabe ao analista passar pelo que foi dito e chegar ao não dito. Chegar a novos sentidos, a significações segundas a partir das primeiras. Deve fazê-lo por intermédio desta espécie de interpretação controlada que, na análise de conteúdo, é a inferência (BARDIN, 2009).

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