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Desenvolvimento humano : como se articulam informação e formação no processo educacional?

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PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E

PESQUISA

STRICTO SENSU

EM EDUCAÇÃO

Universidade

Católica de

Brasília

Mestrado

2011

DESENVOLVIMENTO HUMANO: COMO SE

ARTICULAM INFORMAÇÃO E FORMAÇÃO NO

PROCESSO EDUCACIONAL?

Autor: Ivar César Oliveira de Vasconcelos

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Jacira da Silva Câmara

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IVAR CÉSAR OLIVEIRA DE VASCONCELOS

DESENVOLVIMENTO HUMANO: COMO SE ARTICULAM INFORMAÇÃO E FORMAÇÃO NO PROCESSO EDUCACIONAL?

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial à obtenção

do Título de Mestre em Educação.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Jacira da Silva Câmara.

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V278d Vasconcelos, Ivar César Oliveira de

Desenvolvimento humano: como se articulam informação e formação no processo educacional? / Ivar César Oliveira de Vasconcelos – 2011.

138f. : il. ; 30 cm

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2011. Orientação: Jacira da Silva Câmara

1.Crescimento humano. 2. Valores sociais. 3. Filosofia da educação. I. Câmara, Jacira da Silva, orient. II. Título.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, Todo Poderoso, pela proteção durante os estudos.

À minha querida orientadora Prof.ª Dr.ª Jacira da Silva Câmara que, com paciência, e zelo pelo meu desenvolvimento, acompanhou-me passo a passo. Sou-lhe muitíssimo grato pelo crescimento humano e intelectual proporcionado nesta trajetória acadêmica.

Ao Prof. Dr. Cândido Alberto da Costa Gomes, pela preciosa colaboração que tanto me ajudou a contextualizar o tema desta dissertação. Um abraço e o eterno reconhecimento.

Aos professores Dr. Luis Síveres, Dr.ª Maria Cândida, Dr.ª Clélia Capanema, Dr.ª Beatrice Carnielli, Dr. Geraldo Caliman, Dr.ª Kátia Brasil e Dr. Afonso Galvão, por tudo o que me ensinaram durante a etapa de fundamentação.

Ao Prof. Dr. Célio da Cunha, pela atenção e gentileza de ter aceitado o convite para participar da comissão examinadora.

À Sheilinha, pessoa fantástica, e demais funcionários da UCB, sempre prestativos.

Aos professores participantes da pesquisa, pela disponibilidade, confiança no repasse das informações e entusiasmo com que participaram das entrevistas e aulas observadas. O trabalho é nosso, sem vocês, ele não seria possível.

Ao meu dileto filho, Igor, pelas revisões, realizadas com discussões que enriqueceram a nós dois e ao trabalho.

Aos colegas do BB, caros para mim, pelo incondicional apoio prestado. Agradeço ao Nonato Lima, que me possibilitou a dispensa da jornada de trabalho para assistir às aulas; à Luisa Sabóia, ao Marney e à Ana Paula, pela colaboração nos dias de ausência; ao Carlos Garcia, que me ajudou a conciliar trabalho e estudos; à Fabíola, por ter coberto minhas ausências; ao Leite e ao Patrick, pelo companheirismo.

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“Pode ser que educadores sejam confundidos com professores, da mesma forma como se pode dizer: jequitibá e eucalipto, não é tudo árvore, madeira? No final, não dá tudo no mesmo? Não, não dá tudo no mesmo, porque cada árvore é a revelação de um habitat, cada uma delas tem cidadania num mundo específico. A primeira, no mundo do mistério, a segunda no mundo da organização, das instituições, das finanças.”

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RESUMO

VASCONCELOS, Ivar César Oliveira de. Desenvolvimento humano: como se articulam informação e formação no processo educacional? 2011. 138 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2011.

No mundo atual, a ciência e a tecnologia avançam vertiginosamente e a pessoa humana tem sido relegada para o segundo plano. Com isto, desencadeiam-se problemas sociais graves, fazendo emergir discussões sobre a formação integral do ser humano, na qual os valores, tanto quanto os aspectos científicos e tecnológicos, sejam considerados. Este cenário enseja a realização de pesquisas sobre o tema do desenvolvimento humano, atualizando-o e ressignificando conceitos. Este trabalho teve como objetivo geral averiguar a articulação entre informação e formação para o desenvolvimento integral do ser humano. Especificamente, buscou identificar: a presença das dimensões informativa e formativa do processo educacional em documentos institucionais; as percepções dos participantes quanto à articulação entre essas dimensões e a articulação entre elas nas práticas didático-pedagógicas desenvolvidas em sala de aula. Trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa e exploratória, um estudo de campo, que utilizou para a coleta de dados a análise documental, a entrevista semiestruturada e a observação. A análise de conteúdo, realizada a partir do corpus da pesquisa, permitiu descrever, inferir e interpretar os dados coletados. Foram analisados os Projetos Pedagógicos de Curso e os Planos de Ensino das disciplinas selecionadas, ministradas por oito professores, que foram entrevistados e tiveram cada um deles, duas aulas observadas. As disciplinas fazem parte dos cursos de Pedagogia e de Administração de uma instituição de ensino superior do Distrito Federal. Os resultados evidenciaram uma atualização do discurso institucional sobre o desenvolvimento humano em relação às atuais preocupações teóricas sobre o assunto, mas revelou fragilidades no discurso e na prática dos participantes. Mostraram, ainda, o envolvimento dos participantes com o tema estudado, tanto com relação às questões cognitivas, como emocionais e axiológicas, presentes no processo educacional. Demonstraram, no âmbito dos cursos, que existe um distanciamento entre discurso e prática em relação ao cumprimento do papel social da escola, à implementação da interdisciplinaridade e à formação integral do indivíduo. O trabalho apresenta algumas recomendações para o aprimoramento do processo educacional.

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ABSTRACT

VASCONCELOS, Ivar César Oliveira de. Human development: how are information and formation articulated in the educational process? 2011. 138 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2011.

In today’s world, science and technology advance dramatically and people themselves have been relegated to the background. With that, let loose social problems, giving rise to discussions about the integral formation of the human being, in which the values, as well as the scientific and technological aspects, are considered. This scenario entails the realization of researches on the topic of human development, updating it and redefining concepts. The main goal of this study was to investigate the relationship between information and formation regarding to the development of the human being. Specifically, it sought to identify: the presence of informative and formative dimensions of the educational process in institutional documents’; the participant’s perceptions about the relationship between these dimensions; and in teaching and pedagogical practices developed in the classroom. This is a qualitative and exploratory research, a field study, which used documental analysis, semi-structured interview and observation to collect data. The content analysis, made from the corpus of the research, allowed describing, inferring and interpreting the collected data. The Pedagogical Projects of Course and the Education Plans of the selected disciplines, given by eight teachers, were analyzed and the teachers were interviewed and had, each one of them, two of their classes observed. The disciplines are part of the Pedagogy and Administration courses of a higher education institution of Distrito Federal. The results showed an update on the institutional speech on the human development regarding nowaday’s theoretical concerns about the issue, but revealed fragilities on the speech and actions of the participants. Also showed the involvement of the participants with the studied theme, regarding both cognitive questions and emotional and axiological, present in the educational process. Demonstrated, within the courses, that there is a gap between discourse and practice regarding the fulfillment of the social role of the school, the implementation of interdisciplinarity and integral formation of the individual. The paper presents some recommendations to improve the educational process.

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Domínios de aplicação da análise de conteúdo. ... 59

Quadro 2 – Análise documental e análise de conteúdo: semelhanças e diferenças. ... 62

Quadro 3 – Discurso institucional: categoria informação e respectivos temas. ... 66

Quadro 4 – Discurso institucional: categoria formação e respectivos temas. ... 66

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Razão indolente e ecologia dos saberes. ... 47

Figura 2 – Carpe diem e educação em valores. ... 49

Figura 3 – Da descrição à interpretação. ... 60

Figura 4 – Tipos de leitura. ... 61

Figura 5 – Composição da análise do corpus da pesquisa. ... 65

Figura 6 – Discurso do professor: categorias analisadas. ... 76

Figura 7 – Discurso do professor: categoria informação e respectivos temas. ... 77

Figura 8 – Discurso do professor: categoria formação e respectivos temas. ... 80

Figura 9 – Discurso do professor: categoria informar/formar e respectivos temas. .. 91

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LISTA DE SIGLAS

BB – Banco do Brasil.

CNE/CES – Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação Superior. CNE/CP – Conselho Nacional de Educação/Conselho Pleno.

LDBN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. PE – Plano de Ensino.

PIPA – Programa de Iniciação às Práticas Administrativas. PNQ – Plano Nacional da Qualidade.

PPC – Projeto Pedagógico de Curso.

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LISTA DE ABREVIATURAS

Adm. – administração. Art. – artigo.

Doc. – documento. Et al. – e outros. F. – fala.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 15

JUSTIFICATIVA ... 20

CAPÍTULO I – REVISÃO DA LITERATURA ... 24

1.1. SER HUMANO ... 24

1.1.1. Dimensões humanas ... 24

1.1.2. Sociocultural, um lugar para o ser humano ... 28

1.2. EDUCAÇÃO E SEU PAPEL SOCIOCULTURAL ... 29

1.2.1. Fenômeno educativo ... 30

1.2.2. Papel sociocultural da educação ... 38

1.3. DESENVOLVIMENTO HUMANO ... 44

1.3.1. Chave do desenvolvimento humano ... 44

1.3.2. Ecologia dos saberes e formação ... 46

1.3.3. Aprender a viver no mundo da diversidade moral ... 48

1.3.4. Ser e fazer moral: equilíbrio entre razão e emoção ... 49

CAPÍTULO II – A PESQUISA E SEUS COMPONENTES ... 52

2.1. FORMULAÇÃO E DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA DE PESQUISA ... 52

2.2. OBJETIVOS ... 53

2.2.1. Geral ... 53

2.2.2. Específicos ... 53

2.3. REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO ... 53

2.3.1. Definição e descrição do tipo de pesquisa ... 53

2.3.2. Técnicas utilizadas na pesquisa ... 55

2.3.3. Campo de pesquisa e participantes ... 57

2.3.4. Análise de conteúdo ... 58

2.3.5. Análise de conteúdo e análise documental ... 61

2.3.6. Análise de conteúdo e observação em pesquisa qualitativa ... 62

CAPÍTULO III – ANÁLISE E DISCUSSÃO DO CORPUS DA PESQUISA ... 64

3.1. O QUE É PROPOSTO ... 65

3.1.1. Discurso institucional ... 65

3.1.2. Discurso do professor ... 75

3.2. O QUE É PRATICADO ... 101

3.2.1. Aproximações e distanciamentos do que é proposto ... 103

3.3. O QUE PODE SER DITO PELO NÃO DITO ... 106

3.3.1. Articulação para uma nova ordem ... 107

3.3.2. Intenções e hipocrisias organizacionais ... 109

CAPÍTULO IV – CONSIDERAÇÕES FINAIS E RECOMENDAÇÕES ... 115

REFERÊNCIAS ... 120

APÊNDICE A – ROTEIRO DA ENTREVISTA COM OS PROFESSORES ... 128

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APÊNDICE C – CARACTERIZAÇÃO DOS PARTICIPANTES ... 131

APÊNDICE D – CARACTERIZAÇÃO DAS AULAS OBSERVADAS... 132

APÊNDICE E – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ... 133

ANEXO A – EMENTÁRIO DAS DISCIPLINAS DE PEDAGOGIA ... 135

ANEXO B – EMENTÁRIO DAS DISCIPLINAS DE ADMINISTRAÇÃO ... 136

ANEXO C – COMPETÊNCIAS E HABILIDADES – PEDAGOGIA ... 137

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INTRODUÇÃO

Esta dissertação aborda o tema desenvolvimento do ser humano, tomando como referência o processo educacional realizado junto a graduandos dos cursos de Pedagogia e Administração numa universidade da rede particular de ensino de Brasília. Tem como objetivo averiguar como esse processo articula os aspectos informativos e formativos da educação para o desenvolvimento integral dos indivíduos.

No mundo atual, a articulação entre as ciências da natureza e as do homem tem sido objeto de discussão entre estudiosos das mais variadas áreas do conhecimento. As ciências da natureza excluem espírito e cultura, bem como seu próprio estatuto histórico e social; enquanto as do homem não pensam os indivíduos como seres vivos constituídos biologicamente. De acordo com Morin (2008b), a ciência natural não possui meio algum para se conceber como realidade social; por sua vez, a antropossocial não possui meio algum para se conceber no seu enraizamento biofísico.

Essa desvinculação entre as duas vertentes de conhecimentos científicos encontra-se na base do atual momento histórico, um tempo em que os desenvolvimentos científicos, técnicos e sociológicos inter-retroagem apenas a partir da manipulação do processo científico em sua relação com a técnica (MORIN, 2008b) e não a partir da busca de uma formação integral do ser humano. Como possibilitar uma inspiração unitária ao saber humano, de maneira que favoreça a solução de questões sociais, se constitui um dos grandes desafios da educação na sociedade contemporânea. Apesar da grande contribuição dos avanços da ciência e da tecnologia, problemas como a fome; as doenças; o descaso com o meio ambiente; a violência social, envolvendo muito particularmente a família e a escola, além de outros, continuam ainda, neste milênio, a fazer parte das grandes preocupações da humanidade.

Fica evidente a necessidade de uma nova ordem fundamentada na ecologia

dos saberes a qual reconhece a pluralidade de conhecimentos e promove o diálogo

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participar e habitar num mundo de extrema diversidade moral (MARIA PUIG, 2007). Neste sentido, torna-se necessário o reconhecimento de que o homem, para sobreviver confortavelmente na sua humanidade, precisa construir o seu ser e fazer moral valendo-se da emoção tanto ou mais do que da razão (CÂMARA, 2003).

Que as ciências da natureza e as ciências antropossociais sejam olhadas em sua complementaridade, eliminando as contradições de uma sociedade que enaltece a pura informação, em detrimento da formação; que endeusa a ciência e a tecnologia, deixando de lado a implementação de valores. Sabe-se que epistéme e antropo são indissociáveis e, correlatamente, também o são as informações e a formação. O reconhecimento dessa nova ordem exige a instauração de um processo educacional que afirme a importância da formação para a integralidade humana.

Coerente com isto, o relatório Delors et al. (1996) preconiza que os valores encontram seu lugar adequado em quaisquer culturas, sejam locais, nacionais ou mundial. No mesmo documento consta que é imprescindível reatar o diálogo entre a ciência e a cultura, pois o fosso que hoje separa as pessoas do mundo científico das pessoas do mundo cultural não é algo natural. O relatório conclui que, fundamentalmente, esta alienação é uma característica do século passado, com origem em grande parte na indiferença da educação pela integridade do indivíduo enquanto ser humano.

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preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Para alcançar esses objetivos, aquela Lei preceitua em seu art. 3º que o ensino deve basear-se, dentre outros, nos princípios de liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber; pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas; respeito à liberdade e apreço à tolerância; valorização do profissional da educação escolar; valorização da experiência extraescolar; vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais.

Estes valores não podem ser tratados apenas como conceitos ideais, sendo necessário implementar critérios morais comuns capazes de regular a convivência desejada nos diversos âmbitos da sociedade. Por natureza, o ser humano precisa tomar decisões, sendo um ser que nasce inacabado, mas com grande plasticidade. Uma abertura antropológica que possibilita o processo de endoculturação1 que, por sua vez, transforma-se no locus do trabalho moral a desenvolver-se pela educação.

Este assunto, valores na educação, frequentemente tem sido foco de discussões. Iguiñiz e Romero (2009) afirmam que perguntar sobre valores demonstra o interesse pelas pessoas, pelo que elas dão valor, sonhos e motivos que as levam à busca do melhor de si na família, na vizinhança e como cidadãos. Por sua vez, Marchesi (2008) enfatiza que a educação baseada em valores deve integrar a reflexão compartilhada, a expressão afetiva e a ação, que são os três grandes âmbitos em que ela se desenvolve. O assunto faz parte da agenda de discussão de diversos países, como foi demonstrado na Conferência Internacional de Educação de 1994, em que, preocupados com as manifestações de violência, racismo, xenofobia, nacionalismo, dentre outros, ministros da educação propuseram linhas de ação em favor da paz, direitos humanos e democracia.

Estudar valores na educação, situando o assunto nestas grandes preocupações, significa, portanto, participar do diálogo sobre as mudanças que buscam construir novos rumos para que a humanidade resgate sua natureza intrínseca, que é viver em paz, sem eliminar as diferenças individuais. Significa participar do debate em torno dos grandes objetivos estabelecidos pela sociedade em suas normas de convivência mais caras. Significa, sobretudo, imergir nas discussões sobre o processo de construção de um novo panorama científico, capaz

1 Endoculturação é o processo de aprendizagem e educação em uma cultura desde a infância,

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de interligar as ciências da natureza às ciências humanísticas, considerando o ser humano em sua integralidade.

A pesquisa buscou, portanto, verificar como ocorre a articulação entre informação e formação, a qual é fundamental para o desenvolvimento integral do ser humano. Uma articulação que está sendo exigida pela atual sociedade, que se encontra mergulhada em uma complexa teia de informações, diversidade moral e incertezas.

O uso da informação per si é insuficiente para enfrentar grandes problemas vividos por países e povos do mundo inteiro. Exige-se, neste cenário, a implementação de valores que complementem o processo de conhecimento racional, cognitivo. Transformar esses objetivos em algo concreto é ação precípua do processo educacional que visa a reconduzir os indivíduos à condição de protagonistas de suas vidas; a controlar suas conquistas científicas; a se reconhecerem em sua humanidade.

Ao exigir do processo educacional um olhar sobre a articulação entre informação e formação, a sociedade espera que a educação contribua para formar sujeitos capazes de pensar, julgar, criar, criticar, elaborar e decidir por si mesmos. Com foco neste olhar, pôde-se compreender, nesta pesquisa, como aquela articulação está sendo desenvolvida na dinâmica curricular do processo educacional em que os indivíduos, sujeitos daquela ação, se desenvolvam cada vez mais em sua humanidade.

Esta dissertação compõe-se de quatro capítulos, apresentados após uma breve introdução e justificativa. No primeiro capítulo, demonstra-se o referencial teórico, abordando assuntos que deram base à pesquisa: as dimensões humanas e o lugar do ser humano como ser sociocultural; educação e seu papel sociocultural; articulação entre informar e formar como a chave do desenvolvimento humano, na conexão com a ecologia dos saberes, a moral e afetividade.

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JUSTIFICATIVA

O olhar do pesquisador em direção ao tema desenvolvimento humano originou-se ainda na adolescência. Quando frequentava os bancos escolares do então Segundo Grau, inquietavam-no a priorização de professores pelo repasse de informações em detrimento da efetiva formação humana. Ao cursar Filosofia, na graduação, a inquietação deu lugar à busca de possíveis fundamentos dessa priorização. Nascia o desejo de entender como o processo educacional poderia ser diferente, saindo da exclusiva produção de conhecimentos para o efetivo desígnio de desenvolver pessoas.

Passado o tempo, ocorreram ao pesquisador dois insights que se situam na origem do processo de formatação do tema e sua problematização. O primeiro deu-se com a leitura de um trecho do opúsculo Conversas com quem gosta de ensinar, de Rubem Alves (1985, p. 12), em que o autor se pergunta se é possível que educadores sejam confundidos com professores, da mesma forma como se confunde jequitibá com eucalipto: “no final, não dá tudo no mesmo?”. O segundo

insight se deu durante a etapa de fundamentação deste curso de Mestrado, durante

aula da professora orientadora desta dissertação, quando se discutia sobre as dificuldades sofridas pelos professores para articular os aspectos informativos e formativos no processo educacional. Esses dois insights levaram o pesquisador a perguntar: de que maneira a articulação entre as dimensões informativa e formativa da educação está sendo desenvolvida na dinâmica curricular do processo educacional na sala de aula? Como tem acontecido esta articulação no momento histórico atual, neste mundo marcado por mudanças aceleradas e por profundas transformações?

Na atual sociedade, os indivíduos exigem, escolhem e interpretam informações e, simultaneamente, necessitam de formação compatível com a realidade dinâmica, plural e inconstante. Desse modo, ainda que o lado informativo do aprender e do conhecer seja enfatizado, não é mais possível aceitar um processo educacional restrito à informação, desconsiderando a integralidade do ser humano.

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biotecnologia, exige um olhar mais abrangente, compatível com a magnitude e a complexidade dessas questões e não apenas o olhar exclusivo da via racional. Cada problema precisa ser considerado em seu contexto global, entendido como parte de um tecido interdependente, gerando conhecimentos que contribuam para aprimorar a condição do ser humano, enquanto ser de razão, emoção e ação. Neste caso, os conhecimentos gerados não ficam restritos ao cognitivo, mas alcançam os aspectos axiológicos do fazer humano, reconstruindo permanentemente a relação entre o eu, o tu e o saber.

O fazer humano, à exceção da Modernidade, foi constituído por três esferas de valores interdependentes denominadas por Wilber (2006) como Três Grandes: arte, moral e ciência ou o Belo, o Bom e o Verdadeiro ou, ainda, EU, NÓS e ELE. O autor explica que o EU tem a ver com a consciência, a subjetividade, a autoexpressão (inclusive arte estética); com a verdade e sinceridade; com a irredutibilidade e percepção viva imediata; com os relatos na primeira pessoa. O NÓS refere-se à ética e à moral, às visões de mundo, ao contexto compartilhado, à cultura; ao significado intersubjetivo, à compreensão mútua, ao pertinente, ao justo; aos relatos na primeira pessoa do plural. O ELE se relaciona com a ciência e a tecnologia, com a natureza objetiva, com as formas empíricas (inclusive cérebro e sistemas sociais); com a verdade propositiva, com as exterioridades objetivas tanto de indivíduos quanto de sistemas; com os relatos na terceira pessoa.

Mais do que a diferenciação existente entre as Três Grandes esferas de valores, Wilber (2006, p. 64) coloca como ponto absolutamente crucial a dissociação dessas grandes esferas, a quem ele chama de desastre da Modernidade. Para o autor, este desastre teve os significados de: “o desencanto do mundo (Weber), a colonização das esferas de valores pela ciência (Habermas), o amanhecer da desolação (T.S. Eliot), o nascimento do homem unidimensional (Marcuse), a profanação do mundo (Schuon), o universo desqualificado (Mumford)”.

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instituindo um dualismo ontoepistemológico2 que impede a integração entre a informação e o contexto sociocultural, econômico e político e reduz a condição humana ao aqui e agora, deixando os indivíduos ao sabor das circunstâncias. Desse modo, torna-se necessário religar as dimensões humanas, principalmente o pensar, o sentir e o agir, em prol de uma visão mais abrangente da realidade. Torna-se necessário articular o conhecimento científico com outros tipos de conhecimento, considerando a multidimensionalidade humana.

Verifica-se, de um lado, o mundo da racionalidade, onde a ciência e a tecnologia são colocadas em primeiro plano e, de outro, o mundo da subjetividade e das relações intersubjetivas entre indivíduos. Fica evidente a importância do desenvolvimento de processo de formação integral do ser humano, sem separação entre razão, emoção e ação. Um processo educacional envolvendo, além do conhecimento, a dimensão formativa, buscando, sobretudo, o equilíbrio entre razão e emoção. Um processo educacional onde conhecimento e valores sejam desenvolvidos numa dinâmica profundamente unitária.

Nesse processo, os valores são considerados como projeções afetivas que se constroem na intersubjetividade dos sujeitos, conforme Piaget (1954). Como afirma Gomes, C. (2001), quando perspectivados do ponto de vista da moral, os valores criam sentido de vida, ultrapassando necessidades básicas como se alimentar, vestir-se, educar-se, bem como ter habitação, trabalho e lazer. Assim sendo, esse processo forma integralmente o indivíduo porque se fundamenta numa relação social benéfica em que saber e ser se fundem na concretude do fazer humano.

O desenvolvimento desse processo exige, inclusive, um posicionamento axiológico. A transmissão, a reprodução e a criação de valores que baseiam o processo educacional dependem do grau de importância a eles atribuída, na articulação com as informações. Refletir, também, sobre os referenciais axiológicos que balizam esse processo é importante na medida em que os valores adotados se constituem em parte fundamental da formação do educando. Esses referenciais, quando coerentes com o papel da educação para o século XXI, definido por Delors et al. (1996), encorajam o indivíduo a agir conforme suas tradições e convicções, a respeitar o pluralismo, elevando o entendimento e o espírito ao plano universal, o

2 Ontológico: relativo ao ser; diz-se de algo que é relativo às propriedades dos seres em si mesmos e,

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que explicita um processo educacional que considera a dimensão objetivo-cognitiva e a dimensão subjetivo-afetiva do sujeito em formação. Desse modo, informação e formação se articulam, resgatando a autonomia desse sujeito como um ser humano.

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CAPÍTULO I – REVISÃO DA LITERATURA

Este capítulo apresenta, em três títulos, a revisão da literatura sobre o tema do desenvolvimento humano. Cada título corresponde a um eixo de reflexão, sendo: ser humano; educação e seu papel sociocultural; desenvolvimento humano.

O primeiro eixo foi considerado importante porque os estudos sobre aquele tema não pode prescindir da reflexão sobre o ser humano, interrogação fundamental em qualquer época e lugar. Para Mondim (2005), o encaminhamento da vida depende desta solução, considerada em termos individuais ou sociais, bem como da conduta e das relações que os indivíduos mantêm entre si e com o mundo. Estudar sobre o desenvolvimento humano implica, necessariamente, analisar soluções à pergunta: o que é o ser humano e qual o seu lugar?

De igual modo, o fenômeno educativo fascina as pessoas, sendo um fato concreto que permite aos indivíduos compartilharem experiências entre si e com o mundo. Como explica Vieira Pinto (2007), a educação é processo histórico pelo qual a sociedade forma seus membros. Formar no sentido de desenvolvê-los como seres humanos.

Por fim, o terceiro eixo corresponde aos processos de informação e formação dos indivíduos, que constituem efetivamente o lugar almejado pelos diversos povos, de quaisquer épocas e espaços geográficos, na ideação do ser humano em função dos interesses da sociedade.

1.1. SER HUMANO

Este título gira em torno de duas questões. A primeira, sobre o que é o homem, é discutida nos limites de reflexões sobre as dimensões humanas da razão, emoção e ação. A segunda, sobre a sociabilidade humana, restringe-se a reflexões a respeito do sociocultural como o lugar do ser humano.

1.1.1. Dimensões humanas

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racional. Em suas reflexões no campo da antropologia filosófica, Cassirer (1994) afirma que Sócrates não arriscava uma definição do ser humano. No entanto, aquele pensador grego identificava-o pelas qualidades e virtudes individuais, como a bondade, justiça, temperança e coragem. De qualquer maneira, predominava na resposta socrática a ideia de humanidade a partir da capacidade de raciocinar. Para Platão (428/427-348/347 a.C.), o ser humano é dual, constituído de alma suprassensível e corpo sensível, sendo estas instâncias não apenas distintas, mas opostas. Enquanto para Sócrates o corpo estava a serviço da alma, em Platão o corpo é entendido como tumba, lugar onde a alma sofre suas penas neste mundo o qual é cópia do Mundo das Ideias. O discurso socrático-platônico em favor da primazia da razão tem continuidade com Aristóteles (384-322 a.C.). Embora admita existir algo oposto à dimensão racional, e isto seria a emoção, Aristóteles entende que a característica mais humana é a razão. Finalmente, para os estóicos, cada indivíduo deve se perguntar constantemente sobre a relação que mantém com a parte chamada Razão soberana, aquela que o torna independente e o deixa em perfeita harmonia com o Universo. Estas concepções, entre os gregos antigos, consubstanciam a resposta clássica de que o ser humano é constituído, na essência, pela razão.

Tal resposta sofreu abalo pelo ideal cristão. A faculdade de pensar, que traria independência e harmonia aos indivíduos, e concebida como virtude humana, passou a ser entendida como algo que poderia levar ao vício e ao erro. Em Agostinho (354-430), a razão não é mais o caminho da clareza, verdade e sabedoria, porque ela mesma existe na obscuridade, sendo possível desvendá-la somente por meio da revelação cristã. Mesmo quando Aquino (1225-1274) atribui à razão um poder maior que o concedido por Agostinho, a razão não usa seu poder corretamente a não ser que esteja guiada e iluminada por Deus.

Esta discussão, envolvendo razão e fé, perdura ao longo da Idade Média, assumindo conotação diferente com Pascal (1623-1662) no início da Idade Moderna. Para ele, o que caracteriza o ser humano é a sua variedade intrínseca, sendo a contradição sua primeira e verdadeira lei, não havendo mais uma natureza capaz de defini-lo. A religião é a única abordagem capaz de responder o que é o ser

humano, embora ela não pretenda esclarecer o mistério humano, mas aprofundá-lo

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De todo modo, Descartes (1596-1650) busca finalizar essa discussão, fortalecendo a ideia de homem racional, explicando que a unidade dos seres humanos é representada pela razão bem guiada e desenvolvida. Para o autor, o bom senso e a razão são naturalmente iguais em todos os indivíduos (DESCARTES, 1973).

Nietzsche (1844-1900), por sua vez, afirmou no século passado que o homem é a medida de todas as coisas (repetindo Protágoras, o antigo filósofo grego) porque de sua vontade de potência é que cada coisa adquire o seu sentido. O autor defende a ideia do Super-Homem, aquele que está para além da racionalidade, que despreza valores éticos, vive num mundo dionisíaco e percebe o passar do tempo como um eterno retorno. Em Assim falou Zaratustra, afirma que cada indivíduo é uma corda sobre o abismo, atada entre o animal e o além-do-homem, tendo como grandeza o fato de que ele é uma ponte e não um fim (NIETZSCHE, 1996).

Explicações sobre o ser humano se relacionam, também, com a dimensão emocional, tendo sido Aristóteles o primeiro pensador a refletir e a concluir sobre o assunto, demonstrando que é necessário haver equilíbrio entre razão e emoção. Em Ética a Nicômaco, o filósofo grego demonstra que as paixões são bem vindas, desde que manifestadas de forma equilibrada, senão levam ao erro; explica que são dignos de louvor aqueles que se encolerizam por justos motivos e com os indivíduos certos, fazendo isto como, quando e enquanto devem (ARISTÓTELES, 1996).

As explicações no âmbito da dimensão emocional perduram no tempo. Na atualidade, Casassus (2009) acentua a importância das emoções para que a pessoa se perceba como ser vivo. Para o autor, o indivíduo percebe a sua própria existência somente quando se dá conta de que sente a vida pulsando em si mesmo. Assim, essa noção encontra-se distante da concepção do ser humano presente no antigo cogito cartesiano, sendo possível assumir, em vez do penso, logo existo algo como sinto a vida, logo existo.

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construído por elas na lida com os problemas do dia a dia tem sua importância atestada porque essas ações permanecem gravadas no sistema nervoso de cada um como inclinações inatas e automáticas do coração.

As experiências no âmbito do pensamento e da emoção têm seu suporte no próprio corpo do indivíduo. Para Aranha e Martins (1986), o primeiro momento da experiência humana é o corpo, pois, antes do ser que conhece, há o ser que vive e sente. Por seu intermédio, o indivíduo se engaja de inúmeras maneiras perante o real, a exemplo do trabalho, arte, amor e sexo. As autoras explicam que o corpo não é um instrumento por meio do qual o íntimo de cada um tenta se manifestar, mas, sim, o próprio indivíduo se manifestando.

A partir da disposição natural de decidir, o indivíduo age. Sua ação, diferentemente daquela realizada pelos animais irracionais, produz experiências que criam a existência humana. O ser que pensa-sente-quer é direcionado para fins elaborados conscientemente, em resposta aos desafios da natureza em sua luta pela sobrevivência, reproduzindo técnicas já utilizadas pelos semelhantes e inventando outras (ARANHA; MARTINS, 1986). Desse modo, sua capacidade de resposta cresce qualitativamente porque, ao se desenvolver biologicamente, evolui na capacidade de reflexão e, com isto, inova sua atuação sobre a natureza.

Estas ideias sobre o ser humano demonstram que não se pode fragmentá-lo, ora em sua racionalidade, depois na emoção ou, ainda, na capacidade de agir. Embora o Homo sapiens, segundo a resposta clássica, tenha dado lugar ao Homo fidei, entre os medievos; não obstante o homem sem natureza definida e contraditória, conforme explicam os primeiros modernos, tenha cedido lugar ao homem que é dono da razão; embora, na contemporaneidade, tempo de incertezas e indefinições, as explicações se relacionem com a multidimensionalidade, prevalece, apesar das tentativas de fragmentá-lo, a concepção de que há uma unidade constitutiva do ser humano.

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e Martins (1986), embora didaticamente seja possível distinguir essas atividades, o homem é uma unidade que pensa-sente-quer-age.

1.1.2. Sociocultural, um lugar para o ser humano

Na Antiguidade, os chamados pré-socráticos perguntavam-se, fundamentalmente, sobre o princípio material e ordenador das coisas, denominando-o pela palavra arché. Com Sócrates, a pergunta fundamental passa a localizar-se na pessoa humana, o que alicerça as grandes questões da humanidade até o século XVI, quando então surge o sistema heliocêntrico postulado por Nicolau Copérnico (1473-1543). Nessa época, o homem deixa de ocupar o centro do Universo, constituindo-se uma nova cosmologia, diferente da metafísica clássica, da religião e da teologia medievais, abrindo portas para a compreensão científica do ser humano. Essa cosmologia colocava cada indivíduo em solidão diante do infinito oceano circundante; uma infinitude que fez Pascal (1623-1662) afirmar que “le silence éternal de ces espaces infinitis m’effraye” (CASSIRER, 1994, p. 29).

Naquele momento histórico, Montaigne (1533-1592) exigia, em sua Apologia

de Raimond Sebond, que lhe mostrassem por meio da razão o porquê da ideia de

supremacia do ser humano em relação às demais criaturas. Aquele filósofo se pergunta: quem teria feito os indivíduos pensarem que o admirável movimento do arco celestial, a luz eterna das luminárias situadas acima de suas cabeças e os prodigiosos e temíveis movimentos do infinito teriam sido estabelecidos e continuariam por muito tempo a seu serviço? (CASSIRER, 1994). Por outro lado, para Giordano Bruno (1548-1600), a infinitude na qual os indivíduos se encontravam mergulhados significava não somente a inesgotável riqueza da realidade, mas o poder fantástico do intelecto do ser humano.

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não consegue explicar as diferentes motivações do indivíduo em sua relação com os outros, localizando a discussão em área de conhecimento que envolve o tema da cultura. O ser humano é compreendido não mais em termos individuais, mas na complexidade das relações sociais, envolvendo a linguagem, o mito, a religião e a arte.

Estas explicações, do ponto de vista antropológico, consideram o ser humano em sua totalidade, admitindo-o como elemento integrante de grupos organizados, histórico e possuidor de crenças, usos e costumes, linguagem e assim por diante. Como explicam Marconi e Presotto (2006), ele é o resultado de um processo de evolução, um ser bio-psico-cultural, portanto, pensante, produtor de culturas e pertencente a uma sociedade.

No século XX, essas concepções se consolidam, mas as discussões e perguntas continuariam, recebendo contribuições de ciências surgidas naquele século, tais como: física quântica; neurociência; biologia celular e molecular. Ademais, contribuem para as discussões teorias como o princípio da incerteza, de Heisenberg; o princípio da complementaridade, de Niels Bohr; os níveis de realidade, de Basarab Nicolescu; a teoria autopoiética, de Maturana e Varela; o pensamento complexo, de Edgar Morin; o pensamento ecossistêmico, de Moraes (MORAES, 2008). Estas teorias explicam que o ser humano existe na interação com aquilo que o circunda. Nesta perspectiva, Moraes (2008) toma Morin como referência para explicar que, de certo modo, os princípios que regem o Universo são os mesmos que regem o ser humano.

Portanto, há muito tempo ficou descartada a ideia de que o ser humano é somente ou razão, ou fé ou emoção. O indivíduo não existe na solidão do encontro com ele mesmo ou com a Natureza, mas na relação significativa mantida com o mundo e com aqueles que nele habitam. Sendo essencialmente sociável, o ser humano não vem ao mundo sozinho; não cresce sozinho; não se educa sozinho. Somente na companhia dos outros, o indivíduo ocupa um lugar que é seu enquanto ser humano, podendo realizar suas necessidades elementares e suas aspirações. Nesta interação, ele emerge como um ser sociocultural.

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O conceito ideal do ser humano e, no desdobramento, a clareza quanto ao seu lugar no mundo, são condições que subjazem, previamente, à intencionalidade de educar para formar. Para Vieira Pinto (2007), aquele conceito é um dado de consciência. Assim, a educação assume dois entendimentos: como procedimento de transformação do não-homem em homem (segundo a forma elementar de consciência, ingênua); como diálogo entre os homens (segundo a forma superior de consciência, a crítica). Por conseguinte, pode-se dizer que o conceito de educação, bem como o de seu papel sociocultural, depende do nível de consciência dos indivíduos afetados pelo processo de formação.

1.2.1. Fenômeno educativo

A palavra educação origina-se do verbo educar, proveniente do latim educare, sendo este a tradução do grego paidagogia. Este termo, por sua vez, constitui-se de pais (criança) e ago (conduzo), significando para os gregos antigos a formação integral da pessoa (GILES, 1983).

Seu entendimento envolve dois níveis de abrangência, um restrito e outro amplo. No primeiro caso, educação se refere à pedagogia clássica sistematizada, ocorrida no contexto de unidades educacionais formais, por meio de dinâmicas que utilizam recursos como aula, quadro, computadores, livros e material escolar. Neste nível, encontra-se a ideia de capacitação para sobreviver e fazer parte de contextos de vida. O processo educacional aqui é considerado a partir da visão clássica e tradicional.

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Com os gregos antigos nasceu a educação baseada em conteúdos que eram, simultaneamente, morais e práticos. Aos preceitos relacionados à moralidade externa, à prudência para a vida, agregaram-se mandamentos como honrar os deuses e os pais e respeitar os estrangeiros. Nasceu, também, a ideia de transmissão de conhecimentos e aptidões para a prática de uma profissão, a

techne, como a denominavam os gregos (JAEGER, 2001).

Dos gregos antigos até hoje inúmeras definições de educação foram elaboradas. Para Vieira Pinto (2007), ela tem um caráter processual, permitindo à sociedade moldar seus membros à sua imagem e de acordo com seus interesses. Sendo histórica, ela forma o indivíduo ao longo do tempo. Além disto, representa a história de cada um dos indivíduos e de sua comunidade, devendo ser interpretada por intermédio da lógica dialética e não da lógica formal. Desse modo, as pessoas se formam no sentido Bildung3 porquanto a sociedade atua sobre o desenvolvimento de seus componentes visando a integrá-los ao seu modo de ser e fazê-los aceitar os fins coletivos.

Para Freire (1987), a educação acontece no esforço contínuo por intermédio do qual os seres humanos vão se percebendo, de maneira crítica, como estão

sendo no mundo, com que e em que se acham. A educação deve ser

problematizadora, iniciando-se justamente na historicidade dos homens, reconhecendo-os como seres inconclusos em e com uma realidade que, sendo histórica, também é inconclusa. Neste sentido, o fenômeno educativo re-faz-se na práxis, pois, para ser, tem que estar sendo.

Justamente neste re-fazer-se na práxis, próprio da concepção problematizadora, encontra-se a necessidade de interpretar o fenômeno educativo a partir da lógica dialética. Para Vieira Pinto (2007) a historicidade está na essência da educação e qualquer programa em seu favor nasce inconcluso porque sua própria execução lhe altera aspectos qualitativos, tais como o professor, o aluno e os recursos utilizados, exigindo constante aprimoramento.

3Freitag (2001) explica que, para Kant, Bildung significa o processo de moldagem em que o educador

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Desse modo, a concepção freiriana de educação supõe que a situação humana seja compreendida como um problema sobre o qual incida o ato cognoscente. Em decorrência, explica Freire (1987), o indivíduo aprofunda a tomada de consciência sobre a realidade, apropriada como história e, por isto mesmo, sujeita à transformação. Conforme Vieira Pinto (2007), a educação é um fato que se determina de acordo com a consciência social alcançada e, simultaneamente, tem o objetivo de suscitar no educando a consciência de si mesmo e do mundo.

Finalmente, vale ressaltar que estas concepções filosófico-científicas demonstram o caráter endógeno da educação. Um caráter que não é identificado exclusivamente por formulações teóricas, por um pensar rigoroso e legitimado pelos meios acadêmicos. Ele é evidenciado, também, em discursos como os de indígenas brasileiros:

Aprendi com meu povo o verdadeiro significado da palavra educação quando via meu pai ou a mãe do menino ou da menina conduzindo-os passo a passo no aprendizado cultural: pescar, caçar, fazer arcos e flechas, limpar o peixe e cozê-lo, buscar água, subir na árvore (...) Aprendi que na sociedade indígena, educar é arrancar de dentro para fora, fazer brotar os sonhos e, às vezes, rir do mistério da vida. Descobri, depois, que na sociedade pós-moderna ocidental, educação significa a mesma coisa: tirar de dentro, jogar para fora. Mas decepcionei-me ao ver que os professores faziam o contrário: colocavam de fora para dentro. Os sonhos ficavam entalados dentro das crianças e dos jovens. Aprender, para o ocidental, é ficar inerte, ouvindo (MUNDURUKU, 2001, p. 38).

1.2.1.1. Social na educação

O processo de humanização dos indivíduos inicia com a procriação natural, mas evolui do plano físico ao espiritual. As pessoas sobrevivem, buscando sua alimentação, moradia e proteção, mas emergem como seres espirituais, sendo capazes de realizar ações que melhoram as formas de existência (JAEGER, 2001).

Segundo Mota (2007), os indivíduos produzem sua existência ao extrair necessidades do mundo natural, fazendo isto na relação mantida com os outros. Neste processo, eles transformam a Natureza e a si mesmos, na medida em que inventam novas técnicas, ferramentas, conhecimento, cultura. Desse modo, essas ações transformam-se em princípio educativo porque os indivíduos passam a perceber, de maneira diferente, a si, aos outros e ao mundo em que vivem.

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corpórea e espiritual adquirida naturalmente crie condições especiais de se manter e de ser transmitida, a exemplo da capacidade de se comunicar e de viver socialmente. Segundo o autor, na educação encontra-se a mesma força vital que leva os seres vivos a se conservarem. Nela, esta força se intensifica ao mais alto grau porque o conhecimento e a vontade são esforços conscientes.

Considerando a perspectiva da evolução física, observa-se que a satisfação de necessidades gera o processo histórico-social, caracterizando estruturas próprias de cada sociedade e envolvendo os mais diversos interesses. Segundo Vieira Pinto (2007), a educação real tem acontecido nos limites deste processo. Por um lado, seu caráter social manifesta-se quando os indivíduos são habilitados técnica, social e ideologicamente para gerar resultados por intermédio do trabalho. Neste caso, fica favorecido um grupo que se julga no direito de saber e especializar-se na tarefa de educar, bem como de legislar sobre o fenômeno educativo. Por outro lado, o caráter social da educação fica evidente quando o desenvolvimento de potencialidades e a apropriação do saber social, refletido em conhecimentos e habilidades, atitudes e valores, se voltam para o atendimento de interesses coletivos. Segundo essa caracterização, o trabalho dos membros da comunidade realiza-se de acordo com suas possibilidades, permitindo-lhes se apropriar daquilo de que precisam. Neste caso, a educação contribui com conhecimentos e atitudes que possibilitam às pessoas sobreviverem na comunidade.

De uma perspectiva da evolução espiritual, constata-se que ao inventar sua existência a partir de mecanismos adquiridos naturalmente, o homem promove, em sua especificidade, aquilo que Freire (2009) denomina suporte. Este seria o espaço ao qual o animal se vincula, seja prendendo-se ou resistindo a ele. No caso do ser humano, o suporte alonga-se, fazendo-se mundo. Simultaneamente, a vida faz-se existência. Para Freire (2009), isto ocorre na medida em que o corpo humano transforma-se em corpo consciente, capaz de captar a realidade, aprender, transformar e criar o que é belo, e não em espaço vazio a ser preenchido por conteúdos.

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Este processo, portanto, evidencia a dimensão social da educação. À medida que o indivíduo se conscientiza de sua natureza coletiva, ele se dá conta de que precisa preservar o que favorece a concordância entre o seu comportamento e os interesses da coletividade. Essa dinâmica de conscientização sobre aquilo que é bom ou ruim para a manutenção do grupo é a própria educação se concretizando. 1.2.1.2. Cultura e educação

Segundo Ullmann (1991), cultura é o modus vivendi global, do qual um determinado povo participa, incluindo a maneira de agir, de pensar e de sentir. Neste sentido, refere-se ao conjunto de costumes humanos, traduzindo o cabedal de conhecimentos acumulados e transmitidos na relação social. Ela possibilita a interpretação do mundo humano, sendo resultado da elaboração simbólica e, consequentemente, ultrapassa o sentido meramente factual. Por sua vez, Hofstede (1997) define cultura como uma programação mental coletiva que torna distintos os membros de um grupo, ou categoria de pessoas, diante de outro. Neste entendimento, a cultura acontece porque cada indivíduo transporta em si padrões de pensamentos, sentimentos e ação potencial, originários de um contínuo aprendizado, que se instalam em sua mente ao longo da vida.

Intersectando os principais aspectos dessas definições com a realidade educacional, depreende-se que o caráter cultural da educação manifesta-se na transmissão, interpretação e ressignificação de experiências vividas e saberes acumulados, compartilhados por intermédio da interação entre educadores e educandos, gerando características e dinâmicas de existência específicas de seus grupos de pertença.

Para Vieira Pinto (2007), a educação constitui-se em acontecimento cultural que envolve não apenas o repasse de conhecimentos, vivências, usos, crenças e valores, mas também os métodos implicados neste processo, os quais concernem à totalidade social. Segundo esse entendimento, o aspecto material da relação entre educação e cultura manifesta-se na transmissão de saberes e o aspecto formal evidencia-se nos meios criados e possibilitados pela própria cultura para que esse repasse aconteça na sociedade.

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que se dá na relação entre educação e cultura, pode ser compreendida melhor a partir da seguinte definição:

A cultura é, pois, o processo pelo qual o homem acumula as experiências que [ele] vai sendo capaz de realizar, discerne entre elas, fixa as de efeito favorável e, como resultado da ação exercida, converte em ideias as imagens e lembranças, a princípio coladas às realidades sensíveis, e depois generalizadas, desse contato inventivo com o mundo natural (VIEIRA PINTO, 1979, p. 123).

Nesta definição, ação exercida significa o trabalho humano, que acontece no convívio que os indivíduos decidem estabelecer entre si; acumular experiências e converter imagens e lembranças em ideias significa, precipuamente, aprender, conhecer, tomar consciência sobre o que se faz e pensa. Neste sentido, o caráter cultural da educação se manifesta na dinâmica construída pelas categorias trabalho, aprendizado, natureza e ser humano, na capacidade que o indivíduo tem de se reconstruir consciente e permanentemente no convívio com o outro. Na convivência, exige-se respeito ao direito de tomar decisões possibilitadas pelos conhecimentos e experiências adquiridas no grupo.

Desse modo, o caráter cultural da educação evidencia-se na tensão entre a dimensão material e a espiritual. Uma tensão que é constituída pelo acúmulo de experiências humanas que são, inicialmente, vinculadas ao sentido factual, mas depois elevadas à categoria do simbólico. Neste nível, idealizam-se valores e crenças, que são manifestações culturais presentes no processo educacional.

Sublimando o caráter cultural da educação, Carneiro (2003) propõe a reinvenção da paideia, sinônimo de educação e cultura. Visionário, o autor supõe o despertar de um novo humanismo ao explicar que:

Se a Paideia predominar, isto é, o social, o cultural e o humano adquirirem prioridade sobre o econômico, veremos inaugurado um tempo inclusivo, onde todos podem habitar a cidade e nela buscar a sua felicidade pessoal na dignidade e na concertação de interesses com todos os demais concidadãos (CARNEIRO, 2003, p. 109).

1.2.1.3. Valores da educação

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bases axiológicas pré-estabelecidas e, simultaneamente, transmite, reproduz ou cria valores. Neste trabalho, entende-se que os valores aderem ao processo educacional qualificando-o e dotando-o de contravalores, que podem ou não contribuir para o êxito desse mesmo processo. De qualquer forma, aqueles são transmitidos, reproduzidos ou criados segundo uma hierarquia que lhes é atribuída pelos envolvidos4.

Silva (2000) analisa esse caráter axiológico, relacionando-o com as propostas educativas da escola tradicional e escolanovista, as quais correspondem à pedagogia da essência e da existência; com a proposta progressista, a qual corresponde ao materialismo histórico-dialético5.

A pedagogia da essência remonta aos gregos, para quem o ser humano é essencialmente livre; perpassa os tempos medievais, quando o homem tem sua essência na criação divina; alcança os modernos, quando, ser homem, é ser livre por natureza. Tal concepção pedagógica fundamenta a escola tradicional de educação a partir dos seguintes valores, dentre outros: ensino humanístico de cultura geral segundo saberes e conhecimentos já constituídos; autoridade e orientação do professor, com a valorização da organização lógica do ensino o qual deve ser externo ao aluno; disciplina escolar; aprendizado pela apreensão de modelos para somente depois criar; memorização de conteúdos; caráter conservador na relação educação-sociedade (SILVA, 2000). Nessa perspectiva, o professor transmite informações e o aluno torna-se passivo, memorizando os conteúdos transmitidos.

Conforme explica Pedro (2002), a escola tradicional preocupava-se, principalmente, com a pura transmissão de saberes e de determinados valores pertencentes ao patrimônio cultural da nação. Uma adesão irracional aos conteúdos memorizados, sem sua compreensão.

4 Os valores possuem quatro categorias ontológicas: os valores não são, mas valem algo; são

qualidades, portanto, algo que não é, mas que adere a outra coisa; implicam polaridade na medida em que tem um contravalor, positivo ou negativo; os valores têm hierarquia, na multidão de tipos existentes (GARCÍA MORENTE, 1980).

5 O ser humano pode ser uma invenção de Deus, existente a partir de um modelo estebelecido

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Por sua vez, a pedagogia da existência, que inclui diversas correntes de pensamento, como pragmatismo, vitalismo, historicismo, existencialismo e fenomenologia, fundamenta a escola nova a partir de valores como: ensino para a vida e atividades humanas, sendo a criança o centro do processo educacional; o presente é mais importante do que qualquer herança cultural e modelos pedagógicos; iniciativa pessoal e autonomia do aluno; reforma pedagógico-metodológica em vez da preocupação com os conteúdos; sistematização do mundo escolar, sendo a existência do cotidiano a principal referência; transferência natural do conhecimento adquirido pela criança por si só; integração escola-sociedade, sendo a educação um instrumento de mudança (SILVA, 2000). Em sua atuação, o docente é substituído por um monitor e o ensino acontece somente se houver uma autogestão individual ou em grupo, buscando atingir postura voltada para a integração, em lugar da separação.

Pedro (2002) explica que, em oposição à escola tradicional, a qual criava uma separação entre pensamento e sensibilidade, a escola nova proporcionava uma educação em que o educador tinha o papel de intervir indiretamente, orientando e aconselhando o aluno.

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A educação progressista, conforme afirma Snyders (1974), se distingue da pedagogia conservadora pelo que diz sobre as questões de desigualdades sociais, racismo, guerras e sobre práticas vinculadas às diversas interpretações. De acordo com sua explicação, essa pedagogia se preocupa que o aluno ultrapasse a própria experiência, a qual assume um sentido ativo para ele. Uma experiência que tem necessidade da cultura e de ser guiada.

Segundo Pedro (2002), trata-se de uma pedagogia que valoriza o saber socialmente significativo e jamais o saber artificial e fechado para o aluno ou, ao contrário, o saber espontâneo; mas que trabalha a relação direta entre a experiência do aluno e os conteúdos.

1.2.2. Papel sociocultural da educação

A busca por uma definição do papel sociocultural da educação constitui-se, há muito tempo, em área problemática. As dificuldades se ampliam quando essa busca acontece no mundo atual caracterizado por mudanças aceleradas, transformações profundas, complexidade das relações entre os indivíduos e pelas facilidades de comunicação oferecidas pelos avanços tecnológicos. Trata-se, portanto, não somente de definir esse papel, mas apresentar as condições nas quais se dá a sua concretização.

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aprender a ser, aprender a conhecer, aprender a fazer e aprender a conviver. A concretização desse papel pode estar representada no cumprimento de duas grandes tarefas a cargo da educação.

A primeira dessas tarefas refere-se à formação para o trabalho. Considerando que atualmente o processo formativo não pode mais ser pensado de modo excessivamente rígido, voltando-se para a aquisição de competências e habilidades que possibilitem a execução de certas atividades (TAVARES, 1996), o papel sociocultural da educação deve contribuir para que o educando se prepare para um quadro de ocupações mais flexível, sendo capaz de inovar.

Neste sentido, é importante a classificação feita por Reich (1994) das ocupações que existem em função da competitividade. Segundo o autor, o universo do trabalho tem se organizado em torno de dois eixos de ocupação: os seguidores de rotinas e os analistas simbólicos. O primeiro eixo, que envolve os serviços rotineiros de produção e os serviços pessoais, caracteriza-se pelo cumprimento de procedimentos padronizados e regras pré-estabelecidas e seus funcionários são remunerados em função do número de horas trabalhadas e do volume de trabalho realizado, não sendo necessário possuírem grande educação escolar. O segundo eixo, que envolve atividades de identificação e solução de problemas, caracteriza-se pela manipulação de símbolos – dados, palavras, representações, dentre outros – e seus funcionários são remunerados de acordo com a qualidade do trabalho, tendo a maior parte deles cursos de graduação e pós-graduação.

Para Machado (2004), essa bifurcação fundamental do mundo do trabalho ainda não é considerada pela escola, havendo uma formação para ocupações bastante específicas. Segundo ele, os cursos de graduação ainda são incipientes no preparo das pessoas com algo que ultrapasse o conteúdo, o que as tornaria aptas para um melhor discernimento; não formam, ainda que de maneira geral, em áreas como a educação, a psicologia, a filosofia e a sociologia. Para o autor, o mundo do trabalho aponta para uma formação mais ampla, transdisciplinar, que possibilite às pessoas o desempenho de múltiplas funções e mantenha o foco na capacidade de criar.

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fenômeno educativo. Além disso, segundo o pensamento aristotélico, ser bom significa ser bom cidadão, o que é possível somente na relação que as pessoas mantêm entre si. No mundo atual, é necessário resgatar princípios e valores morais universais que permitam fundamentar um processo educacional capaz de libertar e formar o indivíduo e a sociedade segundo premissas éticas em que o Amor e a Justiça possibilitem o fazer social (BEUST, 2000).

No mundo contemporâneo, caracterizado pela pluralidade moral, como se desenvolve o papel sociocultural da educação na perspectiva dos valores? Como atualmente não existe um modelo de pessoa ideal, Marchesi (2008) lembra que os direitos declarados fundamentais em 1948 constituem-se num conjunto de valores universais que possuem força para orientar a ética individual e a coletiva. Lembra, ainda, que essa perspectiva universalista dos valores sustenta-se na noção de cidadania, servindo para dar coerência aos valores básicos que aglutinem propostas de uma educação moral.

Entretanto, Marchesi (2008) alerta que, dado o aspecto generalista presente na definição desses valores básicos, a maioria dos problemas éticos não são solucionados. Por exemplo, há contradições quando valores fundamentais colidem e há diferenças quando eles são interpretados e implementados. Desse modo, mesmo tendo valores que são referenciais de uma educação moral, o fenômeno educativo lida continuamente com contradições típicas dos relacionamentos inerentes aos grupos.

A maior contradição envolvendo a prática de uma educação moral encontra-se, conforme Marchesi (2008), na diferença entre os valores transmitidos pela sociedade e aqueles que ela mesma exige que a escola promova. De acordo com sua explicação, à competição, ao individualismo, à violência e à desigualdade presentes na sociedade atual competitiva, contrapõem-se a lealdade, a igualdade, a paz e a solidariedade, cuja promoção exige-se da escola.

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exercício de valores cívicos que serão assumidos pelos alunos, tais como participação, respeito mútuo, tolerância e assim por diante.

Com efeito, a instituição escolar é lugar onde os valores cívicos podem ser exercitados. Pesquisa realizada na década de 90 do século passado pela Associação Internacional para a Avaliação do Rendimento Educacional, sobre Educação Cívica, envolvendo 90 mil estudantes de 14 anos de idade em 28 países, evidenciou que as escolas contribuem para a melhoria dos conhecimentos cívicos dos estudantes ao promoverem discussões abertas em sala de aula (TORNEY-PURTA, 2002). A pesquisa mostrou que a participação em organizações, como os grêmios ou conselhos de classe, também leva a resultados positivos em alguns países.

Sobre o assunto, Perrenoud (2000) explica que, embora seja uma injustiça esperar dos professores virtudes educativas maiores do que às pertencentes à sociedade na qual eles se inserem, a educação deve insistir na construção de valores, mesmo que em tais sociedades eles sejam contrários ao que é exigido das escolas. Para o autor, não se deve aquiescer ao estado de confusão e cinismo de uma comunidade violenta, bruta, preconceituosa, desigual, plena de discriminações. Conclui que, ceder a esse estado, significa esquivar-se da contradição entre o que ensina um professor e o que vivenciam as crianças reunidas na classe. Portanto, cabe à educação enfrentar abertamente a contradição entre os valores afirmados por ela e os costumes da sociedade na qual está inserida.

A efetividade desse enfrentamento não depende exclusivamente de boas intenções, convicção e realismo, mas de vivências que possam facilitar a verdadeira aprendizagem, tomada de consciência, construção de valores e identidade moral e cívica (PERRENOUD, 2000). Desse modo, o processo educacional não se restringe ao cumprimento de uma grade horária, mas amplia-se, perpassando questões curriculares envolvidas com a reflexão e a prática conexas a valores e cidadania.

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Entretanto, essas tarefas a cargo da educação se concretizarão se forem satisfeitas, pelo menos, duas condições. Na atualidade, exige-se das pessoas, de um lado, competência e rigor aliados à capacidade de raciocinar rapidamente e comportar-se de maneira ética e, de outro lado, saber conviver com as contradições que permitem fazer e pensar numa mistura de interesses e individualismo (TAVARES, 1996). Existem, simultaneamente, uma cultura científica, rigorosa e bem delineada, e um conjunto de culturas humanas, plenas de incoerências e ricas de possibilidades de realização dos indivíduos. Resgatar o vínculo entre estas duas vertentes, perdido na Modernidade, integra o papel sociocultural da educação que esteja atualizado com as exigências de seu tempo. As duas condições de concretização do papel sociocultural encontram-se, necessariamente, vinculadas a esse resgate.

A primeira dessas condições refere-se ao que Morin (2008a) designa como uma reforma do pensamento, o que permitiria o emprego da inteligência visando a ligar cultura científica e culturas das humanidades. Nesta perspectiva, o papel da educação deve estar conexo com a ideia de que a reforma do ensino leva à reforma do pensamento e vice-versa. Na mesma linha de raciocínio, Pedro (2002) afirma que o desafio do tempo atual é desenvolver nova maneira de pensar, novo tipo de racionalidade, possibilitando ao indivíduo enfrentar as exigências do mundo pós-moderno acelerado e necessitado de uma nova ética. Desse modo, torna-se necessário perguntar pelas relações que existem entre a ciência e a virtude, pelo valor do conhecimento tido como vulgar e que a ciência insiste em considerar irrelevante (SANTOS, 2000).

O que Morin (2008a) propõe é uma razão aberta, que não rejeite mais fragmentos da realidade e conceba o ser humano em todas as suas dimensões, portanto, uma razão complexa. Um novo pensar, pelo qual alguns termos até então antinômicos, tais como inteligência-afetividade e razão-desrazão, não sejam mais concebidos em oposição absoluta, mas em oposição relativa, mantendo complementaridade.

Esta razão aberta implica no abandono de paradigmas6 que reduzam o indivíduo a processos de trabalho, a coisas em favor da economia, da eficácia e do cálculo. Um papel sociocultural atualizado com seu tempo pauta-se em modos de

6 Paradigma é o modo como se pensa e como se usa a lógica. É aquilo que rege a ordem do

Imagem

Figura 1 – Razão indolente e ecologia dos saberes.
Figura 2 – Carpe diem e educação em valores.
Figura 7 – Discurso do professor: categoria informação e respectivos temas.
Figura 8 – Discurso do professor: categoria formação e respectivos temas.
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