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CAPÍTULO 1 – O Setor Público, o Desenvolvimento Sustentável e as Compras Públicas

2.4 Os stakeholders do sistema de CPS no Brasil

3.2.4 Análise dos dados

De acordo com as recomendações de Yin (2005) e Merriam (1998), estudos de múltiplos casos requerem uma análise individual e uma análise cruzada dos dados.

Objetivou-se realizar a triangulação39das informações, utilizando-se várias fontes de evidências, notadamente os dados qualitativos gerados a partir das entrevistas com os especialistas e com os profissionais das organizações participantes e os dados quantitativos decorrentes dos inquéritos sobre os stakeholders (dados primários), além

38 A versão inicial do guião previa a utilização de uma escala de 10 pontos, pois se pretendia obter maior nível de precisão da escala de mensuração, que seria respondida, em sua maioria, por profissionais com nível superior, ou seja, supostamente aptos a utilizarem este tipo de escala (Hair et al., 2005). No entanto, após observação de um dos revisores (Quadro 3.3), percebeu-se que a referida escala poderia dificultar o processo de escolha dos respondentes, pois, “com mais categorias, fica mais difícil discriminar entre rótulos e os respondentes enfrentam uma maior dificuldade em processar as informações” (Hair et al., 2005:194). Dessaforma, preferiu-se a utilização da escala de 5 pontos, em conformidade com trabalhos recentes que se propuseram a mensurar os níveis de PLU, tais como em Guerci e Shani (2013), A. M. S. Costa (2014), Viegas (2015) e Westrenius e Barney (2015), apenas para citar alguns exemplos.

39 Saunders et al. (2009) destaca que a triangulação está relacionada ao uso de diferentes formas de recolha dos dados, tais como dados primários e secundários, técnicas de observação direta, levantamento bibliográfico e entrevistas.

136 do levantamento e análises de dados bibliográficos e documentais (nomeadamente, as leis e normas internas e externas, manuais, planos estratégicos, planos de logística sustentável, relatórios de gestão, sítios eletrônicos das organizações e artigos científicos).

Merriam (1998) ressalta que o processo de triangulação é útil para efetivar a validade interna e a confiabilidade da investigação, enquanto que Rowley (2002) destaca que uma das grandes virtudes dos estudos de casos é o uso de múltiplas fontes de dados. Yin (2005) acrescenta que isso faz com que os resultados e as conclusões do estudo sejam mais confiáveis.

Para os Blocos 1 e 2 (respectivamente “Características do sistema” e “Dimensões e temáticas transversais”) do roteiro (Apêndice IV) foi utilizada a análise de conteúdo (Bardin, 1977) como técnica de análise dos dados, após serem agrupados em cinco categorias de análise: Entradas, Processos e Ferramentas, Saídas, Monitoramento e Avaliação e Dimensões e Temáticas Transversais.

Para o Bloco 3, os dados foram analisados de forma a categorizar os stakeholders de acordo com os modelos de Mitchell et al. (1997) e de Savage et al. (1991).

Para o primeiro caso, na categorização dos oito tipos de stakeholders propostos por Mitchell et al. (1997), foram adotadas adaptações ao método empregado por Guerci e Shani (2013). Utilizou-se como medida de tolerância um valor variável correspondente a ¼ do desvio-padrão das respectivas médias dos atributos de poder, legitimidade e

urgência de cada organização, ao invés do valor fixo de ½ ponto utilizado por Guerci e

Shani (2013).

Tanto a média quanto a mediana são abordadas pela literatura como medidas de tendência central utilizada no tratamento das escalas ordinais (Gravetter & Wallnau, 2013; Lavrakas, 2008). No entanto, conforme orientações de Lavrakas (2008), Langdridge e Hagger-Johnson (2009) e Tullis e Albert (2013), a média aritmética foi utilizada, pois se verificaram os seguintes pressupostos: i) equivalência entre as distâncias dos níveis da escala; ii) adequabilidade da escala sobre o que se pretendeu estudar; e iii) número mínimo de cinco opções de resposta (Escala Likert de 5 pontos).

137 Os valores dos limites de tolerância adotados, calculados do conjunto de dados recolhidos, estão apresentados na Tabela 3.1.

Tabela 3.1 - Limites de tolerância adotados

Organizações ¼ σ 𝒙P ¼ σ 𝒙L ¼ σ 𝒙U Média % médio da escala

BCB 0,19 0,16 0,19 0,18 3,60 TJDFT 0,20 0,21 0,39 0,27 5,33 FNDE 0,17 0,14 0,15 0,15 3,07 Câmara 0,20 0,18 0,21 0,20 3,93 STJ 0,19 0,16 0,19 0,18 3,60 JBRJ 0,33 0,28 0,25 0,29 5,73 TRT6 0,25 0,22 0,20 0,22 4,47 TRE-PE 0,25 0,20 0,23 0,23 4,53

Média do Limite de Tolerância 0,22 0,19 0,23 0,21 4,28

Legenda: ¼ σ 𝑥P – ¼ do desvio-padrão da média de Poder de todos os stakeholders, para cada organização; ¼ σ 𝑥L – ¼ do desvio-padrão da média de Legitimidade de todos os stakeholders, para cada organização; ¼ σ 𝑥U – ¼ do desvio-padrão da média de Urgência de todos os stakeholders, para cada organização; Média – corresponde à média dos limites de tolerância utilizados (Colunas ¼ σ 𝑥P, ¼ σ 𝑥L e ¼ σ 𝑥U); % médio da escala - corresponde à coluna “Média”, mostrada em forma de percentual da escala Likert de 5 pontos utilizada.

Além disso, o critério de decisão sobre se determinado stakeholder possuía níveis mínimos dos atributos PLU foi efetivado a partir da comparação com as respectivas médias de poder, de legitimidade e de urgência da organização considerada (e não com a saliência média). Foram utilizados critérios de decisão para cada situação dos valores das médias PLU (Tabela 3.2).

Tabela 3.2 - Combinação de médias dos atributos e categorias dos stakeholders

Situações Categoria

𝑥Pi ≥ 𝑥P – ¼ σ 𝑥P; 𝑥Li ≥ 𝑥L – ¼ σ 𝑥L; 𝑥Ui ≥ 𝑥U – ¼ σ 𝑥U Definitivo 𝑥Pi ≥ 𝑥P – ¼ σ 𝑥P; 𝑥Li ≥ 𝑥L – ¼ σ 𝑥L; 𝑥Ui < 𝑥U – ¼ σ 𝑥U Dominante 𝑥Pi ≥ 𝑥P – ¼ σ 𝑥P; 𝑥Li < 𝑥L – ¼ σ 𝑥L; 𝑥Ui ≥ 𝑥U – ¼ σ 𝑥U Perigoso 𝑥Pi < 𝑥P – ¼ σ 𝑥P; 𝑥Li ≥ 𝑥L – ¼ σ 𝑥L; 𝑥Ui ≥ 𝑥U – ¼ σ 𝑥U Dependente 𝑥Pi ≥ 𝑥P – ¼ σ 𝑥P; 𝑥Li < 𝑥L – ¼ σ 𝑥L; 𝑥Ui < 𝑥U – ¼ σ 𝑥U Adormecido 𝑥Pi < 𝑥P – ¼ σ 𝑥P; 𝑥Li ≥ 𝑥L – ¼ σ 𝑥L; 𝑥Ui < 𝑥U – ¼ σ 𝑥U Discricionário 𝑥Pi < 𝑥P – ¼ σ 𝑥P; 𝑥Li < 𝑥L – ¼ σ 𝑥L; 𝑥Ui ≥ 𝑥U – ¼ σ 𝑥U Exigente 𝑥Pi < 𝑥P – ¼ σ 𝑥P; 𝑥Li < 𝑥L – ¼ σ 𝑥L; 𝑥Ui < 𝑥U – ¼ σ 𝑥U Irrelevante

Legenda: 𝑥Pi – Média de poder do stakeholder i; 𝑥Li – Média de legitimidade do stakeholder i; 𝑥Ui – Média de urgência do stakeholder i; 𝑥P – Média das médias de poder de todos os stakeholders; 𝑥L – Média das

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médias de legitimidade de todos os stakeholders; 𝑥U – Média das médias de urgência de todos os

stakeholders; σ 𝑥P – Desvio-padrão da média das médias de Poder de todos os stakeholders; σ 𝑥L – Desvio-

padrão da média das médias de Legitimidade de todos os stakeholders; σ 𝑥U – Desvio-padrão da média das médias de Urgência de todos os stakeholders.

Dessa forma, para cada organização, houve uma comparação das médias de poder,

legitimidade e urgência de determinado stakeholder (Pi, Li e Ui, respectivamente) com a

média das médias de poder, legitimidade e urgência (𝑥P, 𝑥L e 𝑥U, respectivamente) de todos os stakeholders.

Adicionalmente, os intervenientes com dois ou três atributos PLU (respectivamente, os expectantes e os definitivos) foram classificados como “mais salientes”, enquanto que as partes com um ou nenhum atributo PLU (respectivamente, os latentes e os irrelevantes) foram rotulados como “menos salientes”.

Por fim, o modelo de categorização dos stakeholders de Savage et al. (1991) foi utilizado. Com o objetivo de se avaliar o potencial dos atores-chave em cooperar ou ameaçar o sistema de CPS, na última parte do instrumento (Apêndice IV), foi solicitado que os participantes indicassem, em uma escala Likert de cinco pontos, o potencial dos

stakeholders em cooperar e o potencial dos stakeholders em ameaçar. As médias foram

então apresentadas em um gráfico, dividido em quatro quadrantes, seguindo-se à categorização proposta por Savage et al. (1991): 1) Stakeholder Disposto a apoiar; 2)

Stakeholder Marginal; 3) Stakeholder Indisposto a apoiar e 4) Stakeholder Ambíguo.

Para se evitar stakeholders classificados, ao mesmo tempo, em duas ou mais categorias, os seguintes padrões foram utilizados (Tabela 3.3).

Tabela 3.3 - Padrões utilizados na categorização dos stakeholders pelo Modelo de Savage

et al. (1991)

Tipo Potencial para ameaçar Potencial para cooperar

Indisposto a apoiar ˃ 3 ˂ 3

Marginal ≤ 3 ˂ 3

Disposto a apoiar ˂ 3 ≥ 3

139 Na apresentação individual dos casos, para cada organização-caso, os dados foram organizados e mostrados por meio das seguintes seções: Caracterização da organização, Principais entradas, Processos e ferramentas, Principais saídas, Monitoramento e avaliação, Dimensões e temáticas estratégicas, Categorização dos stakeholders pelo modelo de Mitchell et al. (1997), Categorização dos stakeholders pelo modelo de Savage

et al. (1991), Análise conjunta dos stakeholders e Principais constatações sobre o caso.

As seções “Caracterização da organização” apresentaram as informações sobre o surgimento, a missão, a visão, os valores estratégicos e a situação da estrutura organizacional relacionada à gestão da sustentabilidade e das CPS de cada organização- caso.

As seções “Principais entradas”, “Processos e ferramentas”, “Principais saídas”, “Monitoramento e avaliação” e “Dimensões e temáticas transversais” exibiram as características sistêmicas de cada organização.

As seções sobre “Categorização dos stakeholders pelo Modelo de Mitchell et al. (1997)” estruturaram os dados recolhidos no Bloco III do instrumento de coleta de dados, após a aplicação dos critérios definidos na Tabela 3.2.

As seções sobre “Categorização dos stakeholders pelo Modelo de Savage et al. (1991)” organizaram os dados recolhidos no Bloco III do instrumento de coleta de dados, representados na forma dos quatro tipos de stakeholders propostos por Savage et al. (1997), depois da consideração dos padrões definidos na Tabela 3.3.

As seções sobre “Análise conjunta dos stakeholders” pretenderam comparar as categorizações das partes interessadas obtidas pelo modelo de Mitchell et al. (1997) e pelo modelo de Savage et al. (1991) e, assim, identificar inconsistências (por exemplo,

stakeholders com altas saliências e marginais) e possíveis repetições (padrões) de

categorização.

Por fim, nas seções sobre “Constatações sobre o caso”, objetivou-se, a partir das evidências analisadas, realizar uma avaliação geral sobre o sistema de CPS da organização específica, indicando-se suas características positivas e negativas.

140 Depois de finalizadas as análises individuais dos casos, foram elaborados relatórios sintéticos e enviados para cada organização participante, para que pudessem corrigir possíveis erros de transcrição e citações relacionadas a nomes de pessoas e departamentos, descrições e numeração de normas internas, bem como verificar a aderência dos resultados preliminares à realidade organizacional. Este procedimento pretendeu contribuir para o alcance de um maior nível de confiabilidade da validade interna dos dados.

Terminada esta etapa, partiu-se para a análise cruzada dos dados, com o objetivo de se identificar semelhanças e diferenças entre os resultados dos casos individuais. Este procedimento teve o intuito de promover a validade externa dos resultados e, por conseguinte, a generalização analítica da proposta.

Foi verificada a normalidade dos dados, por meio da aplicação do teste de Shapiro-

Wilk, que demonstrou a não normalidade dos dados (Apêndice VI). Depois, para se

entender as possíveis concentrações dos stakeholders em algumas das categorias, notadamente a dos definitivos e a dos irrelevantes, verificaram-se as correlações entre os atributos PLU de cada stakeholder, através do teste não paramétrico de Spearman (Apêndice VI), conforme orientação de Norusis (2002). Ambos os testes foram realizados com o apoio do SPSS®, versão 23.

Os resultados da análise cruzada foram organizados e mostrados por meio das seguintes seções: Características organizacionais, Principais entradas, Processos e ferramentas, Principais saídas, Monitoramento e avaliação, Representação do sistema de CPS, Dimensões e temáticas estratégicas, Análise dos stakeholders e Discussão dos resultados.

Finalmente, em decorrência das análises efetuadas, elaborou-se o framework, como contribuição para o conhecimento científico relacionado às CPS e servir de referência para os gestores públicos responsáveis pela política e pela implementação das CPS nas organizações públicas. O modelo conceptual foi apresentado na quarta seção do Capítulo 4 e correspondeu ao objetivo específico 5 desta tese.

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4 Síntese do capítulo

Este capítulo abordou as questões metodológicas. Inicialmente, apresentou-se a filosofia, a estratégia e o método de pesquisa adotados para a busca dos objetivos traçados. Em seguida, mostrou-se o delineamento geral da investigação, no qual foi possível apresentar sinteticamente as etapas da pesquisa realizadas ao longo do tempo.

Definiu-se que a investigação seria dividida em duas fases. A primeira, com características exploratórias, incluiu a revisão bibliográfica, documental e a recolha das opiniões de especialistas brasileiros em compras públicas sustentáveis. A segunda, um estudo de múltiplos casos em organizações públicas brasileiras de referência na temática, utilizou os resultados preliminares da primeira fase para aprofundar o conhecimento das características do sistema de CPS.

Finalmente, passou-se a descrever, para cada fase, os objetivos pretendidos e o detalhamento dos procedimentos metodológicos utilizados, envolvendo os critérios para a escolha dos especialistas entrevistados e das organizações-caso participantes, os instrumentos de recolha dos dados, as revisões e pré-testes realizados e os processos de coletas e de análise dos dados.

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CAPÍTULO 4