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CAPÍTULO 1 – O Setor Público, o Desenvolvimento Sustentável e as Compras Públicas

4.8 As diretrizes da ONU para a CPS

Um dos temas de trabalho do Processo de Marrakesh foi justamente o fomento às compras públicas como impulsionadora da sustentabilidade na cadeia produtiva de diferentes setores da economia – o Grupo de Trabalho de Marrakesh para as Compras Públicas Sustentáveis (MTF on SPP14), criado em 2005 em uma reunião com especialistas em produção e consumo sustentáveis, realizada na Costa Rica (Betiol et al., 2012; PNUMA, 2012; UNEP, 2011).

A MTF on SPP tem como objetivos (UNEP, 2011:81) a) A criação de capacidades para a implementação das compras públicas sustentáveis; b) O aumento da conscientização de todos os envolvidos no processo de compras (decisores políticos, compradores, fornecedores, fabricantes); c) A promoção de métodos de produção mais sustentáveis, da eficiência de recursos, do bem-estar social, de melhores produtos e serviços e do incentivo à inovação e à criação de melhores condições de trabalho através da compra pública; e d) A introdução do conceito de ciclo de vida em atividades de compras.

A partir de 2009, o GTM para CPS se empenhou no projeto denominado Marrakesh

Task Force Approach on Sustainable Public Procurement, com o objetivo de ajudar no

desenvolvimento e na implementação de políticas e planos de ação em CPS, por meio da metodologia específica criada pela Força-tarefa, em sete países-piloto: Costa Rica, Colômbia, Chile, Líbano, Maurício, Tunísia e Uruguai. Juntaram-se a esses países outras quatro nações (Argentina, Gana, Nova Zelândia e Reino Unido15), perfazendo um total de onze países. Essa abordagem foi implementada nesses países-piloto, com a ajuda de especialistas e observação do progresso em cada período de um ano (UNEP, 2011).

O Grupo de Trabalho de Marrakesh apresentou alguns princípios para guiar os países em direção às compras públicas sustentáveis (PNUMA, 2012:8):

a) Uma boa compra é uma compra sustentável – além de incluir as dimensões do DS, a CPS deve considerar características como transparência, imparcialidade, não discriminação, competência, prestação de contas e verificabilidade;

14 Ou GTM para CPS, traduzido para o português.

15 No caso específico do Reino Unido, participaram algumas autoridades públicas locais dos setores de ensino superior e de saúde.

54 b) Oferecer e demonstrar capacidade de liderança através das CPS – as pessoas mais influentes das organizações devem ajudar a fomentar e a consolidar a prática, além de assegurar que os recursos estarão disponíveis para serem utilizados. As organizações mais avançadas nas ações de CPS devem demonstrar sua liderança ao compartilhar as melhores práticas e incentivar a adoção destas por outras organizações;

c) As compras podem cumprir objetivos políticos – as CPS podem ser uma forma para alcançar objetivos governamentais e organizacionais, tais como a eficiência de recursos, o desenvolvimento, o consumo e a produção sustentável;

d) Facilitar a implementação da CPS – o processo de CPS se assemelha ao de uma compra tradicional, no qual são necessárias algumas competências, como a influência, a negociação, a comunicação e a análise. Nesse processo, todos desempenham um papel importante – formuladores de políticas, compradores e fornecedores. Dessa forma, será necessário, por exemplo, o desenvolvimento e a comunicação com os fornecedores e prestadores de serviços nos estágios iniciais de implementação, o acesso à informação, o estabelecimento de linhas claras de prestação de contas etc.; e) Implementação – o processo de implementação das políticas de CPS nas organizações deve levar em conta o princípio da melhoria contínua e a abordagem que considera todo o ciclo de vida do produto. É desejável que o sistema de CPS esteja integrado a outros sistemas organizacionais, tal como com o sistema de gestão ambiental, pois isso facilitará sua implementação;

f) Relatório de resultados e monitoramento – são resultados típicos da adoção das políticas de CPS pelas organizações: o melhor desempenho ambiental, economia de recursos, melhoria da governança, criação de empregos, empoderamento de minorias, redução da pobreza, criação de riqueza e a transferência de competências e de tecnologia, entre outros. As CPS também podem estimular a competição, criar novos mercados, produtos, serviços e tecnologia, promover a inovação e o diálogo com a sociedade civil. Todas essas características necessitam ser monitoradas e avaliadas.

Especificamente para as economias em desenvolvimento, tais como Brasil, China, Índia, México e África do Sul, a UNEP e a Comissão Europeia desenvolveram rodadas

55 nacionais de discussão. Levando-se em consideração que esses países têm padrões de consumo semelhantes, foram criados grupos-alvo no trabalho sobre consumo e problemas de produção (Clark, 2006), tendo como resultado, no caso brasileiro, a Estratégia Nacional de Produção e Consumo Sustentável e a formação do Conselho Nacional de Produção e Consumo Sustentável (UNEP, 2009).

As diretrizes propostas pelo MTF on SPP (enfoque das CPS) teve como finalidade estabelecer orientações gerais para que os governos planejassem e executassem suas políticas e planos de ação, a proporcionar um marco, uma linguagem e uma visão comum no que se refere às aquisições sustentáveis. As diretrizes ainda foram complementadas por uma série de iniciativas de fortalecimento de capacidades e capacitação, uma plataforma de informação (site da UNEP) e uma rede de troca de informações composta por organizações que já implementaram as CPS (PNUMA, 2012).

O enfoque das CPS, dividido em série de passos, foi desenvolvido para guiar os países para o estabelecimento de um programa de CPS eficaz, ao criar um marco político que legitime as ações, informe ao mercado os objetivos e as áreas prioritárias de atuação. Ele foi pensado como uma série com quatro passos fundamentais, compostos por etapas. As diretrizes estão organizadas de forma a permitir que os governos primeiramente planejem a política e o plano de ação de CPS (Passos 1, 2 e 3) e depois as implementem (Passo 4), a ter a capacitação como elemento essencial presente em todo processo (Figura 1.7) (PNUMA, 2012).

As atividades do Processo Marrakesh se encerraram oficialmente em maio de 2011. Durante o período, foram estabelecidas as primeiras diretrizes e criados os primeiros mecanismos mundiais para a promoção da CPS, constituindo-se em um ciclo inicial de ações, continuadas pela aprovação na Rio +20 de uma nova etapa de dez anos (Betiol et

al., 2012). Esta nova etapa, conhecida como 10YFP, funciona com as mesmas

56 Figura 1.7 – Passos para implementação das diretrizes de CPS

Fonte – Adaptado de PNUMA (2012:12)

Durante os oito anos de existência da primeira fase do Processo de Marrakesh foi possível desenvolver uma visão mais acurada das necessidades e prioridades regionais e globais em relação à PCS. Com esse conhecimento, o 10YFP estabeleceu seus principais objetivos (United Nations Environmental Program [UNEP], 2013; MMA, 2016):

 Acelerar as mudanças para o PCS, apoiando iniciativas e políticas regionais e nacionais;

 Contribuir para o uso eficiente dos recursos e a dissociação do crescimento econômico da degradação ambiental e do uso de recursos, ao mesmo tempo em que cria novas oportunidades de trabalho e contribui para a erradicação da pobreza e o desenvolvimento social;

 Integrar a PCS nas políticas, programas e estratégias de desenvolvimento sustentável, incluindo as estratégias de redução da pobreza;

 Prover assistência financeira e técnica e criação de capacidades para países em desenvolvimento, apoiando a implementação de atividades nos níveis regional e nacional; e

 Facilitar a troca de informações e de conhecimento em instrumentos, iniciativas e boas práticas de PCS entre os atores interessados, fortalecendo a conscientização e a

Estudo institucional, implementação do projeto e da governança.

Passo 1 Treinamento

Estudo de mercado Passo 2

Política e plano de ação de CPS Passo 3 Implementação Passo 4 Treinamento Treinamento Treinamento Priorização Estudo da legislação

57 cooperação, e o desenvolvimento de novas parcerias, inclusive parcerias público- privadas.

As diretrizes propostas pelo PNUMA influenciaram o processo de desenvolvimento das políticas de CPS de blocos econômicos regionais, entre os quais, o Mercosul (Mercado Comum do Sul), que tem o Brasil como país-membro. O detalhamento das diretrizes para as CPS propostas pelos Mercosul será melhor descrito na próxima seção.