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Análise dos resultados revelados pelas crianças na notação das vogais

4 ANÁLISE DE RESULTADOS

4.3 Análise dos resultados revelados pelas crianças na notação das vogais

Tendo por objetivo analisar o desempenho das crianças na notação de vogais abertas /a/, /ɛ/, /i/, /ɔ/, /u/, selecionamos quatro das oito palavras ditadas na atividade de ditado usada, originalmente, para verificar o nível de escrita. Em cada uma delas analisaremos, exclusivamente, as vogais abertas que aparecem em destaque na tabela a seguir.

A tabela 11 apresenta as médias percentuais de acertos dos subgrupos de crianças silábicas e alfabéticas em relação à notação das vogais abertas.

Tabela 11 - Médias percentuais de acertos das crianças na notação das vogais /a/, /ɛ/, /i/, /ɔ/, /u/.

/a/ c/a/ju /ɛ/ p/e/teca /i/ b/i/cicleta /ɔ/ s/o/l /u/ caj/u/ Total Silábicos 2 20% 9 90% 10 100% 9 90% 9 90% 39 74% Alfabéticos 10 100% 9 90% 10 100% 10 100% 10 100% 49 98%

Os resultados da tabela 11 mostram que o desempenho das crianças no emprego daquelas vogais apresentou variação significativa, entre os dois subgrupos, em função da vogal /a/, onde registramos o menor percentual de acerto das vogais, no subgrupo dos silábicos. Destacando tal ocorrência, podemos dizer que, no geral, os dois subgrupos fizeram idêntico uso convencional das mesmas, não demonstrando dificuldades de notá-las. Comparando as vogais abertas /ɛ/ e /ɔ/, analisadas em seção anterior com as demais vogais /a/, /i/ e /u/, verificamos que os dados não evidenciam diferença significativa entre elas, sobretudo, no subgrupo dos alfabéticos, ou seja, as crianças demonstraram identificar e notar as vogais das palavras, sem hesitar.

Observamos, no grupo dos silábicos, que, embora tenha apresentado, na vogal analisada /a/, 100% de acerto nas atividades de conhecimento das letras, verificamos apenas 20% de notação da mesma na palavra CAJU, o que não costuma ser observado com frequência entre crianças silábicas, como apontam

resultados de pesquisas de Leite e Morais (2011) onde apresentam a relação entre acerto no conhecimento do nome de letras e uso de seu valor sonoro convencional.

“Os possíveis acertos de fonetização apresentados nos escritos das crianças se deram no som inicial ou final das palavras com a representação da vogal A”

Assim, contrariando os dados observados por nós, a notação da vogal /a/ costumaria ser frequente entre as crianças no nível silábico de escrita. Mas isto pode ter uma explicação: no caso do grupo de silábicos, o que observamos foi 70% de notação da consoante “K”, seis crianças notaram [KU] ou [KO], para CAJU, notando a sílaba inicial com a consoante que carrega em seu nome, o fonema da sílaba inicial da palavra ditada /cá/. Esse fato também foi observado por Soares em seus estudos:

(...) os nomes de algumas letras podem criar ambiguidades, como o nome da letra K, cá, que leva crianças a usá-las em lugar da letra C quando

seguida de A, isto é, em lugar da sílaba CA, como em KVALO por CAVALO, KSA por casa (SOARES, 2016, p. 219).

Segundo Soares, os nomes das letras e seus fonemas, por elas representados, no alfabeto português, podem explicar a ausência do emprego das vogais na fase inicial do processo de alfabetização. Ou seja, as crianças, nesse período, influenciadas pelo nome da letra, costumariam usá-la para representar o som da sílaba, omitindo a vogal. Tal ocorrência não foi repetida com as demais vogais abertas, as quais foram notadas por quase todas as crianças silábicas. Devemos ressaltar que, embora, a vogal /a/ na palavra ditada, não ocupe posição de sílaba tônica, não alterou seu fonema, como acontece com as sílabas átonas finais /e/-/i/ e /o/-/u/ ou mesmo sofreu alteração de fonema, devido a questões de diferentes formas dialetais brasileiras, como podemos obsevar em alguns exemplos trazidos por Moresco (2008) como v/e/stido-v/i/stido, sac/o/-sac/u/, set/e/-set/i/. Dessa forma inferimos que a característica/fonema da consoante notada, em lugar da vogal, tenha sido o principal motivo de “erros”.

Em PETECA, tivemos uma das crianças que notou a palavra com duas letras, usando a consoante convencional para notar toda a sílaba inicial, omitindo a vogal (PA), configurando o provável uso da letra, equivalendo ao fonema da sílaba inicial. Já em BICICLETA, observamos duas crianças que fizeram uso da vogal /i/ no final da palavra, notando respectivamente BCEIA e PBIA, razão pela qual repetiam várias

vezes a mesma sílaba, acrescentando letras, conforme o momento da repetição e percepção do fonema. Um fato semelhante foi observado por Ferreiro em suas pesquisas:

O interessante é que Maria, procurando outras letras para colocar, não repete nenhuma das anteriores, mas repete “so-pa”, enquanto põe as consoantes correspondentes a estas sílabas. (De fato, repete várias vezes “so” antes de colocar o S e várias vezes “pa” antes de pôr o P, como se procurasse estas letras.) O resultado é OASP. Todas as letras da palavra estão ali, mas em desordem (FERREIRO, 2013, p. 65)

Dessa forma, consideramos o emprego da vogal, por termos acompanhado o momento em que a criança fez uso da mesma, se referindo à sílaba verbalizada/falada.

Quanto à palavra SOL, tivemos uma das crianças que escreveu RU, notando uma consoante não convencional no início da sílaba.

E na palavra CAJU, uma notação da vogal “O” para substituir o “U” final, ficando, portanto, KO. Tal substituição pode ter ocorrido em função da observação, pela criança, do uso da vogal “O” no final de algumas palavras, com som reduzido, representando o fonema /u/.

Quanto ao subgrupo dos alfabéticos, observamos que houve quase 100% de acertos na notação das vogais nas palavras ditadas, configurando com isso que as crianças já eram capazes de isolar os sons daqueles fonemas vocálicos e notá-los em suas escritas. As crianças, em sua maioria, conseguiam escrever todos os fonemas de uma palavra. O único caso de “erro” foi registrado em uma criança que notou para PETECA – BOTCA, substituindo a sílaba inicial por BO. Quanto ao uso do “B”, poderíamos justificar tal substituição como traço característico de crianças alfabéticas que, segundo Ferreiro, 1985 “não exclui erros ocasionais”. Mas, estudos realizados por MIRANDA (2008) apontam alguns casos onde ocorre a substituição da vogal coronal /e/ pela dorsal /o/, conforme podemos observar a seguir:

Ao estudar a aquisição fonológica com o objetivo de verificar o que fazem as crianças em relação aos marcadores de classe de palavra, Alcântara, 2005 observou alguns casos de substituição da vogal coronal /e/ pela dorsal /o/, conforme podemos observar [‘kẽⁿtu] para ‘quente’ e [‘dẽⁿtu] para ‘dente’ (MIRANDA, 2008, p. 162).

Embora a autora tenha notificado poucos casos e estes tenham sido no final da palavra, onde geralmente se marca a questão do gênero masculino, não

podemos inferir que foi uma simples questão de erro, sem nos aprofundarmos mais sobre tal assunto.

O que podemos considerar, é que nossos dados convergem para os resultados apresentados por diferentes estudiosos sobre a notação de vogais no nível silábico de desenvolvimento da escrita, tais como: Ferreiro (1985, 1999), Ferreiro e Teberosky (2009), Soares (2016), Leite e Morais (2009, 2011), Morais (2012), onde observam que as crianças, desde cedo, apresentam em suas notações maior incidência das vogais e, acrescentamos, sobretudo, as vogais orais com timbre aberto, como discutido em seção anterior. Dessa forma, corroboramos com Martins e Silva (2009), quando dizem que a natureza das vogais abertas, por serem representadas pelo seu próprio nome/som, deve ser a provável causa de sua notação tão frequente na escrita das crianças em fases de desenvolvimento da escrita anteriores à hipótese alfabética.

4.4 Análise dos resultados revelados pelas crianças na notação de 12