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Análise qualitativa dos espectros THz e difratogramas

Capítulo 4 – Determinação de cristalinidade em celulose microcristalina

4.10. Análise qualitativa dos espectros THz e difratogramas

Primeiramente, foram analisadas de forma qualitativa as amostras preparadas pelo procedimento 1, no qual os tempos de moagem mais longos foram utilizados. Na Figura 41, são apresentados os espectros THz da celulose original e com até 240 min de moagem, medidos no foco e calculados a partir da janela temporal curta (16 ps). Duas bandas largas – uma em 2,15 e outra em 3,03 THz – aparecem evidentes no espectro da celulose original, e completamente ausentes no material moído por 240 min. Esta diferença marcante é um forte indício de que cristalinidade da celulose foi completamente destruída, tendo em vista que o material não se decompôs. Nota-se também uma variação da linha base. Isto é razoável considerando que a moagem afeta a distribuição de tamanhos de partícula, alterando a intensidade do espalhamento da pastilha. Além disso, as granulometrias da matriz (PTFE) e da MCC são muito diferentes, o que torna a distribuição de tamanho na pastilha mais heterogênea.

Figura 41: Espectros de MCC medidos no foco, com tempos de moagem de até 240 min. Janela da FFT: 16 ps (sem SNV).

Observando o conjunto de espectros com diferentes tempos de moagem, nota-se que as bandas da celulose diminuem em função do tempo, e após 60 min de moagem já não é mais possível distinguir os picos da celulose original. Outro fato interessante é que a linha base parece flutuar aleatoriamente. Considerando que há duas prováveis contribuições para esta inclinação de linha base – espalhamento e o teor de material amorfo –, é razoável que a variação seja aleatória, uma vez que não há um controle do tamanho de partícula, principal responsável pelo espalhamento. Além disso, não é possível determinar, a partir do conjunto, qual o peso de cada um desses fatores para o perfil espectral, sendo necessário para isso algum método experimental de separação destes fenômenos, ou ainda um modelo teórico para estimá-los.

Na Figura 42 são apresentados os espectros THz após SNV e os difratogramas das amostras moídas por um longo período de tempo. Nos espectros THz, observa-se que os picos situados em 2,15 e 3,03 THz diminuem gradualmente com o tempo de moagem, sendo este efeito mais visível em 3,03 THz. A intensa absorção crescente com a frequência, típica de materiais amorfos, também é coerente com os padrões de difração de raios-x – mesmo na amostra de celulose original, o difratograma não apresenta picos estreitos como é esperado de um material totalmente cristalino. Tal comportamento também é explicado pela pequena dimensão dos cristalitos de celulose. De fato, os difratogramas da celulose são bastante diferentes daqueles obtidos em polímeros semicristalinos sintéticos.

Comparando os espectros THz das Figuras 41 e 42 nota-se que a aplicação do SNV, embora não tenha eliminado a inclinação da linha base, foi capaz de normalizá-la. De um ponto de vista prático, esta correção é suficiente, uma vez que as flutuações aleatórias entre as

amostras são eliminadas, restando apenas a variabilidade relacionada aos picos em 2,15 e 3,03 THz.

Figura 42: Difratogramas (A) e espectros THz (B) para as amostras de celulose moídas por um período de 4 h. Os espectros THz foram processados por SNV.

Conforme a celulose é moída, observa-se que todos os picos do difratograma diminuem, e há o aumento de um halo amorfo, indicando a desorganização do sistema cristalino promovida pelo processo de moagem. A difratometria aparenta possuir limite de detecção muito mais baixo do que a THz-TDS – com 60 min de moagem os espectros THz já apresentam um caráter completamente amorfo, ao passo que os padrões de difração mostram um aspecto claramente cristalino. Somente com 240 min de moagem os difratogramas assumem um aspecto completamente amorfo.

O menor limite de detecção do DRX frente à THz-TDS é compreensível. Em geral, a intensidade dos picos na região THz de amostras sólidas é muito baixa quando comparada a outras técnicas vibracionais, sendo necessárias concentrações na faixa de 5-20 % em massa. Considerando que o teor de material cristalino na celulose é muito pequeno – lembrando que mesmo o CI determinado pela difração de raios-x não representa exatamente o teor real de material cristalino – é natural que o sinal tenda a ser obscurecido pela parte amorfa, que absorve radiação THz de forma independente da frequência. Outra possível causa para os sinais THz inferiores é a temperatura. Em geral, bandas a região THz se tornam mais largas à temperatura ambiente, pois já há energia suficiente para popular os estados excitados correspondentes a essa faixa de energia. Deve-se ressaltar que este efeito da temperatura depende também do grau de anarmonicidade desses modos vibracionais – do contrário, os espaçamentos entre níveis vibracionais superiores seriam muito próximos e a diferença seria

pequena. Para que isso fosse verificado experimentalmente, seriam necessárias medidas em condições criogênicas (abaixo de 77 K).

Uma vez concluído que, ao menos qualitativamente, a faixa de cristalinidade sensível pela espectroscopia THz correspondia a amostras com tempos de moagem de até 1 h, os procedimentos 2 e 3 da Tabela 3 passaram a ser executados. Os difratogramas e espectros THz das amostras produzidas em uma batelada do procedimento 2 são exibidos na Figura 43. Nela, nota-se claramente o aumento da banda em 3,03 THz à medida que a cristalinidade da celulose cresce.

Figura 43: Difratogramas (A) e espectros THz (B) para as amostras de celulose moídas por um período de 100 min. Os espectros THz foram obtidos fora do foco e processados por

SNV.

Outra avaliação interessante também é com relação aos pré-tratamentos empregados. Na Figura 44, são comparados os espectros obtidos pelos tratamentos 1 e 2. Enquanto que o tratamento 1 eliminou completamente as oscilações provenientes de efeito etalon e/ou reflexões na antena, o segundo tratamento não foi capaz de corrigir completamente esses ruídos. O corte do filtro passa baixo empregado foi selecionado verificando a frequência mínima que poderia ser usada sem distorcer o espectro – frequências de corte inferiores à utilizada começavam a deformar as bandas da celulose. Tentativas com filtros de Fourier passa banda em frequências com amplitude maior também foram realizadas, mas produziram os resultados desejados – o espectro continuava distorcido. Essa dificuldade de filtrar o ruído removendo uma componente específica na análise de Fourier indica que as oscilações não podem ser interpretadas como um simples etalon formado por filmes finos, e sim como uma combinação complexa de etalons compostos por várias superfícies, além do efeito das múltiplas reflexões na antena. Ainda assim, o espectro do tratamento 2 apresenta resolução

superior ao primeiro, de modo que foi também utilizado nos modelos quantitativos para averiguar a existência de informação útil aos modelos de calibração multivariada, que poderia não ser observada apenas qualitativamente.

Figura 44: Comparação entre os pré-processamentos empregados. (A) janela temporal de 16 ps (tratamento 1); (B) janela temporal de 170 ps + suavização por filtro de Fourier

(tratamento 2).

Por fim, na Figura 45, é feita uma comparação entre os espectros medidos no foco e fora do foco, antes e depois da aplicação de SNV. Nota-se que a amplitude das flutuações aleatórias é reduzida para as medidas fora do foco. Este fato reforça a hipótese de que tais variações espectrais ocorrem devido a problemas de heterogeneidade da pastilha – quanto maior a área amostrada, mais o espectro será representativo do tamanho médio da pastilha como um todo. Após o SNV, as diferenças qualitativas entre os dois conjuntos de dados são reduzidas em grande extensão, e o ordenamento das amplitudes de cada banda é mantido em ambos os espectros.

Figura 45: Comparação entre medidas no foco e fora do foco, antes e depois do SNV.

4.11. Análise quantitativa de CI