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analisando a proposta dos PCN para o ensino fun damental 

Maura Penna

Música é uma das modalidades artísticas propostas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais para a área de Arte1, em todos os ciclos do ensino fundamental. É fato que a Educação Artística, tornada obrigatória pela Lei 5692/71, já englobava a música, que constitui, inclusive, uma habilitação específica da licenciatura plena na área. No entanto, a abordagem polivalente e a predomi- nância das artes plásticas no espaço escolar da Educação Artística reduziram, enormemente, a presença da música nas escolas. Como analisa uma pesquisadora:

“Os alunos dos cursos de Educação Artística que não tenham tido formação musical anterior não conse- guem, durante o curso, dominar estratégias, habilida- des e conteúdos específicos da área; o resultado disso

Agradecemos a Cláudia Ribeiro Bellochio seus comentários e sugestões. Este artigo

retoma questões tratadas em trabalho anterior, que analisa o documento para os 3oe 4o

ciclos (Penna, 1999a), apresentado no VII Encontro Anual da Associação Brasileira de Educação Musical (Recife, outubro de 1998).

1Para facilitar as remissões, trataremos como PCN-Arte I o documento para os 1º e 2º

logo se mostrou: a música praticamente desapareceu das escolas de primeiro e segundo graus”... (Fonterra- da, 1998, p. 20) 2

É, portanto, significativa a presença da música, com pro- posta própria, nos PCN-Arte, e muitos educadores da área musical encaram este fato como um retorno dessa linguagem artística às escolas. No entanto, a nosso ver, as indagações a esse respeito persistem, pois, como discutido em artigo desta coletânea, por um lado, é grande a flexibilidade na aplicação da proposta dos Parâ- metros em Arte, sendo delegada às escolas a decisão de como abordar as diversas modalidades artísticas e, por outro, não há definições claras sobre a formação do professor. Esta questão é mais contundente com respeito às quatro primeiras séries do ensi- no fundamental, em que costuma atuar um professor com forma- ção de nível médio, formação esta que, em geral, não contempla suficientemente nenhuma das linguagens artísticas, como reco- nhece o próprio documento para os ciclos iniciais (cf. PCN-Arte I, p. 57).

O que dizer, então, da capacitação desse professor para desenvolver de modo consistente conteúdos musicais, quando o próprio curso de Educação Artística muitas vezes se mostra ina- dequado para tal, como já mencionado? Apesar desta séria ques- tão de fundo, da qual depende em grande parte as possibilidades de realização da proposta para Música dos PCN-Arte, passamos a analisá-la, procurando comparar os dois documentos - para os 1oe 2o ciclos (1a a 4a séries) e para os 3oe 4o ciclos (5a a 8a séries) -, privilegiando este último, por se tratar do nível de ensino onde o professor com formação específica costuma atuar.

2Uma pesquisa de campo realizada em 1999 e 2000 - junto a 186 professores responsá-

veis pelas aulas de Arte nas turmas de 5aa 8aséries, em 152 escolas públicas da Grande

João Pessoa - confirma este quadro (Penna, 2000a; 2001). Apesar de 82,8 % dos profes- sores serem formados em Educação Artística e mais 3,2% estarem cursando a licenciatu- ra na área, encontramos apenas 9 professores com habilitação em Música (sendo que em 2 casos com a habilitação ainda em curso). Por outro lado, 32,3% dos professores decla- ram trabalhar com a linguagem musical em sala de aula.

A prática pedagógica em Música no ensino fundamental

A parte dedicada à Música segue, em cada um dos docu- mentos, o formato que é adotado para a abordagem das diversas modalidades artísticas. Desta forma são apresentados, além de considerações iniciais:

- nos Parâmetros para as primeiras séries, tópicos dedicados aos conteúdos, sendo os critérios de avaliação tratados em item es- pecífico;

- no documento para os 3o e 4ociclos, tópicos dedicados aos ob- jetivos gerais, conteúdos e critérios de avaliação.

Já em suas considerações iniciais, a proposta para Música caracteriza-se pela busca de uma educação musical que tome co- mo ponto de partida a vivência do aluno, sua relação com a músi- ca popular e com a indústria cultural:

“É necessário procurar e repensar caminhos que nos ajudem a desenvolver uma educação musical que con- sidere o mundo contemporâneo em suas característi- cas e possibilidades culturais. Uma educação musical que parta do conhecimento e das experiências que o

jovem traz de seu cotidiano, de seu meio sociocul- tural e que saiba contribuir para a humanização de

seus alunos.” (PCN-Arte II, p. 79 - grifos nossos) “Qualquer proposta de ensino que considere essa di- versidade [da produção musical contemporânea] pre- cisa abrir espaço para o aluno trazer música para a

sala de aula, acolhendo-a, contextualizando-a e ofe-

recendo acesso a obras que possam ser significativas para o seu desenvolvimento pessoal em atividades de apreciação e produção.” (PCN-Arte I, p. 75 - grifos nossos)

Nesta medida, a concepção geral do ensino de música é bem direcionada, uma vez que consideramos que a função da edu- cação musical na escola de ensino fundamental é ampliar o uni- verso musical do aluno. Isto significa dar-lhe condições para a apreensão da linguagem musical em sua diversidade de manifes- tações, pois a música, em suas mais variadas formas, é um patri- mônio cultural, capaz de enriquecer a experiência expressiva e significativa de cada um.

No entanto, esta função da educação musical tem esbarra- do, tradicionalmente, na oposição entre música popular e música erudita - a chamada música “clássica”. Estes dois universos da produção musical têm suas formas próprias e opostas de ensino e de aprendizagem, práticas culturais e valores sociais distintos. Deste modo, o ensino dos conservatórios de música - que é um ensino de caráter técnico-profissionalizante - toma como padrão praticamente exclusivo a música erudita, voltando-se, em geral, para a técnica instrumental e para o adestramento no uso da parti- tura, com as aulas de “teoria musical”. Este ensino, com suas prá- ticas pedagógicas bastante questionáveis, tem historicamente ser- vido como modelo de um ensino “sério” de música, tornando-se referência corrente para as ações educativas na área, inclusive nas escolas de 1ograu / ensino fundamental (cf. Penna, 1995a). Neste quadro, Tourinho (1998, p. 170) caracteriza a atitude dos profes- sores de educação musical por “uma surdez seletiva” em relação à produção musical e pela “reverência à cultura musical notada”.

Destaca-se, neste contexto, a importância do direciona- mento dado à proposta de Música apresentada nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino fundamental, que traz o desafio de superar a histórica dicotomia entre música erudita e popular. Este direcionamento é mais claro no documento para os 3o e 4o ciclos, onde as considerações iniciais da parte de Música são, a nosso ver, mais consistentes e bem articuladas - assim como a proposta como um todo. Neste nível de ensino, a proposta apon- ta para - ou mesmo exige como base - uma concepção de música

bastante aberta. Isto porque, se o princípio é partir “das experiên- cias que o jovem traz de seu cotidiano, de seu meio sociocultural” - que se situam, em geral, no âmbito da música popular -, o obje- tivo é expandir a sua vivência musical rumo ao extenso, rico e praticamente ilimitado (já que a música é viva e está em constante movimento) “conhecimento musical construído pela humanidade no decorrer de sua história” e nos diferentes espaços sociais3. E esta meta é incompatível com uma concepção de música que trate as produções populares e eruditas como situadas em pólos estan- ques e opostos.

Essa necessidade de uma concepção mais aberta e abran- gente de música, como base para a prática pedagógica, pode acar- retar dificuldades na realização da proposta dos PCN-Arte para Música, uma vez que a oposição entre a música popular e a músi- ca erudita tem marcado os cursos superiores na área e, portanto, a própria formação do professor4. Neste contexto, questionamos a proposição, como conteúdo para as primeiras quatro séries do ensino fundamental, de: “Discussões e levantamento de critérios sobre a possibilidade de determinadas produções sonoras serem música” (PCN-Arte I, p. 80). Nas mãos de um professor sem uma maior vivência musical, ou então com uma formação “conservato- rial” baseada no padrão erudito, tal conteúdo pode levar a uma concepção fechada de música, justamente na direção oposta à concepção ampla que se mostra necessária.

A meta pedagógica de expandir a vivência musical do alu- no partindo de sua experiência atual é explicitada no documento para os 3oe 4ociclos, inclusive quando, nas considerações iniciais da parte de Música, procura-se encarar o fato de muitas escolas

3Conforme o 6oobjetivo geral apresentado para Música (PCN-Arte II, p. 81 - citado

adiante). No texto dos PCN-Arte, não é empregada a numeração de objetivos, conteúdos ou critérios de avaliação. Referimo-nos, portanto, à ordem em que são apresentados.

4Para um aprofundamento desta questão, ver Penna (1999b). Para uma discussão da

terem alunos adultos nas últimas séries do ensino fundamental, devido aos problemas de evasão e repetência:

“Quanto ao aluno adulto de terceiro e quarto ciclos (realidade de escolarização fundamental ainda existen- te em nosso país), a escola deve também garantir-lhe uma educação musical em que seu imaginário e ex- pressão musical se manifestem nos processos de im- provisar, compor e interpretar, oferecendo uma di- mensão estética e artística, articulada com apreciações musicais. A consciência estética de jovens e adultos é elaborada no cotidiano, nas suas vivências, daí a ne- cessidade de propiciar, no contexto escolar, oportuni- dades de criação e apreciação musicais significativas.” (PCN-Arte II, p. 60)

No documento para as quatro primeiras séries do ensino fundamental, as considerações iniciais da proposta de Música a- bordam alguns pontos relativos à prática em sala de aula. Já que, nos dois documentos, as orientações didáticas são dadas para a área de Arte de modo global, tendo um caráter bastante genérico, é relevante a indicação, nessas considerações, da importância de se trabalhar a linguagem musical com base em sua concreticidade sonora:

“Uma vez que a música tem expressão por meio dos sons, uma obra que ainda não tenha sido interpre- tada só existe como música na mente do compositor que a concebeu. O momento da interpretação é aquele em que o projeto ou a partitura se tornam música viva. (...) Além disso, as interpretações estabelecem os con- textos onde os elementos da linguagem musical ga- nham significado.” (PCN-Arte I, p. 75)

Neste sentido, essas considerações iniciais dão grande des- taque ao canto e às canções - com ênfase nas brasileiras -, como material para o trabalho musical: “a canção só se faz presente pela interpretação, com todos os demais elementos” (PCN-Arte I, p.

76-77) . Sem dúvida, o canto permite uma prática musical signifi- cativa, sem necessidade de maiores recursos materiais, promoven- do o desenvolvimento de habilidades musicais:

“O cantar deve estar presente em toda atividade musi- cal de base. Ouvido e voz pertencem ao mesmo siste- ma neurológico, sendo assim, a interferência em um deles causa transformações no outro. Dito de outro modo, o aperfeiçoamento da percepção auditiva leva ao melhor desempenho no canto, enquanto a melhoria na capacidade de cantar propicia o desenvolvimento da capacidade auditiva.” (Fonterrada, 1998, p. 22)

O canto tem importante função na educação musical, ao mesmo tempo em que é tido como uma atividade rotineira nas séries iniciais do ensino fundamental. Como mostra Fucks (1998, p. 84), o canto - principalmente o “cantar cívico” - é praticado na escola brasileira desde, pelo menos, o final da I Guerra Mundial. Esta orientação consolida-se e “oficializa-se” com a obrigatorie- dade do Canto Orfeônico5, que deixa suas marcas até os dias de hoje, na “primazia que cantar tem representado no ensino de Mú- sica na escola” (Bellochio, 2000, p. 337), primazia esta que sem dúvida merece ser discutida. Afinal, como indica Souza (1998, p. 134), há “concepções didáticas que descentralizam o canto (como já perguntava Adorno nos anos 50, quem é que disse que na aula de música tem que se cantar?).”

Nos Parâmetros para os 1o e 2o ciclos, a ênfase dada ao canto talvez expresse, em certa medida, a sua presença na prática pedagógica deste nível de ensino, onde é comumente realizado

5Como parte da chamada Reforma Francisco Campos, o Decreto no18.890, de 18 de

abril de 1931, “tornava obrigatório o ensino do Canto Orfeônico nas escolas da Prefeitu- ra do Distrito Federal. Para organizar o ensino musical que fora oficializado, foi criada a Superintendência de Educação Musical e Artística - SEMA - que passaria a orientar os professores de música” (Fucks, 1998, p. 82). Em 1942, sua obrigatoriedade estende-se a todas as escolas do país, sendo criado, por Villa-Lobos, o Conservatório Nacional de Canto Orfeônico (Fonterrada, 1993, p. 75)

pelo professor de classe, freqüentemente sem maiores preocupa- ções com objetivos propriamente musicais, ou até mesmo refletin- do problemas de colocação da voz. Assim, para que a proposta dos PCN-Arte não venha apenas referendar o canto como uma atividade já existente - muitas vezes distorcida de seu potencial de desenvolvimento musical -, mas antes dar-lhe real finalidade edu- cativa, consideramos que seriam indispensáveis algumas indica- ções, por breves que fossem, quanto aos cuidados com algumas questões de técnica vocal - como a tessitura fisiologicamente cor- reta para a voz infantil, ou o processo de muda de voz na adoles- cência. Por outro lado, essa ênfase no canto - que não é encontra- da no documento para as 5a a 8a séries - pode também refletir a falta de definição do professor que irá realizar a proposta para Música nas séries iniciais, pela ausência de um compromisso polí- tico com a questão de recursos humanos com formação adequada:

...“quem deve dar aulas de música? O professor de classe? O professor de Artes? O músico que é também professor de Educação Musical? Sem dúvida, há mui- tas atividades que o professor não músico pode desen- volver com sua classe para estimular o gosto pela mú- sica; sem dúvida, é possível cantar ou tocar, mesmo que o professor não saiba ler música; sem dúvida, ele poderá conduzir o interesse da classe na apreciação do ambiente sonoro escolar ou das imediações. Para isso, ele não necessita de formação específica, mas apenas de musicalidade e interesse pela música e pelos sons. Mas, mesmo para isso, é necessário que tenha uma só- lida orientação. (...) Outras questões, porém, são da alçada do professor especialista e é ele quem deverá tomar as rédeas do processo educativo”... (Fonterrada, 1998, p. 22-23)

Apesar de concordar com estas colocações de Fonterrada, temos de admitir que não seria possível contar a curto prazo - mesmo que houvesse decisão política para tal - com professores com formação específica em música em número suficiente para

atender a todas as escolas deste país, nos diversos ciclos. Faz-se necessário, por conseguinte, reconhecer os limites das possibilida- des de atuação do professor especialista e buscar meios para capa- citar o professor das primeiras séries para o trabalho musical em suas turmas, ou então estaremos aceitando que a música, “enquan- to proposta [pedagógica] sistematizada, permaneça ausente da escola, mesmo estando presente no cotidiano dos alunos” de for- ma tão marcante (Subtil, 1998, p. 6). Alternativas para tal capaci- tação têm sido apontadas por diversos estudos e experiências6, seja inserindo e trabalhando criticamente conteúdos musicais na formação inicial do professor dos primeiros ciclos (em cursos su- periores de Pedagogia), seja através da articulação entre o profes- sor especialista no ensino de Música e o professor de classe, ou ainda em ações efetivas de formação continuada.

Os objetivos e conteúdos de Música

Como já mencionado, apenas o documento para as 5a a 8a séries apresenta objetivos gerais, os quais, de modo global, consi- deramos adequados. Destacamos, principalmente, a pertinência do 6o objetivo, que consideramos fundamental para a linha de traba- lho proposta:

“Interpretar e apreciar músicas do próprio meio socio- cultural e as nacionais e internacionais, que fazem par- te do conhecimento musical construído pela humani- dade no decorrer de sua história e nos diferentes espa- ços geográficos, estabelecendo inter-relações com as outras modalidades artísticas e as demais áreas do co- nhecimento.” (PCN-Arte II, p.81)

6Ver, entre outros: Bellochio (1999, 2000), Torres e Souza (1999), Ramos e Torres

Na modalidade de Música, podemos reconhecer - tanto nos objetivos gerais quanto nos conteúdos - os três “eixos norteado- res”, apresentados na primeira parte dos Parâmetros para toda a área de Arte, que têm por base a Proposta Triangular7. Assim, quanto aos objetivos gerais, podemos observar que:

 O 3o objetivo, por exemplo, diz respeito ao eixo da produção:

“Pesquisar, explorar, improvisar, compor e interpretar sons de diversas naturezas e procedências”... (PCN-Arte II, p. 81)  Com o eixo da apreciação, relacionam-se o 6o objetivo, acima

citado, assim como o 7o: “Conhecer, apreciar e adotar atitudes de respeito frente à variedade de manifestações musicais e ana- lisar as interpenetrações que se dão contemporaneamente entre elas, refletindo sobre suas respectivas estéticas e valores.” (PCN-Arte II, p. 81)

 O 8o objetivo é um exemplo do eixo da contextualização: “Va-

lorizar as diversas culturas musicais, especialmente as brasilei- ras, estabelecendo relações entre a música produzida na escola, as veiculadas pelas mídias e as que são produzidas individual- mente e/ou por grupos musicais da localidade e região”... (PCN-Arte II, p. 81-82)

 Diversos objetivos articulam mais de um eixo norteador, como, aliás, coloca a própria Proposta Triangular; é o caso do 2oobje- tivo: “Desenvolver a percepção auditiva e a memória musical, criando, interpretando e apreciando músicas em um ou mais sistemas musicais, como: modal, tonal e outros.” (PCN-Arte II, p. 81)

Por sua vez, os conteúdos são agrupados em três grandes blocos, que são compatíveis com os eixos norteadores gerais, e

7Nos dois primeiros ciclos, os eixos norteadores são a produção, a fruição e a refle-

xão; para os 3oe 4ociclos, produzir, apreciar e contextualizar. Para um maior deta-

lhamento a esse respeito, ver o artigo “A orientação geral para a área de Arte e sua viabilidade”, nesta coletânea.

que são os mesmos nos dois documentos, salvo diferentes formu- lações para o terceiro bloco:

1o) O eixo da produção, em “Expressão e comunicação em Músi- ca: improvisação, composição e interpretação” (cf. PCN-Arte I, p. 78-79; PCN-Arte II, p. 82-84);

2o) O eixo da fruição/apreciação, em “Apreciação significativa em Música: escuta, envolvimento e compreensão da lingua- gem musical” (cf. PCN-Arte I, p. 79-80; PCN-Arte II, p. 84- 85);

3o) O eixo da reflexão/contextualização, em “A Música como produto cultural e histórico: música e sons do mundo” (cf. PCN-Arte I, p. 80-81) e “Compreensão da Música como pro- duto cultural e histórico” (cf. PCN-Arte II, p. 85-86).

A própria proposição destes blocos de conteúdos pode ser questionada. Por tratar do fazer musical, o primeiro é sem dúvida fundamental. Contudo, como coloca Fonterrada (1998, p. 24-25), se sua formulação é teoricamente pertinente, a situação do ensino de música nas escolas nas últimas décadas pode indicar a sua invi- abilidade: o termo “composição” é, para esta autora, “pretensioso e inadequado”, e mesmo a concepção de improvisação mereceria ser claramente delimitada8. Sendo os PCN-Arte uma orientação oficial para a prática pedagógica na área, gerando expectativas (inclusive por parte das direções de escolas) relativas ao desempe- nho tanto de professores quanto de alunos, consideramos impor- tante a clara definição dessas noções. Certamente, em determina- dos quadros teóricos ou metodológicos, o termo “composição” é tomado em sentido amplo - como em Swanwick (1991, p. 67-68), que o emprega para todo “ato de combinar sons musicais”, inclu-

8“A idéia de improvisação como ação livremente exercida pelo aluno não corresponde a

sua aplicação na área de Música, onde requer, antes de tudo, criatividade, domínio técni- co-instrumental, capacidade de escutar o que está ocorrendo sonoramente à sua volta e capacidade de integração com as propostas dos outros membros do grupo, apenas para citar algumas das necessidades mais prementes.” (Fonterrada, 1998, p. 25)

indo desde “as manifestações mais breves” até as invenções mais elaboradas, desde que haja “uma certa liberdade para eleger a or- denação da música”. Não se pode esquecer, entretanto, que no senso comum “composição” remete a peças musicais elaboradas segundo padrões culturalmente dominantes. Desta forma, parece problemático que os PCN-Arte possam dar margem a expectativas desproporcionais, permitindo que o professor venha a ser pressio- nado, por exemplo, a realizar na escola, ao final de um ano de trabalho, um “festival de música” com as “composições” de seus alunos9. Sendo assim, talvez fosse mais adequada a noção mais ampla de “criação”, que pode se dar tanto de modo exploratório quanto por uma organização planejada do material sonoro (estru- turação).

No documento para as primeiras quatro séries, o bloco da produção tem o maior número de conteúdos. Alguns são bastante claros, permitindo vislumbrar a prática em sala de aula:

 “Percepção e identificação dos elementos da linguagem musi- cal em atividades de produção, explicitando-os por meio da voz, do corpo, de materiais sonoros e de instrumentos disponí-