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1. PARTE

1.3. Capítulo III Da aplicabilidade do princípio da capacidade contributiva a

1.3.1. Seção I – Aplicação do Princípio aos Impostos

1.3.1.1. Aplicação do princípio aos impostos pessoais e reais

1.3.1.1.3. Aplicação do princípio aos impostos fixos

Os impostos fixos, por tributarem os contribuintes sem levar em conta a sua manifestação de riqueza, não atendem ao princípio da capacidade contributiva, sendo, por isso, inconstitucionais na visão de Spinelli.196

Ademais disso, nesses impostos não é possível se saber qual a base de cálculo utilizada para a verificação do seu montante. E, como os impostos não podem ter a mesma base de cálculo das taxas, conforme previsão constitucional, há grande dificuldade em saber se a exação tributária é uma taxa ou um imposto fixo. Ocorre que a ausência de base de cálculo dificulta o reconhecimento do aspecto material da hipótese de incidência, não se sabendo de qual tributo se trata.

Adicionalmente, os impostos fixos atentam contra o princípio da igualdade, pois impõem cargas tributárias iguais para situações distintas. Dessa forma, o ISS fixo cobrado pelos municípios viola a Constituição, que, de forma expressa, determina que os impostos devem atender ao princípio da capacidade contributiva.

Como exemplo de imposto fixo, podemos citar o Imposto Sobre Serviços fixo anual (ISS fixo) criado pelo município do Rio de Janeiro, através da Lei 1.165 de 13 de dezembro de 1966:197

Art. 79. O imposto será calculado de acordo com a seguinte Tabela:

Corretores de imóveis, de seguros ou de mercadorias, leiloeiros, desde que exerçam atividades de caráter individual: Cr$ 60.000;

196 SPINELLI, Luiz Mario Silveira. Capacidade Contributiva um Princípio Constitucional.

Erechim/RS: EdiFAPES, 2001., p. 89.

197 Exemplo obtido no artigo intitulado A Inconstitucionalidade do ISS-fixo na Revista Eletrônica

Profissionais manuais sem empregados, profissionais liberais, manicures, contadores e guarda-livros, despachantes e corretores nomeados pelo Poder Público: Cr$ 24.000.

Da simples leitura do dispositivo acima, claro fica que na fixação do tributo não há uma base de cálculo a ser adotada, o que inviabiliza a regra matriz de incidência tributária. Além disso, a falta de base de cálculo não permite comprovar a natureza jurídica do tributo exigido, pois referida base de cálculo não pode ser desprovida de materialidade, ou ser subjetiva ou duvidosa.

Assim também ocorreu na instituição do ISS pelo município de São Gonçalo no Estado do Rio de Janeiro, que estabeleceu valores fixos do referido tributo para os profissionais autônomos, diferenciando o valor conforme o grau de instrução e o tempo de exercício na profissão, conforme segue:

I – profissionais autônomos, titulados até o nível médio (segundo grau) e autônomos de nível elementar estabelecidos: 12 UFISG por ano;

II – profissionais autônomos, titulados em nível superior (terceiro grau), com até cinco anos diplomado: 18 UFISG por ano;

III – profissionais autônomos, titulados em nível superior (terceiro grau), com mais de cinco anos diplomado: 36 UFISG por ano.

Obs.: UFISG é a unidade Fiscal do município de São Gonçalo.

Vê-se, portanto, que esse imposto só diferenciou os contribuintes segundo o nível de instrução e o tempo de exercício da profissão, sem levar em conta a capacidade econômica do contribuinte. Tal exação, também, por englobar vários contribuintes na mesma classe, independentemente de suas atividades, feriu o princípio da igualdade. Além disso, esse imposto fixo é o mesmo, quer tenha o contribuinte prestado ou não serviço, sendo devido pelo simples fato de estar enquadrado na categoria de contribuintes sujeitos ao tributo.

O mesmo ocorreu com a Lei 1513/89 do município do Rio de janeiro que estabeleceu alíquota fixa do ISS para profissional autônomo, mas, por outro lado, instituiu a tributação sobre o faturamento de sociedade de profissionais, sobre o qual se aplicaria a alíquota de 5 %. Referida discriminação entre a tributação do profissional autônomo em relação à sociedade de profissionais da mesma categoria foi questionada através do RE 237.689-6/RJ, onde ficou assentado que a sociedade de profissionais também deveria ser tributada por alíquota fixa por cada profissional, e não com base no faturamento.

Alegou o recorrente que a Lei nº 1.513/89 do município do Rio de Janeiro era inconstitucional, por ferir o princípio da isonomia, pois aplicava alíquotas distintas para o mesmo serviço (no caso advocacia) por profissional autônomo e por sociedade de advogados. No primeiro caso a tributação, prevista na lei contestada, era fixa por profissional (imposto fixo) e no segundo, a alíquota incidia sobre o faturamento da empresa.

Em seu voto, o Relator, ministro Marco Aurélio enfatizou que, com base no art. 146, III, “a”, da CF/88, cabe à Lei complementar a fixação da a base de cálculo dos impostos. E, como não havia, na vigência da CF/88, uma Lei complementar estabelecendo as bases de cálculo do ISS, estariam valendo aquelas disciplinadas nos parágrafos 1º e 3º, do art. 9º, do Decreto 406/68, pois o mesmo foi recepcionado pela nova Constituição, nos termos do disposto no § 5º do art. 34 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

O § 1º do art. 9º do Decreto 406/68 estabelece que “quando se tratar de prestação de serviços sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, o imposto será calculado, por meio de alíquotas fixas ou variáveis, em função da natureza do serviço ou de outros fatores pertinentes”. Por sua vez, o § 3º determina que, quando os serviços de advogados são prestados por meio de sociedade de profissionais, o tratamento é o mesmo que o previsto no § 1º.

Nesse Recurso, o Ministro Marco Aurélio entendeu que deveria ser utilizado o critério da igualdade tributária na fixação da tributação das sociedades de advogados, de forma que o imposto fosse cobrado com base em cada profissional habilitado, sócio, empregado ou não, que preste serviços em nome da sociedade

Em que pese a decisão acima, não parece ter sido ela fundamentada com base nos princípios tributários da Constituição Federal de 1988, uma vez que referida tributação privilegia determinadas classes de profissionais e viola a isonomia tributária prevista no art. 150, II, e o princípio da capacidade contributiva insculpido no § 1º, do art. 145, ambos da CF/88.

Nesse sentido é o posicionamento de José Eduardo Soares de Melo,198 para quem a base de cálculo do ISS deve manter íntima relação com o objeto tributário e

198 MELO, José Eduardo Soares de. ISS – Aspectos teóricos e práticos. 5 ed. São Paulo: Dialética,

com a capacidade contributiva do contribuinte, que está ligada ao aspecto pessoal da tributação.

Ademais, continua o doutrinador, há uma verdadeira quebra da isonomia no art. 9º, §§ 1º e 3º do Decreto 406/68, uma vez que referido dispositivo legal privilegia certas classes profissionais, advogados, médicos, etc., não dando o mesmo tratamento favorecido a outras classes de profissionais, como é o caso dos tradutores e intérpretes, dos administradores de empresas, dos pedagogos, etc. Portanto, o legislador não pode ignorar os princípios da isonomia e da capacidade contributiva na instituição dos tributos.

Dessa forma, cristalino resta que o imposto fixo, além de não possuir base de cálculo, o que não permite a caracterização de sua natureza jurídica tributária, não permite a aplicação do princípio da capacidade contributiva.