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Capítulo I – Da impossibilidade da aplicação do princípio da capacidade

1. PARTE

2.1. Capítulo I – Da impossibilidade da aplicação do princípio da capacidade

2.1.1. Seção I – Dos impostos diretos e indiretos

Buffon255 reconhece a existência de restrições quanto à classificação dos impostos em diretos e indiretos, uma vez que a mesma se baseia em critérios econômicos e não jurídicos. Foi ela elaborada pela Ciência das Finanças, com base no fenômeno da repercussão.

De todo modo, entende que os impostos diretos seriam aqueles em que o próprio sujeito passivo assume o ônus da exação fiscal. Como exemplo, pode-se citar o Imposto de Renda, o IPTU, o ITR, o Imposto de Importação. Já os Impostos Indiretos seriam aqueles em que a carga fiscal é suportada por outra pessoa que não o sujeito passivo da obrigação. Exemplo de impostos indiretos são o ICMS, o IPI, o PIS, a COFINS e a CIDE.

Para Fanucchi,256 os impostos diretos são aqueles em que serão suportados pelo sujeito passivo da obrigação tributária, não podendo ser repassados a terceiros. Nesse caso, diz-se que o contribuinte “de direito”, que deve recolher o tributo, é o mesmo que o “contribuinte de fato”, que deve pagar o tributo. Por outro lado, os impostos indiretos são os que incidem sobre o consumo, tendo como principal característica a neutralidade fiscal da cadeia produtiva. Assim, nesses impostos, não se tributa a produção, mas tão somente o consumo final. Nos impostos indiretos, portanto, o “contribuinte de direito” não se confunde com o “contribuinte de fato”, sendo este o consumidor final, que vai arcar com o ônus tributário.

Oliveira257 conceitua impostos diretos aqueles cujo ônus tributário recai sobre o próprio contribuinte indicado na lei. Já nos impostos ditos indiretos, o encargo fiscal a ser recolhido pelo “contribuinte de direito” é transferido a terceiro, o “contribuinte de fato”, através do fenômeno da repercussão.

255 BUFFON, Marciano. Tributação e dignidade humana: entre os direitos e deveres fundamentais.

Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p. 212.

256 MELO, João Paulo Fanucchi de Almeida. Princípio da Capacidade Contributiva e sua aplicação

nos casos concretos. São Paulo: Quartier Latin, 2012, p. 166.

257 OLIVEIRA, José Marcos Domingos de. Direito Tributário: capacidade contributiva: conteúdo e

Na tributação indireta, afirma, não é possível se identificar as características pessoais do contribuinte, de forma que se torna muito difícil dosar a carga tributária conforme a sua capacidade de contribuir. Esta tributação é a que ocorre nos impostos sobre o consumo, onde não se consegue identificar o contribuinte de fato, o consumidor final.

Para Becker,258 não há nenhum critério científico que ampare a classificação dos tributos em diretos e indiretos. Apesar disto, a doutrina, faz essa diferenciação com base no fenômeno da repercussão.

Assim, diretos seriam os tributos onde o contribuinte de direito não tem a possibilidade de repercuti-lo, ao passo que nos tributos indiretos o contribuinte de direito pode fazer a repercussão, repassando o seu ônus ao contribuinte de fato.

Caliendo Velloso da Silveira259 também reconhece a classificação dos tributos em diretos e indiretos. Naqueles, o encargo do tributo é suportado pela própria pessoa encarregada de recolher o tributo, havendo a identidade entre o contribuinte de direito e o contribuinte de fato. Nestes, os indiretos, existe um agente intermediário, o contribuinte de direito, que é o obrigado a recolher o tributo, mas que não suporta o seu ônus, que é transferido a terceiro, o contribuinte de fato, através da chamada repercussão econômica do tributo.

Portanto, nos tributos diretos o ônus tributário é suportado pelo contribuinte de direito, que não consegue repassar referido encargo a terceiro. É o caso, por exemplo, do Imposto de Renda, do IPTU, do IPVA e do ITR. Nos tributos indiretos, o encargo financeiro do tributo é repassado a terceiro, uma vez que o mesmo é repercutido no preço da mercadoria, de modo que quem suporta efetivamente o seu custo é o consumidor final.

Logo, contribuinte de fato é a pessoa que sofre o encargo do tributo, não podendo repercuti-lo (transferi-lo) a terceiro. Já o contribuinte de direito é a pessoa indicada na lei como sujeito passivo da obrigação tributária. Este é a pessoa que sofre a incidência da regra jurídica tributária.

258 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 3. ed. São Paulo: Lejus, 1998, p.

538.

259 SILVEIRA, Paulo Antônio Caliendo Velloso da. Direito Tributário e análise econômica do Direito:

Na repercussão econômica, portanto, o contribuinte de direito poderá transferir o ônus do tributo para terceiro, e este fenômeno vai ocorrer por ocasião dos negócios econômicos estabelecidos entre eles.

Deve-se salientar, por outro lado, que o critério de classificação dos tributos em diretos e indiretos com base na repercussão econômica é considerado errado e artificial, só sendo admitida até hoje por razões didáticas ou por conveniência da Administração Pública.

Lembra Becker260 que existem outros critérios para a classificação dos tributos em diretos e indiretos, como é o caso do critério do lançamento e o critério da temporalidade da hipótese de incidência.

Pelo critério do lançamento, tributo direto é aquele cujo sistema de arrecadação é feito pelo sistema nominativo, ao passo que o tributo indireto seria aquele efetuado sem o lançamento. Tendo em vista que o lançamento existe em todo e qualquer tributo, esse critério não tem qualquer valor científico.

Pelo critério da temporalidade da hipótese de incidência, tributo direto seria aquele cuja hipótese de incidência é durável, permanente e continuada no tempo, ao passo que o tributo indireto teria por hipótese de incidência uma situação instantânea, isolada no tempo. Também falta base científica para esse critério, pois a hipótese de incidência não é uma situação isolada, mas um conjunto de fatos, atos e estado de fatos.

2.1.2. Seção II – Da não aplicação do princípio aos impostos indiretos

Para Carrazza,261 nos impostos indiretos, como o IPI e o ICMS, quem suporta o ônus fiscal não é o contribuinte que praticou a operação comercial, mas sim o consumidor final. O contribuinte repassa a carga do tributo ao consumidor final, que tanto pode ser uma pessoa de significativa capacidade econômica, ou um indivíduo de parcos recursos.

Nesses tributos, a finalidade principal é a extrafiscalidade, haja vista que as normas constitucionais a eles impõem a observância da seletividade. Entende Carrazza que a seletividade em função de essencialidade é obrigatória para ambos

260 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 3. ed. São Paulo: Lejus, 1998, p.

538.

261 CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 29. ed. São Paulo:

os tributos. E são tributos extrafiscais, acrescenta, porque são utilizados como instrumentos de orientação econômica e política, estimulando as operações com mercadorias ou produtos considerados convenientes à sociedade e, por outro lado, desestimulando aqueles que não atendam ao interesse coletivo. Assim, no caso do IPI, aquelas operações com produtos considerados supérfluos são taxadas com alíquotas mais severas, ao passo que os produtos considerados essenciais são submetidos a uma carga fiscal mais branda. E a seletividade no ICMS pode ser alcançada com a sistemática de diferenciação de alíquotas, com a criação de incentivos fiscais e com a redução de base de cálculo. Desse modo, as alíquotas do IPI e do ICMS devem ser graduadas para mais ou para menos na razão inversa da essencialidade dos produtos ou mercadorias.

Portanto, nos impostos indiretos, como o IPI e o ICMS, deve ser utilizada a seletividade, que tem por objetivo favorecer os consumidores finais, que vão, de fato, suportar a carga tributária. Desse modo, mister se faz que sobre os produtos mais essenciais a tributação seja reduzida ou nula, devendo, por outro lado, ser mais gravosa quando incidente sobre mercadorias ou produtos mais supérfluos.

Para Alcides Jorge Costa,262 o princípio da capacidade contributiva somente se aplica aos impostos pessoais e diretos, sendo incompatível com os impostos indiretos, como o ICMS e o IPI. Nestes, aplica-se a seletividade, cuja finalidade é de ajustá-los contra os efeitos regressivos e não à real capacidade econômica da pessoa que vai arcar com o ônus do tributo.

Zilveti263 entende que nos tributos indiretos não é possível identificar-se claramente a renda líquida do contribuinte e, por conseguinte, medir-se a capacidade de o contribuinte arcar com a carga fiscal que incide sobre o bem adquirido. Assim, na tributação indireta, onde o contribuinte de fato é desconhecido e o obrigado a recolher o tributo repassa o seu ônus ao preço da mercadoria, difícil se torna graduar a exação fiscal segundo a capacidade econômica do consumidor.

Para Abel Henrique Ferreira,264 nos impostos indiretos não é possível a aplicação do princípio da capacidade contributiva, pois como o valor do imposto é

262 COSTA, Alcides Jorge. Capacidade Contributiva. In: RDT, nº 55, pp. 299-301.

263 ZILVETI, Fernando Aurélio. Princípios de Direito Tributário e a Capacidade Contributiva. São

Paulo: Quartier Latin, 2004, p. 276.

264 FERREIRA, Abel Henrique. O Princípio da Capacidade Contributiva Frente aos Tributos

Vinculados e aos Impostos Reais e Indiretos <disponível em: http://www.fesdt.org.br/artigos/06.pdf, acesso em 27/12/2016> pp. 31-33.

embutido no preço das mercadorias, de modo que tanto o rico como o pobre irão pagar o mesmo imposto ao adquirirem esses bens. Para ele, esses impostos devem atender ao princípio da seletividade, que é um dos subprincípios do princípio da igualdade, e não da capacidade contributiva.

Em seu entendimento, nos impostos indiretos, cujos exemplos mais significativos são o IPI e o ICMS, como é impossível a aplicação do princípio da capacidade contributiva, aplica-se o princípio da seletividade em função da essencialidade das mercadorias, de forma que as mercadorias básicas sofram tributação mais branda do que as mercadorias supérfluas, uma vez que estas só serão consumidas pelas pessoas de maior poder aquisitivo.

Assim, a seletividade proporcionará um tratamento igualitário para os economicamente iguais, e diferenciado para aqueles de condições econômicas distintas, com o objetivo de se alcançar a igualdade na tributação. Por conseguinte, uma carga fiscal baixa ou nula para os produtos essenciais tornaria tais produtos acessíveis às camadas mais pobres da população. Não havendo esse favorecimento tributário aos produtos essenciais, as pessoas carentes poderiam ficar privadas do mínimo essencial à sobrevivência. Já uma tributação elevada aos produtos supérfluos não atingiria as pessoas de baixo poder aquisitivo, uma vez que tais produtos não são, normalmente, por elas consumidos, mas oneraria as pessoas de maior capacidade econômica que têm condições de arcar com uma carga mais gravosa do tributo.

Portanto, nos impostos indiretos, uma vez que não se pode conhecer, a priori, as condições pessoais dos contribuintes, não é possível a aplicação do princípio da capacidade contributiva. Aplica-se, entretanto, o princípio da seletividade, de forma a se alcançar a igualdade na tributação. E o princípio da seletividade se concretiza com a aplicação de alíquotas diferentes para as mercadorias em função de sua essencialidade, ou pela redução de sua base de cálculo, de forma que as mercadorias mais essenciais sejam submetidas a uma carga fiscal mais reduzida, e as mercadorias supérfluas ou suntuosas com um ônus tributário mais exacerbado.

2.2. Capítulo II – Da possibilidade da aplicação do princípio da capacidade