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Apresentação e análise dos dados

A análise dos dados a partir das respostas coletiva dos sujeitos pes-quisados sobre os principais motivos do fechamento das salas de aula da EJA, aponta que: 43,5% dos professores e gestores, entenderam a falta de compromisso do governo com os excluídos da escola regular como o principal motivo do fechamento das salas de aula; já 30,5% dos pesquisados afirmaram ser por desrespeito com o aluno trabalhador;

outros 13% afirmaram ser devido à política da escola; ainda 8,7% en-tenderam ser em razão da falta de alunos para formar as turmas; e, por fim, 4,3% afirmaram ser em razão da evasão escolar.

Sendo qualquer destas razões citadas, vê-se uma clara posição

“opressora” que advém do poder sobre a parcela daqueles que preci-sam da escola para melhorar sua condição social e econômica. É o que desestimula “[...] a presença organizada das classes sociais na luta em transformação democrática da sociedade, no sentido da superação das injustiças sociais”. (FREIRE, 2007, p. 103)

Este caminho de injustiça ficou patenteado com a fala de uma das professoras entrevistadas quando fez o seguinte posicionamento:

O fechamento das salas do noturno causa um grande desconforto para a comunidade escolar, além de ser uma atitude excludente e desrespeitosa.

O maior prejudicado é o aluno desse turno, que na maioria das vezes só tem condição de frequentar as aulas no noturno, pois precisa trabalhar para sobreviver. Já a escola, deixa de contribuir para o acesso desses su-jeitos à educação evidenciando a negação de um direito garantido por lei.

Sem educação esses alunos engordam as estatísticas de desemprego, fome e marginalidade. (P1, 2018)

Corroborando com a discussão, Capucho (2012, p. 24) reafirma que: “a EJA, emerge de um cenário em que são camufladas as razões estruturais dos diferentes processos de distribuição desigual de bens e consequentemente destituição dos direitos da classe trabalhadora“.

Dessa forma, a distribuição desigual e precária do pouco conhecimento

fica subordinada a padrões produtivos requeridos e necessidades de controle social.

Indagado aos entrevistados sobre os impactos provocados pelo fe-chamento das salas de aulas no noturno, dentre muitas colocações, as mais emblemáticas foram:

A redução na qualidade educacional de alunos com distorção idade/série e a redução no número de qualificados para o mercado de trabalho. (P1, 2018)

Impossibilidade para muitos alunos em ter acesso à escola e desta forma deixando de oportunizar a construção de saberes, o processo de emancipa-ção e exercício da cidadania. (G1, 2018)

Empobrecimento social, ampliação do desemprego. Falta de formação e conscientização da classe trabalhadora, exclusão social e segregação, su-bordinação/subalternação de classe trabalhadora.. (G2, 2018)

Agrava o processo de exclusão de parte significativa da população do acesso ao ensino regular. Dificulta o aprimoramento de qualificação destas pes-soas excluídas. Impossibilita a socialização sistemática de parte conside-rável dos estudantes que veêm na escola um ambiente de convívio social.

Outros fatores ainda poderiam ser citados [...]. (P4, 2018)

Subordinação, segregação, a falta de interesse do sistema governamental nos gastos condiciona alguns educandos procurarem alternativas como ENCCEJA, CPA para garantir sua certificação. Outros interrompem o processo devido às dificuldades ao longo do caminho, resultando na am-pliação do desemprego e índice de marginalização. (P7, 2018)

Como base nos sentimentos manifestados pelos professores e ges-tores em relação ao fechamento das escolas, comungamos com Silva (2010) dentre outros autores, na defesa intransigente pela garantia do direito à educação pública, gratuita para toda e qualquer pessoa, inclusive para os que a ela não tiveram acesso, diante das dificuldades interpostas em outros momentos das trajetórias de vida. Sendo assim, a garantia dos direitos já adquiridos é condição sine qua non para que estes sujeitos consigam sair da situação de desigualdade.

Quando inqueridos sobre quem mais perde com o fechamento das escolas da EJA: 40% dos entrevistados afirmaram serem os alunos por

O silêncio das salas de aula da Educação de Jovens e Adultos 159 terem seus direitos negados e não se qualificar para o trabalho. Já 32 % dos entrevistados afirmaram ser a sociedade de um modo geral; outros 12% afirmaram ser a proposta de educação para atender o aluno traba-lhador, ou seja, a EJA. Seguinte, 8% afirmaram serem os profissionais por não ter escolas para trabalhar; por fim, os outros 8% afirmaram ser o empregador por não ter mão de obra qualificada.

Ainda sobre o crivo do autoritarismo percebemos facetas de pre-juízos que recai com maior peso justamente naqueles que precisam da escola como alternativa para o sonho de desenvolvimento cognitivo, social e econômico. Por isso, Freire (1991, p. 74) falava do seu “[...] so-nho de mudar a cara da escola. O soso-nho de democratizá-la, de superar o seu elitismo autoritário, o que pode ser feito democraticamente”.

As políticas públicas ou mesmo as ações políticas na escola não devem ter contornos autoritários, deve ser um processo de diálogo, de avaliações das realidades dos educandos e educandas, principalmente daqueles trabalhadores e trabalhadoras, os excluídos da escola e pela escola, pois os membros dessas categorias podem e devem exigir os seus direitos enquanto cidadão, pois:

[...] quem considera petulância da classe trabalhadora reinvindicar seus direitos; quem pensa, por outro lado que a classe trabalha-dora é demasiado inculta e incapaz, necessitando, por isso, de ser libertada de cima para baixo, não tem realmente nada que ver com libertação nem democracia. (FREIRE, 2011, p. 38)

A perspectiva de humanização de Freire insere-se no conceito de educação, liberdade e democracia em que, no processo de formação do homem, se faz necessário, reconhecer a sua inconclusão e sua atuação no mundo enquanto sujeito histórico. Nesse sentido, Freire (2005, p.

87) verbaliza que “o mundo agora já não é algo sobre o que se fala com falsas palavras, mas o mediador dos sujeitos da educação, a incidência da ação transformadora dos homens, de que resulta a sua humanização”.

Por isso, entendemos a necessidade, a luta e busca constante pela garantia e qualidade da educação que fatalmente passa pelas condições de manutenção das escolas, em particular das salas de aula da EJA, que

muito tem a ver com a humanização dos sujeitos que recorrem a essa modalidade de ensino.

Considerações finais

Entendemos estarmos vivenciando mais um dos períodos críticos da história da educação, num cenário político adverso aos conceitos de humanização, em meio à proposta de educação que assombra as teorias de educação equitária, democrática e progressista, marcada por retrocessos ao entender que se gasta com educação e não se investe na educação. Nesse sentido, refletir sobre a escola e o seu papel social no contexto atual nos remete a expectativas sombrias enquanto lugar de se praticar a educação crítica.

A política de fechamento das escolas não só evidencia o modelo de política elitista, como também visa acatar os ditames da política perversa do meio econômico em que estamos inseridos, que visa ex-clusivamente a formação para o mercado de trabalho.

O silenciar das salas de aula do noturno não significa apenas o tirar direito, mas fazer calar vozes que lutam sem cessar por uma escola de qualidade, bem como o calar de vozes que buscam a liberdade e a de-mocracia a partir da formação de sujeitos críticos e autônomos. É uma posição política da educação, assim como é política a condição de tor-ná-la obsoleta, contrapondo a visão de escola renovada e progressista, estabelecendo um cenário onde a ideologia ultraconservadora impõe um modelo de escola com o bordão de “escola sem partido”.

Na contramão dessa visão, pensamos e defendemos a manuten-ção das escolas noturnas da EJA, principalmente aquelas que se espe-cializaram em atender os sujeitos com necessidades especiais, por ser uma proposta para a superação das desigualdades sociais, econômicas e cidadã, tendo como bandeira o caráter humanizador, político e cons-cientizador para que homens e mulheres conquistem a sua libertação.

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