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Aqui nossa profissão é o amor: o período na Trapa

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2 NOS BRAÇOS DO AMADO

2.3 UNIVERSIDADES DO AMOR: UMA FORMAÇÃO PARA SERVIR A

2.3.1 Aqui nossa profissão é o amor: o período na Trapa

En este monasterio somos viajeros que viajan sin equipaje. Deportados que regresan a la patria. Liberados que no traen nada de las celdas en que estuvieron o de los campos de concentración.

(CARDENAL, 2003 a, p.84)

Já apresentamos, no item anterior, a Trapa. Nosso intuito, nessa parte do capítulo atual, é apresentar as emoções, os desconcertos e os encontros vividos por Cardenal durante os dois anos em que esteve nesse mosteiro.

Comecemos retomando alguns detalhes da entrada de Cardenal nessa Ordem: foi um desejo do poeta nicaraguense entrar nessa Ordem tão restrita, porque queria abandonar tudo a fim de viver a experiência de total entrega a Deus:

O desapegar-se de tudo: como uma garrafa não pode ser enchida se não se esvaziar primeiro. E como o enamorado não pode se unir a quem ama enquanto ela ama outro. A alma, ao deixar de amar a outros seres, automaticamente se une a Deus. A fórmula é muito simples. Mas dói como se matar (sem ter inclinação ao suicídio) (CARDENAL, 2003 a, p. 189. Tradução nossa).

Não foi por acaso que entendeu ser a viagem da Nicarágua para os Estados Unidos “uma viagem de bodas” (CARDENAL, 2003 a, p. 11. Tradução nossa). Principiava, no momento em que entrava naquela Ordem, um longo casamento que dura até os dias atuais.

É fato que, ao adentrar pelas portas do mosteiro e enxergar o letreiro “GOD ALONE”, sentiu-se apreensivo; entretanto, sabia não ser a solidão um problema, porque estava transbordando de Deus. Para ele, o que realmente importava era entrar para o noviciado e “gozar da natureza de Deus”. Essa ânsia, gerada pelo já abordado acontecimento daquele 02 de junho de 1956, deixou-o “liberado de todo desejo, aliviado e vazio, cheio de Deus” (CARDENAL, 2003 a, p. 79. Tradução nossa).

Ernesto, em seu primeiro volume dos diários, deixa registradas as razões que o levaram a ir à Trapa: “desejo de união com Deus e enamoramento (um enamoramento por um “Ser” invisível)” (CARDENAL, 2003 a, p. 79. Tradução nossa).

Desse modo, em 14 de maio de 1957, entrou para a Trapa. E estava muito feliz. Tanto que, ao descrever sua entrada, aproveita o fato de ser primavera para fazer uma analogia entre essa estação (de renascimento) e o início de sua nova vida – sua primeira conversão começava: desejava se tornar um monge.15

Na Ordem Cisterciense, tudo era motivo de contentamento no início de sua estada: o contato com a natureza, o silêncio – que a tantos incomodava e que para ele nada mais era que uma forma de oração -, o despertar de madrugada e o trabalho. Estava tão bem naquele ambiente que chega a relata o seguinte a respeito de o acordar nas primeiras horas do dia:

15Veremos mais adiante que acaba deixando a Trapa e, consequentemente, muda seus planos: ao invés de tornar-se um monge, opta por ser um sacerdote.

Para mim, a hora mais bela era a madrugada, depois da missa do padre mestre no noviciado e a Ação de Graças, quando tinha três quartos de hora, antes do desjejum, todavia no “grande silêncio”, e eu passeava encapuzado nos jardins do noviciado frente aos bosques e colinas, lendo textos da Bíblia, entre os pássaros, os coelhos silvestres que pareciam domésticos e as esquilinhas listadas: meus outros companheiros do noviciado (CARDENAL, 2003 a, p. 120. Tradução nossa).

Estar em meio à natureza e sentindo Deus nas primeiras horas do dia eram sinais de que se encontrava onde deveria e queria estar. Entre os místicos diz-se que, nas primeiras horas do dia, não corrompidas pelos sons do mundo, acessa-se o sagrado na natureza. Provavelmente, esse deve ser o motivo do contentamento de Cardenal: estava, pelo silêncio, em contato com Deus na natureza. Portanto, percebemos que o poeta das ‘muchachas em flor” sentia-se completamente integrado, nesse período, ao mosteiro de Nossa Senhora de Gethsemani.

Quando alguém decide tornar-se um noviço, conforme já dissemos, recebe um novo nome, símbolo da nova vida que começa. Na Trapa, Cardenal recebeu o nome de Fr. M. Lawrence, “Fr. (Frater em latim) é frei em espanhol. E o M. é porque diante de todo nome trapista é colocado o nome Maria que se abreviava com ‘M’” (CARDENAL, 2003 a, p. 105. Tradução nossa).

Enquanto esteve na Trapa, Fr. M. Lawrence teve como Mestre de Noviços, Thomas Merton, Fr. M. Louis. Foi ele, inclusive, quem entregou a Cardenal seu hábito16 e disse ser seu nome “Lorenzo” em espanhol e que esse lembrava o nome de D.H. Lawrence.

Para Cardenal, o novo nome ainda era mais significativo por se tratar do nome de seu tataravô, Lorenzo Cardenal, que fora o primeiro membro da família a chegar à Nicarágua. Além disso, o nome reportar a D. H. Lawrence fora deveras significativo, posto que o noviço em questão admirava esse escritor e o tivera como exemplo no que dizia respeito à iniciação sexual, pois, assim como o poeta norte-americano, só perdera sua virgindade, conforme já havíamos mencionado, aos vinte e um anos.

É necessário ressaltarmos que, inicialmente, Ernesto não era noviço, era postulante. O hábito só se tornou oficial para ele em 15 de agosto de 1956. Coincidência, pois não sabiam

16O hábito, na Trapa, consistia, segundo Cardenal, “em uma roupa interior medieval: uma espécie de camisa ou camiseta atada ao pescoço sem botões (nada era com botões), e uma espécie de calças curtas de um tipo de lona, que chegavam até os joelhos, meias amarradas a essa espécie de calções, os quais cobriam as pernas, mas não chegavam aos pés, [...] ainda uns sapatos feitos pelo sapateiro do mosteiro um número a mais do que se calçava para colocar as calças [...] Isso o interior. O hábito propriamente dito, o do exterior, era uma túnica branca, ou digamos, uma batina amarrada na cintura com uma faixa branca do mesmo tecido, e, por cima, púnhamos uma capa branca com capuz (que abaixava e subia), e essa capa sem mangas, caía nos ombros em amplas pregas abertas ... (CARDENAL, 2003 a, p. 104. Tradução nossa).

disso na Trapa, mas esse era o dia em que se comemorava a Independência da Nicarágua: “Eu senti que minha independência coincidia com a da Nicarágua” (CARDENAL, 2003 a, p. 125. Tradução nossa). Além disso, esse é o dia da Assunção de Nossa Senhora e Cardenal sempre fora devoto dela. Isso mostra-nos que não há coincidências, há uma escritura sagrada marcando os passos da trajetória cardenaliana e mostrando ser ele realmente “destinado a ser de Deus”.

Quanto ao dia a dia na Ordem trapista, havia uma rotina e um grande silencio (o qual já foi trabalhado). Mas para quem está ainda sob os efeitos do “gozo de Deus” “a vida era perfeitamente suportável. Não passava fome, por exemplo, nem tinha sono durante o dia, ou cansaço. Nem tinha necessidade de falar qualquer coisa” (CARDENAL, 2003 a, p. 108. Tradução nossa). Além disso, “o dia era uma combinação de leitura, de trabalho, de estudo e oração, alternados de modo que se passava de um para o outro antes que alguém se cansasse” (CARDENAL, 2003 a, p. 110. Tradução nossa).

No início do noviciado, Cardenal sentia poucos incômodos. Talvez o fato de não poder escrever poemas, uma vez que só era autorizado a redigir apontamentos, fosse o que mais o perturbasse.

Na Trapa, Ernesto conheceu aquele que veio a ser um de seus melhores amigos, um homem com quem se correspondeu por cerca de 10 anos após ter deixado a Ordem Cisterciense. Esse homem foi seu Mestre de Noviço, Thomas Merton, a quem já admirava mesmo antes de conhecer pessoalmente. Essa admiração vinha da qualidade literária dos textos produzidos pelo monge norte-americano. Encantava a Cardenal o fato de se ter, numa Ordem que proibia a escrita profissional, uma das personalidades literárias mais conhecidas daquela época.

O encontro desses dois homens foi muito singular, pois, por meio das conversas que tinham e das orientações espirituais que dividiam – um como mestre, o outro como noviço – foram se transformando. Vamos mostrar, como forma de esclarecer o que afirmamos, algumas dessas influências.

Comecemos com os chamados “desconcertos”. Cardenal relata, em Vida Perdida, que, nos encontros com Merton durante as orientações espirituais, dois desconcertos eram produzidos nele:

Um foi que, na direção espiritual, ia sendo cada vez mais crítico com respeito ao mosteiro e com a vida monástica em geral. Sempre se disse – e é uma realidade – que o noviciado é uma lua-se-mel na vida religiosa. E como a lua- de-mel nos matrimônios, é algo que depois passa [...]. Ele se adiantava ao Concílio Vaticano II [...] me dizia, por exemplo, que a vida que levávamos era irracional. Que a observância diária do mosteiro era estar dando voltas a uma

insensatez. Nossa vida estava cheia de ritualismos e rubricas sem sentido. Uma vez se referiu ao mosteiro como um circo. Outra vez, por seu comercialismo, lhe chamava “Trappist Corporation” [...]. A mim dizia que o Ordem trapista não era para poetas, como ele ou eu. Como um quartel ou uma academia militar não eram para os poetas. (CARDENAL, 2003 a, p. 144. Tradução nossa).

[...]

Outro desconcerto: na direção espiritual [...] ele se ocupava de coisas não espirituais. Semana a semana, eu esperava ensinamentos místicos e ele falava da Nicarágua, perguntava-me de Somoza e dos outros ditadores latino- americanos, dos poetas nicaraguenses, das selvas do rio São João onde vivia Coronel Urtecho; contava-me de seus amigos de Colúmbia; ou perguntava- me o que estava lendo naquele momento, ou falava-me de suas leituras, que eram muitas. Ao final, perguntava-se se eu tinha algum problema espiritual (CARDENAL, 2003 a, p. 145. Tradução nossa).

Inicialmente frustrantes, esses desconcertos foram muito importantes para Cardenal, porque, com o tempo, ele foi percebendo que “a vida contemplativa era simplesmente viver, como o peixe na água” (CARDENAL, 2003 a, p. 146. Tradução nossa). Percebe que o encontro com o sagrado se dá em nossas atividades cotidianas, no trabalho, nas conversas, na admiração do mundo que nos cerca, na luta contra injustiça e por justiça, numa cruzada para alfabetização, na produção de oficinas de literatura para crianças com câncer ou de pintura e escultura para os moradores de Solentiname. Assim, Merton acaba assinalando para seu noviço nicaraguense “e que não poderia aprender na mística clássica, é que minha vida era a única ‘vida espiritual’ que podia ter e nenhuma outra. E que Deus queria que eu fosse tal como eu era e não outro” (CARDENAL, 2003 a, p. 146. Tradução nossa).

A partir dessas orientações, pautadas na filosofia zen, constrói-se o místico Cardenal, que busca alcançar o abraço de Deus, abraçando o mundo que está à sua volta, percebendo que

somos retratos vivos de Deus. Obras de arte. Nosso mais íntimo mistério, a última razão do nosso ser, é que nós não somos somente nós: somos imagens. Nossa essência não é sermos nós, é sermos cópias, fotografias de Outro. Só quando refletimos esse Outro é que somos nós mesmos. Somos uma tela branca onde Deus se projeta. Tiramos o filme e não fica nada. (CARDENAL, 1979, p. 199)

Com Merton aprendeu também o sentido da oração que, para o norte-americano deveria ser semelhante ao conceito beneditino, segundo o qual “era, por exemplo, passear debaixo das

árvores ou ler um livro que lhe faça pensar [...]. Para ele, a oração é ler, ler lentamente, ou meditar com um livro na mão” (CARDENAL, 2003 a, p. 138. Tradução nossa).

Tendo em vista esse ideal de oração, presente nas coisas simples e corriqueiras, Cardenal percebe estar em constante oração, pois experimentava a união com Deus ao contemplar a natureza, ao ler, ao trabalhar, na caminhada para seu “claustro” e percebe ainda que sua “vida espiritual é muito simples, tão simples que quase não se vê: trabalhar, comer, dormir, rezar ou seja: viver” (CARDENAL, 2003 a, p. 183. Tradução nossa). Como diriam os zen budistas: “viver simplesmente, tomando chá e comendo arroz”.

Essa aprendizagem do viver simplesmente vai moldando o místico Cardenal que começava a florescer desde aquele 02 de junho, um ser que busca Deus no mundo que o rodeia, mas que tem a certeza de que tudo o que existe não é Deus, são só reflexos, um homem que tem a intuição de que Deus está dentro e se manifesta fora. Dentro do homem, mas refletido na criação, mas também tem a certeza de que, para o acessar, é mister desapego, “o desapegar-se de tudo” (CARDENAL, 2003 a, p. 189. Tradução nossa). Mas isso não é fácil, “isto se faz mais e mais difícil, até que se saia já da gravidade e se entre ao ponto sem retorno” (CARDENAL, 2003 a, p. 216. Tradução nossa). É o entrar no abismo e perceber que ele está repleto de nada, mas de um nada pleno e, a partir desse ponto “a viagem se faz mais e mais fácil, e sente-se atraído mais e mais pelo lugar para onde se dirige” (CARDENAL, 2003 a, p. 216. Tradução nossa). É uma viagem da qual não se pode retornar, porque a passagem para ela é viver a experiência do encontro amoroso com Deus e a alma que saboreia os beijos, as carícias e o gozo dEle não se pode saciar com nenhum outro afago, está fadada a ser de Deus, anseia por mais e mais momentos de êxtase e de entrega nos quais Amado e amada se fundem, recomeçando a Criação.

Além desses aprendizados, Ernesto ouvia muitas vezes Merton falar sobre o desejo de criar uma comunidade contemplativa na América Latina e, aos poucos, em suas conversas, tal ideia foi tomando forma, foram idealizando esse lugar. Infelizmente, o monge norte-americano morreu sem conhecer a comunidade para a qual muito contribuíra. Cardenal criou-a e nomeou- a Solentiname. Há, mais adiante no presente trabalho, um item dedicado a mostrar esse projeto.

Foram muitos os ensinamentos de Merton. Não podemos ir além sem mencionar a importância que o norte-americano teve na construção poética cardenaliana referente aos índios. Em muitas ocasiões, Merton falava ao noviço Lawrence sobre os índios americanos, o que o deixava constrangido, porque ele – latino – nada sabia sobre os esses habitantes da América. Por isso, propôs-se a estudar suas narrativas e boa parte da Literatura de Cardenal pós Trapa passou a ser dedicada a esses povos. O poema, cujos trechos transcrevemos a seguir, foi o

primeiro escrito por Cardeal sobre essa temática. Foi resultado de muito estudo e de muitas pesquisas. Com ele, o poeta mostra que os ideais de uma vida comunitária, sem “senhores”, e de lugares sem muralhas já eram pregados pelos indígenas. Há uma clara postura política no poema, mostrando o que o colonizador fez aos indígenas. Há também palavras de um poeta encantado com a forma como esses homens enxergavam o mundo, o tempo; de alguém que percebe com tristeza que a vinda do colonizador fez “o tempo que adoravam parar de repente” (CARDENAL, 2012, p. 88), dando início ao vivido hoje, marcado pela divisão, pelos “eus”, por governantes. No tempo atual, não há mais a noção do comum, a comunidade, em seu sentido originário, desapareceu. Eis o texto:

Las ciudades perdidas

Ahora son reales los animales que estaban estilizados en los frescos

y los príncipes venden tinajas en los mercados. ¿Pero como escribir outra vez el jeroglífico, pintar al jaguar otra vez derrocar los tiranos? ¿Reconstruir otra vez nuestras acrópolis tropicales, nuestras capitales rurales rodeadas de milpas? La maleza está llena de monumentos.

hay altares em las milpas.

Entre las raíces de los chilamates arcos com relieves. En la selva donde parece que nunca há entrado el hombre donde sólo penetran el tapir y el pizote-solo

y el quetzal todavia vestido como um maya: allí hay uma metrópolis.

Cuando los sacerdotes subían al Templo del jaguar con mantos de jaguar y abanicos de colas de quetzal y caites de cuero de venado y máscaras rituales. Subían también los gritos del juego de Pelota, [...]

En sus templos y palácios y pirâmides

y en sus calendários y sus crónicas y sus códices no hay un hombre de cacique ni caudillo ni emperador ni sacerdote ni líder ni governante ni general ni jefe y no consignaban en sus piedras sucesos políticos, ni administraciones, ni dinastias,

ni famílias governantes, ni partidos políticos.

¡no existe en siglos el glifo del nombre de um hombre, y los arqueólogos aún no saben como se gobernaban! La palavra “señor” era extraña em su lengua.

Y la palavra “muralla”. No amurallaban sus ciudades. Sus ciudades eran de templos, y vivían em los campos,

entre milpas y palmeiras y papayas.

El arco de sus templos fue una copia de sus chozas. Las carreteras eran sólo para las procesiones. La religión era el único lazo de unión entre ellos, Pero era uma religión aceptada libremente y que no era una opresión ni una carga para ellos. Sus sacerdotes no tenían ningún poder temporal y las pirâmides se hicieron sin trabajos forzados. El apogeo de su civilización no se convirtió en império. Y no tuvieron colônias. No conocían la flecha.

Conocieron a Jesús como el dios del maíz y le ofrecían sacrifícios sencillos

de maíz, y pájaros, y plumas.

Nunca tuvieron guerras, ni conocieron la rueda, pero calcularon la revolución sinódica de Venus: anotaban todas las tardes la salida de Venus en el horizonte, sobre una ceiba lejana,

cuando las parejas de lapas volaban a sus nidos.

No tuvieron metalurgia. Sus herramientas eran de piedra, y tecnologicamente permanecieron em la edade de piedra. Pero computaron fechas exactas que existieron

hace 400 millones de años.

No tuvieron ciências aplicadas. No eran prácticos. Su progresso fue en la religión, las artes, las matemáticas, la astronomia. No podían pesar.

Adoraban el tiempo, esse misterioso fluir y fluir del tiempo.

El tiempo era sagrado. Los días eran dioses. Passado y futuro están confundidos en sus cantos.

Contaban el passado y el futuro con los mismos Katunes17, porque creían que el tiempo se repite

como veían repetirse las rotaciones de los astros. Pero el tiempo que adoraban se paró de repente. [...]

Ahora sólo los chicleros solitários cruzan por el Petén. Los vampiros anidan em los frisos de estuco.

Los chanchos-de-monte gruñen al anochecer. El jaguar ruge en las torres – las torres entre raíces – un coyote lejos, em una plaza, le ladra a la luna, y el avión de la Pan American vuela sobre la pirâmide. ¿Pero volverán algún día los passados Katunes? (CARDENAL, 2012, p. 86-88)18

17 De acordo com o Instituto de Arqueologia de Belize, Katunes é o sistema da contagem curta, ou roda dos treze catunes, foi usado pelos Maias para o cálculo do tempo desde o pós-clássico. Esse distema simplificou outro, e foi representado por uma roda dividida em treze seções. Cada Katún correspondendo ao curso de 20 melodias ou 360 dias e tinha uma divindade que o representasse. Tun (Maia) pedra, ano, fruto ou semente. Pedra preciosa que representa o ano de 360 dias, básico para a conta de Katún. Katún vem de Kal, 20, e tun, ano de 360 dias.

18 As cidades perdidas / agora são reais os animais/ que estavam estilizados nos afrescos/ e os príncipes vendem frascos nos mercados./ Mas como escrever outra vez o hieróglifo, / pintar o jaguar outra vez a derrotar os tiranos?/ Reconstruir outra vez nossas acrópoles tropicais,/ nossas capitais rurais rodeadas de campos de milhos?/ A erva está cheia de monumentos./ Há altares nos campos de milho./ Entre as

Cabe ressaltarmos, no texto “Las ciudades perdidas”, a menção à tolerância religiosa que existia entre os povos tidos como “primitivos”. O poema apresenta uma imagem bastante interessante sobre esse tema, uma vez que dizia ser a religião o traço que unia os povos, mas “era una religión aceptada libremente/ y que no era una opresión ni una carga para ellos”. Há, além disso, uma crítica ao fato de os membros da Igreja, em vários momentos, também serem os detentores do poder temporal. Isso ocorreu em várias épocas, como na Idade Média. E vemos, ainda hoje, esse uso da religião como forma de se ascender ao poder e, como consequência, uma forma de opressão. Essa crítica é mostrada, no texto, no seguinte verso: “Sus sacerdotes no tenían ningún poder temporal”.

Feitos esses breves comentários acerca do poema, retomemos as considerações anteriormente iniciadas, apontando algo que Cardenal ensinou a Merton: a construção da poesia social e política. Após a leitura de “Hora 0”, o poeta norte-americano passa a adotar as construções temáticas usadas por Ernesto na confecção desse poema, marcado “pelo

raízes dos chilamates arqueiam com relevos./ Na selva onde parece que o homem nunca entrou/ onde só penetram a anta, o pizote / e o quetzal (ave) ainda vestido como um maya:/ ali há uma metrópole./ Quando os sacerdotes subiam o Templo do jaguar/ com mantos de jaguar e fâs de cauda de quetzal/ e

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