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1. AS BASES NACIONAIS

1.2 O MOVIMENTO ARMORIAL

1.2.4 Artes matriciais

1.2.4.1 O Folheto de Cordel

Para os artistas armoriais, o ―folheto de cordel‖ será a mais completa dentre as manifestações populares, pois nele está incluída a xilogravura, no desenho da capa, os versos e ainda a voz, que, a despeito do suporte impresso do verso não é omitida, dado o fato de que o público do cordel se reúne ainda para escutar em leituras coletivas a voz do contador, sem mencionar que os recursos mnemônicos próprios do cordel facilitam a apreensão da história e sua propagação oral.

Para o cordel convergem as atenções das distintas manifestações artísticas do universo armorial. Como receptáculo impresso de poesia popular,

e, segundo Eleuda de Carvalho, ―também evangelho, tribuna e noticiário‖ (1998, p. 32), ele é, dessa maneira, a manifestação popular que sem dúvida maior influência exerce sobre os artistas do Movimento Armorial e, em especial, sobre Ariano Suassuna e sua literatura. Em entrevista ao Jornal da

Semana, em maio (20-26) de 1973, Suassuna explica essa relação do Armorial

com o cordel nos seguintes termos:

O folheto possui três tipos de arte ligadas a ele. Em primeiro, a arte plástica que é a gravura da capa. Por aí a gente achava que a gravura popular fornecia o caminho para a pintura, talha, gravura, cerâmica, e tapeçaria. Então, era o primeiro tipo de arte. Depois, tinha a poesia narrativa, que foi de abrir caminho para a literatura e para outras artes narrativas como o Cinema e o Teatro. Do mesmo jeito que me baseei no Enterro de Cachorro que era um soneto. E ainda tinha outra, que era a música. Então, nós todos considerávamos o folheto como canto e por aí é que se liga à tradição do violeiro, do repentista que nem sempre toca viola. (SUASSUNA, 1973).

Realidade relativamente recente no Brasil – finais do século XIX – enquanto literatura impressa, as origens transoceânicas do cordel são muito anteriores às suas origens no país; estas, portanto, remontam à chegada dos primeiros colonizadores, embora sua concreção como suporte escrito das histórias e temas do domínio oral e popular só se dê alguns séculos mais tarde. Os homens que desembarcam das caravelas em terras sul-americanas, no início do século XVI, já estavam familiarizados com os livrinhos vendidos nas ruas, em portais e mercados de suas cidades natais, os folhetos de cego e os

pliegos sueltos.

Os ecos da cultura ibérica são, portanto, muito audíveis na tradição oral herdada pelo cordel. Lendas, histórias e poesias da cultura medieval ressoam nas histórias contadas na zona rural pelos criadores de versos populares, cantadores e repentistas, verdadeiros artífices e divulgadores do nosso Romanceiro Popular. Esses artistas recriaram as histórias e lendas da tradição popular oral e da literatura escrita por autores peninsulares, entre os quais, o Arcipreste de Hita e Don Juan Manuel, pelo Romancero Español, pelas lendas cavaleirescas e depois pela literatura de cavalaria, pelo romance picaresco e pelo teatro barroco.

Embora todos os países mantenham suas tradições e as manifestações de seu folclore, muito poucos registram o vigor que a poesia popular escrita brasileira. O estudioso Joseph M. Luyten calcula em ―100 mil títulos editados, o que é apenas uma estimativa‖ (LUYTEN, 1979), neste pouco mais de século transcorrido desde as primeiras publicações. Entre outros povos a poesia narrativa vai aos poucos cedendo lugar à prosa acompanhando uma tendência generalizada no ocidente.

Márcia Abreu, em seu livro Histórias de cordéis e folhetos, rebate a afirmativa de que os folhetos de cordel nordestinos tenham nos cordéis portugueses ou nas folhas volantes sua matriz, fonte ou origem (ABREU, 1999, p. 54). Para comprovar sua teoria, a autora aponta entre eles diferenças formais e de condições de produção, para concluir que o cordel não seria sequer um gênero literário, mas uma modalidade editorial, que foi utilizada na Península e no Brasil, particularmente no Nordeste brasileiro, pelo seu baixo custo, ou seja, como uma opção que tem suas origens em questões de natureza econômica.

Seus argumentos, no entanto, esbarram em coincidências temáticas e em reproduções quase totais de muitas desses temas ibéricos que dificultam a aceitação de ser a literatura de cordel nordestino-brasileira uma criação nova e independente. Poderia, talvez, ser essa uma tese aplicável a certo tipo de folheto que se produz mais tarde no Brasil, não fosse esse, a nosso ver, uma transformação adaptativa necessária, com o passar do tempo, daqueles que estamparam velhas histórias trazidas na memória dos colonizadores e até nas páginas das econômicas edições de livrinhos de cordel ibéricos. Muitos dos vários temas ibéricos, aqui aportados, arraigaram-se entre o povo brasileiro e se mantiveram vivos até hoje, via tradição oral e através da nossa literatura de cordel, fato endossado por Suassuna em seus depoimentos e textos. Referindo-se a coincidências temáticas entre o Auto da Compadecida, o folheto de cordel de Leandro Gomes de Barros – que lhe inspirou a peça – e um conto popular de origem moura que chegou à Península Ibérica com os norte- africanos, ele diz: ―quem diz brasileiro e nordestino, diz ibérico, mouro, negro e vermelho, judeu e muito mais uma porção de coisas que seria longo enumerar.‖ (SUASSUNA, 2008, p. 180).

Parece-nos especialmente relevante nas pesquisas de Abreu (1999), a informação de que através dos registros dos pedidos de autorização feitos a Real Mesa Censória49, entre os livros enviados ao Brasil, muitos viriam em

edições de cordel e, entre eles, havia uma boa parcela de traduções de originais estrangeiros, especialmente espanhóis – escritos originalmente em castelhano ou traduzidos ao idioma em primeira mão. Embora essas composições originais, não necessariamente fossem publicações de cordel, suas traduções para o português tiveram essa intencionalidade.

É o caso, por exemplo, da história de Roldão – herói que hoje nomeia uma localidade do interior cearense; da história da Donzela Teodora50 que, não obstante sua origem árabe, em As mil e uma noites, foi vertida ao português com amparo em uma versão castelhana do século XII. Esta versão, segundo Caro Baroja (1990, p. 385), por outro lado deu origem também a uma peça de Lope de Vega, e, já no século XIX ao cordel Historia verdadera,

curiosa y entretenida de la doncella Teodora (1848), editada em três ―pliegos‖ de vinte e quatro páginas em Talavera na Imprensa de D. Severiano López Fando; e, as aventuras de Roberto do Diabo que foi traduzida tendo como esteio sua primeira versão espanhola, editada em Burgos, em 1499. Uma edição de uma ―comedia nova‖ intitulada O melhor entre doze, Reinaldos de

Mont‟alvão. Huma das heroicas acções francezas, traduzida fielmente de seu original hespanhol, e ordenada no idioma da nação portuguesa transformou-se

em cordel no Brasil, com título que leva o nome do herói.

Em pleno interior do Nordeste rural, até os nossos dias, a história da Donzela Teodora, sempre agradou às mulheres. A história, que na Espanha de Sancho IV, desfrutava do agrado do público, não perdeu o interesse do público nordestino sobre as sabidurias de uma moça que salvou a fortuna do homem que a adotara como filha:

Houve no reino de Tunis Um grande negociante

49 Junta perpétua criada por D. José em 1768, composta de um presidente e sete deputados

que deveriam examinar com vistas à aprovação ou reprovação, entre outras coisas, os livros enviados ao Brasil.

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Um cotejo de edições portuguesas, espanholas, árabes e nordestinas, realizado por Câmara Cascudo aponta sua origem nas Mil y una noites.

Era natural da Hungria Negociava ambulante A quem podia chamar-se Uma alma pura e constante - Se o mouro vender-lhe tudo Com que possa me compor Vossa mercê vai daqui Vender-me ao rei Almançor; É esse o único remédio Que salvará o senhor51. (SILVA, 1967, p.1)

Entre os homens não é incomum que os cavaleiros franceses e suas proezas se convertam em temas de discussão sobre a coragem e resistência dos cavaleiros da corte do grande imperador Carlos Magno, de seus Pares e de seus adversários: Oliveiros, Reinaldo de Montalvão e Roldão, Ferrabrás, Almirante Balão. Os versos do cordel de Leandro Gomes de Barros exaltam a bravura de Oliveiros, sem desmerecerem a resistência de seu oponente infiel, na Batalla de Oliveiros y Ferrabraz. Nomes antigos, heroicos de nobre e cavalheiresca estirpe das lendas carolíngias, foram incorporados também ao imaginário local: Roldão, Oliveiros, Duque de Nemé, Guy de Borgonha, Lamberto de Bruxelas, exóticos nomes que se aclimatam, da mesma forma que os nórdicos Galarraz ou Galaaz, Genoveva, Lancelote ou Lançarote y Artur das lendas arturianas.

Outras obras de menor repercussão em nosso cordel, como por exemplo, a história trágica de amor entre o príncipe português D. Pedro com a dama da corte Ignes de Castro, apesar de constar entre as edições de uma coleção econômica de 1952 – que atesta a existência de edições anteriores – difundiu-se mais em Portugal a partir do livro de Velez Guevara, Reynar

después de morir, publicado em 1630, e de um cordel sobre o tema publicado

em data anterior à versão erudita de Guevara. Esses fatos comprovam a partilha entre os países ibéricos, e entre eles e a América luso e hispano falante, no que tange aos gostos e acervo temático de boa parte de suas obras literárias, que no Brasil sobreviveram na tradição oral até serem estampados nas páginas dos folhetos de cordel.

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Durante o percurso trilhado pela literatura popular no Brasil, de seus inícios até finais do século XIX, quando os primeiros cordéis começam a ser impressos, deve-se ressaltar que o sincretismo cultural que alimentou suas histórias deu-se, de maneira intensa, durante o ciclo do couro e do gado. Este propiciou as entradas e bandeiras pelo interior, em meados do século XVII. Eleuda de Carvalho (1998, p. 31) comenta que à época ―os clãs e agregados das fazendas coloniais disseminavam em sua comunidade contos e narrativas de origem ibérica‖; estes, por sua vez, sofriam as alterações esperadas diante da ―fantasia fabuladora dos indígenas, negros, caboclos e mestiços novos cristãos‖. É possível conjecturar que os jesuítas, em missão catequética, teriam ainda contribuído de alguma forma com uma ou outra história hagiográfica nos moldes dos livros de cavalaria em versões ―a lo divino”, tão de gosto na Espanha do Renascimento.

Ao longo do tempo, os mitos, as lendas e as façanhas heroicas se misturavam, enchendo a imaginação do homem interiorano, litorâneo e especialmente do sertão. No litoral, da mão de obra escrava, medravam também outros mitos, trazidos do continente africano. Enquanto a população pobre sertaneja, de vida parca e dura, mas livre de grilhões, compartilhava com seus senhores e patrões os mitos brancos trazidos da Europa e vivia da esperança de vida melhor, de chuva, de terras pra plantar, cabeças de gado e o pouco do ―de comer‖ de cada dia.

Entre este povo, de tão escassos recursos e muitas esperanças, várias lendas frutificam e se ancoram no cordel como repositório e divulgador. A recepção, no entanto, é seletiva e obedece a critérios variados, entre os quais, a sintonicidade do povo com o núcleo puro da lenda, que é então ressignificada. Muito cedo os desertos de Alcácer-Quibir, por exemplo, transformar-se-iam nas terras arenosas do semiárido e, assim, ancoradas imaginariamente a uma geografia familiar, novas lendas trazidas pelos videntes degradados da metrópole, conhecedores das Trovas de Bandarra, Sapateiro de Trancoso, são plantadas. Ao lado de cavaleiros como Galarraz e Persival, em sua ―Demanda do Sangral‖, o Sebastianismo, movimento cujo viés político-restaurador ganha dimensões muito mais amplas, instaurando-se no plano religioso, aclimata-se e o Encoberto príncipe-Rei, Dom Sebastião prossegue seu vagar, agora em terras sertanejas para que, n‘ algum fim de século, possa voltar e estabelecer o Quinto

Império do Reino Universal Cristão, de ordem e de justiça para os pobres. Os versos de Bandarra impressionam e encontram relicário no coração nordestino:

Aguillas e leones ganarão la fortaleza subiram em tanta alteza que amansem los dragones y todos rebueltos em lid, vernam em sus confusiones subiren francos leones com uno de sangre de David.

(HERMAN52, 2000apud GODOY, 2005, p. 101).

O universo temático da poética popular é, pois, muito amplo, nele misturam-se lendas, mitos, gestas de heróis e paródias do sagrado e do profano. Da oralidade livre e espontânea à métrica da poesia, os poetas populares serão os encarregados de transportá-la através dos tempos e das sucessivas gerações, até que no quarto final do século XIX, livrinhos pequenos e de impressão rústica e econômica começam a circular pelo interior notadamente no Nordeste, na zona do sertão, ajudando a preservar a memória e ampliando o acervo popular com novas histórias. O folheto de cordel será – a exemplo dos ―corridos‖ y ―contrapunteo‖, do mundo hispano-americano, e dos anteriores ―colportage francês‖, ―pliegos sueltos‖ espanhóis e folhas volantes, ou literatura de cego53 portuguesa – o suporte estrutural dessas narrativas orais desde aqueles tempos.

Nem bem nasceu, o cordel já teve sua vida ameaçada e sua permanência posta à prova. Conforme Joseph M. Luyten (1987, p. 31-32) ele teve, no Brasil, sua morte vaticinada em várias ocasiões nas quais novos meios de comunicação surgiam e pareciam ameaçá-lo. Assim ocorreu no começo do

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Versão de uma trova de Bandarra. A linguagem marca a presença maciça de espanhóis no Portugal filipino. Cf. Herman, Jacqueline. No Reino do Desejado: a Construção do

Sebastianismo em Portugal nos séculos XVI e XVII. São Paulo, Companhia das Letras, 1998.

HERMAN, Jacqueline. 1580-1600: o sonho da salvação. Col. Virando Século, São Paulo: Companhia das Letras, 2000, p. 44-45.

53 Esse nome provêm do fato de D. João V, em 1749, haver concedido o monopólio de suas

vendas à Irmandade do Menino Jesus dos Homens cegos de Lisboa. Muito embora, na Espanha, desde a Idade Média, existiam também os ―romances de ciego‖. Aos cegos também foi concedida a exclusividade na ―venda de breviários e livros de orações, jornais ou caixas de fósforo, dependendo da época que se queira abordar‖. (ABREU, 1999, p.20).

século XX quando os jornais começaram a ser editados e a circular no interior do país. Na década de trinta, com a popularização do rádio, previu-se também o fim do cordel. Já na década de sessenta, foi a vez da televisão. No entanto a poesia popular escrita sobreviveu. Reformulando-se e adaptando-se às diversas épocas que atravessa, o cordel continua vivo e pulsante, em plena aurora do século XXI, promovendo rodas de leitura, diversão e entretenimento e interferindo também na pauta do dia das noticias do país, desde a política à economia, do clima à religião. O cordel, certamente o mais importante segmento do Romanceiro Popular do Nordeste, é um caso atípico de sobrevivência dessa literatura de baixo custo e fácil acesso, no mundo atual. Em realidade, o Brasil, conforme a estatística de Luyten, já mencionada, e comentário anteriormente referido de Ariano Suassuna, tem o maior Romanceiro vivo da atualidade. A esse respeito, é de Suassuna o comentário:

Nós, aqui no Brasil, temos à mão, um material muito mais vasto, rico e variado que o Romanceiro Ibérico, um material que, se caísse, daqui a dois séculos, na mão de um crítico de sensibilidade, encheria toda sua vida de estudos [...]. (SUASSUNA, 2008, p. 152).

Luis Díaz Viana (1990, p. 66-67), apesar de afirmar a sobrevivência do Romanceiro espanhol em seu processo adaptativo de absorção por outros gêneros literários e/ou em parceria com eles, argumenta sobre sua manutenção na forma oral original:

[…] el romance es, cada vez más, una especie de cuento versificado, un relato que encierra una enseñanza ejemplar. Por eso, los mayores siguen trasmitiendo a los más jóvenes ciertos poemas dentro del reducido ámbito familiar.[…] Los romances que nacieron en torno a los castillos y al fragor de la batalla son cantados ahora en patios humildes o narrados en voz baja junto al fuego, como un cuento cuya música casi se ha perdido. (DÍAZ VIANA, 1990, p. 66-67).

As adaptações necessárias para continuar suscitando o interesse do público constituem talvez um dos trunfos da literatura de cordel e acontecem gradual e constantemente, de forma a ajustar-se ao gosto e à necessidade do

leitor ou ouvinte preferencial: o habitante da zona rural nordestina e seus paisanos habitantes periféricos das cidades grandes.

Embora o cordel, como suporte escrito de significativa parte do Romanceiro Popular não assegure, pela sua fragilidade, a preservação do conjunto completo, com o espichar do tempo, as coletâneas começam a surgir, a internet entra igualmente no circuito de divulgação e guarda, cuidando inclusive de reproduzir edições princeps, dado o valor desses originais com xilogravuras em suas capas, cujas matrizes já não existem mais.

A Academia Brasileira de Literatura de Cordel, criada em 1988, tem dado espaço e promovido poetas populares e suas obras. O cuidado com o acervo da poesia popular fixada em cordel levou-os à concepção de coletânea recém-lançada, intitulada 100 cordéis históricos segundo a Academia Brasileira

de Literatura de Cordel, publicado pela Editora Queima Bucho. Fartamente

ilustrada com fotografias dos folhetos, introdução com a história e ensaio sobre a importância do cordel e biografia dos autores, por ordem cronológica de seus nascimentos, desde Silvino Pirauá, nascido em 1842, a Expedido Sebastião da Silva, de 1928. Os folhetos de cordel, que trazem no nome a informação do local que lhes foi destinado, quando começaram a circular, se põem ―de pé‖ (através das coletâneas) nas estantes e começam a surgir como disciplinas no âmbito acadêmico universitário.

No Nordeste, especialmente no sertão, ―reino dos ‗trovadores de chapéu de couro‘‖ (MARTINS, 1977, p. 5) e em uma ou outra região do país, o cordel experimentou as quadras dos versos setessilábicas vindas de Portugal nas narrativas e desafios de viola: ―antigamente a gente cantava de quatro pés‖ diz o poeta octogenário Romualdo da Costa Manduri, em entrevista a Leonardo Mota54 (MANDURI, 1976 apud ABREU, 1999, p. 83), mas essa estrutura de

versejar com rimas no segundo e quarto verso, forma poética popular por excelência em Portugal, não permaneceu, suplantada por outra forma que se consagrou no Brasil chegando a ser considerada ―a maior expressão poética de toda a nossa história‖ (LUYTEN, 2005, p. 17), a chamada ―sextilha‖. Ao que tudo indica, esta forma foi introduzida pelo poeta popular Silvino Pirauá de Lima, no final do século XIX, que se ressentia da falta de espaço nas quadras

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Em entrevista a Leonardo Mota. Violeiros do Norte – poesia e linguagem do sertão

para a extensão das ideias, com estrofes de seis versos de sete sílabas e rimas finais nos versos pares, tornou-se a modalidade poética preferencial entre os nossos poetas populares e cordelistas. Mas, além da sextilha, improvisava-se também ―ao toque mouro da viola‖ no dizer de Eleuda de Carvalho (1998, p. 31), outras rimas mais desafiadoras, como o ―martelo agalopado‖, versos de dez sílabas em estrofes de dez versos.

As dimensões dos folhetos de cordel nem sempre foram pré- estabelecidas. Conforme comenta Márcia Abreu era comum a prática de imprimir diferentes poemas ou partes deles numa mesma brochura de dezesseis páginas; desta forma, segundo a autora, ―em um mesmo folheto, publicavam-se um desafio, uma história de cangaceiros, o relato de um acontecimento social importante, um trecho de uma narrativa ficcional‖ (1999, p. 102) o que obrigava o leitor a comprar, muitas vezes, mais de um folheto se quisesse acompanhar uma determinada história até o seu final. Verificou-se uma mudança dessa realidade com João Martins de Athayde, primeiro editor- proprietário, cuja atividade editorial com os folhetos foi responsável por muitas mudanças nas práticas até então vigentes. Conforme Márcia Abreu (1999) as reformulações previam a vinculação de uma determinada criação poética a um número de páginas fixo, sempre em múltiplos de quatro. Estas normas obrigarão a história a ajustar-se, em quantidade de versos, aos seus formatos. O poeta Rodolfo Coelho Cavalcante, além de glosar as origens do folheto de cordel, marcando diferenças com respeito ao cordel português, escreve também um artigo cujo título ―Como fazer versos‖ (ABREU, 1999, p. 110) deixa óbvia sua intenção. Este artigo sistematiza as regras usuais do cordel que até a atualidade ainda estão em voga.

Vale esclarecer que a dimensão mais comum do folheto de cordel é