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SAHEL: MAPA GEOGRAFIA E POPULAÇÃO

SECTOR DE CONSUMO FRAÇÃO DO SALÁRIO GASTO

N. B As notas da moeda nacional (Ouguya=MRO) mudaram e ao valor facial foi tirado um “zero” mas aqui,

6.5. Coexistência de fontes tradicionais e fontes modernas de energia doméstica 1 Eletricidade e outras formas de iluminação

6.5.3. As energias tradicionais: a lenha e o carvão vegetal

A lenha é vendida em Nouakchott ainda que em quantidades marginais se comparada com o carvão e os clientes não são os consumidores particulares mas os restaurantes populares e de grelhados de carne, nas festas de casamentos, batizados e afins e, cada vez mais, os “hammam” (banho turco) que proliferam desde há uns anos e são frequentados sobretudo pela população feminina da classe alta e média. Há também padarias que fazem um pão escuro, apreciado e mais caro, cozido em forno a lenha. A lenha tem um circuito comercial diferente do carvão e o responsável do departamento de energia doméstica no Ministério do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (que tutela o subsetor das energias tradicionais) afirmou-nos em entrevista que não sabe como aparece essa lenha no mercado. Os camiões que trazem o carvão têm de passar por um check-point à entrada da cidade, declarar a sua carga e tratar de outras formalidades (há taxas a pagar por camião e

xv Tradução livre do autor: «De fato, é cada vez mais espalhado em todo o território, que as botijas não estão atestadas até a sua capacidade nominal.”

130 pelo número de sacos transportados) e a brigada policial nesse check-point não tem registado entrada de camiões com lenha (até a altura da entrevista em fevereiro 2016). O carvão vegetal tem um circuito comercial de distribuição bem montado e a sua procura tem estado a crescer pelas razões já apontadas (crescimento populacional e urbanização, a crise e o aumento do preço do principal concorrente, o gás butano). Isso, não obstante o facto de o preço do carvão ter sofrido também aumentos dada a rarefação da cobertura vegetal e, por conseguinte, os carvoeiros terem que percorrer distâncias cada vez maiores (como já referimos, os locais de produção situam-se a distâncias que vão de 500 a 800 km de Nouakchott) e sobretudo os camiões de transporte do local de produção para o local de consumo, facto que torna a componente custo de transporte cada vez mais “pesada” e ter que ser repercutida no preço de venda. A pressão sobre a procura do carvão levou ao corte da madeira verde, que é proibido pela lei mas com pouca aplicação prática.

Em relação ao gás, embora este seja mais prático e limpo, o carvão vegetal adapta-se melhor ao poder económico e estilo de vida dos mais carenciados. Enquanto o gás exige a compra de equipamentos apropriados e onerosos para os bolsos dos muitos pobres (a botija e o fogão são os mais caros), para o carvão basta um fogareiro simples e barato – entre 1.5 e 2$. (GTZ, 2008, p. 12).

Alguns acham (em geral e não neste caso específico) que das pessoas que não optam pelo gás há umas que têm poder de compra para o fazer, mas recusam-se por várias razões, para além do nível do rendimento em si:

“Many factors in addition to income determine LPG use: availability, reliability of LPG supply, prices of other fuels, acquisition costs of LPG cylinders and stoves, fears about safety, unfamiliarity with cooking with LPG, lack of knowledge about the harm caused by smoke from solid fuels burned in traditional stoves, and cultural preferences”. ( (World Bank, The Role of Liquefied Petroleum Gas in Reducing Energy Poverty, 2011, p. 5)).

Ou seja, o preço não é o único, nem sequer o mais importante fator na escolha do tipo de combustível das famílias e, muitas vezes, a oferta existente e segura acaba por ser determinante na escolha. (Kammen & Lew, 2005). O “acesso” aqui condiciona a “escolha”, dois conceitos que muitos autores insistem em diferenciar na problemática da energia e da pobreza energética.

131 Do que nos foi dado a constatar – e apurar junto de várias pessoas – em Nouakchott sobretudo, o fator económico-financeiro continua a estar no centro do conjunto de obstáculos impeditivos para a adesão das famílias mais carenciadas à utilização do gás butano para a cozinha. Nesse âmbito, podemos subdividir o problema (económico) em três níveis:

a) Os custos do investimento inicial nos equipamentos (fogão, botija e restantes apetrechos). Para a grande maioria das famílias pobres estes custos são incomportáveis, apesar de tratar-se de montantes que para alguns (especialistas estrangeiros, p.e.), em termos absolutos, serem irrisórios.

b) Grande parte do parque de botijas existente é constituída por cilindros de 12.5 kg que são as maiores e, consequentemente, de preço mais elevado dificultando assim a sua aquisição pelos mais pobres por não disporem sempre da quantia requerida. c) A não disponibilidade de um rendimento fixo (salário ou remuneração ou

transferência de familiar mensal equivalente) é, ao nosso ver, o fator mais impeditivo e ao mesmo tempo, diferentemente dos outros fatores, é estrutural e tem a ver com a economia em geral, o nível de emprego que gera e as condições de trabalho que são na prática proporcionadas. A cocção é algo vital e diário (mais que uma vez) não podendo ser “adiado”, como tal a energia para isso tem de ter uma disponibilidade permanente. O caso da eletricidade é diferente e os utentes podem passar dias sem luz elétrica (acontece muito por não pagamento da fatura mensal) até conseguirem resolver o seu problema, remediando a situação entretanto usando velas, lanternas ou outra fonte mais barata e disponível nas muitas lojinhas de bairro.

Problemas com as fontes lenhosas

Como referido, nas cidades e em Nouakchott em particular, o carvão é a fonte de energia para cozinhar mais utilizada pelos pobres e com o peso de cerca de 1/5 no mix energético da cidade. Para além do hábito secular das populações em lidar com a lenha e o carvão, é

132 sobretudo o custo da fonte substituta perfeita, que é o gás, que impede os que têm menos, de adotar esta energia relativamente mais limpa e cómoda quando comparada com a lenha.

Ainda que seja mais barato que o gás, o carvão também vai seguindo as subidas do preço do gás e, sendo um setor económico informal e único combustível cujo preço não é tabelado pelo governo (o gás e os outros combustíveis modernos, são), tem sido marcado por alguma especulação.

Há outros fatores que contribuem também para a formação do preço, para além da pura especulação: na curta altura das chuvas (Agosto a Novembro), e porque a lenha fica molhada e o corte das árvores e coleta da madeira se torna mais difícil, além da carbonização ser mais lenta e demorada, faz com que os preços subam (até 3 ou 4 vezes, conforme). (ESMAP, 1990).

Outro fator, cada vez mais importante na formação do preço é a distância a percorrer pelos camiões que, no caso de Nouakchott, pode ir de 500 a 800 quilómetros e tem vindo a aumentar devido ao decréscimo da cobertura vegetal do país em virtude da procura desproporcionada da madeira para produzir o carvão para abastecer as cidades e muito particularmente Nouakchott.

Estes problemas afetam diretamente o consumidor, mas há outros que afetam a globalmente a sociedade e o muito sensível e já degradado equilíbrio ambiental do país. A Direção do Ambiente e Desenvolvimento Rural (DEAR) estimou, em 1996, o consumo dos combustíveis lenhosos em 1.410.546 m3, numa base de 0,6 m3 por habitante e por ano.

Conjugando esta estimativa da oferta nacional de lenhosos (560.000 m3), percebe-se que

esse consumo (1.410.546 m3) é de 2,5 vezes superior à oferta total e 9,4 vezes superior à

produção nacional em zonas acessíveis (150.000 TM/ano). Já em 2004 a estimativa da produção (oferta) anual era de 1.800.000 m³ de madeira, tornando a situação ainda pior. (TOURE, 2000).

133 Os resultados mais visíveis dessa desflorestação são a aceleração da desertificação que assola o país e a erosão do sol com as consequências graves para a agricultura (familiar essencialmente, já que menos de 5% do território é arável), factos que têm sido uma das causas mais importantes para o êxodo para as cidades, correspondendo a um movimento em direção à degradação ambiental – êxodo rural – maior pobreza nas cidades – maior procura das fontes de energia lenhosa – maior pressão sobre a limitada cobertura vegetal – corte de árvores ainda verdes e até o saque de algumas florestas classificadas – estas duas, proibidas pela lei.