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As Feiras de Ciências constituem-se oportunidades

III PROGRAMAS DE EDUCAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES: oportunidades formativas de múltiplos

Princípio 4: As Feiras de Ciências constituem-se oportunidades

formativas para professores-formadores como situações integrativas avaliativas do processo de ensino-aprendizagem-conhecimento- comunidade, com vistas à educação para a cidadania.

Continuando a busca da compreensão da essência de formação dos sujeitos pesquisados, enquanto integrantes de um grupo de professores que vai constituindo o grupo como tal e, também, constituindo-se sujeito-professor-formador, surgem as Feiras de Ciências, presentes na nossa prática pedagógica de formação de professores e de ensino de Ciências, desde a experiência inicial, em 1979.

Já aí elas surgem como ‘culminância dos trabalhos escolares realizados durante um certo período letivo’, significando uma relação esperada no processo-produto, em contraposição às exposições, às mostras, aos trabalhos realizados para as feiras. Entendíamos os eventos como resultantes do processo educativo com ênfase no ensino como investigação.

O ensino como investigação, ao mesmo tempo que é uma realidade a ser construída, tratando-se de uma utopia em construção no grupo, está presente no processo, de algum modo. Desde o início da formação do grupo, convive com outras alternativas de trabalho docente, no respeito ao ritmo pessoal dos sujeitos envolvidos, ao tempo em que situações desafiadoras de diferentes naturezas também se apresentavam como elementos de formação capazes de suscitar aprendizagens profissionais.

As Feiras de Ciências começam a ocorrer desde a primeira experiência de ensino realizada com as crianças do Clube de Ciências, em 27 de dezembro de 1979. Desde então elas têm tido periodicidade anual. Em 1984, ocorreu a I Feira de Ciências da Cidade de Belém.137 A partir daí...

Foram surgindo gradativamente: Feira de Ciências do Clube, depois Feira de Ciências na Escola, Feira de Ciências da Cidade de Belém, depois Feira de Ciências do Estado do Pará e então são essas coisas que não se pode perder. Acho que sempre tem que estar buscando isso aí. Fazendo as coisas acontecerem. (Vicente, 1997)

Como lembra Vicente, as coisas foram sendo construídas aos poucos, como forma de também preparar os professores. O objetivo da equipe do Clube de Ciências não era o evento, em si, mas o processo de trabalho com a criança e a integração com a comunidade, na perspectiva de disseminação de conhecimentos e formação de uma visão crítica da realidade em que viviam.

137 Sob a coordenação do Clube de Ciências, das Secretarias de Educação - Estadual e Municipal - e do Museu Paraense Emílio Goeldi - MPEG, foi prevista no Projeto LAB e financiada pelo SPEC-PADCT.

Essa preocupação se manifesta desde a primeira Feira de Ciências da Cidade de Belém, em 84. No início de cada semestre letivo, programávamos cursos de projetos de investigação para professores e, desde logo, criamos a figura do Coordenador de Feira Escolar. Sugeríamos que os professores escolhessem um colega para representar a escola junto à equipe interinstitucional, de modo que as escolas interessadas em realizar Feira de Ciências ao final do ano pudessem ter o assessoramento que julgassem necessário durante o ano letivo, fora os cursos, que eram destinados a todos os professores interessados.

Muito embora aí ficasse marcado que a natureza de trabalho desejado fosse o de investigação, aceitavam-se outros tipos de trabalho, como estímulo a que as escolas de algum modo se iniciassem. Ao longo de vários anos vimos crescer o número de projetos de investigação inscritos e apresentados. Acreditávamos haver pelo menos duas razões para isso: uma delas eram os cursos, que continuavam sendo oferecidos a cada ano, e outra razão eram as 'avaliações construtivas' que se faziam durante as Feiras de Ciências. Após formar idéia das ênfases dos trabalhos, a coordenação reunia os professores e discutia as características desejáveis nos trabalhos138; a saber

1. Caráter investigatório: é importante que os trabalhos apresentados em uma Feira de Ciências representem resultados de investigações realizadas pelos estudantes;

2. Criatividade: cada trabalho deve ter muito de seu autor, não devendo este se contentar em reproduzir atividades de livros, revistas, etc. Muitas vezes a criatividade está no uso de materiais alternativos;

3. Relevância: é o grau de importância do trabalho à comunidade, à saúde, à educação...

4. Precisão Científica: refere-se à correção dos dados e do seu tratamento, na busca de uma conclusão coerente com o trabalho executado.

As características desejáveis de um trabalho a ser apresentado em uma Feira de Ciências, acima apresentadas, eram dadas a conhecer ao professor, durante cursos e através do material de divulgação de Feiras de Ciências, como item de regulamento das Feiras de Ciências. Acredito que elas também permitem evidenciar, com alguma clareza, a percepção que a equipe do NPADC tem acerca das Feiras de Ciências. É interessante notar que as características desejáveis eram(ou são!) tão levadas a sério que muito

raramente ocorreram dois trabalhos similares em uma mesma feira. Os professores preocupavam-se com isto e perguntavam: “E se aparecerem dois trabalhos iguais”? Nós respondíamos: “Isto só poderá ocorrer se forem cópia, reprodução de um trabalho divulgado”. E isto era levado muito a sério.

Vicente recorda das Feiras de Ciências do Clube de Ciências, de que ocorriam: (...) Geralmente no final do ano letivo, como culminância, existiam as Feiras

de Ciências. Foi onde pela primeira vez eu vim saber o que era Feira de Ciências, que quando aluno de 2º grau eu não sabia o que era isso. Eu me sentia realizado, porque (...) as Feiras de Ciências eram o resultado daquele trabalho que era desenvolvido junto com o aluno no decorrer do período letivo e eu me sentia também numa felicidade imensa porque na ocasião os nossos alunos não buscavam o Clube de Ciências, naquela época e nem hoje, por notas. Eles vinham espontaneamente e ficavam até o final do período letivo... ficavam por anos e mais anos e isso trazia para nós uma certa recompensa

Vicente não tivera antes a oportunidade de conhecer uma Feira de Ciências. Sentia-se numa felicidade imensa porque os alunos participavam do Clube de Ciências de modo espontâneo, sem nota alguma. A participação nas Feiras de Ciências também não era competitiva.139

A nossa prática pedagógica de ensino de Ciências e formação de professores, numa perspectiva de atuação democrática e de consideração do professor como profissional, nos impulsionava a medidas como a criação de Coordenadores de Feiras Escolares e de oferta de cursos a professores. Entendíamos, entretanto, que o processo era demorado, até porque estaríamos tendo entrada de professores e alunos iniciantes no processo a cada ano, o que considerávamos normal. E esses alunos e professores não poderiam ficar de fora do processo. Durante vários anos consecutivos, vimos aumentar o número de trabalhos de investigação e diminuir experimentos tipo demonstrativos, de natureza reprodutiva. Mas razões várias provocavam por vezes a inversão dessa situação. Em 94, após uma greve prolongada de professores e retorno com reposição de aulas, a Feira da Cidade de Belém ficou inviabilizada. Mesmo assim, continuaram a

138 O anúncio de inscrições continham as orientações gerais, que constam do Relatório Final do FREC, 1991.

139 Haviam alguns destaques por nível de escolaridade, contribuindo com as discussões realizadas na reunião de avaliação. Eram fornecidos certificados de participação a todos, sem resultados classificatórios.

ocorrer as Feiras do Estado do Pará, cuja primeira ocorrera em 89, promovida pelo Projeto FREC, que iniciara o programa de educação continuada de professores em 87.

Como narrei anteriormente, o Projeto FREC desafiou a formação de grupos de professores em diferentes municípios do estado.

As respostas locais dos professores - organizando-se em grupos que promoviam reuniões, planejavam eventos locais/regionais como Feiras de Ciências e Encontros de Professores - deram-nos fortes indicações de que havíamos chegado no momento certo, pois houve ressonância em diferentes locais. Depois de cerca de dois anos de trabalho em 15 municípios-sede de URE, haviam 16 grupos de professores formados.

Assim como na capital, as Feiras do Estado do Pará não se constituíam eventos isolados. Os próprios cursos de Projetos de Investigação no Ensino de Ciências (ou Matemática, conforme o caso), previam um momento final em que os professores apresentavam os projetos, realizados durante o curso, para a comunidade local. Essa apresentação tinha pelo menos dois objetivos: familiarizar os professores participantes do curso com a redação final do trabalho, mesmo que de pequena abrangência, por ser realizado em 40 horas de trabalho, guardando a perspectiva do aprender-fazendo, e proporcionar um momento de denúncia, de crítica e de 'prestação de contas' à comunidade. De denúncia, porque invariavelmente eram realizadas investigações que tinham a ver com qualidade de vida, descaso de autoridades com destino de águas servidas, por exemplo, lixo urbano, reservas de águas poluídas ou contaminadas, armazenamento inadequado de água para beber em escolas do lugar...

Os professores não só apresentavam os resultados a que chegavam em suas pesquisas - realizadas a partir da documentação dos problemas investigados através de fotos e mapas, entrevistas com a população atingida e com autoridades sanitárias, realização de experimentos, se fosse o caso - a uma platéia convidada, como também era convidada a mídia local para a cobertura do que chamávamos de 'culminância do curso'.

Ao se iniciar os cursos do Projeto FREC, encontramos muitas localidades, cujos professores nunca haviam visto uma Feira de Ciências. Em razão disso, as culminâncias de cursos passaram a ser mini-feiras. Assim, os participantes vivenciavam não só a realização dos trabalhos e dos projetos de investigação, como também a organização das