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A prática docente é complexa, envolvendo múltiplos aspectos – sociais, políticos, econômicos, ecológicos, culturais, epistemológicos... É de natureza prática, o que significa dizer que dada a complexidade e a singularidade de seus problemas, o professor não dispõe de soluções técnicas previamente previstas que possam ser simplesmente aplicadas. (SCHÖN, 1992; PÉREZ-GOMES, 1995; MALDANER, 1997; GONÇALVES E GONÇALVES, 1998). Daí a importância de se oportunizar a formação de saberes da prática profissional pelos estudantes universitários dos cursos de licenciatura através de uma prática docente antecipada assistida e da formação de grupos de trabalho, favorecendo discussões, estudos, leituras... Isso,

sem dúvida, significa a formação de uma nova cultura de formação de professores e, como consequência, de uma nova cultura da profissão docente e do processo ensino-aprendizagem- conhecimento, especialmente se a prática antecipada for desenvolvida numa perspectiva inovadora, que permita ao sujeito em formação fazer rupturas/transformações/mudanças... com/em sua formação incidental, advinda de suas experiências educativas desde o início de sua escolaridade, como compreendem MORAES (1991); MALDANER (1999); FRIZZO (1999), CAMARGO (1998), dentre outros.

Na experiência realizada, essa nova cultura de formação vem se constituindo há 21 anos, numa perspectiva, ainda, de opção espontânea de alunos universitários, que se definem pela pesquisa na área de Ensino de Ciências e Matemática, assim como outros optam por pesquisa em Genética, em Biofísica, em Química de Produtos Naturais, em Matemática Aplicada...

A prática antecipada assistida com perspectiva de ensino com/por pesquisa, por ser uma prática complexa, não se desenvolveu de modo linear, tendo altos e baixos e se modificando ao longo do percurso. Evoluiu de uma proposta de “Didática Prática” – embora nunca tenha sido assim denominada, mas pelo lugar que a proposta ocupava – para uma Iniciação ao Ensino como pesquisa, a partir de um movimento voluntário de estudantes atendendo anúncios de inscrição para estágio no Clube de Ciências, à semelhança de outros estágios, oferecidos por outros setores da Universidade. Essa opção voluntária implica uma tomada de decisão de se dedicar ao ensino- aprendizagem-conhecimento, enquanto pesquisa, assim como outros optam pela pesquisa em outras áreas.

A formação de duplas com colegas igualmente iniciantes ou parceria com outro mais experiente, bem como as diferentes práticas formativas interativas parecem indicar a essência de formação no âmbito do Clube de Ciências, pois foram altamente valorizadas pelos sujeitos da pesquisa. A interação com o outro constituiu-se em oportunidades formativas de constituição do sujeito-professor, durante todo o percurso. Essa interação – desde o início da década de 80 ‘perseguida’ e entendida como ‘busca de uma cultura comum’ no grupo – está tão presente nas práticas evidenciadas/assumidas/valorizadas que parece se constituir, de fato, uma cultura de formação de professores e de formadores de professores para o ensino de Ciências e de Matemática dentro do Clube de Ciências/Núcleo Pedagógico de Apoio ao Desenvolvimento Científico na UFPa.

Parece possível, pois, dizer que a prática antecipada assistida em parceria pode ser entendida como uma formação compartilhada, em que os sujeitos se formam na interação com seus pares e seus alunos (FRIZZO, 1999), com a oportunidade de refletir sobre a sua própria

prática, recebendo feedback não só de seu parceiro, como do professor-formador responsável pelo grupo e pelo próprio grupo de que participa. Outros elementos de formação contribuem para a constituição do profissional com autonomia progressiva, tais como a ‘liberdade para aprender’, proporcionada pelo ambiente democrático, pelas discussões e tomadas de decisão conjuntas e pelo aprender-fazendo, sob orientação do parceiro mais experiente.

A participação nos grupos de trabalho possibilita o desenvolvimento de elementos outros de formação, tais como relações de ajuda, desenvolvimento de atitudes de solidariedade, discussões, estudos, leituras espontâneas e compartilhadas, produção coletiva, exercitando a escritura de textos e de materiais didáticos.

A participação em congressos, seminários e encontros aponta para elementos de formação profissional no plano das relações da iniciação científica, do reconhecimento, e da valorização pessoal e profissional, de tempo de reflexão sobre o seu próprio trabalho.

Todos esses elementos de formação concorrem para a formação do sujeito-professor- reflexivo-pesquisador. Para isso, o sujeito precisa ser, inevitavelmente, um profissional crítico, singular e autônomo. Esse, entretanto, é um estado em contínua construção, num vir-a-ser constante, jamais plenamente atingido.

Indicadores dessa formação se evidenciam nas falas dos entrevistados já neste capítulo, como a busca de leituras, uma nova visão de conteúdos, o desenvolvimento de pesquisas com os alunos do ensino fundamental e médio, a perspectiva de um ensino para a cidadania marcando as pesquisas realizadas com os alunos, o surgimento de uma ênfase mais epistemológica, evidenciada pela preocupação com a história dos conteúdos... A construção da utopia de ensino com/por pesquisa vai se aproximando de uma realidade, no momento em que se desloca de uma situação mais esporádica, para uma situação institucional, com bolsas de iniciação científica para universitários...

Resultados como esses apontam para a formação de uma nova cultura de formação no Clube de Ciências/Núcleo, caracterizada pela prática docente antecipada assistida de professores, através de parcerias e de grupos de trabalho. Procuro representar as relações fundamentais de formação do sujeito-professor no Clube de Ciências pelo quadro- síntese a seguir, buscando representar também que aí se iniciam processos de formação do sujeito-formador.

As práticas formativas, entretanto, não se esgotam aí. Os programas de Educação Continuada desenvolvidos pelo Núcleo também são apontados pelos membros do grupo – sujeitos da pesquisa – como importantes para a sua formação como professores e formadores ao

tempo em que formam outros professores (FREIRE, 1999). No capítulo seguinte discutirei a participação desses programas na constituição do sujeito-professor-formador.

III - PROGRAMAS DE EDUCAÇÃO CONTINUADA DE