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CAPITULO V OPÇÕES E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

4. Participantes na Pesquisa

4.2 As formadoras Entrevistas e Notas de Campo

A formadora (A) é professora há vários anos na escola secundária de Miraflores, a outra formadora (L) lecionou vários anos na Escola secundária Padre António Vieira, atualmente está reformada, mas continua a trabalhar como formadora de filosofia com crianças e jovens. Através das entrevistas às formadoras foi possível caracterizar o seu processo pessoal de formação e experiência na área da filosofia com crianças e jovens. Com base no seu discurso demos conta do seu percurso, motivações e experiência profissional nesta área. Ambas as formadoras, referem ter iniciado a sua formação em filosofia para crianças, com a frequência de um Seminário Internacional orientado por Ann Sharp e Felix Moriyón na Sociedade Portuguesa de Filosofia. O seminário acontecia uma vez por semana e, no final, tinham de fazer um estágio que durava praticamente um ano letivo numa escola do primeiro ciclo com supervisão de uma pessoa que já tivesse feito o referido seminário. O seminário contemplava uma parte teórica de apresentação e explicação do modelo de Lipman, e uma parte prática onde os formandos dinamizavam pelo menos uma sessão. Posteriormente, participaram numa formação de professores nesta área nos Estados Unidos da América, na década de noventa, com Lipman e Ann Sharp, onde puderam contactar com pessoas de diferentes países interessadas no programa, na sua divulgação e implementação.

Uma das formadoras reflete criticamente nas entrevistas, sobre o seu desencanto inicial com a filosofia e o seu ensino, o que a levou, inclusive, a procurar outro curso, designadamente “língua e cultura portuguesa ensino para estrangeiros”, e que se encontrava já a frequentar, quando tomou contacto com o programa. Considera que o programa mudou radicalmente a sua visão sobre o ensino da filosofia como podemos constatar nas suas palavras:

Queria largar a filosofia; achava que, tal como foi dado na universidade, é um bocadinho aquilo: a filosofia é a ciência com a qual e sem a qual se fica tal e qual. Eu achava que não ia fazer grande coisa no ensino e no mundo com aquela forma de fazer filosofia, ou de abordar a filosofia; portanto, no sentido de apresentar os autores, falar dos autores e os alunos repetirem os autores e falarem dos autores. A principal coisa, quando nós praticamos o pensamento e não falamos apenas do pensamento, nós mudamos realmente a nossa perspetiva do mundo; quando nós falamos do pensamento e dos autores, nós nunca temos possibilidade de modificar o nosso padrão de pensar, então isso foi mesmo uma revolução na minha vida (A).

Depois da formação nos Estados Unidos da América, as formadoras regressaram a Portugal e começaram a trabalhar com outras colegas na formação de professores em filosofia com crianças e jovens. Numa primeira fase, destacam o apoio dado pelo Ministério da Educação à implementação e divulgação do programa, e ao interesse demonstrado pelos formandos que procuravam a formação nesta área e mostravam desejo de implementar o programa nas suas escolas. Consideram que os educadores de infância e os professores do 1º ciclo revelavam maior interesse; os professores de filosofia, só mais tarde começaram a frequentar o programa e, mesmo assim, apresentavam de um modo geral mais resistência, como podemos constatar nos seus discursos:

Começámos a ver que havia um grande interesse sobretudo dos professores do primeiro ciclo, não tanto de filosofia, porque a ideia era que eles, do primeiro ciclo, aplicassem aos seus alunos, e os de filosofia eram os formadores, digamos assim. Os de filosofia, primeiro, nem sequer tinham grande interesse, começaram a vir mais tarde, mas o grande impacto foi no primeiro ciclo e educadores de infância (L).

Isso para mim foi terrivelmente surpreendente, que é como é que pessoas que defendem o pensamento crítico, a abertura ao outro, etc. na prática não fazem isso, é um bocadinho como aquela, olha para o que eu digo não olhes para o que eu faço! É que vê-se no professor uma dissociação completa entre o que diz e o que faz, que é a pessoa deve ser crítica e aberta à mudança, etc. e depois a prática é radicalmente oposta; eu refleti bastante sobre isto e eu acho que advém um bocadinho de, por vezes, os professores de filosofia se encerrarem demasiado no discurso e se confrontarem pouco com a prática (A).

Ambas as formadoras referem que a formação abrangia escolas públicas e escolas privadas. Uma delas refere que os primeiros cursos eram de cinquenta horas e funcionavam habitualmente em regime pós-laboral. Destaca, na sua experiência como formadora, a introdução da modalidade de estágio pelo envolvimento com os formandos, designadamente no acompanhamento permanente de assistência às aulas e na discussão das dificuldades vividas:

Depois tivemos uma experiência diferente; essa é a experiência que se destacou, foi o estágio, a modalidade de estágio. Fizemos acompanhamento de estágios no colégio Moderno no âmbito do programa Foco; o grupo de pessoas em vez de ser um grupo grande de formandos eram poucos; 4 ou 5 da mesma escola, portanto 4 professores do primeiro

ciclo (…). Primeiro eles faziam sozinhos e a partir de uma certa altura nós tínhamos uma calendarização, rodávamos, éramos três na altura e íamos cada uma na sua vez, ou seja, procurávamos cada uma de nós ir ver as várias professoras, que era para elas também terem contacto com vários tipos de acompanhamento. Digamos, nós tínhamos personalidades diferentes e formas de acompanhamento diferentes, mas sempre dentro da mesma linha (L)

A experiência das formadoras iniciou-se no final da década de oitenta e, desde aí, sempre estiveram envolvidas na formação em filosofia com crianças e jovens, em simultâneo com a docência da filosofia em escolas públicas, aplicando com os jovens os princípios que se encontram na base desta formação. A sua experiência no programa integra a aplicação prática com grupos de crianças do pré-escolar e do primeiro ciclo e o acompanhamento dos formandos na aplicação e consolidação do programa. A formação que ministravam, ocorreu em diferentes locais, embora a área de maior influência tenha sido, numa primeira fase, a zona de Lisboa; a partir de 2006, no concelho de Sintra, mais propriamente na Associação de Professores de Sintra, onde criaram o Centro Diálogos Filosofia com crianças e…outras idades. De acordo com os seus relatos, o Centro surge numa altura em que existiam vários apoios comunitários e nasce do desejo de consolidarem o seu trabalho, aliado à necessidade de terem um local de contacto e de apoio aos formandos.

4.3 Os Professores que frequentaram a formação no período compreendido entre