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Desde sempre os cristãos entenderam sua existência e ministério como herdeiros da tradição escrita que eles compartilhavam com os judeus; os valores morais e rituais foram baseados na Bíblia e seus textos sagrados eram tomados como fundamentos das origens do povo de Deus e das histórias que os levaram ao agraciamento divino e imperial. Como vimos, exegetas cristãos compreendiam os textos bíblicos como referências proféticas à Trindade, à encarnação e ressureição de Jesus e à fundação da igreja cristã, de maneira que o Antigo Testamento se configuraria como uma predição da vida de Cristo e de sua divindade, sem as quais a história do “povo eleito” seria incompleta.

Mas o universalismo salvífico do sacrifício messiânico possibilitou que outros povos pudessem compartilhar do mistério de fé cristológico e, dessa forma, o cristianismo pode incluir em suas fileiras não só judeus, mas gentios convertidos que traziam seus códigos sociais e uma imensa variedade cultural. Essa condição é observável nas imagens que analisamos, principalmente quando notamos que muitos dos elementos e temas foram assimilados do meio greco-romano e empregados sob novos significados. Quanto a isso, nota-se que no terceiro século houve um interesse coletivo de representar Jesus como um “curador”, um milagreiro capaz de realizar várias taumaturgias, mostrando, assim, todo o seu poder.

Muitas imagens de Cristo segurando uma varinha, ou um bastão, e realizando milagres foram alguns dos motivos que levaram Thomas Matthews (1999, p. 10) a sustentar firmemente que tais representações de Jesus não foram adaptadas da arte imperial romana, mas constituíam- se como formas de expressar uma batalha entre os deuses politeístas e as novas personagens cristãs, incluindo o próprio Messias. Tal situação se justificava pelo contexto de conversão e pela busca de reivindicar que Cristo era mais poderoso que as “antigas” deidades. Segundo Matthews, a varinha, que também aparece em imagens de Moisés e de Pedro, seria um claro

atributo dos magos, de forma que a representação de personagens cristãs com ela evidenciaria as tentativas de mostrar Jesus como mago, e não como imperador, como dizia André Grabar (1966, 1991).

De fato, a iconografia paleocristã usou de fórmulas, temas e estilos pictórios greco- romanos para a representação de personagens divinas, como o exemplo do Cristo filósofo/pedagogo e do Bom Pastor, assim como também assimilou símbolos que foram dotados de significados cristãos, de maneira que Matthews estava certo em apontar a natureza híbrida e polimórfica desta cultura visual tardio-antiga. E essa perspectiva se torna ainda mais interessante se nos atentarmos para o período histórico em que as primeiras imagens apareceram; no século III os cristãos passaram por momentos de violentas perseguições, populares e estatais, então considerar que o povo perseguido não tinha interesse em representar seu deus com atributos do seu algoz é um caminho bastante viável. Já o século IV marca o patrocínio imperial e a “batalha” pública pela legitimação de Cristo como senhor absoluto, motivos satisfatórios para acampar tentativas de mostrá-lo como mais poderoso que qualquer outra divindade.

Contudo, pensamos que a concepção anti-imperial de Thomas Matthwes (1999) não é suficiente para sustentar a ideia de impotência da arte imperial de influenciar as produções cristãs, ainda que seu trabalho tenha sido importante para fomentar análises imagéticas diferenciadas. Como vimos no tópico anterior, houve mudanças nítidas nas formas imagéticas de Jesus e de personagens cristãs que estão articuladas ao contexto “triunfal” que o cristianismo acreditava ter alcançado, de maneira que Jesus passou a figurar não só com aparência mais madura mas em posição de destaque, em trono, com elementos divinizados, e em situações que remetiam a seu poder, como nas imagens da Traditio Legis.

Outro fator relevante nesta discussão é o fato de que a magia foi bastante difamada pelos cristãos antigos. De acordo com Lee M. Jefferson (2018, p. 319), os próprios Padres da Igreja, como Agostinho e Crisóstomo, foram terminantemente contra qualquer representação de Jesus como mago e defenderam o banimento das práticas de magia, mesmo sendo elas persistentes entre os conversos. Jefferson, então, ressalta que o uso da vara nas imagens de Cristo pode estar vinculado a Moisés, outra personagem bíblica muito importante. Em dois momentos da história judaica, na travessia do Mar Vermelho (Ex. 14: 15-31) e na ocasião em que água é retirada de uma rocha para dar de beber ao povo no deserto (Nm. 20: 1-13), Moisés usa uma vara para realizar a ordem divina. Assim, o uso do objeto, segundo Jefferson, demonstra a tentativa de representar Jesus com um atributo familiar para mostrá-lo não só como

um milagreiro poderoso mas como um cumprimento profético, ou seja, mais uma tentativa de dar unidade aos Testamentos.

Por outro lado, não podemos negar que os vários exemplares que apresentam milagres messiânicos atestam o desejo de referenciar a intervenção de Deus e a capacidade taumatúrgica de Jesus, tendo em vista que, em termos religiosos, um milagre seria um evento tutelado pelo divino. Além disso, essas imagens foram confeccionadas em catacumbas, lembrando os espectadores que Jesus era eficaz tanto nas curas terrenas, no mundo físico, como na provisão da vida eterna. O poder curador de Cristo era promovido nessas composições ao passo que elas também revelavam a importância da fé do cristão. Exemplo disso é a mulher hemorroíssa que é curada tocando em Jesus, enquanto ele a diz “Filha, tua fé de curou” (Mc. 5: 25-34) (A16).

Dessa forma, de muitas maneiras pode-se compreender a tese de Thomas Matthews (1999) de que houve uma busca por representar Jesus com atributos tão poderosos quanto os outros deuses, porém, consideramos que, se os cristãos foram visualmente orientados a este ponto, também o foram para conceber Cristo com atributos próprios da maior autoridade de seu mundo, o imperador. Cabe notar, ainda, que essa aproximação foi promovida, inclusive, pela iniciativa imperial que cunhou e disseminou um símbolo próprio de identificação, o chi rho, e investiu na construção e ornamentação de basílicas. Assim, entendemos que os cristãos retrataram seu deus com uma variedade de influências, incluindo aquelas do Império no qual estavam imersos. Em nossa opinião, tais condições evidenciam a vitalidade das práticas sociais, das tradições culturais e da capacidade delas de se articularem às mudanças religiosas.

A primitiva iconografia cristã exprimiu, direta ou indiretamente, a exegese bíblica, mas a compreensão das imagens e o próprio uso delas não se deveu somente a isso. Mesmo em composições que refletiam momentos testamentários, os gostos e costumes populares atuaram tanto na produção como na identificação dos elementos, como no caso do “grande peixe” na história de Jonas e na clássica posição de descanso do Profeta. Além disso, a compreensão dos textos veterotestamentários como profecias que se realizaram com a vida e a morte de Jesus, nos alertam sobre as abordagens multifacetadas, nas quais se estabelecia um diálogo entre os livros, em acordo com a definição de uma continuidade histórica da crença cristã.

Desse modo, a exegese textual não se restringiu a uma leitura única e adquiriu sentido por meio da linguagem iconográfica pela qual foi representada. As identificações sociais que se processavam na interpretação dessas imagens não só tratavam sobre as origens cristãs, como também sobre as articulações necessárias para administrar as mudanças e para reivindicar uma continuidade. Como enfatiza Stuart Hall (1990), em um ensaio no qual analisa os processos de autenticação de uma identidade por meio da promoção de um passado supostamente comum,

todo sujeito que fala o faz, sempre, a partir de sua posição social e do seu contexto cultural. Isso não significa que este sujeito irá reivindicar designadamente as mesmas origens que seus antepassados, mas que, ao reivindicar um passado histórico para legitimar algo no presente, a identidade inerente é reconstruída e, assim, passa por constantes transformações. Nesse sentido, como ressalta Hall, as identidades sociais são fluídas e, portanto, é uma “questão tanto de ‘tornar-se’ quanto de ‘ser’” (1990, p. 225), e isso implica na participação ativa dos sujeitos históricos, que seriam capazes de posicionarem-se e de reconstruir e transformar identidades herdadas do passado reclamado.

No contexto cristão tardio-antigo, as imagens que demandavam a origem judaica não funcionavam apenas para legitimar que Jesus era o Messias prometido, e assim sustentar uma explicação histórica para a crença, mas para explicitar, principalmente, que não só a encarnação e a ressurreição de Cristo havia instituído uma continuidade como isso estava diretamente vinculado ao estabelecimento de uma diferenciação entre os cristãos e os “outros”. Como afirma Paul Veyne (2010, p. 43), diferente das deidades greco-romanas, Jesus foi “real” e humano. Era preciso para os cristãos afirmar que eles veneravam o Deus verdadeiro que conviveu em matéria com o seu povo e, assim, estabelecer uma alteridade fulcral com o culto politeísta.

Mas a construção de identidades é um empreendimento tão social quanto simbólico e tem causas e implicações materiais. Nesse ínterim, a época em que imagens de Cristo com características imperiais começam a aparecer é também o período de agraciamento político do cristianismo e significou, como vimos, maior capacidade cristã de demarcar posição na disputa por símbolos de poder, por gozar de patrocínio político e financeiro para tal. As catacumbas foram, então, marcadas por imagens produzidas por ordens dos clérigos, que passaram a participar mais ativamente da produção iconográfica demarcando os túmulos dos mártires como locais de peregrinação, e assim fomentaram a identificação de tais personagens com o “triunfo” cristão.

Como argumenta Jas Elsner (2003), após a conversão de Constantino, o cristianismo, por meio de seus fiéis e clérigos, foi traçando sua própria memória no espaço urbano romano, para a qual teve de desenvolver uma espécie de equilíbrio entre a tradição histórica de Roma e a nova religião. Mas a cidade, tendo sido sede de um bispo e mártir que reivindicou a preeminência da cristandade, tinha um passado essencialmente pagão. No esforço de dotar o espaço romano de epifanias cristãs, as melhores reivindicações estavam “nos ossos daqueles cuja passagem para a santidade tinha sido ajudada pelos carrascos da cidade” (ELSNER, 2003,

p. 78) e, portanto, a história cristã foi reclamada na figura dos mártires e dos santos, de maneira que a exaltação de suas narrativas foi usada para a legitimação do tempo cristão.

Ser cristão era fazer parte de uma comunidade que se estendia para além do abismo entre céu e terra; a igreja terrena vivia na companhia da celeste. Tal relação fazia-se cotidianamente reforçada na eucaristia e promovida na proximidade com os santos e mártires, que exerciam o papel de mediadores e de representantes das comunidades, em razão de terem sido aqueles que, a exemplo do Messias, deram a vida pelo bem comum. O mártir foi compreendido como o símbolo da vitória, do triunfo sobre a morte e sobre a perseguição dos incrédulos, como bem argumenta Robert A. Markus (1997).

Nos séculos III e IV os clérigos potencializaram as honrarias aos mártires celebrando as datas de nascimento ou de martírio junto aos túmulos; a idade das perseguições, o ante

pacem, era concebida como uma época heróica, da qual a Igreja era herdeira e representante,

de maneira que esse passado foi mantido vivo e renovado nas novas condições sociais do cristianismo. Eusébio de Cesareia deu voz a isso quando escreveu, depois de mais de vinte anos do reinado de Constantino: “Nós, embora não tenhamos sido dignos de lutar [agonozasthai] até a morte e derramar nosso sangue por Deus, todavia, sendo filhos dos que assim sofreram e se distinguiram [semnumenoi] pelas virtudes de nossos pais, rogamos por misericórdia através deles” (apud MARKUS, 1997, p. 98).

Percebe-se, através deste excerto, que Eusébio entendia que todos os cristãos, mesmo aqueles que gozavam do Tempora Christiana, estavam unidos pela luta e pelos sacrifícios da geração anterior e que os martirizados detinham virtudes suficientes para servirem como intercessores, concepção que foi compartilhada por vários outros exegetas, como Agostinho44. Assim, as imagens de Pedro e Paulo junto a Cristo no sarcófago de Junius Bassus, bem como a Figura 13, na qual quatro outros mártires são retratados, nos servem como exemplos dessa busca por vincular Jesus a essas personagens e, por consequência, à Igreja. Os túmulos dos mártires foram celebrados como lugares nos quais o divino e o terreno se encontravam e, portanto, onde o passado e o presente da Igreja se congraçavam, constituindo-se como espaços sacralizados devido ao restos mortais dos que se sacrificaram no mistério da fé e possibilitaram a continuidade da trajetória cristã. Por conseguinte, o que estava em questão na promoção do culto a essas personalidades era a unidade histórica da Igreja que implicava na identificação social da comunidade.

44 Agostinho, inclusive, falou sobre o poder e atuação dos mártires, dando como exemplo Estêvão, quando

escreveu: “Mas ele não nos estaria visitando a nós morto, se na morte ele não estivesse vivo. [...] Os dons misericordiosos concedidos mediante eles são manifestos” (apud MARKUS, 1997, p. 101).

Nesse ínterim, não só os sepulcros constituíam-se como mídias externalizadas dessa história, como as imagens neles confeccionadas também tinham um desempenho memorativo, tendo em vista que elas serviam à comunicação e, portanto, articulavam-se interativamente com a construção de memórias coletivas expressadas num discurso visual. Afinal, como nos informa Aleida Assmann (2011), em nível social a memória é uma questão de comunicação e interação, e é transmitida por mídias. Nesse sentido, as imagens dos mártires e dos santos, nesses ambientes, podem ser entendidas sobre, pelo menos, duas perspectivas: primeiro, atestavam o avanço do culto que, por sua vez, apresentava esses indivíduos como promotores celestes da aproximação entre o divino e o humano, e intermediários entre a igreja do Ante Pacem e aquela do Tempora Christiana. E em segundo, assessoravam o processo de compreensão da morte, tendo em vista que os mártires representados, ao se sacrificarem, tinham dado testemunho da firmeza da fé e das graças de uma vida eterna plena e santa, e desse modo, tornaram-se excelentes mediadores entre os que partiam e os que ficavam em busca de salvação.

Em espaços como as catacumbas, nos quais a finitude da vida era essencialmente recordada, as imagens funcionavam como instrumentos para a legitimação das memórias cristãs, retrospectivas e prospectivas, pois consideramos que tais memórias imagéticas são tão “formadoras” do espaço quanto “estimuladoras” de sua manutenção. As catacumbas eram ambientes construídos, justamente, para o trato com os mortos e abrigaram uma miríade de ritos que tinham por fundamento a recordação. Elas próprias eram espaços que corporificavam memórias e as cruzavam entre indivíduos, religiões e épocas. Nesse ínterim, as composições imagéticas confeccionadas eram meios de celebrar os falecidos, honrando seus nomes e feitos oferecendo-os um ambiente confortável na última morada terrena, mas não só.

Elas eram mídias de memória. Esta compreensão é concebida por nós de acordo com a concepção de Aleida Assmann (2011) de que a memória cultural é formada a partir de pontos fixos do passado, guardados em formas simbólicas e exteriorizados em diversos meios, como escritos, festas, lugares. Isso não significa que todo o passado será preservado num pote hermético de onde nada escapa, mas que a memória cultural se alimenta do passado como lembrado, na medida em que este pode ser tomado como “nosso”. As imagens aqui analisadas atestavam uma consciência cristã e, em nosso parecer, adquiriram funções e propriedades da memória cultural porque estavam articuladas a um conceito de identidade.

Logo, se os cristãos eram capazes de construir um significado social de sua tradição religiosa e de seu tempo histórico, e na medida em que essa construção se dava por meio de processos comunicativos, as imagens serviam como mídias de identificação social, oneradas de sentidos e recordações, e portanto, como suportes privilegiados de memória cultural. “Tornar-

se” cristão, como vimos, não significou desfazer-se de todas as outras áreas da vida que não se relacionavam diretamente com a religião, em outras palavras, não significou deixar de participar dos banquetes fúnebres ou de produzir materiais visuais, por exemplo, mas reivindicar essas práticas e as executar com propósitos cristãos. As imagens, assim como seus motivos e significados, foram condicionadas a quadros sociais identitários, e por isso, em nossa concepção, se caracterizam em três tipos de relação: articulam-se ao espaço e ao tempo; vinculam-se essencialmente ao grupo religioso; e inserem-se em uma contiguidade histórica.

A memória cultural, como nos assinala Jan Assmann (2011), depende de seus portadores, quem quer que a compartilhe, por mídias ou discursos, demonstra sua participação no grupo e em razão disso é ligado não só a elementos temporais e espaciais, mas também a uma identidade. Esses elementos junto às formas de comunicação dentro do grupo operam em um contexto tomado por valores e emoções que, articulados, criam significados fundamentais para a comunidade. Quando tais significados são concebidos nas imagens, uma mídia de memória, elas passam a ser instrumentos de expressão identitária que reproduzem uma história, uma posição cultural e definem continuidade.

No cenário cristão, essas imagens aludiam às experiências passadas, mas também à possibilidades futuras. As composições que referenciavam narrativas bíblicas, como aquelas de Jonas e de Lázaro, serviam como núcleos de lembrança do mistério da morte e de como este processo podia transcender a ordem biológica. O visitante da tumba podia entender a narrativa ali ilustrada como uma lembrança da necessidade da fé e da busca incessante pela salvação. Deste modo, as imagens acabavam por estimular a memória dos falecidos, assim como estimulavam à fidelidade a Deus, afinal, a morte chegaria para todos, mas a vida eterna estava em questão.

Assim, essas imagens operavam, simultaneamente, em duas direções. Iam para trás e para a frente. Referenciavam o passado diversas vezes quando representavam símbolos e motivos ressignificados do meio artístico greco-romano, ou quando remetiam às origens judaicas naquelas composições de narrativas bíblicas, que tomavam os textos como profecias somente realizadas com a vida e morte de Cristo. E referiam-se ao porvir, em nível individual, quando aludiam à esperanças de salvação e, em nível coletivo, quando mostravam atributos de Jesus que o divinizavam e o apresentavam como autoridade máxima e imperiosa.

Desse modo, nossa compreensão fundamenta-se nas ambivalências irredutíveis de nossas fontes, pois elas tanto corporificam memórias de suas origens religiosas, o que nos auxilia na compreensão dos cristãos como um grupo sociocultural em um tempo e espaço

histórico determinados, como emitem uma força memorativa sobre as práticas religiosas que se preocupavam com a recordação individual e com a salvação das almas.

Por fim, podemos perceber, através dessas imagens, um investimento em posições de identidade por parte dos cristãos e, por isso, observamos nelas traços da construção dessas identificações e das características relacionais e conflituosas inerentes a este processo. Os cristãos viveram em um contexto social no qual a cultura e a religião deram sentido às experiências com as quais eles se identificavam, mesmo em graus diversos, pois os significados construídos por esses discursos foram eficazes para lhes recrutarem como sujeitos. A lógica volátil da interabilidade cultural entre cristãos, judeus e politeístas foi o dilema com o qual o cristianismo teve de lidar e, em nossa compreensão, o uso de imagens produzidas pelos próprios fiéis convertidos evidenciou a dinâmica das assimilações e das experiências sociais, de maneira que essas imagens não se configuravam, essencialmente, como um retorno às origens, mas como uma negociação das rotas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As três experiências religiosas observadas neste trabalho são, sobretudo, religiões marcadas pela pluralidade, de tal forma que não podemos conceber que “o” politeísmo greco- romano, “o” judaísmo e “o” cristianismo existiram enquanto formas religiosas e culturais autônomas, blocos monolíticos que não interagiam entre si, mas sim categorias que se desenvolviam por meio da dinamização e da fluidez de suas interações, ao longo dos espaços geográfico e sociocultural. A lógica dialética destas interações atuou, portanto, nas formas de assimilação, exclusão, adaptação e conflito que regeram os encontros entre tradições religiosas