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Capítulo 2 – Instituições Financeiras Internacionais e a

2.2 POLÍTICA DE SANEAMENTO NO BRASIL E INSTITUIÇÕES

2.2.1 As Influências das IFI na Política de Saneamento do Brasil

A influência de organizações internacionais na definição de políticas de saneamento no Brasil é das mais ponderáveis. Por outro lado, o alinhamento do governo brasileiro ao ideário dessas organizações demonstra o fiel e firme engajamento das elites nacionais na construção de um país cuja soberania é fragilizada e a economia é subordinada aos ditames e necessidades do capitalismo.

Já no início do século XX, a Fundação Rockfeller, entidade americana voltada para questões de saúde pública, forneceu apoio técnico e econômico para o combate às endemias rurais da malária e ancilostomíase que representavam obstáculos para as atividades econômicas. Sua atuação começou em São Paulo e, posteriormente, se estendeu para outros estados brasileiros, após assinatura de contrato de cooperação com governos estaduais. Essa atuação foi iniciada justamente no momento em que o Governo Federal passou a se

responsabilizar pelas ações de saneamento em nível nacional, fruto das ações desenvolvidas no âmbito da Liga Pró-saneamento (REZENDE, 2000).

A Fundação Rockfeller foi fundada em 1909 com o objetivo de resolver os problemas de saúde pública do Sul dos Estados Unidos de forma a tirá-lo do atraso econômico. Para isso, era necessário realizar a melhoria das condições sanitárias em que viviam os trabalhadores, de forma a aumentar a produtividade dos setores agrícola e industrial. Com o sucesso de seus trabalhos, a Fundação ampliou o seu raio de ação para a América Latina e, conseqüentemente, para o Brasil. Segundo Rezende (2000), as campanhas da Fundação Rockfeller visavam consolidar os Estados Unidos no mercado financeiro e industrial internacional e influenciar as instituições econômicas e políticas dos países anfitriões. Pretendia-se, ainda, ampliar os mercados para a comercialização dos produtos norte-americanos. Para Brown (apud RESENDE, 2000, p. 87), “eles favoreciam grandemente o controle político e econômico e o lucro das nações capitalistas européias e dos Estados Unidos, eles eram forças maléficas que trabalhavam em detrimento das populações que eles ostensivamente estavam ajudando”.

Em 1913, foi fundada a Comissão Internacional que também atuava no âmbito da saúde pública. Para Brown (apud REZENDE, 2000), essa Comissão pretendia aumentar a produtividade do trabalho em países em desenvolvimento; amenizar a hostilidade aos Estados Unidos; reduzir a autonomia cultural das populações rurais com vistas a torná-las submissas, preparando-a para tornarem-se força de trabalho industrial; e minar com a independência política e econômica.

A Fundação Rockfeller influenciou o movimento sanitarista brasileiro não só por meio da atuação direta de seus técnicos no Brasil, mas também por meio da capacitação de técnicos nas escolas de saúde pública dos Estados Unidos e no Curso de Saúde Pública criado no Brasil (REZENDE, 2000). Embora o País já contasse com centros de pesquisa no campo da saúde pública e a problemática do saneamento já era uma questão nacional, mobilizando diversos setores da sociedade e obrigando o Governo Federal a adotar políticas públicas de cunho sanitário, não se pode minimizar, no entanto, as influências da Fundação Rockfeller nas questões de saúde pública no Brasil, que, apesar do ideário colonizador, contribuiu para a melhoria da saúde pública naquele período.

A criação do Serviço Especial de Saúde Pública (SESP), em 1942, é outro episódio que evidencia a influência de organismos internacionais no Brasil no campo do saneamento. Pretendia-se criar condições para a integração do País ao modelo de desenvolvimento pautado em uma economia de mercado subalterna, produtora de matéria prima e consumidora de produtos industrializados da metrópole. Esse serviço foi criado como recomendação da 3ª.

Reunião de Consulta de Ministérios das Repúblicas Americanas, realizada no Rio de Janeiro, em 1942, que estabelecia a criação de um programa de saúde e saneamento das Repúblicas Sul Americanas, que contaria com auxílio técnico e financeiro dos Estados Unidos (PEÇANHA apud REZENDE e HELLER, 2002). Segundo Rezende e Heller (2002), a verdadeira razão para essa cooperação era a demanda por recursos minerais e vegetais, após a Segunda Guerra Mundial. Interessava aos Estados Unidos as fontes produtoras do Vale do Amazonas, do Estado de Goiás e do Vale do Rio Doce, o que conduziu ao acordo de cooperação deste país com o Brasil, com a criação do Instituto de Assuntos Interamericanos (IAIA), onde o SESP ficou subordinado.

O SESP, que contou com a participação de profissionais da Fundação Rockfeller, tinha um caráter provisório e voltava-se para o atendimento dos interesses dos Estados Unidos durante a guerra (REZENDE e HELLER, 2002). Em 1950, o SESP assumiu um caráter mais nacionalista e em 1960 o convênio com os Estados Unidos expira e este serviço passa a ser chamado de Fundação SESP (FSESP), ligada ao Ministério da Saúde. Posteriormente, em 1991, passa por uma fusão com a Superintendência de Campanhas de Saúde Pública (SUCAM), dando origem a Fundação Nacional de Saúde como até hoje é chamada.

Os Estados Unidos, através do SESP, influenciaram fortemente a engenharia sanitária brasileira. O primeiro curso de pós-graduação em engenharia sanitária foi realizado nos Estados Unidos e seus recursos contribuíram para que, em 1949, a Faculdade de Higiene e Saúde Pública de São Paulo criasse o primeiro curso de pós-graduação em Engenharia Sanitária no Brasil (REZENDE, 2000). Assim, a atuação da engenharia sanitária brasileira tem forte influência americana, tanto no uso de tecnologias convencionais, como no uso de quimioterápicos e biocidas para controle de vetores.

A atuação do BID no financiamento do saneamento no Brasil data da década de 1960. Em 1966, essa instituição destinou recursos para as autarquias municipais, ligadas a FSESP, responsáveis pelas ações de saneamento em nível local. A criação, em 1959, da Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) ampliou de forma significativa os empréstimos externos, via BID, para ações de saneamento (REZENDE, 2000). A partir desse momento começa a ser concebida, no âmbito da SUDENE, DNOS e BID, uma mudança fundamental na gestão dos serviços de saneamento no Brasil. O modelo da administração via empresas de economia mista e autarquias passou a ser encarado como mais viável e flexível que a administração direta dos serviços; além disso, a autonomia dos mesmos possibilitava a contração de financiamentos externos que eram captados pelo Banco Nacional de Habitação (BNH) (MERCEDES, 2002). É nesse momento que começa a ser

implementada no setor saneamento a lógica financeira, do retorno do capital investido. O saneamento passa a ser encarado como um serviço que deve ser auto-sustentável, via cobrança de tarifa, modelo que vai se consolidar com o Plano Nacional de Saneamento (PLANASA).

Nesse momento, inicia-se o esvaziamento das ações de saneamento no âmbito do Ministério da Saúde e, conseqüentemente, da FSESP, que passa a contar com parcos recursos (REZENDE e HELLER, 2002; MERCEDES, 2002). Essa estratégia colocou como única alternativa para o setor a consolidação do modelo via autarquias e empresas de economia mistas que deveriam ser geridas sob a lógica do retorno do investimento. Os processos de urbanização e industrialização que o País passou a vivenciar na década de 50, justificam a adequação do modelo de gestão e a “modernização” do setor saneamento.

Assim, já na década de 50, diversos programas de financiamento previam o retorno do investimento via tarifa. Os Serviços Autônomos de Água e Esgoto (SAAE) foram os precursores na implantação desse modelo. Rezende e Heller (2002), resgatando as idéias da época, observam que, naquele momento, defendia-se que “toda a água consumida deveria ser paga”, sendo que, os pobres deveriam pagar taxa mínima para que pudessem utilizar água suficiente para a higiene e nutrição. Segundo Mercedes (2002), o modelo dos SAAE diferenciava-se da concepção anterior quando o saneamento estava mais ligado ao setor saúde, uma vez que se estruturava em torno da receita tarifária, “passando a distinguir-se de outras políticas sociais como educação e saúde” (ibid., p. 145).

Essas transformações do setor saneamento têm fortes influências dos organismos internacionais que, naquele momento, passaram a financiar os projetos de infra-estrutura. A partir de 1960, ocorre um ingresso maciço de capital estrangeiro no Brasil, situação que vai se ampliar na década de 70, com o modelo desenvolvimentista que conduziu o País ao chamado

milagre econômico. Já em 1960, o BID estimula a formação das empresas de economia mista, tendo nas cláusulas contratuais de financiamento, exigências quanto “à descrição das responsabilidades, autonomia administrativa, autoridade para impor a tarifação, arrecadação e legislação por parte das contratantes” (REZENDE e HELLER 2002, p. 210). Em 1966, o BID firma contrato com a FSESP para realizar o “Programa de Pequenas Comunidades”, o qual previa a auto-sustentação via tarifa e o desenvolvimento de tecnologias apropriadas. No final da década de 60 e início de 70, essa instituição passou a condicionar seus empréstimos à transferência da concessão dos serviços de saneamento dos municípios para as empresas estaduais de economia mista. Em face dessa imposição dos agentes financiadores, os municípios passam a transferir os seus serviços para as companhias estaduais de saneamento

básico, transferência esta facilitada pelo regime militar (REZENDE e HELLER, 2002). Os municípios que não aderiram são marginalizados, não sendo contemplados com financiamentos para seus serviços. Segundo Costa (1998), a exclusão dos serviços municipais do acesso aos recursos do Sistema Financeiro de Saneamento (SFS), era necessária para viabilizar o PLANASA, uma vez que a auto-sustentação financeira era o eixo do modelo. Segundo o autor, as sugestões para que as tarifas cobrissem os custos de operação, manutenção e amortização dos empréstimos foi feita pelo BID, nos anos 60.

Em 1967, já com o modelo das empresas de economia mista, o BNH foi criado com o objetivo de promover e controlar a política de saneamento no Brasil, o que provocou o esvaziamento do Departamento Nacional de Obras de Saneamento (DNOS), Departamento Nacional de Engenharia Rural (DNERu) e Fundação dos Serviços Especiais de Saúde Pública (FSESP). A estrutura básica desse banco estava alinhada com a política internacional (REZENDE e HELLER, 2002; MERCEDES, 2002). Nesse mesmo ano, foi criado o Conselho Nacional de Saneamento (CONSANE), com o objetivo de formular a política nacional para o setor, em consonância com o setor saúde. O Ministério do Interior (MINTER) e o da Saúde seriam os executores da Política. No entanto, esse Conselho nunca funcionou e a política ficou a cargo do MINTER e BNH. Em 1968, foi criado o Sistema Financeiro de Saneamento (SFS), que passou a utilizar os recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para realizar ações de saneamento (MERCEDES, 2002).

O modelo de gestão via companhias estaduais começa a ser consolidado. O Governo Federal condiciona a concessão de empréstimos com recursos provenientes do FGTS e de organismos internacionais, como o BID e o Banco Mundial, à existência da companhia estadual. Com esse mecanismo, pôde-se ampliar o raio de ação das companhias em todo o território brasileiro (COSTA, 1998; REZENDE e HELLER, 2002; MERCEDES, 2002).

Na década de 70, o governo militar, apoiado pelos Estados Unidos, conduziu a centralização das políticas no Governo Federal. As estabilidades econômica e política obtidas por forte repressão militar, proporcionaram um ambiente atraente e seguro para a entrada de capital estrangeiro. Rezende e Heller (2002), citando Vicentino e Dorico (1997), observam: “chegando em grande volume, o capital estrangeiro era repartido entre empresas privadas brasileiras, multinacionais e estatais, com cada setor especializando-se num ramo de atividade industrial” (ibid., p. 226).

Nesse momento, o saneamento é visto como uma atividade empresarial, passível de ser conduzida sob a lógica do retorno do investimento via tarifa, considerado necessário para dotar as cidades de infra-estrutura sanitária e fundamental para o processo de urbanização, o

qual que exigia um ambiente favorável ao novo ciclo de desenvolvimento do Brasil, pautado no crescimento econômico. No entanto, o modelo de desenvolvimento excluiu cidades e regiões, contribuindo para a geração de um grande êxodo rural que conduziu a um crescimento populacional urbano acelerado, cujas políticas implementadas não foram suficientes para atender a demanda crescente por serviços urbanos no País. Os interesses econômicos do capital internacional voltavam-se, naquele momento, para a construção de um parque industrial, principalmente na Região Sudeste, o que fez canalizar os investimentos em infra-estrutura para esta região. Essa prioridade fez elevar a cobertura de serviços urbanos, inclusive os de saneamento, nessas regiões (BORJA e outros, 1998; MERCEDES, 2002).

Em 1971, o Plano Nacional de Saneamento (PLANASA) é criado e o País passa a contar com uma política de saneamento centralizada no Governo Federal e executada em nível estadual pelas Companhias Estaduais de Água e Esgoto. Rezende e Heller (2002), observam que o período do auge do PLANASA (1975-1983) “[...] ficou conhecido pelas ampliações dos investimentos em saneamento básico [...] tendo havido um aumento nas atividades de financiamento por parte do Banco Mundial para execução de projetos urbanos” (ibid., p. 239),

O PLANASA privilegiou as ações de abastecimento de água e esgotamento sanitário, principalmente de áreas urbanas, para fazer frente à ampla industrialização do País e a conseqüente urbanização. Por meio de concessões dos municípios, a execução da política coube às Companhias Estaduais, que eram financiadas com recursos do BNH e de cada estado. Seguindo a lógica da auto-sustentação, o retorno do capital investido deveria vir por meio da cobrança de tarifas. Os municípios que não aderiram ao PLANASA foram excluídos do acesso aos recursos do SFS. Muitos desses municípios constituíram Serviços Autônomos de Água e Esgoto (SAAE) ou eram atendidos pela FSESP.

Apesar dos avanços na cobertura da população com serviços de abastecimento de água, principalmente nas áreas urbanas, e dos pequenos avanços no campo do esgotamento sanitário, o modelo PLANASA não se consolidou do ponto de vista administrativo e econômico-financeiro. Após duas décadas, a rígida política centralizada no Governo Federal e sob o comando das Companhias Estaduais não correspondeu às expectativas devido às deseconomias geradas, aos desacertos políticos e administrativos. Inclusive, tal política não proporcionou o atendimento das metas estabelecidas (cobertura de 90% da população em água e 65% em esgoto, no ano de 1990). Além disso, a noção de saneamento foi restringida para as ações de abastecimento de água e esgotamento sanitário, sendo negligenciadas as de limpeza pública, manejo de resíduos sólidos e de drenagem das águas pluviais, que ficaram a

cargo dos municípios, proporcionando um déficit grave de cobertura da população com estes serviços, em função da carência de recursos (BORJA e outros, 1998).

A recessão econômica, o endividamento externo, o declínio dos recursos do FGTS em face do desemprego e as mudanças de perspectivas do papel do Estado no campo das políticas públicas e sociais, conduziram à retração dos investimentos na chamada década perdida – anos 80 (BORJA e ELBACHÁ, 1995; MERCEDES, 2002). A partir daí, as Companhias Estaduais passam a conviver com uma crise financeira, ampliada com as dívidas acumuladas. O modelo se mostrou incapaz de promover a expansão dos serviços a toda a população. Com a extinção do BNH, em 1986, o PLANASA entra em colapso.

O vazio institucional e a carência de recursos para ampliar os níveis de cobertura, aliado à redemocratização do País, proporcionou a abertura do debate em torno da política de saneamento em vários segmentos da sociedade. Foi nesse ambiente que emergiu o Projeto de Lei n. 199/93, que buscava instituir a Política Nacional de Saneamento, segundo os princípios da descentralização, ações integradas (água, esgoto, lixo e drenagem) e controle social (BRASIL, 1993). Tal projeto, apesar de ter sido aprovado pelo Congresso Nacional, foi vetado integralmente pelo então Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, em detrimento de outro projeto que começava a ser esboçado em torno do Projeto de Modernização do Setor de Saneamento (PMSS), financiado pelo Banco Mundial e coordenado pelo Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicadas (IPEA) (BORJA e outros, 1998).

Nesse período, modificações profundas ocorrem no âmbito econômico e político global. O milagre brasileiro começa a se findar, no rastro da crise do capitalismo mundial em 1973. O Brasil entra numa crise econômica profunda que vai se estender até a década de 80, quando ocorre a redução dos gastos sociais e a ampliação da pobreza no País. Por outro lado, a nação brasileira, submetida há duas décadas à ditadura militar, passa a clamar pela abertura democrática num País esfacelado pela crise econômica. As influências internacionais da construção de uma democracia liberal na América Latina, aliado às pressões internas, influenciam o governo brasileiro a iniciar o processo de redemocratização do País, que naquele momento, não foi capaz de renovar o quadro político brasileiro, marcado pela influência de oligarquias regionais e pelo coronelismo clientelista.

Novas diretrizes econômicas e políticas passam a serem gestadas e o papel do Estado nas políticas públicas passa a ser modificado. Os ideais neoliberais começam a ser disseminados no Brasil do Governo José Sarney, eleito indiretamente pelo Congresso Nacional após a abertura política; são confirmados no governo de Fernando Collor de Melo, eleito diretamente pelo voto popular; são mantidos timidamente por Itamar Franco, levado ao

poder após o impeachment de Collor; e são completamente assumidos pelos dois governos de FHC.

O receituário neoliberal para os países em desenvolvimento, estabelecidos no Consenso de Washington, passa a ser fielmente cumprido pelo governo de FHC, dentre eles a contenção de gastos em políticas sociais, a modernização da administração pública e a privatização de estatais. Essa diretriz neoliberal vai influenciar dramaticamente o setor saneamento. Após a extinção do BNH, em 1996, a redução drástica dos investimentos faz emergir enfermidades antes erradicadas como o cólera, a febre amarela e a dengue. O setor passa a vivenciar o vazio institucional que perdura até hoje. A solução apontada pelos organismos internacionais e aceita pelo governo brasileiro é a privatização dos serviços. Diversas estratégias passam a ser adotadas pelo governo para estabelecer a nova regulação do setor, com vistas a dar maior segurança aos investidores internacionais ligados ao setor da água no mundo, a exemplo dos grupos Vivendi (ex-Générale des Eaux) e Suez (ex-Lyonnaise des Eaux).

Em 1992, o esfacelamento técnico-financeiro e administrativo das companhias de saneamento, produto também do esvaziamento da política de saneamento no País, fez com que o governo do Presidente FHC, seguindo orientações do Banco Mundial, concebesse e implantasse o Projeto de Modernização do Setor Saneamento (PMSS), de forma que fosse possível fazer um diagnóstico e propor diretrizes para a chamada “modernização” do setor (MORAES e BORJA, 2001). Tal projeto contou com recursos financeiros do Orçamento da União, da CEF, do BNDES e do Banco Mundial (BIRD) para financiar consultorias internacionais visando elaborar documentos que subsidiassem o Governo Federal na formulação de um marco regulatório para o setor, bem como para a reestruturação de algumas companhias estaduais (CORDEIRO, 2002). Para Costa (2003), a disseminação dos estudos do PMSS em vários seminários no País tinha por objetivo apresentar as “novas idéias-força que sintetizam a nova política” (ibid., p.58), sendo que esse processo buscava construir uma nova hegemonia para a política de saneamento proposta pelo Governo FHC. O gerenciamento do PMSS era feito por uma Unidade de Gerenciamento do Projeto (UGP), cujo coordenador para ser nomeado deveria receber o aval do Banco Mundial (ibid., p. 72).

O PMSS tinha como meta a privatização dos serviços de saneamento no Brasil, seguindo o ideário neoliberal, tendo a elaboração de novo arranjo jurídico-institucional como ponto fundamental (ASSEMAE, 1995 e COSTA, 2003). O objetivo do PMSS era promover a modernização do setor de saneamento no Brasil e a retomada dos investimentos na área. O projeto, agora Programa e em sua segunda fase, tem duas linhas de ação: Componente Institucional e Componente de Investimentos e Modernização. O Componente Institucional

visa desenvolver estudos aplicados para a reestruturação do setor saneamento, incluindo: a revisão dos atuais modelos institucionais e de financiamento do setor, com a definição de um novo modelo de regulação capaz de estimular um maior grau de competição entre agentes produtores das atividades de saneamento; o desenvolvimento dos instrumentos institucionais (jurídicos, administrativos e técnicos) e o provimento de equipamentos e consultorias técnicas necessárias à capacitação de um projeto de gerenciamento de demanda por serviços de saneamento e reabilitação dos sistemas existentes (MPO, 1995, p. 27).

A segunda linha de ação envolveu investimentos em três Companhias Estaduais de Água e Esgoto: a CASAN, de Santa Catarina; a EMBASA, da Bahia; e a SANESUL, do Mato Grosso. Em um no prazo máximo de cinco anos, o investimento objetivava dotar as companhias de condições técnico-financeiras, de forma que fosse assegurada “uma política saudável de financiamento”, buscando “induzir as empresas de saneamento a atuar em bases empresariais” (MPO, 1995, p. 28).

Os recursos previstos para o PMSS foram de US$ 500 milhões, sendo que US$ 250 milhões foram financiados pelo Banco Mundial e os outros US$ 250 milhões constituíram a contrapartida dos mutuários. No total, foram gastos US$ 488,8, sendo que a maior parte dos recursos foi investida nos componentes abastecimento de água, esgotamento sanitário e desenvolvimento institucional (Tabela 8).

Tabela 8 – Custos e Componentes do Projeto PMSS.

Componente do Projeto Valor estimado US$ milhões %

Fortalecimento Institucional 19,40 3,97

Abastecimento de água 165,30 33,82

Esgotamento sanitário 112,30 22,97

Desenvolvimento Institucional 102,30 20,93

Projetos 13,00 2,66

Sub-projetos (aceitos como contra-partida) 76,50 15,65

Total 488,80 100,00

Fonte: WORLD BANK, 2001.

Para Mercedes (2002), no escopo e diretrizes do PMSS se distinguem claramente as orientações de liberalização econômica que recomendavam as agências multilaterais. A série