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As metodologias participativas como veículo privilegiado para o Ensino mútuo

4. O International People’s College

4.2. Características do International People’s College

4.2.6. As metodologias participativas como veículo privilegiado para o Ensino mútuo

“O método pedagógico das Escolas Populares é completamente diferente *do modelo escolar tradicional]. É um diálogo entre o professor e o estudante … e, por vezes, o estudante é aquele que sabe mais (…) Definitivamente, as contribuições dos estudantes enriquecem o diálogo pedagógico. Para alguns estudantes isso é algo de muito diferente. Portanto, em vez do professor representar a autoridade, que sabe sempre mais, … nós tentamos encarar os estudantes olhos nos olhos, construir a partir das suas competências e trazê-las activamente para o diálogo na aula. Isso é importante!” (Laundbjerg, Anexo 3, p. 6).

Mais uma vez, a utilização de metodologias participativas parece ser o veículo privilegiado para a construção colectiva do currículo. Pelo que pude perceber, na maioria das apresentações realizadas pelos estudantes, a escolha do tema, dos conteúdos expostos ou da abordagem foi feita pelos próprios estudantes. Também nos trabalhos de projecto como os das aulas de Trabalho de Equipa ou de Gestão para o Desenvolvimento, ou como as Noites Culturais, partem da vontade dos estudantes. Enquanto os projectos desenvolvidos para a aula de Trabalho de Equipa primam pela diversidade de temas e abordagens seguidas (um grupo trabalhava na construção de um estendal da roupa, outro trabalhava uma estratégia de comunicação e um outro elaborava um filme), os trabalhos de “Gestão para o Desenvolvimento” espelhavam, e serviam inclusivamente, para a preparação de potenciais projectos a desenvolver pelos estudantes após o final do curso:

“ O objectivo deste grupo é criar uma ONG à imagem da organização de uma das alunas que faz parte do grupo: uma professora indiana (com cerca de 30 anos) que desenvolve paralelamente ao seu trabalho como professora (…), um projecto de integração das crianças das comunidades que foram forçadas a sair das florestas (onde viviam como povos indígenas) para viver na cidade. O projecto reflecte, portanto, estas problemáticas e abarca os objectivos que levaram a referida aluna a ingressar no IPC” (Anexo 1, p. 31).

As aulas de expressão dramática constituem, igualmente, um exemplo muito interessante: o grupo recebe do professor um esboço da cena que vai trabalhar. O esboço contém relativamente pouca informação e o grupo passa mais tempo a trabalhar o texto do que propriamente a ensaiar. Quando o professor voltou à sala ficou bastante surpreendido com a volta que os estudantes tinham dado à ideia inicial (Anexo 1, p. 43).

Ainda que não tenham sido muitas as aulas onde foi utilizado o registo mais tradicional, de exposição de conteúdos por parte do professor, notei que os professores procuravam muitas

vezes que os estudantes interviessem com histórias pessoais. Aquando da abordagem do Centro Pompidou na aula de Cultura Europeia, Kristof fez uma série de perguntas a uma estudante que viveu em Paris (Anexo 1, p.17). Da mesma forma, o professor de Estudos Africanos, recorreu aos estudantes Ganês e Nigeriano para contarem a sua experiência em relação à evolução da problemática da Sida nos respectivos países.

“Por ser uma situação muito repetida *o pedido de contribuições aqueles estudantes+, o professor chegou a pedir desculpa e a justificar-se por eles serem os únicos que podiam falar com um conhecimento mais aproximado da realidade” (Anexo 1, p. 18).

Tal como relatado no Diário de Campo, senti que algumas vezes foram abordados temas que seriam susceptíveis de maior discussão ou de intervenções mais vivas por parte dos estudantes.

Participei em pelo menos duas aulas onde o tema principal era a situação africana e onde foram abordadas questões como a circuncisão feminina, a SIDA ou a exploração dos recursos humanos e minerais. Confesso que, no momento, estranhei97 bastante o facto de os estudantes não terem manifestado as suas opiniões – uma vez que se tratavam de assuntos normalmente polémicos e vistos com algum sentido crítico, principalmente no Mundo Ocidental.

Coloquei esta questão ao Director da Escola, que enunciou duas ordens de razão para esta pouca participação.

A primeira vai para o princípio, enunciado por exemplo no Guia do Estudante, de distinguir opiniões de factos, evitando assim julgamentos de valor precipitados e parciais. Este princípio deverá estar presente nas aulas mas, sobretudo, nas relações diárias entre a comunidade escolar.

“Eu penso que é muito importante que, sempre que haja um diálogo intercultural, ambas as partes tentem não julgar, … e que tentes olhar para um problema com os olhos do outro. E se tu apenas julgas baseado na tua perspective política, religiosa ou qualquer que seja, então não é um verdadeiro diálogo. Eu penso, … eu espero que isso é algo que se constrói aqui. Que quando lhes é apresentado um problema, em vez de apenas julgarem a partir do seu ponto de vista, eles tentem compreender do que é que resulta este problema, porque é que surgiu este conflito, (…) Porque se olharmos sempre para os problemas apenas do nosso ponto de vista, então não vamos conseguir resolver qualquer problema” (Laundbjerg, Anexo 3, p. 6).

Em segundo lugar, existem ainda várias barreiras a uma participação mais activa dos estudantes, como a questão linguística – ou seja, os muito diferentes níveis de domínio da língua inglesa – ou no que concerne à própria maneira de ver a educação.

“Definitivamente a língua é um problema …, mas lidamos ainda com estudantes … provenientes de sistemas educativos muito diferentes, e por exemplo os estudantes japoneses, eles estão habituados a estar sentados em aulas muito grandes em que o ensino é uma

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Esta estranheza foi ainda reforçada pela minha experiência enquanto estudante da Licenciatura de Ciências da Educação. Na maioria das aulas em que participei, a pequena dimensão do grupo e abertura ao debate, conduzia a uma participação mais activa, e ao debate de opiniões, por parte dos estudantes.

comunicação de sentido único. O professor ensina algo, dá-te a verdade … e tu tomas notas e memoriza-la” (Laundbjerg, Anexo 3, p. 6).

Pude presenciar um dos exemplos mais significativos desta diferença de atitudes quando participei na aula de “Desenvolvimento Espiritual”. Antes de mostrar um filme com uma duração considerável (cerca de 60 minutos), o professor recomendou que nos sentássemos de uma forma confortável e, informalmente, avisou que seria normal sentirmos sono durante a exibição do filme. Fui observando o comportamento dos estudantes e reparei que enquanto a grande maioria se deitou ou sentou de forma mais relaxada, os estudantes orientais mantiveram a sua postura mais “formal” e rígida (Anexo 1, p. 50).

Na conversa estabelecida com Søren, este reforçou ainda a ideia das diferentes maneiras de viver o fenómeno educativo, referindo-se inclusivamente à liberdade de expressão:

“Alguns estudantes vêm de países onde não podes dar a tua opinião … e para alguns deles, é preciso tempo apenas para se habituarem ao facto de que este é um espaço “neutro” onde podes expressar a tua opinião” (Laundbjerg, Anexo 3, p. 7).

Voltando à aula de “Cultura Europeia”, o professor tentou lançar o debate perguntando se os estudantes gostariam ou não de ter o Centro Pompidou na sua cidade. As opiniões seguiram por ambos os sentidos, e o professor não corrigiu nem tomou partidos, mas tentou sempre perceber os porquês de cada opinião (Anexo1, p. 17).