• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO III – A Comunidade e a Escola

5. As Parcerias e a Comunidade

Sendo a escola uma “instituição central do processo de desenvolvimento comunitário” tal só se pode concretizar “convenientemente por via do estabelecimento de relações de parceria com outras entidades presentes nas comunidades territoriais” (Despacho normativo n.º55/2008). Importa, assim, esclarecer como se desenvolveu o conceito de parceria no contexto educativo. Começaremos por fazer uma breve referência à sua expansão fora de Portugal para posteriormente analisarmos o nosso contexto educativo. De seguida procuraremos abordar as questões que surgem na implementação das parcerias, nomeadamente as suas vantagens e desvantagens.

Em 1990, na Declaração Mundial sobre “Educação para Todos” de Jomtien, reconhece-se que as autoridades nacionais ou locais tem a obrigação de providenciar a educação para todos, sendo tal uma tarefa difícil de concretizar. Evidencia-se, assim, a necessidade das parcerias a vários níveis: parcerias entre subsectores da educação; entre educação e outros departamentos governamentais, como o financeiro, do trabalho, agricultura, comunicação, saúde, social entre outros; entre organizações governamentais e não governamentais, sector privado, comunidades, grupos religiosos, e famílias. Destacando a importância das famílias, professores e restantes agentes educativos. (UNDO, UNESCO, UNICEF e WORLD BANK, 1990:38)

Em Portugal, as parcerias desenvolvem-se a partir da década de 90 nomeadamente através da “aparente reaproximação dos mundos escolar e social, mediante o apelo ao trabalho em parceria entre os diversos profissionais, serviços e instituições dos sectores da educação, da saúde, da justiça, da acção social, etc.” (Ferreira, 2005 :508).

Verifica-se a sua utilização em 1991 no programa Programa de “Educação para Todos” (PEPT), onde se pode ler “promover atitudes de solidariedade, de parceria e de cooperação entre todos os agentes educativos, designadamente no plano comunitário” (Resolução do Conselho de Ministros n.º 29/91, de 16 de Maio)

Mais tarde, em 1996, a constituição dos Territórios Educativos de Intervenção Prioritária implicam: “o estabelecimento de relações de parceria com outras entidades que concorrem para a existência de uma efectiva articulação de espaços e recursos e para a construção de uma efectiva igualdade de oportunidades de formação.” (Despacho n.º 147-B/ME/96, de 1 de Agosto de 1996).

Em 1999, com Despacho n.º10322/99 é lançado um programa dirigido ao 1º ciclo que pretende estimular as “parcerias com o poder local”. Alguns anos depois, em 2008, os Territórios Educativos de Intervenção Prioritária II previam a constituição das parcerias referindo que estas “concorrem para a existência de uma efectiva articulação de espaços e recursos educativos, ao mesmo tempo que potenciam o papel educativo e formativo da escola nos processos de

desenvolvimento comunitário.” (Despacho normativo n.º55/2008). Ainda no mesmo despacho, o Artigo 4º é dedicado às parcerias, podendo ler-se que:

Na elaboração dos projectos educativos a que se refere o artigo anterior devem ser ponderadas as circunstâncias e interesses específicos da comunidade e contempladas as intervenções de vários parceiros, designadamente professores, alunos, pessoal não docente, associações de pais, autarquias locais, serviços desconcentrados do Estado, incluindo centros de emprego e de formação profissional, centros de saúde, serviços de acção social, empresas, comissões de protecção de menores, instituições de solidariedade, associações culturais, recreativas e desportivas, entre outras. (Despacho normativo n.º55/2008)

Dando exemplos de eventuais parceiros tendo em consideração os interesses da comunidade.

Mas quais são as reais vantagens/desvantagens da constituição das parcerias? Quem beneficia com a sua composição? Que tipo de expectativas existem nos diversos sectores da sociedade em relação a estas? Numa tentativa de resposta a estas questões Filomena Matos, no artigo Novas Parcerias Numa Educação Para Todos da revista Noesis, apresenta o seguinte quadro:

Figura (Noesis :Matos, 2008)

Verificando-se pelo mesmo que existem mais vantagens do que

desvantagens, podendo a escola utilizar as vantagens nas suas negociações para o estabelecimento de parcerias com os diversos sectores.

A mesma autora, citando Zadek et al., destaca ainda os seguintes benefícios: “Alcançar objectivos sociais e ambientais, Acesso a mais recursos, Melhores condições de gestão da informação e riscos, Construção de capital social, Promoção do capital humano, Melhoria da eficácia operacional, Inovação organizacional, Produtos e serviços mais eficazes, Reputação e credibilidade” (Matos, 2008:28).

Já Stoer e Rodrigues (2000), indicam alguns limites e potencialidades das parcerias, tendo por base a análise de experiências no contexto dos TEIP. Assim, identificam: “i) a diversidade de perfis da parceria; ii) a definição escolar dos TEIP; iii) a forma de apropriação/entendimento das parcerias; iv) as condições prévias e o acompanhamento do percurso; e v) as identidades locais como base de cooperação.” (p.182).

No caso da “i) diversidade de perfis da parceria”, os autores identificam dois perfis com base no seu desenvolvimento: a “parceria como complemento da actividade escolar, [...] uma parceria organizada na lógica de incluir a escola na

comunidade” e a “parceria mais técnica, [...] uma parceria organizada na lógica de criar na escola um espaço para a comunidade” (Stoer e Rodrigues, 2000:182).

Ambas têm vantagens e desvantagens. Assim, a parceria como complemento da actividade escolar tem a vantagem da “maior articulação e integração do território educativo na comunidade” e a desvantagem de uma maior “vulnerabilidade desse território face à compartimentação de interesses na base de conflitos institucionais, de personalidade, de natureza política, etc.” (p. 183). Já a parceria mais técnica evidencia a vantagem da “força (mais ou menos coerente) que resulta do seu espírito e organização de base cooperativa” e a desvantagem “de reforçar a lógica mais convencional das escolas em vez de a diluir com a representação local” (p. 183).

Em relação à “ii) definição escolar dos TEIP”, os autores destacam o local na criação e execução das políticas educativas. O local é visto como uma prioridade, contudo, é a escola que tem um papel central na resolução de problemas como “o insucesso e o abandono escolares, a necessidade de articulação com a vida activa, (re)formar agentes para a designada ‘comunidade

educativa’ ” (Stoer e Rodrigues, 2000:183-184). Assim, os objectivos serão concretizados “para além da escola, mas com a escola” (p. 184).

Destacam, ainda, a visão do local, na perspectiva da intervenção prioritária, como um território deficitário ao invés de identitário. Subvertendo a visibilidade do local sobre os seus problemas e dinâmicas e limitando a sua autonomia.

Já no que se refere à “iii) forma de apropriação/entendimento das parcerias”, os autores evidenciam duas ideias. Por um lado, o conceito parceria é muitas vezes utilizado pelos diferentes actores/parceiros de forma incondicional, vendo a parceria como “qualquer coisa que se faz (dispensando que se pense), que é do campo da acção, do desenrolar das coisas e da evolução naturalizada dos poderes.” (Stoer e Rodrigues, 2000:185). Por outro, a visão da parceria como resolução de problemas, e não como “modo e lugar para uma mais ajustada identificação/clarificação” (p. 185).

Em relação às “iv) condições prévias e o acompanhamento do percurso”, os autores identificam alguns requisitos para o funcionamento das parcerias. Devem, deste modo, ser considerados os seguintes factores: tempo, recursos, objectivos, responsabilidade mínima e investimento esperados e exigíveis de cada parceiro, necessidade de estabelecer claramente as regras (democráticas) do jogo, canais de comunicação, postura inter/multicultural, conflitos, algumas outras estratégias de gestão das parcerias (Stoer e Rodrigues, 2000:189).

Finalmente no que concerne às “v) identidades locais como base de cooperação”, é identificada a relevância das parcerias no âmbito das políticas públicas, sendo o estado gradualmente substituído pelos diferentes parceiros.

Em 2007 o World Economic Fórum e a UNESCO lançaram o programa, “Partnerships for Education” (PFE), que tinha como objectivo criar parcerias para a educação com vista à promoção do progresso e da educação para todos (Draxler, 2008:7). Segundo este programa as vantagens das parcerias podem ser agrupadas do seguinte modo: transformar a educação relevante para a economia; inovação; programas para grupos específicos; tecnologia e finanças e técnicas de gestão; melhorar o ambiente de aprendizagem (p. 18). E o seu sucesso depende do efeito das suas acções na educação, ou seja: na melhoria do ensino e da aprendizagem,

melhores infra-estruturas e gestão dos sistemas de educação, na maior participação e comprometimento da comunidade, e maior comprometimento pelos sectores da sociedade para melhorar a qualidade da educação para todos (p. 18).

Em jeito de conclusão podemos verificar, que de um modo geral as parcerias que a escola procura com a comunidade surgem da necessidade da escola de responder à responsabilidade de uma educação consciente e harmoniosa. A sua constituição permite à escola enriquecer a sua oferta formativa, proporcionando “mais e diferentes recursos materiais e humanos” (Santos, 2008:5). Contribuindo para o sucesso educativo e prevenindo o abandono escolar. São, ainda, “estudada(s) enquanto dispositivo potencial facilitador e estruturado das articulações e contributos de uma orientação educativa integrada, multidimensional e socialmente coerente.” (Stoer e Rodrigues, 2000:171). Devendo ser analisados os seus benefícios tanto para a escola como para os seus parceiros.

6. Breve Síntese

Através da análise legislativa portuguesa verifica-se uma constante preocupação com a obrigatoriedade e gratuitidade do ensino. Não só em Portugal, mas também noutros países como os Estados Unidos da América, a Grã-Bretanha, a França e o Brasil, destacam-se, ainda, os inúmeros programas de promoção do sucesso educativo e prevenção do abandono escolar. Verifica-se que, de um modo geral, estes programas destinavam-se a crianças provenientes de zonas carenciadas, de classes com baixos rendimentos económicos, de diversas etnias, emigrantes e de famílias com pouca ou nenhuma instrução, visto que, os níveis de insucesso e abandono escolares parecem maiores nestas crianças. Criaram-se, assim, na década de 90 com o Decreto-Lei n.º 35/88 de 4 de Fevereiro, os Territórios Educativos de Intervenção Prioritária em Portugal, um pouco à semelhança de outros programas como as Zones d’Education Prioritaires (ZEP) em França ou aos Centros Integrados de Educação Popular (CIEP) no Brasil. Através deste programa pretendia-se dotar as escolas de mais e melhores recursos humanos e pedagógicos numa lógica de discriminação positiva. Mais tarde,

verifica-se um ressurgimento destes com a criação dos Territórios Educativos de Intervenção Prioritária II com o Despacho Normativo n.º 55/2008 de 23 de Outubro. Estes programas previam um maior envolvimento entre a escola e a comunidade com vista à melhoria do sucesso educativo e prevenção do abandono escolar. Podendo a escola familiarizar-se com o meio que a envolve conhecendo os seus costumes e linguagem e podendo a comunidade participar de forma mais activa nas actividades escolares. A escola procura conhecer melhor as famílias desenvolvendo uma relação mais próxima com estas e procurando melhorar diversas questões como a saúde, a alimentação, a formação, entre outras. A integração dos jovens na escola seria assim facilitada, contribuindo para a melhoria dos seus resultados académicos. Através da interacção entre a escola e a comunidade são também estabelecidas relações de parceria que contribuem para uma melhoria das condições de instrução/formação dos jovens, bem como dos restantes elementos da comunidade. Com as parcerias pretende-se também facilitar a transição do jovem para a vida activa, contribuindo para a sua inserção na comunidade, trabalhando para o seu desenvolvimento. Verifica-se, contudo, que existem vantagens e desvantagens na implementação de parcerias. Devendo cada caso ser analisado individualmente, avaliando os seus custos/benefícios para a escola e para a comunidade.