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CAPÍTULO IV – Metodologia e Contexto da Investigação 1 Investigação Qualitativa

1.5. Técnicas de Recolha/Produção de Dados

As técnicas de recolha/produção de dados são muito diversificadas, entre as utilizadas pelos investigadores qualitativos podemos distinguir: a pesquisa arquivística, a observação, a entrevista, os testes de avaliação (conhecimentos/

performance), notas de campo e as escalas de medida de características pessoais.

Iremos dar relevância à pesquisa arquivística, à observação, à entrevista e às

notas de campo.

A pesquisa arquivística ou documental pode ser feita em documentos públicos, privados ou oficiais. A vantagem deste tipo de pesquisa é a obtenção da informação sem a intervenção de outros e sem a componente sujeito, ou seja, é uma metodologia não interferente. Através da pesquisa documental o investigador tem acesso a informação sem que o ou os sujeitos da investigação tenham necessariamente consciência disso evitando assim problemas de qualidade (Afonso, 2005:80).

Através dos documentos oficiais os investigadores podem ter acesso à forma como os sujeitos comunicam bem como à sua “perspectiva oficial” (Bogdan e Biklen, 1994:180). No contexto escolar os documentos oficiais referem-se a actas de reuniões, registos dos estudantes, boletins informativos, registos contabilísticos, pareceres, despachos, projectos educativos e curriculares, regulamentos internos, planos de actividades, circulares, folhetos, entre outros (Afonso, 2005:89).

Nos documentos públicos, segundo Afonso (2005), enquadra-se a imprensa. Esta pode ser abordada como objecto de estudo ou como fonte de informação. São ainda documentos públicos toda a informação publicitária, de propaganda política ou sindical, livros, anuários ou manuais escolares que incluam documentos sobre educação ou administração escolar (p. 90).

A documentação privada engloba os arquivos de empresas, de escolas particulares, movimentos pedagógicos e sindicais, documentos pessoais, entre outros (Afonso, 2005:90). Estes documentos são, normalmente, de acesso mais restrito. Em relação aos documentos pessoais, estes podem englobar documentos escritos pelo sujeito ou recolhidos de entrevistas. Dos documentos escritos pelos

sujeitos existem os que são redigidos a pedido do investigador, como por exemplo uma composição, e os que o são por livre vontade da pessoa como normalmente são os diários ou autobiografias (Bogdan e Biklen, 1994:177).

A observação, tal como a documentação, é uma técnica de recolha de dados em que a informação obtida não é condicionada pela opinião dos sujeitos. Os produtos da observação podem ser registos escritos ou áudio, realizados pelo investigador ou por alguém sob a sua coordenação.

Relativamente à observação, e apesar de numa primeira abordagem podermos discriminar entre observação estruturada e observação não estruturada, Afonso (2005) diz que: “toda a observação é necessariamente estruturada na medida em que o seu ponto de partida é sempre um questionamento específico do contexto empírico em causa, orientado, ou seja, estruturado, a partir das questões de partida e dos eixos de análise da investigação” (p. 92). Para a observação estruturada ou sistemática utilizam-se, normalmente, grelhas ou fichas de observação previamente concebidas tendo em consideração os objectivos da investigação (p. 90). No que concerne à observação não estruturada ou observação de campo os seus resultados são redigidos em diversos textos que constituem o conjunto de registos de observação. Entre os registos da observação não estruturada temos as notas de campo os relatórios de campo e o diário de campo (p. 93).

As notas de campo são o registo escrito do que o investigador ouviu, viu e vivenciou na recolha dos dados do seu estudo. Nos estudos de observação participante, as notas de campo são todos os dados recolhidos para o estudo, ou seja, entrevistas, documentos oficiais, imagens, entre outros. Apesar da sua importância para a observação participante, as notas de campo são também importantes para outros métodos de recolha de dados podendo ser complementares. Assim ao utilizar as notas de campo com outros métodos de recolha de dados o investigador enriquece o seu trabalho (Bodgan e Biklen, 1994:150).

As notas de campo podem ser de carácter descritivo ou reflexivo. Quando o objectivo é descrever concretamente o que aconteceu, onde com quem, então estamos a falar do carácter descritivo. Quando a preocupação se centra no ponto

de vista do observador, nas suas ideias então estamos a abordar o carácter reflexivo das notas de campo (Bodgan e Biklen, 1994:152). O relatório de campo, segundo Afonso (2005), é elaborado a partir das notas de campo e constitui um texto mais organizado e reflexivo (p.93). Já o diário de campo consiste num registo detalhado do quotidiano do investigador normalmente com um carácter reflexivo (p. 93).

A entrevista para Bingham e Moore, citados por Ghiglione e Matalon (2005), “é uma conversa com um objectivo” (p.64). Outra característica apresentada designa a entrevista como “um encontro interpessoal que se desenrola num contexto e numa situação social determinados, implicando a presença de um profissional e de um leigo.” (p. 64). As entrevistas, em investigação qualitativa, podem ser utilizadas como uma estratégia dominante na recolha de informação ou dados, ou podem ser utilizadas conjuntamente com outras técnicas, como por exemplo, a observação participante ou a análise de documentos (Bogdan e Biklen, 1994:134). No nosso estudo estas serão utilizadas conjuntamente com outras técnicas permitindo, deste modo, obter informações sobre a forma como os sujeitos interpretam e percepcionam a realidade.

A entrevista pode ser estruturada de muitas formas distintas. Podemos propor um tema ao entrevistado e este desenvolve-o conforme quiser. Neste caso o entrevistador apenas intervém para encorajar o entrevistado. É o que se designa de entrevista não directiva ou livre ou ainda em profundidade. No extremo oposto podemos ter o questionário fechado ou entrevista estruturada. Este é composto por uma série de perguntas elaboradas previamente e com respostas, também já construídas, de entre as quais o entrevistado escolhe a opção que quiser (Ghiglione e Matalon, 2005:63). Este tipo de entrevista, normalmente, é usada quando se pretende obter informação quantificável de um número elevado de sujeitos com o objectivo de fazer um tratamento estatístico (Afonso: 2005:98). Entre estes dois métodos podemos ainda identificar a entrevista semi-directiva e o questionário aberto.

Na entrevista semi-directiva também designada de clínica ou estrutural, o entrevistador sabe os temas que quer ver abordados pelo entrevistado, no entanto,

apenas fixa o tema para o início da entrevista, os restantes serão introduzidos como e quando quiser (Ghiglione e Matalon, 2005:64).

Para os mesmos autores, Ghiglione e Matalon (2005), no questionário aberto as questões são formuladas e ordenadas previamente, o entrevistado pode responder livremente (p.64).

A questão que se coloca é: que tipo de entrevista usar? Para esta questão Ghiglione e Matalon (2005) dizem que existem quatro tipos de utilização conforme a investigação. Assim se a investigação tiver por função o controlo, devemos usar a entrevista directiva. No caso de ser uma investigação de verificação podemos usar a entrevista semi-directiva ou directiva. Se for uma investigação de aprofundamento a entrevista pode ser não directiva ou semi- directiva. No caso de se tratar de uma investigação de exploração então a entrevista deve ser a não directiva (p. 86).

Segundo Bogdan e Biklen (1994) podemos usar diferentes tipos de entrevista ao longo do nosso estudo. Assim, podemos usar a entrevista livre no início do nosso estudo, com o objectivo de compreender as diferentes perspectivas, e no final podemos optar por uma entrevista mais estruturada, podendo obter dados comparáveis (p. 136).

As entrevistas podem ser feitas a uma única pessoa de cada vez ou podem ser em grupo. As entrevistas de grupo podem proporcionar ao investigador uma visão sobre os sujeitos e o seu contexto. Podem ainda estimular os diversos intervenientes, revelando temas que poderão ser de interesse para a investigação. Contudo, é necessário saber mediar a entrevista, pois alguns intervenientes poderão tentar dominar a sessão, e saber como iniciar a mesma. A transcrição da entrevista, neste caso, poderá revelar-se um problema, pois, por vezes, os discursos sobrepõe-se ou então torna-se difícil reconhecer quem está a falar (Bogdan e Biklen, 1994:138).

Durante a realização da entrevista, Bell (1997), salienta o “perigo da

parcialidade”, podendo a postura e maneira de ser do entrevistador condicionar de

certa forma o seu desenvolvimento. Além disso, quando elabora a entrevista, o entrevistador deverá ter cuidado na formulação das questões, pois “É mais fácil «induzir» numa entrevista do que num inquérito” (p. 123). Como se pretende o

maior rigor e objectividade possíveis, devemos ainda ter em consideração o ênfase e o tom de voz na formulação das questões, pois estes também podem influenciar as respostas.

Para a realização da entrevista devemos respeitar alguns critérios com vista à criação de um clima de neutralidade que favoreça a espontaneidade e colaboração do entrevistado. É necessário, deste modo, estabelecer uma relação de confiança, empatia e segurança com o entrevistado. Este deve ser informado sobre o objectivo da entrevista bem como sobre a duração da mesma. O entrevistador deve, também, assegurar o anonimato e confidencialidade da informação recolhida. A entrevista deve ser marcada previamente e em conformidade com a disponibilidade do entrevistado, deve, ainda, decorrer num local onde não seja interrompida constantemente. Durante a sua realização, o entrevistador deve assegurar-se que as respostas são dadas pelo entrevistado e que não existe ninguém presente que condicione as mesmas. Cabe ao entrevistador garantir que a entrevista não se prolonga para além da hora estabelecida. Se se pretender utilizar um gravador, o entrevistado deve ser consultado previamente, pronunciando-se este sobre a sua utilização no decurso da entrevista. O entrevistador não deve emitir juízos de valor sobre o entrevistado, o seu objectivo é compreender o seu ponto de vista mesmo que não esteja de acordo com o mesmo. É necessário dar tempo para que o entrevistado responda abordando tudo o que pretenda sobre o tema. O entrevistador deve estar atento, mostrando ao entrevistado que compreendeu as suas ideias. O entrevistador também deve ser sensível ao discurso do entrevistado, envolvendo-se emotivamente (Gómez, Flores e Jiménez, 1999:173). Antes da realização da entrevista, o investigador, deve seleccionar os entrevistados tendo em consideração a sua importância para o estudo. O número de entrevistas a realizar deve ter em consideração o tempo disponível para a realização do estudo (Bell, 1997:128).

Durante a realização da entrevista e com o intuito de clarificar ou expandir as respostas, o entrevistador pode recorrer a diversas técnicas, estas podem ser verbais ou não. No caso das técnicas verbais, pode recorrer à utilização de expressões que demonstram o interesse pelo discurso do entrevistado e simultaneamente incitam à sua prossecução, exemplo destas expressões são:

“estou a ver, sim, compreendo, estou a ouvir, ‘mm-mm’ etc” (Ghiglione e Matalon, 2005:96). Pode, ainda, recorrer à técnica do “espelho” ou “eco”, neste caso o entrevistador repete uma palavra ou um conjunto de palavras que foram proferidas pelo entrevistado, sem contudo, repetir uma frase inteira. Esta técnica pode ser usada para incitar o entrevistado a prosseguir com o seu discurso ou a aprofundar algum tópico ou ainda a confirmar um sentido. Outra técnica que pode ser utilizada pelo entrevistador é a da “realização de sínteses parciais ou ‘reformulações’ de uma parte do discurso” (p. 96). Esta permite um aprofundamento dos tópicos abordados pelo entrevistado, contudo, o entrevistador deve ser cauteloso na elaboração das sínteses, uma vez que inconscientemente poderá transmitir as suas próprias concepções. O entrevistador também pode recorrer à formulação de pedidos “neutros” de informação sobre o discurso proferido. Estes traduzem-se por expressões como: “que quer dizer; que tem exactamente em mente neste momento; em que pensa?” ou “poderia dizer-me mais sobre isso?” (p. 96). Ou pedidos particulares que se traduzem em expressões como: “Porque pensa isso, quando se passou isso quer explicar?” (p. 97). Estes tem como objectivo estimular um discurso mais ou menos bloqueado. Durante a realização da entrevista, e se tal se verificar necessário, o entrevistador pode repetir o tema da mesma. O entrevistador deve respeitar os silêncios do entrevistado, permitindo a sua reflexão. O entrevistador pode ainda pedir ao entrevistado que elabore diagramas ou desenhos; indique exemplos; explicite interpretações, causas ou objectivos; clarifique contradições (Afonso, 2005:99).

A utilização da entrevista num estudo de investigação qualitativa deve, contudo, ser bastante ponderada, uma vez que é uma técnica que consome muito tempo. O investigador deve considerar o tempo da entrevista, o da sua deslocação e ainda o tempo necessário para transcrever a entrevista (no caso das entrevistas gravadas) e ponderar sobre o que foi dito (Bell, 1997:126-127).