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As políticas de mercado de trabalho

2 DESEMPREGO ESTRUTURAL E CRISE DO SISTEMA

4.4 As políticas de mercado de trabalho

As políticas de mercado de trabalho se inserem no contexto das mudanças econômicas e estatais no âmbito do capitalismo monopolista, seja de maneira pioneira nos países avançados, seja de maneira tardia nos países da periferia. As políticas de mercado de trabalho visam à regulação das relações de trabalho, com o objetivo da inserção produtiva e da adequação dos fatores oferta e demanda dentro desse mercado, atendendo os compradores de mão de obra, oferecendo-lhes mão de obra adequada aos seus interesses de produção (em conjunto com a política educacional), e atendendo aos interesses dos trabalhadores, orientando e encaminhando os mesmos no sentido de inseri-los de forma mais rápida possível em uma ocupação no mercado de trabalho.

Aos trabalhadores, fica consignada a contribuição com programas de seguro social, para garantir sua manutenção em períodos em que não esteja colocado no mercado de trabalho por um curto espaço de tempo, como no caso do seguro-desemprego.

Vários fatores interferem, portanto, no planejamento e na implantação das políticas de mercado de trabalho: nível de emprego, escolaridade e qualificação de mão de obra, rotatividade no mercado de trabalho, crises econômicas, etc. Nesse sentido, várias ações governamentais conjuntas intervém também, como a orientação dos

investimentos públicos e privados para a criação de empregos em determinados setores específicos, o incentivo ao empreendedorismo e mudanças na legislação trabalhista e fiscal para redução dos custos trabalhistas.

De fato, as políticas de mercado de trabalho espelham a dinâmica instável do mercado de trabalho como um todo. Diferentemente da tradição da economia política, a análise crítica do sistema capitalista demonstra seu caráter complexo e longe de estar em um estado harmônico.

Conforme visto no capítulo anterior, a proletarização da força de trabalho está longe de ser, historicamente, um processo linear e pacifico (OFFE, LEHRARD). Da mesma forma, a análise de Chahad (1984) apresenta a dinâmica errática do mercado de trabalho, com necessidade de ajustes constantes, a fim de adequar sua dinâmica aos propósitos do capital. De fato, as políticas de mercado de trabalho tornam-se, à primeira vista, mais restritas à relação entre empregadores e trabalhadores. No entanto, no seu contexto, adquirem expressão para atender aos interesses mais gerais do capital e por isso não podem ser analisadas pelo viés tecnicista, mas também de forma a entendê-las no contexto político mais geral de embate entre capital e trabalho, em torno da disputa do excedente econômico.

Na análise econômica, denominam-se políticas de mercado de trabalho aquelas políticas específicas que atuam dentro das relações de trabalho, mas não contemplam as ações macroeconômicas e sociais que interferem no mercado de trabalho como um todo, mas são por elas influenciadas diretamente. As políticas de mercado de trabalho são as mediações do Estado na relação mais próxima entre compradores e vendedores de força de trabalho.

Moretto (2009) propõe o uso do termo “políticas de mercado de trabalho” para diferenciá-las das “políticas de emprego”, que, para o autor, são desdobramentos das políticas mais gerais de desenvolvimento, com estímulos a ramos específicos de produção e com potencialidade de atuar na geração de empregos. Diferentemente dessas políticas de emprego, as políticas de mercado de trabalho incluem, para o mesmo autor,

O conjunto de políticas cuja ação é direcionada à demanda ou à oferta de mão de obra com o objetivo de facilitar o funcionamento do mercado de trabalho, proteger a renda do trabalhador no momento de desemprego e auxiliá-lo a encontrar

uma nova ocupação, bem como ajudar as empresas a preencherem, rapidamente, os postos de trabalho vagos. As políticas de mercado de trabalho podem contribuir para reduzir o nível de desemprego, mas essa redução é limitada pelo nível das atividades econômicas, que é dado exogenamente ao mercado de trabalho (MORETTO, 2009, p. 23).

As várias modalidades de políticas de mercado de trabalho podem ser conjugadas em duas formas originais: as políticas ativas e as políticas. Conforme Cacciamali (2005, p. 86):

A literatura especializada aponta quatro tipos de políticas ativas de mercado de trabalho: Serviço público de intermediação de mão-de-obra e orientação para o mercado de trabalho; Sistema

nacional de capacitação e

treinamento; Desenvolvimento de pequenas e microempresas e de atividades por conta própria; Criação de empregos transitórios; e Medidas de apoio aos jovens.

As políticas passivas de mercado de trabalho se caracterizam basicamente por benefícios financeiros direcionados a empregados e desempregados, de acordo com critérios estabelecidos. O pagamento do seguro-desemprego é uma política passiva, que garante rendimentos por determinado período de tempo de acordo com critérios de contribuição anterior. O abono salarial é outro benefício caracterizado nessa mesma forma, pois consiste em pagamento anual de salário complementar de acordo com a média salarial obtida no ano anterior. A definição dos critérios é diversa, mas os benefícios se caracterizam pelo pagamento de prestações diretamente para os trabalhadores.

As políticas ativas de mercado de trabalho se caracterizam por programas e projetos que auxiliam o trabalhador na sua inserção no mercado de trabalho como trabalhador assalariado ou como empreendedor. Além disso, contempla também aos programas de criação de empregos temporários.

A análise de Raichelis (2013), apresentada no tópico anterior, é fundamental para entender a forma como as políticas sociais têm se voltado a ações de “ativação”, o que inclui as políticas de mercado de trabalho, educação, assistência social. No caso do seguro-desemprego, sua vinculação com o Pronatec e a modalidade de Bolsa-qualificação

profissional são exemplos dos esforços do Estado em promover a “ativação” desta política, considerada passiva. Assim, o pagamento de benefícios se articula à demanda pelo retorno ao mercado de trabalho no menor período possível, a fim de garantir a eficiência deste mercado.

No caso da assistência social, sua vinculação a projetos de qualificação, empreendedorismo e intermediação de adolescentes e jovens para programas de aprendizagem aponta a busca pela vinculação ao mercado de trabalho no âmbito dos direitos sociais, como bem demonstraram os autores trabalhados.

A qualificação profissional é um dos carros-chefes das políticas ativas, tendo em vista especialmente os países periféricos, que são destacados por níveis inferiores de escolarização de sua população. Sendo assim, a qualificação profissional caracteriza-se por uma complementação dos estudos formais, com caráter mais direto e prático, de acordo com as demandas do sistema produtivo. A qualificação profissional contempla, em geral, cursos técnicos, com curta duração, com conteúdos essencialmente práticos, voltados a uma modalidade específica do sistema produtivo.

A intermediação de mão de obra é outra modalidade das políticas ativas, pois se refere à intervenção direta do órgão estatal na mediação entre empregadores e trabalhadores. Ela visa tanto adequar os perfis da vaga de emprego ou colocação aos perfis dos trabalhadores cadastrados, quanto diminuir o tempo de espera de ambos os lados para a ocupação de uma vaga.

Por meio da intermediação de mão de obra, o Estado consegue ainda ampliar os dados estatísticos sobre o mercado de trabalho, para além das estatísticas periódicas. Com os dados formulados junto à intermediação, o Estado tem um retrato pormenorizado do perfil da mão de obra e qualidade dos empregos gerados pela atividade econômica. Assim, as demais políticas, como a qualificação profissional e o planejamento do seguro-desemprego e abono salarial têm condições de acesso e previsão dos benefícios a serem pagos e dos cursos a serem oferecidos aos trabalhadores.

Paralelamente à atuação do Estado no desenvolvimento dessas políticas, uma série de ações correspondentes são desenvolvidas por iniciativa de empresas especializadas e das próprias empresas que contratam. A intermediação de mão de obra pode ser realizada na própria empresa, por profissionais especializados ou por serviços específicos de captação de mão de obra. A qualificação profissional pode ser realizada por federações patronais, empresas privadas, ou mesmo pela empresa contratante, com programas contínuos de treinamento de seu pessoal. Até

mesmo os mecanismos de complementação de renda, como o abono salarial, podem ser encontrados nas empresas, como no caso dos diversos benefícios e na participação de lucros, se bem que com critérios e recursos bastante diferenciados.

Portanto, as ações desenvolvidas no âmbito das políticas de mercado de trabalho não são exclusivas da atuação estatal. No entanto, quando desenvolvidas pelo Estado, adquirem um caráter público, que contempla um âmbito mais amplo de beneficiários. Cabe ressaltar também que essas ações desenvolvidas pela política de mercado de trabalho não são restritas a essa política específica. A própria política de assistência social, ou a política educacional, desenvolvem ações e projetos paralelos de qualificação profissional e intermediação.

De acordo com Cacciamali (2005, p. 86), as políticas assumem funções econômicas importantes no mercado de trabalho. A autora cita o caso do programa de intermediação de mão de obra:

Cada tipo de programa que compõe a agenda das políticas ativas de mercado de trabalho encontra-se amparado em uma justificativa teórica, que, em geral, centra-se em argumentos de custos ou de assimetria de informações no mercado. Assim, o Serviço público de emprego é validado pela teoria econômica porque tanto a busca de uma vaga/trabalho quanto o seu preenchimento no mercado de trabalho demandam tempo, traduzindo-se concretamente em custos. O sistema de intermediação de mão-de-obra promove benefícios para o desempregado, a empresa e a sociedade no momento em que o preenchimento de uma vaga é efetuado no menor tempo, com o menor custo e a melhor qualidade.

Moretto (2009) explica que as políticas de mercado de trabalho foram criadas num contexto de pleno emprego nos países centrais, a partir do entendimento de que, mesmo numa situação de pleno emprego, podem existir contingências que dificultam o acesso ao emprego, sendo estas contingências de caráter geográfico, de informação, de diversificações das qualificações profissionais dos trabalhadores e dos perfis de vagas criados. Assim, o Estado deveria atuar para corrigir possíveis assimetrias existentes no mercado de trabalho.

O autor realiza a avaliação das possibilidades das políticas de mercado de trabalho em países de industrialização tardia:

Há que se ressaltar a diferença entre as economias industriais avançadas, em que a demanda por trabalho é bastante homogênea, e as economias de industrialização tardia. Nestas, a demanda da grande empresa é diferente da micro e pequena empresa, além da existência de um grande contingente de trabalhadores autônomos. [...] nesses casos, o atendimento dos vários tipos de demandantes de trabalho implica diferentes serviços a serem oferecidos, para que se possa ter maior efetividade das políticas (MORETTO, 2009, p. 159).

Sobre o benefício do seguro-desemprego, Moretto (2009) informa que este benefício procura oferecer ao trabalhador desempregado condições de voltar ao mercado de trabalho. A configuração do seguro- desemprego possui diferenças entre os mais variados países e recebe variações23 de acordo com a situação econômica do país, podendo ser mais abrangente ou mais restrito de acordo com cada situação.

O pagamento do benefício de desemprego tem como premissa o fato de o trabalhador estar desempregado e estar em busca de novo emprego. Assim, ele permite que durante o período de desemprego o trabalhador tenha os meios necessários para manter sua condição de vida enquanto procura uma nova ocupação. Procura evitar que o trabalhador, ao perder o emprego, caia numa situação de pobreza, mantendo o ânimo e o respeito próprio. Por outro lado, com o aumento do desemprego de longa duração nos países desenvolvidos, o benefício de desemprego passou a ser visto como um fator de desestímulo à busca por emprego para os trabalhadores que permanecem por longo período desempregados. Ademais, como o maior contingente de indivíduos em situação de desemprego, aumentaram os gastos com benefícios e as necessidades de recursos orçamentários destinados a essas despesas. Com isso, os sistemas de benefícios de emprego foram reestruturados, tornando-se mais rígidos, tanto em

relação ao tempo de recebimento como em relação ao valor do benefício. Com a reestruturação, o serviço de emprego passa a ser considerado um instrumento importante para estimular os desempregados à busca ativa por um emprego (MORETTO, 2009, p. 178-9).

O seguro-desemprego no Brasil tem sofrido alterações recentes no sentido de estimular de diversas formas esta busca ativa por emprego, conforme análise do autor. Ainda, tem sofrido restrições nos critérios de inserção, reduzindo o número de trabalhadores beneficiados. Os dados a seguir apontam ainda a possibilidade de redução do valor dos benefícios, com o objetivo de desmotivar o recebimento do mesmo pelo trabalhador. O seguro-desemprego foi previsto pela primeira vez no Brasil na Constituição Federal de 1946, mas foi instituído por lei apenas no ano de 1986 (Decreto-Lei n.º 2.284, de 10 de março de 1986) (MTE, 2014).

A Constituição Federal de 1988 prevê o seguro-desemprego no artigo 7º, que trata dos direitos dos trabalhadores, em seu inciso II, sendo previsto para situações de desemprego involuntário (BRASIL, 1988).

Apesar de não constar entre as três políticas tradicionais de seguridade social na Constituição Federal de 1988 (Previdência Social, Saúde e Assistência Social), o seguro-desemprego também é considerado como uma política de seguridade social: “O Seguro-Desemprego é um benefício integrante da seguridade social, garantido pelo art.7º dos Direitos Sociais da Constituição Federal e tem por finalidade prover assistência financeira temporária ao trabalhador dispensado involuntariamente” (MTE, 2014).

Em algumas modalidades, o seguro-desemprego se aproxima mais da política de Previdência Social, como no caso do trabalhador formal e do pescador artesanal, inclusive sendo esta última modalidade operada pelas unidades do INSS. Em outras modalidades, aproxima-se da política de assistência social, como no caso do trabalhador resgatado, que ingressa no benefício mesmo sem a contrapartida das contribuições previdenciárias. De qualquer modo, o seguro-desemprego não consta das legislações específicas das políticas da Previdência Social e assistência, exceto no caso do seguro voltado ao pescador artesanal, que é conhecido no âmbito da Previdência Social como Seguro-Defeso, mas não integra os conhecidos benefícios previdenciários, apesar de o trabalhador ser enquadrado como segurado especial.

Além de constar do art. 7º da Constituição Federal de 1988, o financiamento do seguro-desemprego é previsto no art. 239, que determina o seguinte:

Art. 239. A arrecadação decorrente das contribuições para o Programa de Integração Social, criado pela Lei Complementar nº 7, de 7 de setembro de 1970, e para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público, criado pela Lei Complementar nº 8, de 3 de dezembro de 1970, passa, a partir da promulgação desta Constituição, a financiar, nos termos que a lei dispuser, o Programa do Seguro-Desemprego e o abono de que trata o § 3º deste artigo.

[...]

§ 4º - O financiamento do seguro-desemprego receberá uma contribuição adicional da empresa cujo índice de rotatividade da força de trabalho superar o índice médio da rotatividade do setor, na forma estabelecida por lei (BRASIL, 2015). A partir de 1990, a legislação prevê uma integração das principais políticas de mercado de trabalho no Brasil (Lei nº 7.998, de 11 de janeiro de 1990), criando o Programa Seguro-Desemprego, que articula as políticas de pagamento do seguro-desemprego, qualificação profissional e intermediação de mão de obra. (BRASIL, 1990).

A criação do Fundo de Amparo ao Trabalhador e do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador garantem ao Programa uma fonte de financiamento e uma instância participativa de deliberação sobre as aplicações do fundo.Ao longo das décadas de 1990 e 2000, foram sendo criadas categorias específicas de trabalhadores atendidos pelo Programa Seguro-Desemprego, como pescador artesanal e empregados domésticos.

O desenvolvimento do benefício do seguro-desemprego prevê estratégias de combate aos efeitos de crises econômicas, que atinjam a economia como um todo ou setores específicos, para ampliar em até duas parcelas o número máximo de parcelas recebidas por trabalhadores desempregados dos setores mais atingidos pela crise.

4.5 TEMAS RELEVANTES PARA ENTENDER O SEGURO-