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O seguro-desemprego no contexto das demais políticas sociais

2 DESEMPREGO ESTRUTURAL E CRISE DO SISTEMA

4.1 O seguro-desemprego no contexto das demais políticas sociais

Antes de tratar propriamente do seguro-desemprego, é preciso entendê-lo no contexto das políticas sociais de Estado, no sentido de atuar em demandas da questão social. Essa atuação não está descolada do processo de acumulação capitalista. Netto (2011) apresenta-se como referência na análise da atuação do Estado no contexto do capitalismo monopolista, e no exame de seus desdobramentos, o autor explica que, nessa fase mais recente, o controle dos mercados pelos grupos capitalistas gera uma situação de concorrência imperfeita, que aprofunda ainda mais os efeitos de tal acumulação.

O autor explica que o Estado sempre foi fator fundamental para o desenvolvimento capitalista, mesmo quando sua atuação se concentrava na manutenção das condições gerais do sistema, como no caso da garantia do direito à propriedade privada e manutenção de um sistema de segurança capaz de assegurar a ordem social. Essas funções se avolumam e ganham maior fôlego no contexto do capitalismo monopolista, aliadas a outras funções mais particulares, conforme descreve o autor:

[...] No entanto, com o ingresso do capitalismo no estágio imperialista, essa intervenção muda funcional e estruturalmente. Até então, o Estado, na certeira caracterização marxiana o representante do capitalista coletivo, atuara como o cioso guardião das condições externas da produção capitalista. Ultrapassava a fronteira de garantidos da propriedade privada dos meios de produção burgueses somente em situações precisas – donde um intervencionismo emergencial, episódico, pontual. Na idade do monopólio, ademais da preservação das condições externas da produção capitalista, a intervenção estatal incide na

organização e na dinâmica econômicas desde

dentro, e de forma contínua e sistemática. Mais

exatamente, no capitalismo monopolista, as funções políticas do Estado imbricam-se organicamente com as suas funções econômicas (NETTO, 2011, p. 24-5 grifos do autor).

As políticas sociais se inserem nesse espectro de intervenção estatal próprio do capitalismo monopolista e permitem ao Estado manter as condições de reprodução da classe trabalhadora no contexto do aprofundamento das contradições da acumulação capitalista. Conforme Netto (2011), a manutenção da força de trabalho e seu controle contínuo “é uma função estatal de primeira ordem" (grifo do autor), respondendo às demandas do capitalismo monopolista:

[...] quer pelas contradições de fundo do ordenamento capitalista da economia, quer pelas contradições intermonopolistas e entre os monopólios e o conjunto da sociedade, o estado – como instância da política econômica do monopólio – é obrigado não só a assegurar continuamente a reprodução da força de trabalho, ocupada e excedente, mas é compelido (e o faz mediante os sistemas de previdência e segurança social, principalmente) e regular a sua pertinência a níveis determinados de consumo e a sua disponibilidade para a ocupação sazonal, bem como a instrumentalizar mecanismos gerais que garantam a sua mobilização e alocação em função das necessidades e projetos do monopólio (NETTO, 2011, p. 27).

Na interpretação do autor, fica claro que a administração da dinâmica da população é fator fundamental entre as variadas funções diretas do Estado no contexto do capitalismo de monopólios, especialmente no sentido de manter um controle da população e de suas reivindicações, bem como manter níveis adequados de força de trabalho conforme as necessidades do capital.

Dessa forma, as políticas sociais, em suas mais variadas frentes – políticas de mercado de trabalho, como seguro-desemprego, qualificação profissional e intermediação demão de obra, políticas de assistência social, políticas educacionais, políticas de saúde e previdência social, entre outras – servem de ferramentas para a intervenção estatal junto ao

trabalhador e sua família, com força econômica e política para regular a dinâmica populacional da classe trabalhadora.

Essa regulação não se dá às abertas, mas parte de processos complexos – que aliam coerção, consensos e conflitos entre as diferentes esferas da sociedade – que são recebidos pelo Estado e traduzidos em ganhos para diferentes segmentos sociais, mas que tendem a ser direcionados, em última instância, para a vocação da acumulação capitalista (NETTO, 2011).

O autor ressalta que as novas configurações que se apresentam nesse período buscam justamente a manutenção da ordem econômica e social num contexto de importantes transformações de um ator central na sociedade capitalista: a classe trabalhadora organizada e em luta. Tendo em vista o avanço da luta dos trabalhadores desde o final do século XIX, as mudanças que ocorrem na organização do modo de produção capitalista visam conter, minimizar e mudar o foco e a direção de atuação das diversas frentes de luta da classe trabalhadora, dos sindicatos e dos partidos operários.

É possível perceber, desde o final do século XIX, uma preocupação ampliada com as novas configurações da luta operária e da questão social. A ampliação das atividades sindicais, das greves gerais e a Revolução de 1917 trouxeram ao Estado capitalista novas demandas para sua atuação. Se antes a questão social era caso de polícia, cada vez mais ela vai adquirindo respostas políticas e os conflitos a ela inerentes passam a ter uma legitimidade dentro do espaço estatal.

No início do século XX, mas principalmente no período que fica conhecido como anos dourados nos países centrais (décadas de 1940 a 1970), o enfrentamento da questão social, por outros meios que não aqueles apenas coercitivos, passa a ser um papel fundamental do Estado, para sua própria legitimação e legitimação do sistema do capital. Essa intervenção adquire o caráter de respostas às demandas das classes subalternas, principalmente por meio de legislação trabalhista, programas de seguro social capazes de proteger o trabalhador em situações adversas, em que não pudesse trabalhar, e ações diretas junto à população. A ampliação e a conquista de direitos e liberdades civis e políticas também são conquistas desse período, visto que a ampliação da democracia como um todo também fez parte da pauta de reivindicações do movimento operário (NETTO, 2011).

Em face disto, a questão social passa a ser objeto de uma intervenção contínua e sistemática do Estado, atingindo países diferentes, em períodos diferentes. Para o autor, as políticas sociais possibilitam que parte do excedente econômico, acrescido pelos processos de acumulação

capitalista, chegue ao exército industrial de reserva para garantir sua manutenção e controle. Este processo ocorre tanto para a parcela empregada dos trabalhadores, “mediante a regulamentação das relações capitalistas/trabalhadores”, quanto para a parcela da população que integra o exército industrial de reserva, “através dos sistemas de seguro social” (NETTO, 2011, p. 31).