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CAPÍTULO II EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA NO BRASIL

2.1 As Principais Reformas: Panorama a partir da Década de 1990

O cenário da educação no Brasil nas últimas décadas do século XX é forjado pelos novos contornos do capitalismo internacional neoliberal, segundo o qual a flexibilidade é a força motriz que delineia as relações de produção. Sob essa perspectiva, Gentilli (1996) denuncia com veemência a violência desse ideário, no tocante ao fato de as instituições escolares serem obrigadas a adotar estruturas e padrões de avaliação inspirados diretamente em modelos empresariais, assemelhando-se a organizações voltadas à produção de bens e serviços. Segundo a lógica neoliberal, a escola produzia um tipo específico de mercadoria (o conhecimento, o aluno escolarizado, o currículo), e deveria ter seus processos peculiares submetidos aos princípios de funcionamento de toda empresa dinâmica, eficiente e flexível.

O Brasil, que acaba de conquistar a sua democracia, encontra-se imerso, nesse período, em uma forte crise econômica, e, incorporando os ideais consagrados pela

globalização2, assume uma postura política direcionada para uma educação profissional que atenda às demandas da divisão internacional do trabalho.

A educação passa a ser idealizada, no plano governamental, como um modelo que forneça respostas aos novos paradigmas organizacionais, representado pelo toyotismo, que, segundo explica Antunes (1995), baseia-se nos princípios da polivalência, da qualidade total, do just in time, dentre outros elementos.

Ciavatta (2006b) ilustra com clareza essa “nova fase” ao registrar o pensamento de Bourdieu e Wacquant, na obra “A Nova Bíblia do Tio Sam”, que versa sobre o uso da linguagem como uma forma de dominação histórica dos centros hegemônicos, citando como exemplo os funcionários graduados de instituições internacionais que passam a repetir exaustivamente novos vocábulos em todos os países avançados, tais como: globalização, flexibilidade, governabilidade, empregabilidade, underclass e exclusão, nova economia, tolerância zero, comunitarismo, multiculturalismo, etnicidade, identidade, fragmentação, etc. Porém, enfatiza Ciavatta (2006b, p.920), suprime-se palavras como “capitalismo, classe, exploração, dominação, desigualdade, que revelariam a materialidade da dominação”.

Nesse conjunto de crise econômica e capitalismo neoliberal, o Governo do Brasil, ora representado pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso3, assume a iniciativa de “reformar” a educação brasileira em todos os seus níveis e modalidades, e adota um conjunto de políticas definidas pelo Banco Mundial para os países pobres, que têm profundos e negativos impactos sobre a educação. O investimento em educação passa a ser determinado a partir da compreensão de que o Estado só deve se comprometer com investidas que resultem em retorno econômico e, diante do quadro de progressiva redução do emprego formal, não é racional investir em ensino profissional técnico, em ensino médio e em ensino superior de forma generalizada, dando margem à iniciativa privada de assumir a oferta de educação nestes níveis de ensino (KUENZER, 1999a).

Nesse viés, Martins (2000) ressalta que após a década de 1960 os organismos financeiros internacionais mudaram o foco dos seus patrocínios, que se desloca do

2 O termo globalização reveste-se de um significado positivo e consensual, que procura dar a todos a noção de

que serão incluídos nos processos de mudança, mas, na realidade, refere-se a uma tentativa de generalização de condições indispensáveis à transnacionalização do capital. Os aspectos políticos, econômicos e até mesmo culturais da globalização estão orientados por uma lógica que responde às demandas atuais de reestruturação do capitalismo (OLIVEIRA, 2001, p. 48).

3 Fernando Henrique Cardoso foi eleito Presidente do Brasil em 1994 e tomou posse no dia 1º de Janeiro de

1995. Governou o país por 08 anos. Seu primeiro mandato como presidente ocorreu no período de 1995 a 1998 e o segundo no período de 1999 a 2002. Para não gerar repetição no texto, ao referir-se a este presidente, utilizar- se-á a sigla FHC, conforme ele é comumente citado em outras publicações científicas.

financiamento em infraestrutura para investimentos direcionados às políticas sociais, a exemplo da saúde e da educação, pois estas foram identificadas como potencializadoras do “capital humano” necessário ao desenvolvimento econômico.

Uma abordagem lúcida sobre a participação do Banco Mundial na política de educação do Brasil e América Latina é elaborada por Leher (1999) ao sustentar a tese de que as conexões educação, segurança e pobreza fornecem o substrato das reformas educacionais dos anos 1990 nesses países. Para o autor, o Banco “preocupa-se” com a pobreza, pois esta pode gerar um clima desfavorável para os negócios.

[...] o Banco dedica cada vez maior atenção à construção de instituições adequadas à era do mercado, de modo a ter recursos institucionais para “manejar” as contradições do sistema. A educação é radicalmente modificada, tornando-se cada vez menos politécnica (no sentido conferido por Marx) e cada vez mais instrumental: os conteúdos estão fortemente carregados de ideologias apologéticas ao capital e o debate educacional é pautado em grande parte pelos “homens de negócios” e pelos estrategistas políticos. [...] O capitalismo atual é justo com aqueles que souberam se qualificar corretamente. Basta não insistir nas prioridades erradas. [...] Neste sentido, os problemas do desemprego e da precarização do trabalho são deslocados para a qualificação do trabalhador. É como se a exclusão fosse decorrente de opções educativas erradas dos indivíduos. Daí a tese de que a única alternativa realista é a formação profissional. [...] O corolário é a perda da capacidade de contestação política ao sistema capitalista, favorecendo o avanço das reformas neoliberais e o enraizamento da ideologia da globalização nas classes trabalhadoras que, deste modo, se movem no interior das ideologias dominantes (LEHER, 1999, pp. 29-30).

De acordo com o exame de Kuenzer (2000b), os princípios do Banco Mundial para financiamento da educação no Brasil foram:

1. Investir prioritariamente no ensino fundamental, cuja taxa de rentabilidade dos investimentos com relação à redução da pobreza é mais alta; em seguida investir no ensino médio e continuar investindo apenas o necessário no ensino superior, orientado-se para que o financiamento seja mais equitativo e eficaz em função dos custos, de modo que os níveis primário e secundário possam merecer mais atenção, como resultado da progressiva privatização do 3º grau; 2. Fomentar maior diferenciação das instituições uma vez que programas de um só nível são muito custosos; para tanto deve-se estimular o desenvolvimento de instituições não universitárias públicas e privadas que ofereçam cursos pós-médios para atender à demanda e às necessidades dinâmicas do mercado de trabalho com maior flexibilidade, ampliação da oferta e diminuição dos custos [...] ainda no aspecto de fomento à diversificação, o Banco ressalta que o custo mais baixo das estratégias propostas que separam o acadêmico do profissional é atrativo para o setor privado, permitindo maior flexibilidade no atendimento à demanda do mercado e mantendo as formas de articulação com o 3º grau pelo aproveitamento de créditos e equivalência. 3. Diversificar o financiamento das instituições estatais e adotar incentivos para o seu desempenho através de: participação dos estudantes no custeio do ensino [...]; financiamento por ex-alunos; ajuda externa e financiamentos para iniciar fundos;

desenvolvimento de atividades que gerem lucros [...]; estímulo às instituições que captam, com maior aporte de recursos públicos [...]; estímulo à participação dos empresários na gestão da escola como forma de “adequar” os currículos [...]; 4. Fomento da oferta privada, para contemplar a ação do estado e como meio de controlar os custos do aumento de matrículas nos estabelecimentos públicos [...]; 5. Melhoria da equidade mediante subsídios diretos a estudantes carentes por meios de programas de “trabalho e estudo” [...]; 6. Vinculação entre cessão de recursos e critérios de desempenho [...] (KUENZER, 2000b, pp. 69-72).

Assim, sob a influência do mercado inspirado pela “Teoria do Capital Humano” foram instituídas, no Governo da época, as reformas da educação no Brasil que, além de modificar a educação em âmbito geral produziram impactos negativos sobre a educação profissional abalando conquistas históricas que pautavam a dinâmica das relações entre educação e trabalho. A partir de então, retoma-se por meio de ações concretas, dirigidas pelo Governo, a proposta dualista de ensino para o trabalho sem uma formação humanística, visando apenas a inserção no mercado, e ensino com maior densidade e abrangência de conteúdos para o desenvolvimento da intelectualidade.

A primeira dessas reformas culminou em 20 de dezembro de 1996, com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394, ante às frustrações de educadores, parlamentares e outras lideranças sociais que demonstravam um grande interesse no destino da educação no país. O mal estar que foi gerado com a “Nova LDB” originou-se da forte expectativa dos sujeitos envolvidos nas discussões acerca dessa Lei, pois desde a LDB anterior, a 4.024/61, discutia-se o texto da nova lei a fim de construí-la com base em princípios democráticos que “fixassem as linhas mestras de uma ordenação da educação nacional orgânica e coerente”, conforme salienta Saviani (2004a, p.42).

Desse movimento resultou uma proposta, denominada “Substitutivo Jorge Hage”, referenciando-se ao seu relator, à época Deputado. Na condição de relator, Hage ouviu democraticamente as contribuições de todos que ele julgava terem competência para tanto, expôs o andamento do projeto em vários eventos, ouviu em audiências públicas cerca de 40 entidades e instituições e promoveu seminários temáticos para discutir os pontos polêmicos da proposta.

No entanto, havia uma proposta paralela a essa, criada originalmente no Governo anterior, sob a gestão do Presidente Fernando Collor de Melo (1990 a 1992).

No período em que Collor conseguiu manter-se na Presidência da República, estabeleceu-se uma aliança dele com o PDT4, que resultou em uma proposta de LDB apresentada pelo Senador Darcy Ribeiro. Tal proposta contou em

sua elaboração com a participação do primeiro escalão do MEC, abdicando da contribuição de todas as entidades representativas da educação nacional e de eminentes figuras da área, que estavam profundamente comprometidas com o processo de estabelecimento de novas diretrizes e bases para a educação nacional de forma democrática e com conteúdo que privilegiasse a formação cidadã (MARTINS 2000, p. 77).

Uma vez sancionada a LDB nº 9.394, o espaço destinado à Educação Profissional, ou seja – no capítulo III do Título V, os artigos 39, 40, 41 e 42 –, abordam, conforme explica Saviani (2004c), a educação profissional de forma genérica, não definindo instâncias, competências e responsabilidades, enfim, sem determinar a cargo de “quem” estaria a educação profissional, se da União, dos Estados, dos Municípios, das empresas ou da iniciativa privada indistintamente. O documento tampouco clarifica se, no nível da União, o órgão responsável pela educação profissional seria o Ministério da Educação ou o Ministério do Trabalho, ou até mesmo ambos.

O nível de generalização da Lei de Diretrizes e Bases é tal que a torna menos importante como lei maior da educação nacional, isto é, as diretrizes e bases que reordenam de fato a educação caminham por fora da lei de Diretrizes e Bases: nas medidas provisórias, emendas constitucionais, projetos de lei, encaminhados pontualmente ao Congresso pelo Executivo e nas resoluções do Ministério da Educação (DOMINGOS apud CHRISTOPHE, 2005, p. 6). Contudo, essa generalização que caracteriza o texto legal, especialmente no tocante à educação profissional, mostra-se funcional aos interesses do Estado, pois permite, à sombra da Lei, a implementação de políticas anteriormente discutidas com os organismos financeiros internacionais. Estas seriam políticas voltadas à instalação de um sistema de qualificação de cunho imediatista direcionado à formação de uma reserva de mão-de-obra que servisse à ordem da produção do capital.

Desse modo, utilizando-se da universalidade da Nova LDB, o Governo delibera o Decreto n° 2.208/97 que ratifica, definitivamente, nesse período, a separação entre educação para pensar e para fazer, algo que historicamente havia se imaginado superado devido às experiências negativas anteriores, como fora as das Leis n° 5.692/71 e a 7.044/825.

5 Em um contexto de euforia em decorrência do “milagre econômico”, o período de 1964 a 1985, da ditadura

militar, foi marcado por uma “evolução” industrial, e, como consequência, o foco da educação com um compromisso para o trabalho. O Governo investia na educação profissional visando o aumento da produção brasileira. Como afirmativa a essa política, Romanelli (2001, p.235) cita a instituição da Lei n° 5.692, em 1971, que fixa o objetivo geral da educação de 1º e 2º graus da seguinte forma: “Art.1º - O ensino de 1º e 2º graus tem por objetivo geral proporcionar ao educando a formação necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto-realização, qualificação para o trabalho e preparo para o exercício consciente da cidadania.” A Lei n°5.692 tornou o ensino secundário eminentemente profissionalizante.

Uma significativa contribuição de análise sobre a Lei n° 5.692, os Pareceres 76/75 e a Lei n° 7.044/82, é fornecida por Gomes e Hiloko na obra: A ação docente na educação profissional (2004, p. 43 a 51). Os autores observam que a Lei nº 5.692 avançou ao tratar da dimensão educação-trabalho no ensino médio, dado o caráter

O Decreto 2.208/97, na prática, inviabilizou a possibilidade de manutenção de cursos de habilitação profissional que integrem educação geral e formação profissional. Ainda, a equivalência entre cursos de nível médio, gerais e profissionais, conquistada desde a LDB de 1961, desaparece quando o mesmo decreto determina que a continuidade de estudos depende do certificado de conclusão do ensino médio, e os novos cursos profissionais não exigem escolaridade anterior para a realização de cursos de nível básico e médio (KUENZER, 1999a, p. 135).

O Decreto n° 2.208, de 17 de Abril de 1997, permite a execução de algumas medidas previstas no Projeto de Lei, PL n° 1.603/96. Tal documento, desenvolvido em uma discussão anterior à Lei de Diretrizes e Bases não conseguiu aprovação à época, graças a um movimento contrário das diversas correntes políticas dentro do Congresso Nacional, representadas pela comunidade acadêmica, principalmente pelos grupos de investigação do campo trabalho e educação, das instituições públicas federais e estaduais. Dentre as medidas citadas, o conteúdo do PL n° 1.603/96, separava, obrigatoriamente, o ensino médio da educação profissional (BRASIL/CNE, 2010).

O Decreto n° 2.208/97 está organizado em 12 artigos; neles constam os objetivos da educação profissional, a articulação desta com o exercício do trabalho, os níveis dessa modalidade de educação, o conceito de “competências” e “habilidades”, a organização modular e a indicação de um novo profissional da educação sob a nomenclatura de “instrutor e monitor especializado”. O nível tecnológico, por seu turno, correspondente aos cursos superiores na área de tecnologia sendo citado, de forma supérflua, apenas no art.3 e art.10, deixando margens para dúvidas a respeito da sua estrutura e funcionamento (BRASIL, 1997).

Neste sentido, o Decreto que já indica em seu texto a formação por competências para atender o exercício da profissão, sugere também a participação efetiva dos agentes privados nas decisões sobre a oferta da educação profissional, respaldando, assim, os novos programas propedêutico e acadêmico do ensino médio até então. Porém, a proposta de profissionalização fracassou e, na prática, novamente, o que ocorreu foi que somente as escolas que já mantinham os cursos profissionalizantes deram continuidade a seus cursos. Enquanto isso, as escolas antes destinadas à formação acadêmica continuaram seu percurso de formação para prosseguimento de estudo, utilizando a obrigatoriedade da lei de formação profissional apenas como aparência para continuarem a desempenhar sua função propedêutica. Em 1975, o Conselho Federal de Educação promulgou o Parecer 76/75. Nele o seu relator admite haver ocorrido um equívoco na interpretação da lei, pois nesta estava sendo interpretado que toda a escola de segundo grau deveria transformar-se em escola técnica sem contar com recursos de qualquer ordem. O que a lei, na verdade, propunha, era que o ensino, e não a escola, fosse profissionalizante. Isto é, deveriam ter sido agregados conhecimentos específicos com uma base comum. Os alunos, portanto, não deveriam ser conduzidos a uma especialização para determinada ocupação, mas a uma formação básica para o trabalho.

A Lei n° 7.044/82 veio regulamentar o que, na prática, já acontecia, tornando a educação profissional facultativa para o ensino de segundo grau. Ao libertar esse nível de ensino da profissionalização, acabou por restringir a formação profissional às instituições especializadas. Gomes e Martins (2003) concluem que as Leis n° 5.692/71 e n° 7.044/82 acabaram por gerar falsas expectativas com relação à formulação profissional integrada a uma estrutura sem identidade para o ensino médio, mantido, de certa forma, escondido na estrutura de ensino de primeiro grau ampliado.

que logo foram organizados e operacionalizados pelo Governo; O Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador - o PLANFOR, e o Programa de Expansão da Educação Profissional – PROEP. Essa sinalização no texto do Decreto está claramente posta no art. 7º, parágrafo único, no qual se lê que “Para atualização permanente do perfil e das competências de que trata o caput, o Ministério da Educação e do Desporto criará mecanismos institucionalizados, com a participação de professores, empresários e trabalhadores” (BRASIL, 1997, p. 2).

Sob o viés do crescimento econômico do país, explica Ferreira (2006), o Governo de FHC propôs, através dos Planos Plurianuais – PPA, a execução de programas de formação e qualificação dos trabalhadores, denominados, respectivamente, de “Brasil em Ação” (1996- 1999), quando o Governo expôs a preocupação com a empregabilidade do trabalhador e apresentou as principais linhas de organização da educação profissional e o “Avança Brasil” (2000-2003), que reforçou essas diretrizes e efetivou as ações, executando e ampliando as ações do PLANFOR e PROEP

O PLANFOR, implementado pelo Ministério do Trabalho e Emprego – MTE por dois quadriênios de vigência (1995-1998 e 1999-2002), teve como proposta articular as Políticas Públicas de Emprego, Trabalho e Renda para a formação em massa da mão-de-obra brasileira. O Plano teve como a sua principal fonte de financiamento o Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT, articulado ao programa do seguro-desemprego.

O PLANFOR começou a ser mais amplamente executado a partir de 1996, dado ao estabelecimento da Resolução nº 126, de 23 de outubro deste ano, do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador – CODEFAT. Apesar da coordenação do Plano ter ficado a cargo do Ministério do Trabalho, suas ações passaram a depender da aprovação daquele Conselho, composto por representantes do Governo, dos empresários e das entidades sindicais (FERREIRA, 2006; HOLANDA, 2007).

Dentre as expectativas sobre o Plano, explica Silva (2009, p. 68), constava o ideal de “contribuir para a construção de uma política pública de trabalho e renda no país que pudesse atender as demandas postas pelo novo momento de internacionalização capitalista, de reorganização produtiva e de reforma do Estado”. A autora também acrescenta que, segundo o MTE, as ações de educação profissional propostas pelo PLANFOR tinham como objetivo a redução do desemprego e do subemprego da População Economicamente Ativa – PEA, o combate à pobreza e desigualdade social, e a elevação da produtividade, qualidade e competitividade do setor produtivo. A sua meta era garantir, tanto em médio quanto em longo prazo, a qualificação anual de pelo menos 20% da PEA.

O gerenciamento do PLANFOR se organizou de forma descentralizada por meio de uma cadeia estratégica e operacional estruturada nos níveis local, estadual e federal. O Plano mobilizou programas nacionais, estaduais e emergenciais, assim como os mecanismos de parcerias: os Planos Estaduais de Qualificação – PEQs e as Parcerias Nacionais e Regionais do MTE – PARCs. Os PEQs contemplavam projetos e ações de educação profissional circunscritos a uma unidade federativa, executados sob gestão da Secretaria Estadual ou sua equivalente e recebiam, no mínimo, 70% do investimento anual do PLANFOR. Já as PARCs, absorviam ações de qualificação profissional e projetos especiais implementados em escalas regional ou nacional, e ficavam com 30% dos recursos do Plano (idem).

Visando o desenvolvimento de competências e habilidades para a aplicação das condições de empregabilidade dos trabalhadores, o PLANFOR também se propôs a colaborar com a modernização das relações de trabalho e com a prática de uma política pública nos marcos da nova configuração do Estado brasileiro (CÊA, 2006).

No entanto, frente às decisões da “Reforma da Educação Profissional” de dissociar o ensino propedêutico do ensino técnico e conceber, de forma aligeirada, a formação profissional, tornou-se arriscado mensurar como o referido Plano sustentaria essa colaboração em um mundo do trabalho tão plural, avaliado por Antunes e Alves (2004) como heterogêneo, fragmentado e complexificado6, exigindo do homem uma formação escolar que o instrumentalizasse para analisar criticamente esse cenário.

Maués, Gomes e Mendonça (2008), com base em autores como Kuenzer (1999) e Fidalgo (1999), que analisam o PLANFOR, elucidam que os cursos, então oferecidos por sindicatos, Organizações Não Governamentais - ONGs e empresas privadas respaldavam a chamada nova institucionalidade, resultado da negociação do interesse comum na qualificação profissional, envolvendo representantes do Estado, trabalhadores e empresários a fim de reduzir custos e incrementar a parceria público-privado.

6 Antunes e Alves (2004) explicam que a conformação atual da classe trabalhadora vem presenciando um

processo multiforme cujas principais tendências são: redução do conjunto de trabalhadores estáveis que se estruturavam por meio de empregos formais; aumento do novo proletariado fabril e de serviços a exemplo dos terceirizados, contratados, part-time; aumento significativo do trabalho feminino precarizado e desregulamentado; significativa expansão dos assalariados médios no “setor de serviços”; crescente exclusão de jovens, que atingiram a idade de ingresso no mercado de trabalho; exclusão dos trabalhadores considerados “idosos” pelo capital; crescente expansão do trabalho no “Terceiro Setor”, assumindo uma forma alternativa de