• Nenhum resultado encontrado

As provas em face da presunção de legitimidade do lançamento tributário

7. LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO

7.2 Lançamento Tributário

7.2.11 As provas em face da presunção de legitimidade do lançamento tributário

As provas apresentam fundamental importância em face da legitimidade do lançamento tributário, tendo em vista, ao prezar pelo direito de defesa do contribuinte, permitem que este possa contestar a ocorrência de um determinado fato e a alegação do Fisco, e logo, a exigência de um determinado tributo, mediante a produção de provas.

É através da presunção de validade do ato administrativo que é permitido ao contribuinte que apresente a sua defesa, pois essa presunção de validade exige que o ato administrativo, e logo, o lançamento tributário, seja fundamentado para que seja válido, o que significa dizer que explicite as razões pelas quais o ato administrativo foi praticado, permitindo ao contribuinte que detenha o conhecimento dos fatos que lhe estão sendo imputados e das normas que estão sendo aplicadas e deles possa se defender, mediante a apresentação de uma prova negativa.

Nesse sentido, manifestou-se o Superior Tribunal de Justiça:

TRIBUTÁRIO – LANÇAMENTO FISCAL – REQUISITOS DE AUTO DE INFRAÇÃO E ÔNUS DA PROVA.

O lançamento fiscal, espécie de ato administrativo, goza da presunção de legitimidade; essa circunstância, todavia, não dispensa a Fazenda Pública de demonstrar, no correspondente auto de infração, a metodologia seguida para o arbitramento do imposto – exigência que nada tem a ver com a inversão do ônus da

prova, resultado da natureza do lançamento fiscal, que deve ser motivado. Recurso especial não conhecido.259

Não é cabível à Administração Pública apenas afirmar que um determinado fato ocorreu, mas sim deve, também, indicar o dado fático, concreto e individualizado, devidamente comprovado, mediante a linguagem admitida em direito, que motivou a imputação ao contribuinte, e assim, para que o lançamento tributário, enquanto ato administrativo, goze de presunção de legitimidade.

Em conformidade ao disposto no artigo 142, do Código Tributário Nacional, o lançamento tributário, enquanto atividade privativa da Administração, deve compreender “o

procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador correspondente”, englobando, assim, a verificação efetiva da ocorrência do fato jurídico,

mediante a investigação de todos os aspectos necessários a constatar se deu a sua ocorrência ou não.

Paulo de Barros Carvalho, nesse sentido, afirma que “(...) na própria configuração

oficial do lançamento, a lei institui a necessidade de que o ato jurídico administrativo seja devidamente fundamentado, o que significa dizer que o fisco tem que oferecer prova concludente de que o evento ocorreu na estrita conformidade da previsão genérica da hipótese normativa”.260

Desse modo, o lançamento tributário constitui-se como uma norma individual e concreta em que no antecedente, deve conter o relato de um fato que especifique a ocorrência de um determinado acontecimento, mediante a apresentação de todos os elementos que o constituem, através da linguagem jurídica, caracterizando-o como pertencente aos fatos hipoteticamente previstos na hipótese da norma geral e abstrata, ou seja, na norma que enuncia a regra-matriz de incidência tributária.

259 Acórdão unânime da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial n. 48.516-SP, Rel. Min. Ari

Pargendler, DJ de 13.10.1997.

Cabe destacarmos a lição de Fabiana Del Padre Tomé:

A fundamentação das normas individuais e concretas na linguagem das provas decorre da necessária observância aos princípios da estrita legalidade e da tipicidade tributária, limites objetivos que buscam implementar o sobreprincípio da segurança jurídica, garantindo que os indivíduos estarão sujeitos à tributação somente se for praticado o fato conotativamente descrito na hipótese normativa tributária. Como bem ensina Paulo de Barros Carvalho, o princípio da tipicidade tributária se define em duas dimensões, quais seja, o plano legislativo e o da facticidade. No primeiro está a necessidade de que a norma geral e abstrata traga todos os elementos descritores do fato jurídico tributário e os dados prescritores da relação obrigacional, ao passo que no segundo tem-se a exigência da estrita subsunção do fato à previsão genérica da norma geral e abstrata, vinculando-se à correspondente obrigação. Por esse motivo, a norma individual e concreta que constitui o fato jurídico tributário e a correspondente obrigação deve trazer, no antecedente, o fato tipificado pela norma geral e abstrata, com as respectivas coordenadas temporais e espaciais, indicando, no conseqüente, o fato da base de cálculo, juntamente da alíquota, especificando o quantum devido, bem como os sujeitos integrantes do vínculo obrigacional. E, para que a identificação desses fatos seja efetuada em conformidade com as prescrições do sistema jurídico, deve pautar- se na linguagem das provas. É por meio das provas que se certifica a ocorrência do fato e seu perfeito enquadramento aos traços tipificadores veiculados pela norma geral e abstrata, permitindo falar em subsunção do fato à norma e em implicação entre antecedente e conseqüente, operações lógicas que caracterizam o fenômeno da incidência normativa. 261

A presunção de legitimidade do lançamento tributário requer, portanto, a fundamentação concreta e comprovada acerca da ocorrência de determinado fato jurídico tributário, mediante o acesso às provas que ensejaram o agente administrativo a enunciar a norma individual e concreta do lançamento tributário, tendo em vista ser uma exigência que decorre, necessariamente, da fundamentação do ato administrativo, e logo, da natureza do lançamento tributário, enquanto atividade privativa da administração, bem como dos elementos necessários ao exercício do direito de defesa do contribuinte. A veracidade do relato, contido no lançamento tributário, deve ser passível de verificação mediante correspondência à linguagem das provas acerca do fato enunciado.

É o que afirma Raquel Cavalcanti Ramos Machado, que, ato contínuo, diz ainda:

Isso porque o fato meramente alegado, ou cuja ocorrência não é demonstrada, simplesmente não tem o condão de obrigar o contribuinte. Nesses casos, para não

261

TOMÉ, Fabiana Del Padre. Conhecimento, verdade e direito tributário. Revista de Direito Tributário. Cadernos de Direito Tributário. São Paulo. n. 106. p. 113. 2009.

se submeter à exigência, em vez de tentar produzir prova muitas vezes de difícil realização, deve o contribuinte, em verdade, demonstrar o vício na formação do ato administrativo. Essa é a lição de Marco Aurélio Greco, ao afirmar que, nesses casos, o ônus do contribuinte:

“não é o de produzir prova negativa ou prova impossível, mas sim o de demonstrar que a exigência feita padece de vícios, dentre os quais pode se encontrar o de não ter a Administração realizado prova suficiente da ocorrência do fato gerador do tributo. (...)

Não cabe ao contribuinte provar a inocorrência do fato gerador, incube ao fisco, isto sim, demonstrar sua ocorrência”.

Tanto o ato administrativo de lançamento deve fundar-se em afirmações sobre fatos devidamente comprovadas, que o art, 9 do Decreto n. 70.235/72 reconhece que: “Art. 9. A exigência de crédito tributário, a retificação de prejuízo fiscal e a aplicação de penalidade isolada serão formalizadas em autos de infração ou notificações de lançamento, distintos para cada imposto, contribuição ou penalidade, os quais deverão estar instruídos com todos os termos, depoimentos, laudos, e demais elementos de prova indispensáveis à comprovação do ilícito”.262

No entanto, caso a presunção de legitimidade do lançamento tributário não se encontre devidamente comprovada, mediante a devida demonstração de fundamentação de dados individualizados e concretos, através de provas apresentadas pelo Fisco que ensejem a demonstração da ocorrência do fato jurídico, é possível ao contribuinte produzir provas em contrário, objetivando não se submeter à obrigação imposta através do lançamento tributário, por entender que as provas contidas no ato administrativo não se encontram suficientes. Para tanto, deve impugnar o lançamento tributário, mediante a apresentação de defesa administrativa, visando questionar a validade do ato, desconstituindo, assim, a sua presunção de legitimidade, requerendo, ainda, a produção de provas. Cabe ressaltar que, em conformidade ao disposto nos artigos 145 e 149, do Código Tributário Nacional, o lançamento tributário, quando regularmente notificado ao sujeito passivo, somente admite alteração em casos de apresentação de impugnação pelo sujeito passivo ou através de apresentação de recurso de ofício pela autoridade administrativa.

É o que ensina Susy Gomes Hoffmann:

Então, se o lançamento tributário é passível de impugnação, é necessário que em vista do direito constitucional à ampla defesa, o sujeito passivo tenha acesso não só

262 MACHADO, Raquel Cavalcanti Ramos. A prova no processo tributário: presunção de validade do ato

ao enunciado fáctico constante da norma individual e concreta do lançamento tributário, mas também que lhe seja dado acesso às provas que levaram o agente administrativo a enunciar tal norma, imputando-lhe a ocorrência de um fato jurídico tributário e determinando a obrigação de pagar um determinado valor a título de tributo.

É imperioso destacar que as provas devem ser apresentadas ao sujeito passivo juntamente com a notificação do lançamento tributário, fazendo parte integrante do mesmo.

Então, para nós, a legitimidade do lançamento tributário – entendendo legítimo como o que é realizado de acordo com as regras do sistema e que portanto deverá prevalecer – será reconhecida pela verificação de que o acontecimento fáctico narrado e a relação jurídica instaurada estão relacionados com as provas – que se apresentam por meio de uma forma e linguagem imposta pelo direito.263

Portanto, as provas assumem fundamental importância em face da legitimidade do lançamento tributário tendo em vista que, caso seja verificável que não existem provas suficientes e aptas a sustentarem o relato contido no enunciado de uma norma individual e concreta de lançamento tributário, logo, este pode ser anulável ou alterável, mediante a expedição de uma norma individual e concreta que seja emanada por um agente competente e de hierarquia superior àquele que expediu a norma que deve ser alterada.264

Nesse sentido, Fabiana Del Padre Tomé afirma:

É insustentável o lançamento ou ato de aplicação de penalidade que não tenha suporte em provas suficientes da ocorrência do evento, como se observa da seguinte decisão proferida pelo Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo: PROVAS – FALTA DE APRESENTAÇÃO PELO FISCO – APELO PROVIDO. O duelo de provas é facilmente vencido pela recorrente. A própria afirmação do Agente Fiscal de Rendas de que “infelizmente nem tudo que apuramos em nossas investigações pôde ser provado e levado ao AIIM” enfraquece bastante o trabalho fiscal. O Julgador deve ater-se ao que consta do processo e aos elementos existentes nele, e nuca às afirmações que as partes façam e não comprovem.

Convém, nesta oportunidade, advertir: a Administração não detém o ônus da prova, mas o dever de provar.265

Então, a maioria dos motivos que ensejam a anulação ou a alteração do lançamento tributário, afetando, assim, a sua legitimidade, encontram-se relacionados às provas: por não haver equivalência entre a linguagem que relata o fato jurídico tributário exposto na norma

263 HOFFMANN, S. G. A presunção de legitimidade do lançamento tributário e a legitimidade do lançamento

tributário em face das provas.., p. 154.

264 Destacamos que a validade do lançamento tributário também depende da observância de outros requisitos,

tais como a competência da autoridade e a regular notificação ao sujeito passivo. No entanto, tendo em vista o objetivo de estudo do presente trabalho, importa, tão somente, enfatizar a relevância de motivação acerca do conteúdo do lançamento tributário, enfatizando a importância da presunção de legitimidade em face das provas.

individual e concreta do lançamento tributário e a linguagem das provas, devido ao fato das provas que sustentam o lançamento tributário não se afirmarem em face de novas provas apresentadas, por constatar a ocorrência de fato distinto ao relatado devido a análise e produção e de novas provas, por constatar a ocorrência de dolo, fraude ou erro na elaboração de provas que sustentam o fato jurídico tributário que embasa o lançamento tributário, entre outros.266

Por fim, cabe concluirmos com a lição de Fabiana Del Padre Tomé acerca do assunto, que sustenta:

A produção de prova pela Administração (...) não caracteriza mero ônus, entendido como encargo necessário para se atingir uma pretensão. Mais que isso, configura um verdadeiro dever. Tendo em vista o caráter vinculado do lançamento e do ato de aplicação de penalidade tributária, é dever da autoridade administrativa certificar-se da ocorrência ou não do fato jurídico desencadeador do liame obrigacional, o que só é possível mediante linguagem das provas. Nesse sentido, inclusive, é a determinação do art. 9, caput, do Decreto n. 70.235/72, que ordena sejam a exigência do crédito tributário e a aplicação da penalidade instruídos com os termos, depoimentos , laudos e demais elementos de prova.

(...)

O atributo da presunção de legitimidade, inerente aos atos administrativos, não dispensa a construção probatória por parte do agente fiscal. Essa figura presuntiva é júris tantum, significando a possibilidade de ser ilidida por prova que a contrarie, o que reforça nosso posicionamento no sentido de que os atos de lançamento e de aplicação de penalidade dependem da cabal demonstração da ocorrência dos motivos que o ensejaram. 267

É, desse modo, um dever da Administração Pública provar que o evento ocorreu em conformidade à previsão genérica da hipótese normativa, provando, assim, a ocorrência do fato jurídico tributário e as circunstâncias em que este se verificou, permitindo a aplicação normativa, mediante a constituição do fato jurídico tributário e do respectivo laço

266 Paulo de Barros Carvalho enfatiza: “Cumpre advertir que o conhecido ‘atributo’, conhecido como

pressuposto de legitimidade dos atos administrativos, aqui tomado com o nome de ‘lançamento tributário’, vem sendo submetido a duros questionamentos. Indaga-se: uma vez que todo ato jurídico, produzido pelo particular ou pelo órgão público, vale até prova em contrário, que juridicamente o desconstitua, por que só os atos administrativos gozariam da presunção de legitimidade? Não seria esse um traço presente em todos os atos jurídicos? Dúvidas como essas foram enfraquecendo o teor de “ïmperatividade” (não em termos jurídicos) que os atos emanados do Poder Público sempre ostentaram. Seja qual for a fonte ejetora do ato, valerá até prova em contrário, o que significa reafirmar a necessidade premente de observar-se a linguagem estipulada pelo direito objetivo, como linguagem competente, nos vários campos de incidência das normas jurídicas”.

(CARVALHO, P. de B. A prova no procedimento administrativo tributário..., 1998. p. 108.)

obrigacional, de modo que Paulo Cesar Bonilha afirma que “a presunção de legitimidade do

ato administrativo confere à Administração uma ‘relevatio ab onere agendi’e não uma ‘relevatio ab onere probandi’, isto é, a presumida legitimidade do ato permite à Administração aparelhar e exercitar, diretamente, sua pretensão e de forma executória, mas este atributo não a exime de provar o fundamento e a legitimidade de sua pretensão”.268

7.2.12 A causa (motivo, motivação e o conteúdo) que enseja a existência e a regular