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1 CARACTERIZAÇÃO GERAL DO OBJETO DE ESTUDO E ASPECTOS

1.5 ASPECTOS METODOLÓGICOS

Por se tratar de uma investigação no campo das Ciências Humanas e Sociais, mais precisamente em Geografia escolar, utilizamos a pesquisa qualitativa para analisar o processo de ensino-aprendizagem de Geografia no Ensino Médio, em escolas públicas e privadas da cidade de Caicó.

Considerando que esse tipo de pesquisa pode ser etnográfico ou estudo de caso, optamos pela segunda concepção, visto que a problemática que suscitou a investigação está centrada no fraco desempenho dos candidatos nos processos seletivos vestibulares da UFRN, tratando-se, portanto, de um estudo de uma situação em particular. Justificando o problema de pesquisa a partir do período do recorte temporal estabelecido, é possível perceber que, em determinado ano, a média dos discentes chega a 0,5, em um instrumento avaliativo de valor geral 4.0. Nesse sentido, enfocamos o estudo de caso porque visa à descoberta, enfatizando a “interpretação em contexto”, usando uma variedade de fontes de informação que permitem generalizações naturalísticas e buscam representar os diferentes e, às vezes, conflitantes pontos de vistas presentes numa situação social (LUDKE; ANDRÉ, 1986, p. 18-20).

No intuito de elucidar a problemática da pesquisa, seguimos em nossas análises os padrões éticos, uma vez que preservamos tanto os nomes das escolas quanto os dos professores, ambos identificados por letras maiúsculas do alfabeto. Desse modo, as escolas são identificadas pelos símbolos E1, E2, E3 e E4, enquanto os professores por P1, P2, P3, P4, P5, P6 e P7.

Neste estudo, fez-se necessário também buscarmos referenciais teóricos acerca da temática apresentada. Nesse sentido, além da pesquisa em campo, realizamos leituras de bibliografias que abordam o Ensino Médio e a Geografia enquanto disciplina da estrutura curricular desse nível no Brasil, Rio Grande do Norte e Caicó, município onde está a base empírica de análise.

Além disso, utilizamos a pesquisa documental, a qual, segundo Bardin (2011, p. 51), “tem por objetivo dar forma conveniente e representar de outro modo a informação, por intermédio de procedimentos de transformação”. Nesta investigação, esse tipo de pesquisa foi usado devido à necessidade de analisar os programas de estudo dos processos seletivos vestibulares, os planos anuais de Geografia no Ensino Médio das quatro escolas, os instrumentos avaliativos dessas

instituições de ensino e da COMPERVE/UFRN, bem como os documentos relacionados ao histórico das escolas pesquisadas.

Em relação aos planos anuais de Geografia, em nenhuma das escolas conseguimos encontrar todos que estavam compreendidos entre 2002 e 2012. Diante disso, para elaborar os quadros de nossa análise, consideramos aqueles que foram disponibilizados. É válido ainda mencionar que em alguns estabelecimentos escolares, segundo P3 e P4, tais planos não eram realizados. Os docentes seguiam uma programação anual de conteúdos para cada série de ensino.

No que concerne aos programas de estudo dos vestibulares, levando em conta o período do recorte temporal, foram disponibilizados no site da COMPERVE e também por e-mail, conforme solicitado.

Afora a pesquisa bibliográfica e documental, realizamos ainda entrevistas com os sete professores de Geografia do Ensino Médio das escolas citadas. Para que chegássemos aos questionamentos propostos12 nessa fase, no segundo semestre de 2013, aplicamos, de forma experimental, essa mesma entrevista com três desses docentes. Com base no resultado, reformulamos algumas questões e chegamos ao roteiro final, utilizado posteriormente nas entrevistas com todos os sujeitos, no período de abril a junho de 2014.

Optamos por essa técnica (entrevista), por possibilitar um diálogo com incremento de novas questões, quando buscamos coletar dados sobre aspectos socioprofissionais dos docentes e aqueles inerentes ao Ensino Médio e aos conteúdos e formas de avaliação trabalhados pelos professores que atuam na sala de aula, na perspectiva de confrontar os dados com os planos anuais de ensino e com as observações realizadas.

Mesmo sendo de interesse do pesquisador realizar todas as entrevistas gravadas, dois professores, identificados como P1 e P7, preferiram responder utilizando-se da linguagem escrita. Aceitamos a escolha deles, mas ficamos inquietos, pois muitas das informações solicitadas no questionário não foram mencionadas de forma abrangente, ou seja, não apresentaram a mesma riqueza de detalhes, se considerarmos as respostas obtidas com o uso da entrevista mediada.

Sabendo que os estudos de caso oportunizam a descoberta, buscamos evidenciar os fatores ou fatos que contribuem negativamente para o processo de

ensino-aprendizagem dos alunos do Ensino Médio das escolas-alvo desta pesquisa, e em grande medida não favorecem que eles consigam resultados satisfatórios em questões que envolvem o conhecimento da disciplina Geografia.

Nessa perspectiva, torna-se necessário caracterizar os diferentes contextos vivenciados pelas escolas de Ensino Médio pesquisadas, uma vez que, em alguns casos, tem-se o mesmo professor de Geografia lecionando em ambas as redes de ensino, sendo as discrepâncias entre o desempenho dos alunos relevantes.

Tal constatação nos permite trabalhar com outra característica do estudo de caso, que é a generalização naturalística, pois, se considerarmos que esses professores são facilitadores da aprendizagem e responsáveis pelo rendimento satisfatório dos alunos, o desempenho destes em ambas as instituições deveria, pelo menos, se aproximar. Porém, se levarmos em conta outros fatores, como os argumentos de inclusão, os discentes da rede pública deveriam aparecer com resultados melhores nas provas de Geografia.

Dessa forma, compreendemos a validade dessa técnica enquanto instrumento de investigação, em virtude de ser controlada e sistemática, implicando “a existência de um planejamento cuidadoso do trabalho e uma preparação rigorosa do observador” (LUDKE; ANDRÉ, 1986, p. 25).

2 PANORAMA REGULAMENTADOR DO ENSINO DE GEOGRAFIA EM NÍVEL MÉDIO

Apresentamos neste capítulo as mudanças ocorridas na educação brasileira a partir da Constituição Federal de 1988, as quais propiciaram transformações no Ensino Médio, inserindo a disciplina escolar Geografia na grande área das Ciências Humanas e suas Tecnologias.

Inicialmente, discutimos aspectos relacionados à Carta Magna do Brasil, mais precisamente ao artigo 208, que trata da educação básica. Nesta mesma seção, versamos sobre as mudanças propostas para o Ensino Médio a partir da Lei de Diretrizes e Bases 9.394/96, bem como sobre as orientações das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (DCNEM). Posteriormente, abordamos os PCN e suas propostas metodológicas na perspectiva de uma formação cidadã na última etapa da educação básica nas diversas áreas do conhecimento. Finalizando as discussões deste capítulo, analisamos as mudanças e os desafios enfrentados pela disciplina Geografia no Ensino Médio, em nosso país.

2.1 LDB 9.394/96 E DCNEM: CONSIDERAÇÕES ACERCA DO ENSINO MÉDIO A partir da década de 1990, iniciou-se uma série de mudanças no setor educacional do Brasil, que englobaram os diversos níveis e modalidades de ensino. Contudo, é oportuno ressaltar que, mesmo se consolidando de forma mais efetiva no último decênio do século XX, essas transformações têm suas origens diretamente atreladas à Constituição Federal de 1988, tendo em vista que, nas duas constituições anteriores (CF/196713 e CF/196914), prevaleceu um regime de caráter ditatorial no Brasil.

13 Pautada sob inspiração da ideologia da segurança nacional, abriu amplos espaços de apoio ao

fortalecimento do ensino particular. A ampliação da obrigatoriedade do ensino fundamental de sete a 14 anos, aparentemente uma grande conquista, conflitava com outro preceito, que permitia o trabalho de crianças com 12 anos. Também a ideia de gratuidade do ensino esbarrava na prescrição constitucional da criação de um sistema de bolsas de estudo reembolsáveis. Por fim, retirava-se a obrigatoriedade de percentuais do orçamento destinados à manutenção e ao desenvolvimento do ensino (CARNEIRO, 2013, p. 27).

Os artigos 206, 207 e 208 da CF/1988 explicitam os deveres do Estado no que concerne à educação brasileira. Contudo, neste trabalho, considerou-se apenas o último artigo, uma vez que apresenta em seus incisos aspectos inerentes à garantia da educação básica no país.

Segundo o artigo 208, o dever do Estado brasileiro com a educação será efetivado mediante a garantia de:

I – educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada, inclusive, sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria; (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 59, de 2009) (Vide Emenda Constitucional n. 59, de 2009); II – progressiva universalização do ensino médio gratuito (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 14, de 1996);

III – atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;

IV – educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 53, de 2006); V – acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;

VI – oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando; VII – atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio de programas suplementares de material didático escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 59, de 2009).

Ao analisarmos os incisos que compõem o presente artigo, constatamos que, ao longo dos 26 anos dessa Constituição, algumas emendas já foram inseridas visando garantir ainda mais os interesses da sociedade organizada, bem como fortalecer a educação básica em seus diversos níveis.

Nesse contexto, ressaltamos a importância da garantia de escolarização a crianças e jovens do Brasil, mesmo para aqueles que não estão na idade certa. Sabe-se que o desenvolvimento de um país está diretamente atrelado à ampliação do nível de escolaridade de seu povo. Além disso, é válido mencionar a proposta de universalização do Ensino Médio, que passa a adquirir uma nova face com a Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996.

14 A escola passou a ser palco de vigilância permanente dos agentes políticos do Estado. Nesse

período, editaram-se vários Atos Institucionais, que eram acionados, com muita frequência, contra a liberdade docente (CARNEIRO, 2013, p. 27).

A Lei de Diretrizes e Bases (LDB) n. 9.394/96, também chamada de Darcy Ribeiro15, em homenagem ao político e educador, é composta por 92 artigos,

distribuídos em diferentes títulos relativos ao ensino do Brasil.

Dentre os itens mais significativos dessa Lei, relacionados ao Ensino Médio, podemos mencionar a edificação de uma nova identidade desse nível de ensino e a reformulação de sua base curricular.

Quando nos referimos aos dois itens citados acima, consideramos como marco a CF/1988, além de levarmos em conta as mudanças que ocorreram16, já que, segundo Carneiro (2013, p. 24), “o ensino secundário visava à preparação dos alunos para o ensino superior, portanto, tinha uma orientação curricular propedêutica”, ou seja, esse nível de escolaridade era direcionado para garantir o ingresso da população nas universidades. Ainda de acordo com o autor, “a maioria das escolas secundárias abrigava-se nas mãos de particulares, o que por si só representava uma elitização, dado que somente famílias de posse poderiam custear os estudos de seus filhos” (CARNEIRO, 2013, p. 24-25).

Diferentemente do que foi estabelecido no passado para o ensino secundário, com a Lei 9.394/96, a sociedade como um todo passa a ter acesso a esse nível de ensino, o que é “relevante porque abre possibilidades para a formação e o aperfeiçoamento das diferentes camadas sociais da coletividade, assegurando-se, assim, a rota para a materialização do primeiro dos princípios do Art. 3º, da LDB, igualdade de acesso e permanência” (CARNEIRO, 2013, p. 54).

Nesse sentido, pode-se afirmar que a gratuidade do Ensino Médio

tem tríplice alcance: social, porque eleva o padrão de escolaridade do cidadão brasileiro, aprimorando os níveis de compreensão política em geral;

cultural, porque ressitua as pessoas no contexto das diversas linguagens

atuais, ampliando as chances de multiplicar os espaços dialógicos e interacionistas e, por fim, econômico, porque qualifica o trabalhador, ensejando uma relação profissional mais adequada com as transformações produtivas atuais e com a TECNOCIÊNCIA (CARNEIRO, 2013, p. 70).

15 Dedicou-se à educação. Fundou a Universidade de Brasília à custa de muita luta e foi o seu

primeiro Reitor. Sua meta era favorecer a pesquisa na universidade para a solução dos problemas nacionais. Foi também Ministro da Educação e, mais tarde, Ministro-Chefe da Casa Civil de João Goulart. Recebeu títulos de Doutor Honoris Causa de Sorbonne, da Universidade de Copenhague, da Universidade do Uruguai e da Universidade da Venezuela. Darcy Ribeiro faleceu em 17 de fevereiro de 1997. No seu último ano de vida, dedicou-se especialmente a organizar a Universidade Aberta do Brasil, com cursos de educação à distância (Biografia – Disponível em: www.revistaliteraria.com.br).

16 Formação cidadã – implica que os sujeitos possam ser formados na perspectiva de seres críticos,

Considerando que vivemos em uma sociedade capitalista, que dita os diversos sistemas (incluindo nestes o educacional) a serem seguidos pela população brasileira, tem sido garantido o direito a um ensino público que tanto contribui para o aumento da escolaridade quanto oportuniza a qualificação profissional e o processo de produção.

Mesmo com uma entrada gratuita garantida, muitos jovens e adultos ainda não têm acesso a um Ensino Médio de qualidade, pois, em muitos estabelecimentos escolares, faltam vagas, professores, laboratórios e espaços adequados para o desenvolvimento de atividades junto aos discentes.

Esse conjunto de fatores é constatado também nas escolas públicas do Rio Grande do Norte, com um agravante quando se considera a infraestrutura e a procura por vagas, tendo em vista que, em alguns casos, é necessário que os pais pernoitem nos estabelecimentos de ensino no início do ano letivo para ter a vaga garantida.

Tal situação acontece porque a Secretaria de Educação e Cultura do Estado (SEEC/RN), tendo implantado um sistema de gerenciamento acadêmico (SIGEDUC), requer que as matrículas sejam realizadas via internet, ou seja, os responsáveis pelos discentes solicitam a vaga por meio do sistema, mas para que esta seja efetivada deve-se comparecer à escola para assinar o requerimento de matrícula e entregar a documentação pessoal do aluno.

Quando analisamos o que rege a Constituição Federal e a realidade das escolas brasileiras, podemos interrogar até que ponto a obrigatoriedade e a gratuidade prevalecem, uma vez que, se o direito é garantido, subtende-se que deveriam existir espaços com estruturas adequadas, quadro de professores suficientes e vagas para esse nível de ensino, independentemente da localização da escola.

O Ensino Médio contemporâneo, que compreende a etapa final da Educação Básica, tem como finalidades

[...] a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos; a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores; o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico; a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos

produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina (BRASIL, 1996, p. 28-29).

A partir da LDB 9394/96, o Ensino Médio do Brasil passou a oferecer uma formação geral, de modo que o discente se torne capaz de criar, formular, pesquisar e analisar, não somente memorizar.

Como forma de aprimorar ainda mais esse nível de ensino, em 1998, são criadas, através da Resolução CEB n. 03, de 26 de junho, as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (DCNEM),

[...] que se constituem num conjunto de definições doutrinárias sobre os princípios, fundamentos e procedimentos a serem observados na organização pedagógica e curricular de cada unidade escolar integrantes dos diversos sistemas de ensino, em atendimento ao que manda a lei [...] (BRASIL, 1998, p. 01).

Nesse sentido, todas as unidades federativas do país e o Distrito Federal precisam considerar, na organização da estrutura curricular, que o Ensino Médio é composto por uma base nacional comum e outra parte diversificada, as quais devem estar integradas e possibilitar o conhecimento das realidades locais e regionais. Além disso, o currículo deve levar em conta as quatro áreas de formação, oportunizando a interdisciplinaridade sem excluir as particularidades de cada componente curricular.

Para Moehlecke (2012), a proposta de currículo para o Ensino Médio, que lhe atribui um caráter tanto unificado quanto diversificado, pode ser uma mudança, mas o desafio está em sua consolidação por meio de ações efetivas dos sistemas das escolas e, atualmente, no embate com o ENEM, que é nacional e não leva em consideração as realidades regionais.

Como forma de garantir os objetivos propostos para o Ensino Médio, as DCNEM, em seu artigo 14, apontam que esse nível de ensino deve contemplar no mínimo três anos, com 200 duzentos dias letivos cada um, abrangendo uma carga horária total de, pelo menos, 2.400 horas.