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PLANEJAMENTO E CONTEÚDOS DE ENSINO: CONCEITOS, TIPIFICAÇÃO E

3 OS CONTEÚDOS DE ENSINO E AVALIAÇÃO: SUA IMPORTÂNCIA NO PROCESSO

3.1 PLANEJAMENTO E CONTEÚDOS DE ENSINO: CONCEITOS, TIPIFICAÇÃO E

Nas últimas décadas, foram implementadas várias políticas de educação pelo Governo Brasileiro, dentre elas, encontram-se as que estão direcionadas para a formação de professores, visto que em algumas regiões do país o déficit de docentes ainda é elevado. Esse fato pode ser constatado ao observarmos dados em órgãos governamentais, como o MEC, ou ao acompanharmos o noticiário do Brasil pela televisão, internet, jornais e revistas impressos.

Essa falta de professores qualificados, em algumas áreas do território brasileiro, pode ser justificada por inúmeros fatores, entre os quais estão: falta de interesse dos jovens pela docência, baixa remuneração para o trabalho docente, falta de infraestrutura nos estabelecimentos escolares e de oportunidade de ingressar nas universidades, principalmente nas regiões mais longínquas, onde a

difusão e a expansão do ensino superior ainda não ocorreram. Ainda nesse contexto, há um grande número de licenciados que, ao concluírem seus cursos, optam por outras carreiras diferentes do ensino. Contudo, é significativo dizer que, “[...] ao ingressarmos em uma licenciatura, devemos ter convicção de que estaremos sendo preparados para enveredarmos no ofício da docência. [...] adquirir competências e habilidades a fim de se tornarem excelentes profissionais em suas atividades [...]” (GARCIA et al., 2014, p. 119).

Dessa forma, é preciso ficar claro para os graduandos que as licenciaturas têm por objetivo formar professores, os quais no âmbito de suas atividades são também pesquisadores. Assim, mesmo os que não possuem interesse pelo ensino, mas buscam as licenciaturas, terão sua formação voltada para a docência, que vai muito além de ministrar aulas.

Os que escolhem seguir a carreira docente devem estar cientes de que essa profissão envolve atividades inerentes ao cotidiano da sala de aula, que abrangem desde o planejamento com definições de objetivos, identificação de conteúdos, escolhas de metodologias que favoreçam a aprendizagem, elaboração de instrumentos avaliativos até o conhecimento das realidades econômicas e sociais dos educandos.

Por esse motivo, muitos se angustiam ao iniciarem as atividades profissionais enquanto docentes, principalmente no que diz respeito ao que fazer em sala de aula, o que pode gerar as seguintes dúvidas: que atitudes ter diante dos alunos? Que estratégias metodológicas utilizar para obter o envolvimento e a participação dos alunos? Que conteúdos selecionar para abordar nas aulas?

Para esse conjunto de questionamentos não existem respostas definitivas nem receitas prontas, mas há habilidades e competências adquiridas na formação que devem fundamentar a prática cotidiana, considerando o público envolvido no processo de ensino-aprendizagem. Outrossim, a experiência ao longo do tempo propicia o aperfeiçoamento do trabalho docente em sala de aula.

Mesmo sabendo que a prática contribui de forma significativa no processo de formação de qualquer profissional, entendemos que algumas ações são primordiais para que o desenvolvimento das atividades seja realizado de forma satisfatória. Portanto, ao enfocarmos a profissão docente, devemos atentar para a importância do planejamento de ensino e dos conteúdos.

Em relação ao planejamento de ensino, Turra et al. (1986, p. 14) define-o como um

processo contínuo que se preocupa com o “para onde ir” e “quais as maneiras adequadas para chegar lá”, tendo em vista a situação presente e possibilidades futuras, para que o desenvolvimento da educação atenda tanto as necessidades do desenvolvimento da sociedade, quanto as do indivíduo.

Nesse contexto, podemos entender o ato de planejar como uma ação para executar algo. No ensino, essa etapa consiste no momento em que o professor organiza sua forma de trabalhar em sala de aula, considerando, para tanto, o que é estabelecido pelos programas oficiais em cada área do conhecimento e as diversidades existentes nas turmas escolares.

Legitimando esse pensamento, Pinheiro (2012) define planejamento como o conjunto de objetivos e metas, procedimentos e ações pensadas para apoiar o trabalho docente. Essa fase é de fundamental importância para o processo de ensino-aprendizagem, pois possibilita ao professor identificar e acompanhar o desenvolvimento dos discentes ao longo de um período letivo.

Com o planejamento de ensino, o professor fica seguro de suas atividades, sabendo o que vai desenvolver na aula e que estratégias metodológicas poderá utilizar, adequando-o, ainda, se preciso, a novas temáticas que surjam no transcurso da unidade didática, uma vez que deve também ser flexível.

Considerando a significância do planejamento para o ensino, identificamos que em duas das escolas pesquisadas (E3 e E4), este não é realizado de forma a atender aos anseios do corpo docente e discente. Tal fato ocorre porque os professores apenas seguem a programação anual que é estabelecida pelos sistemas24 aos quais os estabelecimentos de ensino estão vinculados.

Acreditamos que isso não favorece a atividade profissional do docente nem a aprendizagem dos alunos porque o professor é praticamente obrigado a trabalhar os conteúdos que estão elencados na programação para o Ensino Médio, de modo a cumpri-los ao término do ano letivo, sem muitas vezes considerar as realidades vivenciadas pelos alunos e as temáticas que são mais relevantes no processo de construção pessoal e intelectual dos discentes.

24“Sistemas”, nesse contexto, faz referência aos grupos privados de ensino existentes no Brasil e

Em relação às escolas E1 e E2, percebe-se que o planejamento ocorre de forma superficial, uma vez que no início do ano letivo os professores organizam uma sequência de conteúdos que devem ser trabalhados em cada série do Ensino Médio. Essa organização é elaborada a partir das temáticas elencadas no livro didático adotado pela escola.

Nesse contexto, Callai (1995, p. 100-101) alerta:

Por influência dos livros didáticos que estão sendo utilizados, as divisões são feitas por áreas, considerando os aspectos econômicos e depois os aspectos referentes ao meio ambiente. Isto é, trocaram de lugar o físico, o quadro natural, as condições naturais e passaram a denominá-lo de questões do meio ambiente, onde a maioria das vezes são considerados os problemas e os encaminhamentos ecológicos [...]. Continuam portanto todos os itens, apenas foram trocados de lugar, quando seria de se esperar que o tratamento metodológico aliado à seleção/definição dos conteúdos redefinisse todo o conjunto do planejamento e o fazer da sala de aula.

No entanto, devemos ter clareza de que

[...] os conteúdos do livro didático somente ganham vida quando o professor os toma como meio de desenvolvimento intelectual, quando os alunos conseguem ligá-los com seus próprios conhecimentos e experiências, quando através deles aprendem a pensar com sua própria cabeça (ZABALA, 1998, p. 79).

Entendemos, assim, que não bastam apenas os manuais didáticos para trabalhar os conteúdos de ensino, mas também inserir e aproximar suas propostas das realidades dos educandos para que construam e aperfeiçoem seus saberes.

Ao falarmos em conteúdos, torna-se necessário defini-los e, em seguida, inseri-los no contexto educacional, visto que podemos encontrar diferentes concepções para o termo. Se observarmos os dicionários Aurélio25 e Informal26,

encontraremos definições não muito próximas, pois o primeiro define o termo como “o que está contido”, enquanto o segundo denomina quanto ao “assunto de que se trata em algum documento”.

Ao considerarmos essas definições, podemos compreender que ambas são coerentes para utilizarmos em diversos momentos do cotidiano. No entanto, quando

25 O que está contido: conteúdo de uma garrafa. / Fig. Substância, sentido: conteúdo de uma carta.

(Dicionário do Aurélio – Disponível em: www.dicionáriodoaurelio.com).

26 1- Aquilo que está contido, ou encerrado, dentro de alguma coisa. 2- O assunto de que se trata em

nos reportarmos à perspectiva educacional, é preciso um aprofundamento em torno da definição de conteúdos. No campo do ensino, esse termo é utilizado para caracterizar as temáticas que são estabelecidas para as matérias ou disciplinas de cada ano ou série escolar.

Dessa forma, podemos inferir que conteúdo de ensino é o conjunto de saberes elaborados que integram as diferentes áreas do conhecimento e que são transmitidos, repassados, trabalhados ou ensinados a um grupo que busca o saber.

Nesse sentido, concordamos com Libâneo (1994) quando menciona que os conteúdos de ensino são resultantes do saber sistematizado, ou seja, das investigações realizadas pelo homem sobre o mundo da natureza e das relações sociais. Esse conjunto de elementos proporciona a cientificidade do saber nas ciências, o que posteriormente é transformado em um saber didático-pedagógico, no intuito de possibilitar conhecimento aos discentes. A esse respeito, o autor explica que

[...] os conhecimentos e modos de ação são frutos do trabalho humano, da atividade produtiva científica e cultural de muitas gerações, no processo de prática histórico-social. No seio desse mesmo processo (de atividade prática transformadora pelo trabalho), a herança recebida da história anterior vai sendo modificada ou recriada, de modo que novos conhecimentos vão sendo produzidos e sistematizados (LIBÂNEO, 1994, p. 129).

A assertiva converge para o que pensamos sobre o papel dos professores ao trabalharem os conteúdos de ensino nas diversas áreas do conhecimento, pois, a partir dos debates em sala, novos conhecimentos podem ser construídos e apreendidos por todos os sujeitos envolvidos no processo.

Interrogando os professores alvo da pesquisa sobre como definem conteúdo de ensino, apresentamos as falas de cinco deles, já que consideramos as demais como repetitivas. O docente P1 conceitua como “não é algo específico, é mais amplo, envolve áreas diferentes do conhecimento”. O P2 diz que “são conhecimentos básicos necessários para os alunos; aqueles que eles têm que aprender para chegar onde querem”. Já o P3 menciona que “são aqueles mais importantes que devem estar presentes nos livros didáticos de Geografia, aqueles que os alunos devem aprender”.

Em relação aos outros docentes, reproduzimos suas falas sequencialmente: “são assuntos diversos que fazem parte do cotidiano, do cotidiano geral” (P4). “São

conteúdos [...], está relacionado à parte da didática do escrever, do ler, copiar... matéria e disciplina [...] materialização do estudo que vai servir para o aprendizado do aluno” (P6).

Analisando as falas dos professores, podemos perceber diferentes conceituações para conteúdos de ensino, algumas bastantes coerentes e próximas do que defendem alguns teóricos, outras nem tanto, o que nos causa inquietação e questionamento sobre o modo como esses docentes são orientados em suas práticas didático-pedagógicas e que critérios estabelecem ao planejarem suas aulas, se não apresentam uma definição clara do termo ora discutido.

Como forma de apresentar uma definição científica, recorremos mais uma vez a Libâneo (1994, p. 128), que define os conteúdos de ensino como “o conjunto de conhecimentos, habilidades, hábitos, modos valorativos e atitudinais de atuação social, organizados pedagógica e didaticamente, tendo em vista a assimilação ativa e aplicação pelos alunos na sua prática de vida”.

Portanto, os conteúdos de ensino vão além dos saberes que já estão sistematizados, envolvendo também aqueles que já foram construídos nos diversos espaços onde professores e alunos estão inseridos.

Reforçando esse pensamento, Zabala (1998, p. 30) afirma que

[...] devemos entendê-lo como tudo quanto se tem que aprender para alcançar determinados objetivos que não apenas abrangem as capacidades cognitivas, como também incluem as demais capacidades. Deste modo, os conteúdos de aprendizagem não se reduzem unicamente às contribuições das disciplinas ou matérias tradicionais. Portanto, também serão conteúdos de aprendizagem todos aqueles que possibilitem o desenvolvimento das capacidades motoras, afetivas, de relação interpessoal e de inserção social.

Mesmo utilizando outra terminologia (“conteúdos de aprendizagem”), o autor mostra a importância destes fora do ambiente escolar. Nessa perspectiva, podemos inferir que muito do que se aprende na vida cotidiana nem sempre acontece dentro dos estabelecimentos de ensino. Contudo, devemos concordar que parte significativa desses conhecimentos é sistematizada nas escolas, cabendo, portanto, ao professor auxiliar no processo de construção ou reconstrução dos saberes, considerando também o espaço e os conhecimentos prévios dos discentes.

É sabido que existe uma gama de conteúdos de ensino nas diferentes áreas do conhecimento e que estes se inserem em diferentes tipologias a partir de

características próprias. Nesse sentido, recorremos a Coll et al. (1998), com seus seguintes questionamentos: “o que se deve saber?”, “o que se deve saber fazer?” e “como se deve ser?”, para identificarmos e caracterizarmos os conteúdos de ensino, por acreditarmos que seja essa a tipologia que mais se aproxima das discussões empreendidas (Quadro 3).

Quadro 3: Síntese da tipificação dos conteúdos

Conteúdos Caracterizações

Conceituais Referem-se ao conjunto de fatos, objetos ou símbolos que têm características comuns, e os princípios se referem às mudanças que se reproduzem num fato, objeto ou situação em relação a outros fatos, objetos ou situações e que normalmente descrevem relações de causa-efeito ou de correlação.

Procedimentais Incluem, entre outras coisas, as regras, as técnicas, os métodos, as destrezas ou habilidades, as estratégias, os procedimentos – é um conjunto de ações ordenadas e com um fim, quer dizer, dirigidas para a realização de um objetivo. Atitudinais Engloba uma série de conteúdos que, por sua vez, podemos agrupar em valores, atitudes e normas. Cada um destes grupos tem uma natureza suficientemente diferenciada que necessitará, em dado momento, de uma aproximação específica.

Fonte: Zabala, 1998.

Partindo dessa tipificação, podemos afirmar que nos estabelecimentos escolares os conteúdos conceituais estão relacionados aos saberes que foram sistematizados pela sociedade, ou seja, aqueles que aparecem nos currículos, programas e práticas de professores e são discutidos diariamente em sala de aula, os quais podem propiciar o surgimento de novos conhecimentos junto aos alunos. É necessário que tanto o professor como o aluno construam definições próprias acerca das temáticas estudadas.

Os conteúdos procedimentais envolvem os objetivos, isto é, aqueles procedimentos que devem ser trilhados para que o conhecimento seja aprendido pelos alunos. Assim sendo, na disciplina de Geografia,

[...] os conteúdos procedimentais relacionam-se ao modo pelo qual os alunos assimilam certas práticas que passam a fazer parte de sua própria vida. Aqui lembramos alguns exemplos: fazer leituras de imagens; habituar- se a ler várias modalidades de textos e integrá-los aos conhecimentos possuídos; ser capaz de utilizá-los em situações externas à escola [...] (PONTUSCHKA et. al., 2009, p. 108).

Dessa forma, é pertinente que possam ser trabalhados considerando sempre as realidades vividas pelos alunos para que estes saibam agir na resolução de problemas em prol de uma melhor sociedade.

No que diz respeito aos conteúdos atitudinais, “[...] destacam-se o respeito às diferenças de sexo, de etnia, de faixas etárias, com responsabilidade sobre as crianças e os idosos, a valorização do patrimônio sociocultural, da diversidade ambiental, dos direitos e deveres do cidadão” (PONTUSCHKA et al., 2009, p. 109).

Portanto, entende-se que, em relação aos conceitos e conteúdos atitudinais, estes devem estar voltados para a formação humana, contribuindo, também, para o entendimento do conhecimento científico. É oportuno que os discentes construam e edifiquem a diferença entre razão e emoção, senso comum e saberes cientificados na escola.

3.2 OS CONTEÚDOS DE GEOGRAFIA NO ENSINO MÉDIO: OS PLANOS ANUAIS