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II. DA AÇÃO RESCISÓRIA EM GERAL

2.8. Aspectos procedimentais

A ação rescisória deve ser proposta dentro do biênio posterior ao trânsito em julgado da sentença que se quer desconstituir (art. 495 do CPC).

68 Ainda retornaremos à temática no Capítulo III, item 3.2.2.3: Extensão objetiva e subjetiva da coisa julgada.

Pode haver o trânsito em julgado de parte(s) ou capítulo(s) da sentença que não fora(m) objeto de recurso; nesse caso, correrão separadamente os prazos para o ajuizamento da ação rescisória visando à rescisão de partes distintas da sentença. Outra situação que gera divergência quanto ao início da contagem do prazo da ação rescisória é a hipótese de não conhecimento do recurso. Tem-se decidido que o referido prazo começará a correr a partir do trânsito em julgado da última decisão exarada nos autos, já que, antes disso, não havia como fazer uso do meio excepcional da ação rescisória. O assunto será melhor trabalhado no item 3.2.3.4.

A petição inicial da ação rescisória deve observar os requisitos dos artigos 282 e 283 do CPC. Devem ser juntados à inicial da rescisória, por serem documentos indispensáveis: a) certidão de inteiro teor ou fotocópia do julgado rescindendo; b) certidão do trânsito em julgado dessa mesma decisão.69 Em faltando um desses documentos, o autor poderá providenciá-lo dentro do prazo que lhe será concedido pelo juiz para a emenda da inicial. Deve subscrever a peça inicial um advogado, não havendo, todavia, necessidade de outorga de poderes especiais para o ajuizamento da ação. É possível a apresentação posterior da procuração (art. 37, caput, CPC).

Via de regra, o pedido na rescisória é duplo: rescisão do julgado e novo julgamento da causa. Obrigatoriamente, deve constar da peça inicial o pedido de rescisão da sentença (ou de parte dela). Sendo o caso, também o pedido de novo julgamento da causa deve ser formulado. Não o sendo, o juiz deve conceder ao autor prazo para emenda da inicial, conforme permite o artigo 284 do CPC. Sobre o pedido na ação rescisória, conferir o item 2.4.

69 Esse o teor da Súmula 299 do TST: “ É indispensável ao processamento da ação rescisória a prova do trânsito em julgado da decisão rescindenda. Verificando o relator que a parte interessada não juntou à inicial o documento comprobatório, abrirá prazo de dez dias para que o faça, sob pena de indeferimento”.

Exige-se que o autor junte à petição inicial da ação rescisória o comprovante de depósito da importância equivalente a 5% sobre o valor da causa (art. 488, II, CPC), quantia que reverterá ao réu no caso de julgamento de improcedência ou inadmissibilidade da ação. No caso de ausência ou insuficiência do referido depósito, deve o juiz conceder ao autor prazo para correção, sob pena de indeferimento da inicial.

A União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e o Ministério Público são isentos do pagamento do depósito (art. 488, parágrafo único). As autarquias e as fundações federais também estão dispensadas do pagamento do depósito e da multa, de acordo com permissivo da Lei 9.028 (art. 24-A). E nesse sentido reforça o teor da Súmula 175 do STJ, in verbis: “Descabe o depósito prévio nas ações rescisórias propostas pelo INSS”. E, ainda, à parte que faz uso da assistência judiciária gratuita também não cabe o pagamento.

Além do pagamento da verba referida, o autor deve comprovar o pagamento das custas judiciais, assim exigindo a legislação pertinente.

O valor da causa na ação rescisória deve ser o mesmo da ação originária, com as devidas atualizações. Assim apregoa uma das conclusões do 7º Encontro dos Tribunais de Alçada: “O valor da causa na ação rescisória é o mesmo da ação originária, com correção monetária na data da inicial”.70 Se, todavia, a rescisória visa à rescisão de apenas parte do julgado rescindendo, o valor deve ser proporcional. Logo, o valor da causa não poderá equivaler ao resultado da correção monetária aplicada sobre o valor in totum da causa originária.71

70 Aprovada por maioria, com um voto contrário, relator Juiz Semy Glans, Anais do VII

Encontro dos Tribunais de Alçada do Brasil, São Paulo, Tribunal de Alçada Criminal de São

Paulo, 1985, p. 237.

71 Assim também pensa José Ribamar de Moraes, O labirinto da ação rescisória, p. 26: “Todavia, o valor da causa na ação rescisória de um modo geral deve ser o mesmo da ação

Não há impedimento do juiz que proferiu a sentença rescindenda para julgar a ação rescisória. A hipótese de impedimento prevista no artigo 134, III, do CPC tem aplicação dentro do mesmo processo, e a ação rescisória, é cediço, dá lugar a um novo processo. É assim o conteúdo da Súmula 252 do Supremo Tribunal Federal: “Na ação rescisória, não estão impedidos os juízes que participaram do julgamento rescindendo”. Todavia, se a rescisória for fundada no impedimento do juiz que proferiu a decisão impugnada (art. 485, II), não poderá ele (o juiz impedido) julgar a rescisória. Ademais, aqueles que atuaram como relator e revisor no processo primitivo também não podem participar do julgamento da ação rescisória, salvo disposição em contrário no respectivo regimento interno. Por exemplo, o artigo 238 do Regimento do Superior Tribunal de Justiça prevê que “à distribuição da ação rescisória não concorrerá o Ministro que houver servido como relator do acórdão rescindendo”; nesse caso, diante da ressalva expressa, fica excluído apenas o relator. Também o artigo 751, § 2º, do Regimento do Tribunal de Justiça de São Paulo dispõe que, “na ação rescisória, não estão impedidos os desembargadores que tenham participado do julgamento rescindendo, salvo para as funções de relator”.

A decisão que indefere a petição inicial da ação rescisória pode ser impugnada por agravo regimental (ou agravo interno).

Não é imprescindível que o autor da rescisória indique o inciso do artigo 485 que apóia a sua ação ou o indique acertadamente, desde que precise os fatos que embasam o seu pedido. Isso porque às rescisórias são aplicáveis os

originária, cuja decisão deseja o autor desconstituir. Entretanto, pode ocorrer, na prática, que o autor não busque desconstituir integralmente a sentença rescindenda, mas apenas uma parte, devendo o valor corresponder apenas a esta parte”. Diferentemente, Coqueijo Costa, Ação rescisória, p. 245: “Conforme se passa com a rescisória no cível, o valor da causa é o da ação cuja sentença se quer desconstituir, ainda que a rescisória vise apenas a um dos capítulos da decisão rescindenda”.

brocardos iura novit curia e da mihi factum dabo tibi ius, cabendo ao juiz fazer o adequado enquadramento legal. Nesse sentido a Proposição 32 da Segunda Subseção do Tribunal Superior do Trabalho: “Ação rescisória. Petição inicial. Causa de pedir. Ausência de capitulação ou capitulação errônea no art. 485 do CPC. Princípio iura novit curia. Não padece de inépcia a petição inicial de ação rescisória apenas porque omite a subsunção do fundamento de rescindibilidade no art. 485 do CPC, ou o capitula erroneamente. Contanto que não se afaste dos fatos e fundamentos invocados como causa de pedir, ao Tribunal é lícito emprestar-lhes a adequada qualificação jurídica (iura novit curia)”. A mesma Segunda Subseção do Tribunal Superior do Trabalho, na proposição seguinte, traz assertiva que parece estabelecer uma exceção à regra, ao dispor: “Fundando-se a ação rescisória no art. 485, inciso V, do CPC, é indispensável expressa indicação na petição inicial da ação rescisória do dispositivo legal violado, não se aplicando, no caso, o princípio iura novit curia”. Não se trata de exceção à regra, porque regula situação diversa: o autor da rescisória do artigo 485, V, do CPC, deve, sim, indicar a norma violada, e aí é que não se aplica o princípio iura novit curia, o que não é indispensável é a indicação da hipótese de rescindibilidade do artigo 485 (o inciso mesmo), porque aí o juiz deve sabê- la, fazendo o devido enquadramento legal, após analisar os fatos trazidos a sua apreciação. Sendo assim, no caso da rescisória por violação à literal disposição de lei, o autor deve apontar a norma supostamente violada, sendo possível, todavia, que o faça sem a exata designação numérica do dispositivo (ver item 4.2.2., último parágrafo).

Sendo recebida a petição inicial da ação rescisória, o relator determinará a citação do réu, conferindo-lhe prazo entre 15 e 30 dias para a resposta (art. 491, primeira parte). Esse prazo é judicial, não legal, porque fixado pelo juiz.

Expirado o prazo, deve-se observar, no que couber, o disposto nos capítulos “Das providências preliminares” e “Do julgamento conforme o estado do processo” (Livro I, Título VIII, Capítulos IV e V, do CPC). Em não havendo resposta do réu, dá-se a revelia, mas não se aplicam os seu efeitos (art. 319),72 devido ao envolvimento de bem indisponível, que é a coisa julgada. Assim, não há presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor, embora não contestados, cabendo ao autor fazer a prova dos fatos constitutivos do seu direito (art. 333, I) e vedado ao juiz julgar antecipadamente a lide (art. 320, II).

Ainda quanto ao prazo da resposta, mister se faz investigar a aplicabilidade dos artigos 188 e 191 do CPC, que prevêem hipóteses de prazo diferenciado. Aplicando-os, o prazo concedido ao réu para contestar a rescisória pode extrapolar o limite de 30 dias previsto no artigo 491. Para o professor Nelson Nery Junior, as prerrogativas são aplicáveis.73 Barbosa Moreira, por sua vez, entende que o artigo 188 só pode ser aplicado aos prazos legais e não aos judiciais, como o da rescisória.74 Bernardo Pimentel também refuta a incidência dos artigos 188 e 191 no caso da ação rescisória, sob pena de o prazo máximo do artigo 491 ser ultrapassado.75 Na jurisprudência, a questão também enseja controvérsias, sendo possível encontrar julgados num e noutro sentido.76

72 RSTJ 19/93, RT 626/120, JTACivSP 99/343, 49/56, STJ, 3ª T., REsp 23596-4-RS, rel. Min. Eduardo Ribeiro, j. 12.03.1996, DJU 22.04.1996, p. 12.566.

73 Código de Processo Civil comentado, nota 1 ao artigo 491, p. 925. 74 Comentários ao Código de Processo Civil, p. 191.

75 Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória,

76 A favor: “PROCESSO CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. PRAZO PARA CONTESTAÇÃO. ARTIGO 188 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. 1. A regra do artigo 188 do Código de Processo Civil, referente à dilação de prazos processuais, é aplicável ao prazo de resposta para a ação rescisória. 2. Precedentes do STF e do STJ. 3. Recurso especial conhecido” (STJ, 6ª T., REsp 363780, relator Min. Paulo Gallotti, j. 27.08.2002, DJ 02.12.2002, p. 379). “As prerrogativas estatuídas no CPC 188 e 191 se aplicam ao prazo de resposta para a ação rescisória” (STF, RE 94960-7-RJ, relator Min. Rafael Mayer, j. 24.11.1982, DJU 08.10.1982, p. 10.190). Idem: TRF, 1ª Região, AR 200001000422061, relator Des. Tourinho Neto, j. 23.04.2003, DJ 04.07.2003, p. 21. Contra: “Processo Civil. Agravo regimental. Ação

Nesse ínterim, outra questão que surge é a admissibilidade da ação rescisória reconvencional. Não há impedimento quanto ao cabimento de reconvenção em ação rescisória, desde que o réu-reconvinte pretenda a rescisão de parte do julgado rescindendo que fora favorável ao autor e restem preenchidos os requisitos do artigo 315 do CPC.77

Ainda é possível a apresentação de impugnação ao valor da causa e exceções de impedimento e suspeição.

Pode ser necessária a produção de provas. Nesse caso, o relator pode delegar a competência ao juiz de primeiro grau para os atos instrutórios (art. 492). Mas é o relator que tem poderes para deferir e indeferir provas e determinar a produção das provas que julgar necessárias.

Concluída a instrução probatória, será concedido às partes o prazo de dez dias para a dedução de suas razões finais (art. 493, caput, primeira parte).

Apresentadas as razões finais, o Ministério Público deverá se manifestar, dado o caráter obrigatório da sua intervenção. Ensina Nelson Nery Junior: “É obrigatória sua intervenção por tratar-se de causa de interesse público pela natureza da lide (CPC 82 III), evidenciado pela fiscalização da validade da decisão judicial e pela proteção da coisa julgada”.78

rescisória. Contestação. Prazo. Ente público. Inaplicabilidade do art. 188 do CPC. Na rescisória, o relator mandará citar o réu, assinando-lhe prazo nunca inferior a 15 dias, nem superior a 30, para a resposta – art. 491, CPC. As pessoas jurídicas de direito público só gozam do privilégio previsto no artigo 188 do CPC quando o prazo for legal. Inaplicabilidade nos casos de prazo judicial, como é o da contestação em rescisória. Manutenção da decisão que declarou inexistente a contestação manifestada extemporaneamente. Agravo improvido” (TRF 5ª Região, AGRAR 689, relator juiz Ridalvo Costa, j. 18.09.1996, DJ 11.10.1996). No mesmo sentido: TJRJ, 4º Grupo de Câmaras Cíveis, AR 286, relator Des. Barbosa Moreira, j. 03.09.1980, RP 22/250 e RT 547/177; RT 571/163, RJTJSP 104/380, 96/399; JTACivSP 80/276.

77 Nesse sentido: Barbosa Moreira, ob. cit.; José Ribamar Moraes, O labirinto da ação

rescisória; Bernardo Pimentel, ob. cit.; Pontes de Miranda; Cruz e Tucci, Reconvenção.

Após a manifestação do Ministério Público, os autos sobem ao relator para a juntada do relatório e seguem para a conclusão do revisor que pedirá dia para julgamento da ação.