• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO II: CONFIGURAÇÕES DA FLEXIBILIZAÇÃO DA

2.4 Situações de despadronização da jornada

2.4.3 Asseio e conservação e limpeza urbana

A categoria de asseio e conservação, limpeza urbana e conservação de áreas verdes tem como características principais a terceirização e o trabalho em turnos. Segundo dados de uma pesquisa do DIEESE contratada pelo sindicato SIEMACO (2011) de São Paulo, em 2009 a categoria contava com mais de 100 mil trabalhadores somente no estado sendo que 84% atua no ramo de asseio e conservação, 12,4% na limpeza urbana e apenas 3,6% na conservação de áreas verdes.

Na área de asseio e conservação os trabalhadores são prestadores de serviço terceirizados em comércios, empresas, condomínios e são responsáveis pelas tarefas de asseio e conservação dos ambientes, manutenção predial, pintura, serviços de

portaria, recepção, copa e até serviços administrativos. Já na área de limpeza urbana, os trabalhadores são responsáveis pela limpeza e manutenção das áreas públicas, ruas, calçadas, praças. As atividades variam entre varrição de rua, coleta de lixo e serviços de manutenção. Os trabalhadores que se dedicam à conservação de áreas verdes trabalham na manutenção e jardinagem de praças e parques.

Em relação a questão de gênero, no setor de asseio e conservação 58,8% são trabalhadoras enquanto 41,2% são trabalhadores. Já tanto no ramo de limpeza urbana quanto conservação de áreas verdes, os homens são vasta maioria, 98,9% e 91% respectivamente.

A pesquisa também revela que, em relação a jornada de trabalho, 38% dos trabalhadores em asseio e conservação declararam trabalhar 44 horas semanais enquanto 35% disseram trabalhar além da jornada máxima estipulada pela lei. A pesquisa aponta que a maioria dos trabalhadores tem horário fixo, mas 9% trabalha em regime de turno de revezamento ou escala. A maioria dos empregados trabalha em horário diurno, até as 22:00, com exceção dos trabalhadores em limpeza urbana já que aproximadamente 25% trabalham no período noturno, na coleta de lixo. (SIEMACO, 2011)

Ainda na pesquisa do DIEESE, em relação às horas extras, 44% dos trabalhadores de limpeza urbana relataram que trabalham com frequência além da jornada e 20% disseram extrapolar seu horário de trabalho eventualmente. Em asseio e conservação, 4% normalmente estendem a jornada e 10% a estendem esporadicamente.

O trabalho aos sábados é comum na categoria. Na área de Limpeza Urbana a totalidade dos trabalhadores trabalha aos sábados todas as semanas. Na de Asseio e Conservação, esse percentual é de 56% e nas Áreas Verdes de 50%.

O trabalho quinzenal aos sábados é executado por 29% do pessoal de Áreas Verdes e por 19 % do de Asseio e Conservação. Vinte por cento dos trabalhadores de Asseio e Conservação e 12% dos de Áreas Verdes afirmam não trabalhar aos sábados. (SIEMACO, 2011, p. 46)

Segundo o estudo, mais de 25% dos trabalhadores de asseio e conservação trabalham todos os domingos, 19% trabalha um domingo a cada quinze dias e 5% trabalha aos domingos esporadicamente. Ainda, 40% dos trabalhadores de asseio e conservação e 56% dos trabalhadores de limpeza urbana trabalham regularmente nos feriados e 14% de ambos os setores trabalham ocasionalmente. (SIEMACO, 2011)

Para o presente estudo quatro trabalhadoras e dois trabalhadores foram entrevistados, cinco do ramo de asseio e conservação e uma de limpeza urbana, na tentativa de representar a diversidade e a subdivisão dentro da categoria. Todos os entrevistados atuam diretamente na área de asseio e conservação, ou seja, na limpeza dos ambientes e a entrevistada que trabalha na limpeza urbana é responsável por varrição de rua e pequenos trabalhos de manutenção. Um trabalhador e uma trabalhadora entrevistados eram líderes de setor. Todos trabalhavam como terceirizados e tinha contrato a tempo indeterminado, conforme relatou o trabalhador do ramo de asseio, limpeza e conservação 2: “Eu tô nessa empresa a 12 anos, vou fazer agora em junho. Agora, lá dentro da Mercedes eu tô a 26 anos, vai fazer 27, eu sempre trabalhei nesse ramo, sempre firma de terceiro, 26 anos.”.

As entrevistas corroboram com os dados sobre jornada relatadas pela pesquisa do SIEMACO, exceto um dos entrevistados que é terceiro em um órgão público, que abre somente de segunda a sexta e trabalha 40 horas por semana. Os demais entrevistados cumprem jornadas muito extensas, de 44 horas de segunda a sábado e trabalham em turno de revezamento. Nenhum dos entrevistados trabalha no turno da noite 22:00 às 6:00.

O trabalhador de asseio e conservação 2 informou que os turnos de trabalho na empresa terceirizada que ele trabalha são das 5:45 às 14:45, de segunda a sexta e sábado alternados, das 5:45 às 13:45, de segunda a sábado, das 13:45 às 21:45 também de segunda a sábado e 14:45 às 23:45 de segunda a sexta e sábado alternados. Todos os turnos são fixos. Nesse caso, não havendo alternância de turnos, com os domingos livres e a não clareza da lei, as empresas alegam que não se enquadra como turno ininterrupto de revezamento, privando assim os trabalhadores do direito à jornada de seis horas diárias.

A trabalhadora 3 que está no ramo de limpeza urbana informou que os horários iniciam as das 6:00 da manhã, são 3 turnos e apenas os homens trabalham no turno da noite. Essa trabalhadora também prefere o horário da manhã, porém hoje está alocada no horário da tarde.

É claro que o melhor horário é de manhã, já trabalhei de manhã já, só agora estou à tarde, mas o melhor horário é de manhã (...) porque acho que dificulta mais esse horário da tarde, vamos supor, meu marido chega do serviço 7 e meia, é um horário que se eu tivesse em casa eu já estaria com tudo pronto, janta. Trabalhadora do ramo de asseio e conservação – limpeza urbana 3

A trabalhadora do ramo de asseio e conservação 5 também prefere o turno da manhã. E o trabalhador do ramo de asseio e conservação 4 cuja jornada é das 8:00 às 17:00 de segunda a sexta, afirmou que “na questão profissional o tempo é bom, esse horário é tranquilo, dá pra administrar”. De acordo com os três trabalhadores, fica clara a preferência de se trabalhar nos horários considerados comerciais ou o mais próximo dele possível.

Apesar de as longas jornadas de trabalho exercidas por cinco dos seis entrevistados, poucos trabalhadores queixaram-se. Apenas uma entrevistada ressaltou a questão, o turno de trabalho dela inicia as 6:00. “É puxado, eu acordo às 4:00 todos os dias, pesa, mas você acaba se acostumando, mesmo no domingo você acaba acordando cedo por causa do costume. ” Trabalhadora do ramo de asseio e conservação 1.

Apesar da longa jornada de trabalho de 44 horas semanais e da longa semana de segunda a sábado, apenas um trabalhador relatou uma pequena redução da jornada, conquistada por meio de negociação entre o sindicato e a empresa.

Conseguimos uma vitória lá que foi o calendário, fizemos uma soma de calendário, fizemos reunião lá na (nome da empresa) e depois nós voltamos pro sindicato, e conseguimos (...), tem vez que a gente conseguiu (...) 4 folgas pro pessoal, tem ano que a gente consegue 5, teve ano que a gente conseguiu 3, esse ano são 3. Trabalhador do ramo de asseio e conservação 2

O pagamento de hora-extra não é uma prática no setor. Quando perguntada sobre hora-extra, todos os trabalhadores informaram o mesmo “eles não pagam hora- extra ” (Trabalhadora do ramo de asseio e conservação 5) Esta trabalhadora explicou que, caso necessário ficam além do horário seria compensado com algum feriado.

É quando aqui precisa, a gente sai mais tarde, mas aí, é como diz assim, a gente tem aqui que eles dão feriado prolongado, a gente fica em casa e aí quando eles precisam a gente passa do horário da gente. (...). É tudo marcadinho, a líder, ela tem um caderno que ela anota tudo. Mas é tudo marcado, tudo direitinho, mas isso não é todos os dias que eles precisa da gente, eles precisa da gente as vezes. Trabalhadora do ramo de asseio e conservação 5

Outra trabalhadora reforçou que não há pagamento de hora-extra. Como a trabalhadora em questão é líder de área, ela explicou que se a empresa precisar ela vem em outro horário para acompanhar alguma atividade.

Extra não, se tem algum evento aqui na (nome da empresa que trabalha) a noite, eu não venho trabalhar de manhã, eu venho no período da tarde. (...). Sim, porque eu faço o mesmo horário que eu faço, só muda o horário de trabalho, em vez de eu entrar as 8:00 eu entro a 1:40 as 10:00 dependendo que hora é o evento. Trabalhadora do ramo de asseio e conservação 6

Do relato de alguns trabalhadores é possível extrair que há compensação de jornada no setor, ainda que não negociada ou formal. E essa flexibilização da jornada, estende a jornada diária de trabalho e também obriga, por vezes, o trabalho aos domingos.

Igual, tem as vezes carnaval, a gente fica em casa quatro dias aí a gente vem em um domingo pra lavar a secretaria, mas isso daí eles não tão explorando a gente, a gente tá pagando a hora, os dias que nós ficamos em casa, mas aí se nós ficamos em casa 4 dias, nós não vem esses 4 domingos, nós vem 1 domingo no ano. Trabalhadora do ramo de asseio e conservação 5

Pela fala da trabalhadora, ela não considera a compensação de jornada algo negativo, pelo contrário, parece que ela sente que a compensação é benéfica para ela. Ela não aventa a possibilidade de que esse trabalho aos domingos fosse pago como hora- extra, muito menos que por ser no domingo esse valor deveria ser acrescido.

Apesar das longas jornadas, alguns entrevistados relataram ter outros trabalhos para complementar a renda. Algumas trabalhadoras disseram trabalhar com venda de produtos por catálogo, uma delas, além da venda por catálogo, é subsíndica do seu condomínio (atividade remunerada). Um trabalhador relatou trabalhar aos domingos, como segurança particular. “Final de semana eu mexo na área de segurança, mas já é particular meu(...) geralmente são seis horas de trabalho, todo final de semana, só domingo”. Trabalhador do ramo de asseio e conservação 4

Apesar de o debate sobre remuneração estar fora do escopo desta tese, vale ressaltar que o fato de alguns trabalhadores da amostra buscarem outras formas de renda, a despeito das longas jornadas em seus trabalhos principais, é um indicativo dos baixos salários no setor, o que os impele a aumentar ainda mais sua jornada de trabalho remunerada buscando trabalhos alternativos.

Nos ramos de asseio e conservação e limpeza urbana, destacam-se as longas jornadas, o não pagamento de hora-extra, a compensação de jornada no sistema. Em alguns casos, a convocação para o trabalho esporádico aos domingos é creditada em um banco de horas informal e a compensação não diferencia o trabalho aos domingos de um dia normal de trabalho, o que é aceito pelos trabalhadores. Ademais, o trabalho extra

foi relatado pelos entrevistados como estratégia de complemento de renda, dada a baixa remuneração, aumentando a jornada de trabalho.

Quanto aos horários dos turnos, os trabalhadores revelaram preferir jornadas mais próximas ao horário comercial, evitando o trabalho no período vespertino e noturno. Também foram relatados outros tipos de flexibilização como compensação de jornada, arranjo que visa eliminar o pagamento de horas extras.

Os trabalhadores do ramo de asseio e conservação e limpeza urbana são menos articulados no que diz respeito às críticas ao trabalho e à jornada, isso fica evidente tanto no conteúdo quanto na extensão das falas dos entrevistados. Ademais, será possível observar que, principalmente para as mulheres deste setor, a jornada de trabalho remunerada parece ser a parcela mais leve do seu dia, essas questões serão abordadas no capítulo III.