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CAPÍTULO II: CONFIGURAÇÕES DA FLEXIBILIZAÇÃO DA

2.3 Evolução recente da jornada de trabalho

2.3.1 Evolução da duração da jornada

A partir de 2004, há uma inflexão importante na jornada. A faixa dos que trabalham mais de 45 horas deixa de ser a que agrupa o maior número de ocupados. Na evolução realizada a partir de 1992, momento em que as teses de flexibilização começam a ganhar expressão. A tabela 14, a seguir, permite observar que no período entre 1992 a 2003, a distribuição dos ocupados nas faixas de jornada de trabalho não sofreu alterações significativas. Em 2003 aproximadamente de 40% dos ocupados no Brasil exercia uma jornada semanal de 45 horas ou mais e 32,3% dos trabalhadores e das trabalhadoras se localizavam na faixa entre 40 a 44. Pouco mais de 21% trabalhava entre 15 a 39 horas semanais e a jornada até 14 horas semanais era uma realidade para apenas 6,6%.

Tabela 15 – Evolução do tempo de trabalho (Nº horas habitualmente trabalhadas por semana – todos os trabalhos – dez anos ou mais de idade) – Brasil: 1992-2013

Evolução do tempo de trabalho (Nº horas habitualmente trabalhadas por semana – todos os trabalhos – dez anos ou mais de idade) – Brasil: 1992-2013

1992 1995 1998

(Em Milhões) (%) (Em Milhões) (%) (Em Milhões) (%)

Até 14 horas 3,79 5,8 4,26 6,1 4,19 6 15 a 39 horas 13,76 21,1 15,04 21,6 15,03 21,5 40 a 44 horas 20,41 31,3 22,09 31,7 21,62 30,9 45 horas ou mais 27,16 41,7 28,21 40,5 29,06 41,5 Sem declaração 0,03 0,1 0,02 0 0,06 0,1 Total 65,15 100 69,62 100 69,96 100

Fonte: Microdados PNAD-IBGE, adaptada de Rao (2013).

Já no período entre 2004 e 2013 a redução da jornada foi mais significativa, visto que as duas faixas mais baixas, até 14 horas e entre 15 e 39 horas não sofreram modificação relevante, porém caiu número dos ocupados, com jornada acima de 45 horas semanais, passando, de 37,9%, em 2004para 33,4% em 2008. A queda continuou no período seguinte, chegando a 28,4% em 2013. Ao mesmo tempo, os ocupados na faixa em 40 e 44 horas por semana aumentaram de 33,6% em 2003 para 38,8% em 2008 e para 45,4% em 2013. Portanto, há uma evidente tendência de redução dos que trabalhavam nas faixas com maior número de horas.

A próxima tabela permite observar a distribuição da jornada em faixa setores econômicos na perspectiva de analisar aonde houve a inflexão identificada.

Tabela 16 – Pessoas de 10 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, por grupos de horas habitualmente trabalhadas por semana no trabalho principal, por ramos de atividade selecionados do trabalho principal (%) – Brasil: 2003- 2014

1999 2001 2003

(Em Milhões) (%) (Em Milhões) (%) (Em Milhões) (%)

Até 14 horas 4,65 6,3 4,62 6,1 5,31 6,6 15 a 39 horas 16,22 22,1 15,9 20,9 17,17 21,4 40 a 44 horas 23,27 31,7 24,44 32,1 25,92 32,3 45 horas ou mais 29,16 39,8 31,13 40,9 31,7 39,6 Sem declaração 0,05 0,1 0,07 0,1 0,04 0 Total 73,34 100 76,16 100 80,15 100 2004 2008 2013

(Em Milhões) (%) (Em Milhões) (%) (Em Milhões) (%)

Até 14 horas 5,36 6,3 5,71 6,2 5,9 6,1 15 a 39 horas 18,69 22,1 20,04 21,7 19,44 20,1 40 a 44 horas 28,41 33,6 35,81 38,8 43,9 45,4 45 horas ou mais 32,09 37,9 30,83 33,4 27,42 28,4 Sem declaração 0,04 0 – – – – Total 84,6 100 92,39 100 96,66 100 2003

Sexo Grupos de atividade Até 14 15 a 39 40 a 44 45 a 48 49 ou mais TOTAL

H

om

em Ramo Metalúrgico Ramo Químico e Petroquímico 0,6 2,0 3,6 7,8 60,4 50,3 21,9 21,5 13,4 18,4 100,0 100,0

Ramo Financeiro

2014

Sexo Grupos de atividade Até 14 15 a 39 40 a 44 45 a 48 49 ou mais TOTAL

H

om

em

Ramo Metalúrgico 2,2 4,3 70,4 14,0 9,1 100,0

Ramo Químico e Petroquímico 1,3 7,8 63,5 13,9 13,6 100,0

Ramo Financeiro

Bancos e instituições financeiras 2,0 16,4 62,2 7,1 12,3 100,0

Ramo dos Comerciários

Supermercados e hipermercados 2,0 7,6 41,9 28,7 19,8 100,0

Serviços sociais (público e privado)

Serviços de saúde pública 1,5 27,4 44,0 10,1 17,1 100,0

Serviços de saúde particular 2,8 19,3 44,9 10,4 22,5 100,0

Serviços Auxiliares

Técnico-profissionais da informática 2,6 14,3 59,0 9,9 14,2 100,0 Trabalhadores asseio, limpeza e conserv. 3,4 12,1 56,7 16,0 11,8 100,0

Serviços sociais (privado)

Professor do ensino superior privado 5,5 28,2 46,5 7,5 12,4 100,0

M

ul

he

r

Ramo Metalúrgico 2,8 8,5 72,7 10,8 5,2 100,0

Ramo Químico e Petroquímico 2,0 10,0 70,9 12,5 4,6 100,0

Ramo Financeiro

Bancos e instituições financeiras 2,0 18,4 69,0 6,7 3,9 100,0

Ramo dos Comerciários

Supermercados e hipermercados 1,6 7,6 48,6 27,7 14,4 100,0

Serviços sociais (público e privado)

Serviços de saúde pública 1,2 28,1 53,0 7,7 10,0 100,0

Serviços de saúde particular 3,5 24,7 52,2 9,0 10,5 100,0

Serviços Auxiliares

Técnico-profissionais da informática 2,6 27,5 54,2 3,0 12,7 100,0 Trabalhadores asseio, limpeza e conserv. 4,6 23,9 52,8 13,0 5,7 100,0 Serviços sociais (privado)

Professor do ensino superior privado 4,3 36,0 49,5 5,2 5,1 100,0 Fonte: PNAD, Elaboração de Eduardo Rao, seguindo a mesma metodologia da tabela 14.

A tendência de diminuição dos ocupados na faixa com mais de 45 horas ocorre em todos os ramos selecionados. Observando a evolução entre 2003 e 2014 no setor metalúrgico, as faixas de horas acima da jornada legal, entre 45 e 48 horas e 49 horas ou mais, reduziram 7,9% e 4,4% respectivamente para os homens e 6,3% e 4,3% para as mulheres enquanto os que se encontram na jornada entre 40 e 44 horas semanais aumentou 9,9% para os homens e 13% para as mulheres. Ainda no caso das mulheres,

Ramo dos Comerciários

Supermercados e hipermercados 1,3 7,3 20,8 33,2 37,3 100,0

Serviços sociais (público e privado)

Serviços de saúde pública 1,8 22,9 36,9 12,8 25,6 100,0 Serviços de saúde particular 1,6 19,3 35,1 14,2 29,8 100,0

Serviços Auxiliares

Técnico-profissionais da informática 2,6 12,8 44,6 14,0 26,0 100,0 Trabalhadores asseio, limpeza e conserv. 1,8 13,4 40,0 23,0 21,8 100,0

Serviços sociais (privado)

Professor do ensino superior privado 6,7 24,5 40,1 11,8 17,0 100,0

M

ul

he

r

Ramo Metalúrgico 2,5 11,1 59,8 17,1 9,5 100,0

Ramo Químico e Petroquímico 1,3 13,3 61,4 15,5 8,4 100,0

Ramo Financeiro

Bancos e instituições financeiras 1,2 20,9 59,6 10,6 7,7 100,0

Ramo dos Comerciários

Supermercados e hipermercados 0,5 9,6 27,4 33,6 28,9 100,0

Serviços sociais (público e privado)

Serviços de saúde pública 0,7 32,5 41,6 10,9 14,2 100,0 Serviços de saúde particular 2,0 25,0 42,6 16,3 14,1 100,0

Serviços Auxiliares

Técnico-profissionais da informática 2,6 18,6 56,5 8,8 13,5 100,0 Trabalhadores asseio, limpeza e conserv. 3,9 21,8 41,3 21,0 12,0 100,0 Serviços sociais (privado)

nota-se uma redução de 2,6% de ocupadas na faixa de 15 a 39 horas. Cabe, no entanto, ressaltar que em termos absolutos o contingente feminino no ramo metalúrgico é aproximadamente 1/5 do masculino.

No ramo químico houve um aumento 13,2% e 9,5% (61,4 para 70,9%) na faixa entre 40 e 44 horas semanais, respectivamente para ocupados e ocupadas. Nas demais faixas, as reduções mais expressivas foram nas faixas entre 45 e 48 horas (7,6%) e 49 horas ou mais (4,8%) para os homens. No caso das mulheres, além de reduzir o contingente de ocupadas nas faixas mais altas 3% (45 e 48) e 3,8%, (49 horas ou mais). Ainda houve redução de 3,3% das ocupadas na faixa de 15 a 39 horas.

Também neste caso, vale lembrar que em termos absolutos o contingente feminino é aproximadamente 1/3 do masculino. Chama atenção o fato de que a redução dos que trabalham mais foi mais intensa para homens do que mulheres. Assim como, há maior presença das mulheres nas faixas com menor carga horária semana. É uma tendência similar ao dos metalúrgicos.

O ramo bancário exibiu baixa modificação na distribuição da jornada dos homens, com uma modesta redução de 2,2% e 1,7% dos ocupados nas faixas entre 45 e 48 horas e 49 horas ou mais, respectivamente. Essa diminuição foi distribuída nas faixas de jornada até 14 horas (1,2%), entre 15 e 39 horas (0,9%) e entre 40 e 44 horas (1,8). Já em relação às mulheres, a diminuição foi mais expressiva nas duas faixas superiores (3,9 para as entre 45 e 48 e 3,8% para a de 49 horas). Também reduziu as mulheres que trabalham na faixa entre de 15 a 39 horas (2,5%). No segmento reforça um fenômeno comum de aumento das ocupadas na faixa entre 40 e 44 horas semanais (9,4%). Cabe ainda destacar que a categoria dos bancários tem jornada legal de seis horas por dia, 30 horas por semana, porém o contingente maior de ocupados no ramo encontra-se na faixa entre 40 e 44. O setor será analisado mais adiante no capítulo, com base em um estudo de caso.

A tendência de redistribuição da jornada no sentido da jornada legal aparece ainda com mais força no ramo de supermercados e hipermercados, que aumenta o contingente de trabalhadores de ambos os sexos em mais em 21% na faixa entre 40 e 44 horas semanais e reduz 4,5% e 5,9% os ocupados e ocupadas na faixa de 45 a 48 horas. Assim como diminuíram em 17,5% os ocupados e 14,4% as ocupadas na faixa de 49 horas ou mais.

Nos serviços de saúde, a proporção de trabalhadores da rede pública aumentou 4,5% na faixa de 15 a 39 horas enquanto a das trabalhadoras reduziu 4,4%. Na faixa entre 40 e 44 horas houve elevação da participação tanto para homens (7%) quanto para mulheres (11,4%). Nas duas faixas superiores (entre 45 e 48 horas e 49 horas ou mais,) ocorreu redução: de 2,8% e 8,6% para os homens e de 3,2% e 4,6% para as mulheres. Na rede particular a mudança é similar, diminuiu em 7,35% e 3,6% o contingente masculino e feminino que trabalha acima de 49 horas e 3,8% e 7,3% a proporção de ocupados na faixa entre 45 e 48 horas semanais e aumentou na faixa de 40 a 44 horas em quase 10% para ambos os sexos. No ramo da saúde pública se observa um aumento do contingente feminino que tem sua jornada deslocada da faixa entre 15 e 39 horas para a faixa entre 40 e 44 horas semanais, diferentemente da jornada das ocupadas privadas do ramo. Apesar da luta pela jornada de 6 horas diárias no setor, também acompanhou a tendência de concentrar os ocupados na faixa entre 40 e 44 horas semanais. O caso estudado mostra que há um crescimento de pessoas que tem mais de um emprego, como será visto no estudo de caso.

No ramo da informática há uma diminuição da porcentagem de homens e mulheres nas duas faixas mais altas entre 45 e 48 horas semanais e 49 horas e acima, com destaque para a redução do contingente masculino que trabalha acima das 49 horas que foi de 11,8% no período. Na faixa entre 45 e 48 horas semanais a redução foi de 4,1% dos homens e 5,8% das mulheres nessas faixas. O deslocamento se deu para faixas diferentes, para os homens houve migração expressiva (14.4%) para a faixa entre 40 e 44 horas semanais. Enquanto que no caso das mulheres essa faixa também diminuiu (2,3%) e 8,9% das ocupadas migraram então das três faixas superiores para a faixa de 15 a 39 horas semanais. Aqui se tem uma tendência diferenciada para as mulheres, em que a migração mais expressiva ocorreu para uma jornada menor do que 40 horas semanais.

No ramo de asseio, limpeza e conservação é possível observar redução de 10% de homens e 6,3% de mulheres na faixa de jornada de 49 horas ou mais e 7% de homens e 8% de mulheres na faixa entre 45 e 48 semanais. O aumento de ocupados na faixa entre 40 e 44 horas foi de 16,7% enquanto o de ocupadas foi 11,5%.

Por fim, os professores do ensino superior privado também reduziram sua participação nas faixas de jornada de 45 a 48 horas e 49 horas ou mais em 4,3% e 4,6% no caso dos homens e em 1,5% e 4,1% no caso das mulheres. Os professores também reduziram em 1,2% o contingente na faixa de até 14 horas, assim esses docentes passaram

para as faixas de 15 a 39 horas (3,7%) e entre 40 e 44 horas (6,4%). Já no caso das professoras, a faixa entre 15 a 39 horas também caiu 6,9% e a faixa entre 40 e 44 horas aumentou 12%.

A extensão da jornada de trabalho entre 2003 e 2014 reduziu na média do país e em todos os ramos observados. A tendência da jornada no Brasil no período foi de concentração na faixa entre 40 e 44 horas semanais, próxima da jornada legal máxima. É uma tendência diferente dos países analisados no capítulo I, em que houve um aumento das jornadas concentradas nas faixas mais elevadas (40 horas ou mais) e nos contratos a tempo parcial (entre 1 e 19 horas e 20 e 29 horas), esvaziando a faixa dos que trabalham entre 34 e 39 horas semanais. Apesar da diminuição dos que trabalham 45 horas ou mais, a jornada no Brasil continua sendo alta em comparação com os países analisados no capítulo 1, especialmente os europeus.

Assim, a verificação da flexibilização da jornada discutida anteriormente neste capítulo não pôde ser observada nos dados das faixas de horários trabalhados na semana, ao contrário, se considerar apenas a extensão da jornada houve uma concentração do tempo de trabalho no Brasil. Pode-se apontar como possíveis razões explicativas para a concentração de um maior número de ocupados dentro da faixa mais próxima da jornada formal duas razões: 1) a evolução da jornada acompanha o movimento de regularização (formalização) do emprego, ou seja, os parâmetros legais são relevantes na conformação do tempo de trabalho; 2) com a melhora da renda, em uma sociedade que o trabalho assalariado perde significação, as pessoas passaram a optar a trabalhar menos (realizar menos hora-extra), especialmente, os das duas faixas superiores.

No entanto, uma ressalva, os ocupados em postos de direção de empresa ou mais qualificados aumentaram suas jornadas de trabalho. Os dados também reforçam que nem a jornada legal nem a contratual da jornada no período reduziram, apesar de o tema estar na agenda sindical. Nos dados não é possível observar o processo de flexibilização da jornada, por isso será analisado o resultado das negociações e situações concretas de reorganização da jornada em categorias, apresentando que, apesar de uma aparente redução da jornada, sua distribuição está mais desigual entre os empregados.