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3. PRÁTICA LETIVA

3.4. Assistência às aulas – A complexidade da observação

O processo de observação ocorre desde que o novo professor entra no contexto escolar tendo em conta toda a análise realizada desde o meio escolar e dinâmicas de funcionamento até à supervisão da nossa turma. Contudo um dos objetivos deste estágio passou também por observar as aulas do nosso colega estagiário. É preciso deixar bem claro que através desta observação estamos a verificar comportamentos tanto do professor (estratégias de ensino) como da turma e em momento algum a análise crítica realizada será no sentido de desvalorizar a prestação.

Concordamos sem qualquer dúvida que este processo pode revelar-se extremamente importante, pois permite-nos não só ajudar o colega através de um reflexão da sua prestação, como também nos pode auxiliar na nossa intervenção pedagógica através de algumas estratégias que nos poderão ser úteis para combater alguns pontos negativos da nossa prestação.

A observação é considerada a forma mais primitiva para chegar ao conhecimento, apesar do seu caráter subjetivo (Anguera, 1985). É por esta subjetividade que não nos podemos esquecer que quem tudo quer ver, nada vê, isto é, ver não é o mesmo que observar e antes de observar é preciso saber o que pretendemos observar. Disto isto, o que se procura é identificar e caraterizar a intervenção do professor (padrões de atuação) e verificar qual o impacto dessa mesma intervenção sobre o comportamento dos alunos (Piéron, 1996; Mendes, Clemente, Rocha & Damásio, 2012).

Para além do que foi dito anteriormente, observar, além de ser um processo deliberado e voluntário, é um ato inteligente, pois existe uma reflexão sobre a informação pertinente que é selecionada pelo observador (Blanco & Anguera, 2001, citados por Prudente, 2006).

Prudente, Garganta e Anguera (2004) sustentam que o processo de observação passa por alcançar uma perceção deliberada da realidade de forma a poder interpretá-la obtendo um significado que ao ser analisado de forma adequada permite-nos alcançar resultados válidos.

Sendo assim este ato deve permitir identificar prestações menos eficazes, garantindo ao professor feedbacks sobre a sua atuação, no sentido de melhorar através de uma reflexão crítica, o seu processo de ensino aprendizagem (Mendes et al., 2012). Não se trata meramente de mencionar os aspetos negativos dos outros, não se trata de elogiar as boas estratégias utilizadas, trata-se essencialmente de um processo reflexivo sobre o observado e observador.

A velha máxima de que a observação só serve para analisar e avaliar o aluno está errada. Cada vez mais este é um instrumento essencial e contribui para a formação do docente (Reis, 2011). Podem existir diversos propósitos que sustentam o processo de observação. Por isso, podemos dizer

que este processo é uma ferramenta de diagnóstico que tem em conta a prática profissional e os aspetos que se pretende melhorar, tentando assim adequar a tomada decisão do professor através de uma reflexão sobre as potencialidades e limitações da sua intervenção prática (metodologias e estratégias) procurando ao mesmo tempo desenvolver diferentes dimensões do conhecimento profissional do docente (Idem).

É de salientar que este processo não foi realizado de forma solitária. Contámos com a supervisão não só do nosso colega estagiário mas também do nosso orientador científico e cooperante tendo em conta toda a sua experiência na dinâmica de funcionamento de uma aula. Assim sendo podemos considerar este processo como algo colaborativo havendo debate, troca de ideias, reflexão e experiências no sentido de desenvolver transformações que achamos necessárias para o desenvolvimento tanto pessoal como profissional do docente no ato da lecionação (Idem).

Este processo nunca deve ser realizado de forma isolada pois a sua objetividade é perdida se não realizarmos uma ligação deste processo com a prática letiva. Sendo assim, mais do que procurar desenvolver um instrumento de observação ou uma metodologia foi necessário identificar os problemas mais visíveis e a partir daí definir objetivos tanto para o observador como para o observado.

3.4.1. Objetivos Gerais e Específicos

O processo de assistências às aulas procurou sempre, ao longo do ano letivo, colmatar as dificuldades apresentas pelos professores estagiários. Com o avançar do tempo verificámos algumas evoluções em determinados parâmetros mas, tendo em conta que o que pretendíamos seria a melhoria das nossas intervenções, procuramos com base em determinadas reflexões, estabelecer objetivos de observação que fossem mais-valias para a melhoria do nosso processo educativo.

Objetivos Gerais

 Analisar a prestação do nosso colega estagiário diagnosticando aspetos a melhorar (o tempo de empenhamento motor é adequado, as estratégias utilizadas são viáveis entre outros aspetos);

 Desenvolver a capacidade de autorreflexão enquanto observador e observado;  Promover hábitos profissionais enquanto professor reflexivo;

 Promover cooperação e diálogo entre estagiários e orientador cooperante;  Desenvolver a capacidade de auto e heteroavaliação;

 Construir um instrumento de observação.

Objetivos Específicos

 Analisar, refletir e conceber estratégias que visem a melhoria de aspetos relacionados com a gestão, controlo e comportamentos solicitados com as diferentes tarefas

(empenhamento motor é ou não adequado, os alunos atingem os objetivos propostos, o professor mantem a ordem no local de aula entre outros aspetos).

3.4.2. Métodos e procedimentos

As aulas dos dois estagiários coincidiam nos mesmos dias (segunda e quinta-feira), mas em períodos do dia diferentes (manhã e tarde com exceção da quinta-feira). Inicialmente decidimos observar todas as aulas sendo que a partir do 2º e 3º período, de acordo com a disponibilidade, observaríamos maioritariamente as aulas da quinta-feira. Foram definidas vinte observações que poderiam ser distribuídas ao longo do ano letivo. Estas observações, definidas pelas linhas orientadoras do estágio, foram ultrapassadas havendo claramente uma mais-valia a nível do ato de observação, garantindo cada mais qualidade e fiabilidade nas mesmas.

Tendo em conta as observações iniciais levantámos um conjunto de problemas a serem analisados considerando três categorias: gestão da aula, controlo da aula e comportamentos solicitados/induzidos sendo que dentro de cada uma destas existiu uma subdivisão em microcategorias mais específicas.

Em cada microcategoria, levantámos aspetos positivos, negativos assim como verificámos que tipo de estratégias eram utilizadas para “combater” determinados problemas. Assim sendo realizamos um diagnóstico à prestação do colega, prescrevemos algumas alternativas em aspetos menos positivos e na aula seguinte, monitorizámos a performance do colega, de forma a verificar se o comportamento do observado se alterou ou não.

A nossa estratégia de observação começou através do método de observação “eyeballing” com a intenção de realizar uma observação geral dos problemas mais casuais do professor estagiário. Contudo sentimos a necessidade de focar aspetos que eram mais visíveis e frequentes de forma a possuirmos indicadores mais precisos para conseguirmos uma melhor análise da prestação do professor. Como tal especificámos microcategorias realizando assim uma ficha de observação (ver anexo I). O método utilizado passou então por registar os incidentes verificados na aula, realizando também dentro de cada microcategoria uma escala de likert avaliativa de 1 a 5. Concebemos então uma ficha de observação baseada nas utilizadas por Bárbara (2015) e Andrade (2013) adaptando algumas das categorias utilizadas. Assim sendo consultámos os planos de observação de comportamento verificando algumas técnicas de intervenção pedagógica que seriam importantes de observar sobre a prestação do colega (Piéron, 1996) assim como alguns apontamentos referentes à unidade curricular de Pedagogia (H. Lopes, comunicação pessoal, 2012). Na seguinte tabela podemos observar as macro e microcategorias utilizadas pelo NE da EBSAAS aquando da observação de aulas.

Tabela 8 - Macro e microcategorias de observação (adaptado de Piéron, 1996; Lopes, 2012)

Gestão da aula Controlo da aula Comportamentos

solicitados/induzidos

 Início de aula sem atrasos;

 Colocação do professor, na instrução/ tarefa/

circulação de forma a verificar toda a turma;

 Objetivos da tarefa foram alcançados;  Tempo de Instrução (breve, conciso);  Controlo da turma: -Distância; -Comportamentos de desvio e intervenção;  Há intencionalidade da tarefa em alcançar determinados comportamentos;  Tempo de transição (tarefas encadeadas e sem atrasos);  Bom clima: -Reforço positivo; -Feedbacks (tipo e frequência);  Alunos demonstram transformações (comportamentos induzidos);  Formação de grupos (pré definida e encadeada entre exercícios);  Tempo de empenhamento motor adequado.

 Adequação da tarefa (perante facilidades ou dificuldades apresentadas pelos alunos).  Demonstração (se

necessária) e interligada com a instrução.

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3.4.3. Principais ilações

Este processo de assistência às aulas do colega estagiário foi extremamente importante na nossa formação e intervenção pedagógica. Passámos pelos dois papéis, o de observador e observado, o que nos permitiu fornecer algumas sugestões ao nosso colega, mas também receber outras sugestões por parte do mesmo.

Inicialmente, como forma de observação das aulas do colega, utilizamos uma ficha de registo e de observação onde eram salientados alguns aspetos menos conseguidos por parte do professor observado. Todavia sentimos a necessidade de evoluir e tendo em conta a avaliação diagnóstica realizada ao nosso colega percebemos quais as principais dificuldades sentidas. Definimos então uma série de categorias (gestão e controlo da aula e comportamentos solicitados/induzidos) onde cada uma delas possuía uma série de microcategorias realizando depois uma sequência de registos anedóticos e de ocorrências de forma qualitativa.

Analisando as observações realizadas foram considerados alguns aspetos numa fase inicial:  Episódios de instrução demorada e com muito conteúdo;

 Colocação inapropriada perante os alunos em algumas situações (dar as costas a determinados grupos);

 Circulação do professor por entre as tarefas desenvolvidas pelos alunos dificultando o controlo e supervisão da turma;

 Organização dos exercícios pouco encadeada tendo em conta a formação de grupos, distribuição do material e disposição das tarefas (tempos de transição demorados);

 Feedbacks com ausência de conteúdo. Havia muitos feedbacks de reforço como “muito bem” ou “boa” sendo que os alunos muitas vezes não sabiam o que realmente estavam fazendo pois não havia qualquer reflexão por parte dos mesmos;

 Pouca adaptabilidade tendo em conta a exigência da tarefa, não havendo muitas vezes alteração da mesma consoante o nível de proficiência dos alunos;

 A intencionalidade da tarefa não existia, muito devido aos episódios de desatenção e predisposição dos alunos para a realização da mesma.

Após cada aula e após cada observação as reuniões e reflexões realizadas pelo professor orientador cooperante e científico, assim como pelo colega estagiário foram permitindo melhorar determinados aspetos. Tais reflexões permitiram-nos definir estratégias que eram utilizadas em aulas consequentes, nomeadamente ao nível do controlo da turma, organização da aula e objetivos delineados para a mesma. Podemos referir e salientar a importância deste processo colaborativo na evolução da intervenção pedagógica, onde foram alcançadas melhorias extremamente positivas garantindo, cada vez mais, a adaptação do professor a um meio que lhe era “estranho”.

Esta observação do colega não teve só como objetivo que este melhorasse a sua prestação enquanto professor, mas permitiu também a nós, professores e observadores verificar tarefas e estratégias que podiam ser implementadas na nossa turma (com algumas adaptações) assim como identificar erros a serem evitados (posicionamento do professor, organização dos exercícios e dos materiais, instrução demorada entre outros).

A grande reflexão tirada da observação à prestação do colega é que por mais que algumas estratégias sejam válidas, cada professor é diferente a nível da sua personalidade e das suas crenças. Como tal, é necessário refletir muito bem sobre se essas estratégias serão válidas para nós, tendo em conta a nossa forma de ser e também a turma pela qual somos responsáveis. Observar a aula do colega não se prende apenas com os aspetos negativos e que precisam de ser melhorados, prende-se também com os aspetos positivos que precisam também ser salientados e as mais-valias que estes podem trazer para a nossa intervenção no processo de ensino aprendizagem dos alunos.

Observar e olhar são conceitos completamente diferentes. Observar implica definir objetivos, implica uma intencionalidade e uma reflexão sobre aquilo que é observado. Daí que este processo de assistência às aulas é extremamente positivo em que por vezes entre os dois professores estagiários eram definidos determinados parâmetros que pretendíamos verificar se estavam sendo alcançados como por exemplo: tempo de instrução, tempo de empenhamento motor, fornecimento de feedbacks, se os alunos revelavam ou não diferenças a nível dos comportamentos que lhes estavam sendo solicitados em relação às aulas anteriores, entre outros.

Em suma, a observação e análise das aulas permitiu-nos, sem qualquer dúvida, perceber quais os nossos pontos fracos no sentido de refletirmos e delinearmos melhor as nossas aulas dia após dia.

Sem este processo arriscamo-nos a dizer que determinadas ações, que em nada abonavam ao nosso sucesso pedagógico, poderiam persistir ao longo do ano letivo. Podemos também dizer que sem este processo muitas das evoluções verificadas poderiam revelar-se ao acaso não havendo qualquer reflexão neste processo.

Sem qualquer dúvida este deverá ser um processo a implementar não só durante as aulas realizadas pelos estagiários, mas também a outros professores com o propósito de verificar e analisar diferentes atuações e estratégias implementadas como também, permitir que estes recebam feedbacks sobre a sua prestação.

Finalizamos dizendo que não podemos ter medo de errar porque o erro fará sempre parte da nossa aprendizagem por isso, devemos tentar experimentar ao máximo determinadas situações que acreditamos serem potenciadoras de um bom processo de ensino-aprendizagem. Acima de tudo devemos sempre refletir sobre todas as estratégias tomadas de forma a eliminar aquelas que não revelem benefícios à nossa intervenção pedagógica.