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Atividade Prática realizada em 25/05/2011: “Extração do DNA de frutas”

4. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS

4.4 Atividade Prática realizada em 25/05/2011: “Extração do DNA de frutas”

Participaram da atividade, os pesquisadores e as professoras PB e PQ.

A atividade de extração do DNA de frutas, foi inicialmente proposta pelas professoras do Projeto Diálogos sobre o Ensino de Ciências, como trabalho para uma Feira de Ciências que aconteceria em uma instituição de ensino superior da cidade. A direção da escola havia incumbido às professoras do Projeto de participarem da Feira e

esperava que nós as ajudássemos na concretização da proposta. Posteriormente, a tal Feira de Ciências foi cancelada, mas todos concordaram, porém, que seria interessante realizar a extração do DNA como parte de suas aulas normais no ensino médio.

PQ propôs a realização dessa atividade, como uma possibilidade de trabalho interdisciplinar (biologia-química) em torno do tema, ressaltando que em um ano anterior já havia realizado um trabalho semelhante com uma ex-professora daquela mesma escola. PQ explicou que, no trabalho em questão, os alunos acompanharam uma atividade prática de extração do DNA vegetal, e também manipularam e observaram um modelo da molécula de DNA, modelo este constituído de peças de plástico encaixáveis. Na ocasião, a ideia surgira em função da participação das professoras em curso de biotecnologia oferecido pela Diretoria de Ensino. Os participantes do curso puderam observar a atividade de extração do DNA vegetal e receberam o kit para montagem do modelo dessa molécula. PQ procurou explicar sobre a estrutura química das bases nitrogenadas e das pentoses, e sobre as “pontes de hidrogênio” que se formam entre as cadeias do DNA.

Acreditamos que a participação dos docentes em cursos de atualização e similares pode proporcionar, entre outras coisas, certo nível de enriquecimento dos saberes curriculares, conforme o participante tem acesso a novas propostas de atividades e novos materiais didáticos para uso em aula. Assim, também, o Projeto Diálogos sobre

o Ensino de Ciências, consistiu um trabalho que pode ter incidido sobre os saberes

curriculares dos professores participantes, visto que lhes apresentamos propostas de montagens experimentais e discussões de conceitos correspondentes.

A demonstração prática da extração do DNA de frutas foi realizada segundo a descrição de um protocolo que a PB havia conseguido e depois nos repassado. Pegamos com a PB o livro didático “Biologia Geral” (AMABIS, J. M.; MARTHO, 2009), disponível na escola, para examinarmos a estrutura química da desoxirribose, das bases nitrogenadas etc. Nesse momento, ao nos contar sobre o tipo de explicações que havia dado aos alunos no trabalho anterior sobre DNA, a professora PQ referiu-se às pentoses como “ácidos” que possuíam o grupamento “álcool” (hidroxila). Essa fala, reunida a outras que vieram depois, sugeriu que a professora enfrentava problemas de domínio da matéria a ser ensinada, pelo menos na área de bioquímica. Problemas com os saberes disciplinares, os quais não tinham muito como ser resolvidos naquela situação de reunião de trabalho do projeto, e nem tampouco se alterariam em função dos resultados do experimento proposto.

Conforme combinado anteriormente na reunião da equipe de pesquisadores, perguntamos a PQ sobre o porquê do uso do sal nos procedimentos para extração do DNA, deixando claro que nós, por sermos biólogos, não tínhamos uma resposta. Entendemos que uma compreensão satisfatória da atividade requer alguma noção acerca de como o sal e o álcool atuam no processo, e tivemos a ideia de buscar essa informação com a professora PQ, pois isso presumivelmente valorizaria a participação dela nos trabalhos propostos. Porém, para certa surpresa nossa, ela pareceu também desconhecer a função do sal; mesmo assim, tentou não demonstrar suas eventuais dúvidas, e falou um pouco sobre o sal e o DNA, como se estivesse raciocinando “em voz alta”. A fim de ajudá-la a achar pistas, mostramos a ela um trecho do protocolo; esse trecho, embora não esclarecesse maiores detalhes, sugeria a participação do sal em processos que diminuíam a solubilidade do DNA (“na presença de álcool e sódio, o DNA sai de

solução”); PQ então afirmou que o sódio fazia com que o DNA diminuísse “sua densidade e subisse” (no caso, em direção à interface entre a “coluna” inferior de

extrato de morango e a “coluna” superior de álcool gelado).

Valorizar os comentários e a participação dos professores na discussão das atividades foi uma estratégia que consideramos importante no que se refere ao Projeto

Diálogos sobre o Ensino de Ciências, pois, foi a partir da explicitação das concepções

ou indagações dos professores, durante as atividades propostas que os pesquisadores puderam planejar ações visando à formação docente. Algumas vezes, no entanto, essa estratégia levou a situações incômodas, nas quais era preciso ter „habilidade política‟ para lidar com certas concepções errôneas manifestadas pelos professores.

Um dos pesquisadores realizou a demonstração da extração do DNA do morango e do mamão, seguindo de forma adaptada o protocolo que havíamos recebido da professora PB. As frutas utilizadas foram levadas pela própria professora e pudemos contar com material existente no laboratório (tubos de ensaio, estantes, funis de vidro etc.).

Surgiram dúvidas sobre se o álcool precisava mesmo ser gelado ou poderia estar à temperatura ambiente. PB perguntou também (e novamente) sobre a razão do uso do sal. Tal fato foi interessante, pois reforçou nossa ideia de que os professores tendem a sentir necessidade de explicações sobre a função do sal e do álcool, a fim de que possam compreender satisfatoriamente a atividade; além disso, de acordo com tal linha de raciocínio, existe a possibilidade de que também os alunos perguntem o porquê dos

procedimentos utilizados, sendo importante que o professor possua uma noção a respeito.

Tendo em vista os questionamentos surgidos, decidimos ampliar o experimento e testar extratos de fruta com sal e sem sal, e o uso de álcool gelado e álcool à temperatura ambiente, dando, assim, abertura para que as professoras investigassem questões de seu interesse.

Durante a preparação do material, a professora PB perguntou sobre o porquê da adição de detergente, e a professora PQ explicou que o detergente “destrói os lipídeos” das membranas celulares (não há, porém, uma degradação química dos lipídeos, mas somente a solubilização em água do complexo formado pelos lipídios e moléculas de detergente). Mais adiante, a professora PQ usou a palavra “proteína” numa fala em que se referia ao DNA. Assim, o conjunto de observações e explicações duvidosas, colocadas pela professora PQ, nesse dia, deu-nos a impressão de que ela, pelo menos na área de bioquímica, possuía conhecimentos confusos, embora procurasse demonstrar domínio dos assuntos.

Ao final, todas as montagens experimentais funcionaram satisfatoriamente (não houve diferenças muito evidentes entre os resultados obtidos nos diversos tubos de ensaio). Notamos, porém, que o uso do álcool gelado tornava mais distintas as duas fases da mistura e a interface entre elas.

Posteriormente, localizamos um material publicado pelo Instituto de Biociências da USP no qual se explicava detalhadamente o papel do sal e do álcool, o porquê do álcool gelado e a forma de diferenciação entre a “massa” de DNA e outra “massa” que aparece, a de pectina (RODRIGUES, 2008), o que foi socializado com as professoras.

De modo coincidente com o que estava indicado no protocolo, uma “nuvem” de material (decorrente da aglomeração de moléculas de DNA) surgiu na interface entre a “coluna” de extrato de fruta e a “coluna” de álcool, e todos os presentes pareceram ter ficado animados com os resultados obtidos.

PB perguntou o que veríamos se observássemos a “massa” de DNA ao microscópio, demonstrando que acreditava que as moléculas individuais de DNA seriam visíveis. Em resposta, propusemos que realizássemos essa observação. Solicitamos à PQ que arriscasse uma hipótese sobre o que seria visto, e ela respondeu com insegurança - “Nada?”.

Montamos, então, o microscópio, e colocamos uma amostra da “massa” de DNA entre lâmina e lamínula. A imagem obtida ao microscópio mostrou numerosos

corpúsculos semelhantes a minúsculos fragmentos pontiagudos de vidro. Colocando a amostra sob aumento maior, pudemos detectar que, na verdade, os corpúsculos encontrados não eram filamentosos, e possuíam contornos irregulares. Explicamos que tais “corpos” são ainda, um conjunto muito numeroso de moléculas agrupadas.

PB insistiu se, com um microscópio bem poderoso, não seria possível ver o DNA. Respondemos que não, isto é, que o máximo que veríamos seria algumas manchas. Notamos, portanto, a dificuldade da PB em entender que a ciência trabalha com modelos. Percebemos, assim, lacunas nas concepções epistemológicas de PB.

Alguns pesquisadores (GARCIA BARROS et al, 1998, GIL e PAYÁ, 1998, HODSON, 1990, 1993) são unânimes ao reforçar as dificuldades de nível epistemológico e conceitual dos professores, quando se trata de utilizar atividades práticas no processo de ensino de ciências.

Ao longo do Projeto, várias falas colocadas pelos professores participantes sugeriram que eles estavam pouco familiarizados com determinadas noções epistemológicas que poderiam ser importantes para a reflexão sobre o ensino escolar de ciências. PF e PB, por exemplo (em outra ocasião), relataram ter tido pouca ou nenhuma oportunidade de contato com estudos de história e filosofia da ciência durante a sua trajetória como alunos de graduação ou professores do ensino fundamental e médio; PQ afirmou várias vezes, que “a maioria dos fenômenos químicos não são observáveis”, e com isso pareceu atribuir realidade (caráter fenomênico) a entidades e processos submicroscópicos que são postulados pela ciência na qualidade de modelos; PB e PQ não compreenderam, inicialmente, a crítica que os pesquisadores apresentaram em relação a um trecho do Caderno do Aluno, o qual faz confusão entre o que seria uma “hipótese” e uma “previsão”; PB, PQ e PC mostraram não estarem familiarizadas com a expressão “natureza das ciências” confundindo, inicialmente, a discussão sobre características da atividade científica com uma discussão sobre aspectos relevantes do mundo natural que a ciência investiga e desvenda (natureza da ciência correspondendo não a uma descrição sobre o que a ciência é, mas sim a uma descrição sobre objetos de estudo da ciência); entre outros.

Os vários dados sugestivos de que os professores participantes possuíam lacunas em suas noções epistemológicas vieram à tona gradativamente, mas logo os colaboradores externos se perguntaram se tais dificuldades não prejudicavam um dos objetivos do projeto, que era o de discutir o trabalho em aula com atividades práticas. (dito de outro modo, se quero explorar as várias possibilidades que se desdobram a

partir de uma determinada proposta de atividade prática, preciso ter uma noção mínima sobre como a observação e a experimentação se interligam com outros aspectos do processo de produção de conhecimentos na ciência, tais como a formulação de hipóteses, a elaboração de modelos e teorias, a influência do contexto econômico, social e político etc.).

As questões epistemológicas podem ser consideradas como parte dos saberes disciplinares, já que estes últimos não se referem apenas ao conhecimento dos produtos da ciência (teorias, leis etc.), mas também ao conhecimento sobre o que são esses produtos e como eles se originam e se sustentam.

Gil-Pérez e Payá (1988) ressaltam que, para os professores conhecerem a forma como os cientistas abordam os problemas, as características de sua atividade, os critérios de validade e aceitação das teorias científicas é essencial para orientar as práticas de laboratório, a resolução de problemas e, em geral, a construção de conhecimentos pelos alunos.

Seguem os quadros de síntese e exemplos sobre estratégias empregadas e saberes docentes envolvidos.

Quadro 10. Síntese das estratégias de ação empregadas pelos colaboradores externos durante a atividade prática de “Extração de DNA de frutas” Estratégia empregada pelos colaboradores

externos em que a estratégia recebeu destaque Exemplos de situações Valorizar os interesses e demandas dos

professores. - A atividade de extração do DNA de frutas foi solicitada pelas professoras (inicialmente) para apresentação em uma feira de ciências. Valorizar e estimular a utilização das instalações e

equipamentos presentes na escola - Para a atividade realizada foram utilizados materiais presentes no laboratório da escola como tubos de ensaio, estantes, funis de vidro, etc.

Dar espaço para a participação ativa dos

professores nas atividades propostas. - Perguntamos a PQ sobre o porquê do uso do sal nos procedimentos para extração do DNA, deixando claro que nós, por sermos biólogos, não tínhamos uma resposta.

- As frutas utilizadas foram levadas pela própria professora PB. As professoras participaram da montagem de todos os experimentos. Dar abertura para que os professores investiguem

questões de seu interesse - Tendo em vista os questionamentos feitos pelas professoras, decidimos ampliar o experimento e testar extratos de fruta com sal e sem sal, e o uso de álcool gelado e álcool à temperatura ambiente,

- Em resposta à duvida de PB, sobre o que veríamos se observássemos a “massa de DNA”

ao microscópio, propusemos a ela que separasse um pouco daquele material e o colocasse em uma lâmina de microscopia para observação. Quadro 11. Indicação dos saberes docentes que se manifestaram e/ou podem ter

sido construídos durante a atividade de “Extração do DNA de frutas” Tipos de saberes

(TARDIF, 2004) se manifestaram e/ou podem ter sido construídos Exemplos de situações em os saberes em questão Saberes disciplinares - Os diálogos ocorridos ao longo da reunião sugeriram que PQ enfrentava problemas de domínio da matéria a ser ensinada, pelo

menos na área de bioquímica. Os pesquisadores optaram por não questionar as falas da professora, a fim de não causar

constrangimentos a ela.

- Provável dificuldade da PB em entender que a ciência trabalha com modelos. Em resposta, os pesquisadores procuram argumentar que o DNA e outros construtos da ciência não são diretamente observáveis.

Saberes da formação profissional xxxx

Saberes curriculares - Conhecimento de proposta de atividade prática para uso em aula. - Socialização do protocolo da atividade prática de “extração de DNA de frutas” publicado em site da USP.

Saberes experienciais - Vivência do processo de experimentação de acordo com diferentes possibilidades de procedimentos e uso de materiais, fornecendo aos professores uma ideia sobre o modo como os alunos poderiam interagir com aquele experimento em situação de aula.

4.5 Atividade teórica realizada em 05/06/2012: “Discussão sobre a