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Capítulo III – A Compatibilidade do Contrato de Concessão Comercial com as

2. As (potenciais) práticas restritivas da concorrência

2.4. A atribuição exclusiva de clientes

De acordo com a Comissão Europeia ―num acordo de atribuição exclusiva de clientes, o

fornecedor concorda em vender os seus produtos apenas a um distribuidor para revenda a um determinado grupo de clientes. Simultaneamente, o distribuidor deve normalmente observar limitações a nível das suas vendas ativas a outros grupos de clientes (atribuídos em regime de exclusividade)‖ 325.

Falamos aqui daqueles casos em que o concedente divide a distribuição dos seus produtos, pela sua rede de concessionários, por categorias de clientes. Isto é, em cada contrato de concessão que a empresa celebra ela atribui uma categoria exclusiva de clientes a cada concessionário e proíbe as vendas ativas às categorias de clientes exclusivos dos outros concessionários. Cada concessionário tem assim uma determinada categoria de clientes a que deve revender os produtos (e eventualmente prestar assistência pós-venda). Como já acima foi referido, no âmbito do capítulo I, podemos encontrar no contrato de concessão comercial, no que diz respeito à fase de revenda, uma cláusula que define as classes de clientes do concessionário. Importa assim aferir dos seus efeitos sobre a concorrência, em específico quando nos referimos a uma atribuição exclusiva nos termos em que a Comissão Europeia a define.

Ora, estas cláusulas podem, desde logo, reduzir a concorrência ―intramarcas‖ e levar a uma ―compartimentação‖ do mercado, o que pode conduzir a discriminações ao nível dos

preços. De acordo com a Comissão Europeia a ―atribuição exclusiva de clientes dificulta a

possibilidade de os clientes beneficiarem de eventuais diferenças de preços relativamente a uma

determinada marca‖ 326. Quando este sistema é aplicado pela maior parte, ou a totalidade, dos

fornecedores no mesmo mercado a concorrência pode sofrer um abrandamento e a colusão (entre fornecedores ou distribuidores) pode tornar-se mais fácil, com os riscos daí imanentes. A atribuição exclusiva de clientes pode igualmente conduzir à exclusão de outros distribuidores, sendo deste modo a concorrência afetada.

324

Neste sentido ver RICARDO BORDALO JUNQUEIRO, op. cit., p. 409.

325

Ponto 168, ―Orientações relativas às restrições verticais‖.

326

De notar que se é certo que a atribuição exclusiva de clientes já pode levantar de per se problemas concorrenciais em certos casos, a combinação de restrições verticais só contribui para a possibilidade dos seus efeitos negativos serem agravados.

A respeito da combinação com uma obrigação de compra exclusiva a Comissão Europeia sublinha o seguinte:

―A combinação de um sistema de atribuição exclusiva de clientes com um sistema de abastecimento exclusivo aumenta os riscos de compartimentação do mercado e de discriminação de preços a nível da concorrência. A combinação com um abastecimento exclusivo, exigindo que os distribuidores exclusivos adquiram os seus fornecimentos relativamente a uma determinada marca diretamente ao fabricante, elimina também uma eventual escolha por parte destes distribuidores, que são impedidos de comprar a outros distribuidores. Esta combinação aumenta, por conseguinte, a possibilidade de o fornecedor limitar a concorrência intramarcas e aplicar condições de venda diferentes em detrimento dos consumidores, a não ser que a combinação permita gerar ganhos de eficiência que conduzam a

uma redução dos preços aplicados a todos os consumidores finais‖ 327.

A não olvidar igualmente que a posição do concedente também assume aqui relevo na apreciação dos eventuais efeitos anticoncorrenciais, uma vez que quanto maior for o seu poder de mercado, maior poderá ser a redução de concorrência na própria marca.

O art. 4º, alínea b), ponto i), do Reg. 330/2010, que inclui como sabemos as denominadas restrições graves aborda a questão da atribuição exclusiva de clientes. Dispõe assim a norma:

―A isenção prevista no artigo 2º não é aplicável aos acordos verticais que, direta ou indiretamente, isoladamente ou em combinação com outros fatores que sejam controlados pelas partes, tenham por objeto:

(…)

b) A restrição do território no qual, ou dos clientes aos quais, o comprador parte no acordo, sem prejuízo de uma eventual restrição relativa ao seu local de estabelecimento, pode vender os bens ou serviços contratuais, exceto:

i) a restrição das vendas ativas no território exclusivo ou a um grupo exclusivo de clientes reservados ao fornecedor ou atribuídos pelo fornecedor a outro comprador, desde que tal restrição não limite as vendas dos clientes do comprador‖.

327

A atribuição exclusiva de clientes pode, assim, beneficiar de uma isenção por categoria desde que caía na exceção do ponto i), da alínea b) do art. 4º do Regulamento (i.e. não seja considerada uma restrição grave) e a quota de mercado do fornecedor e do distribuidor não ultrapasse 30% do mercado relevante (art. 3º do Regulamento). Nos casos em que a cláusula em questão não beneficie da isenção, há então que apreciar cada caso, perceber o contexto em que a cláusula se insere, as demais obrigações impostas, a posição das partes, o mercado em que opera, etc.

De realçar que, não obstante os eventuais efeitos negativos supra apontados, a

atribuição exclusiva de clientes é passível de conduzir a ganhos de eficiência, em especial quando os concessionários são obrigados a realizar investimentos de modo a se adaptarem às necessidades específicas dos seus clientes (por exemplo, investimentos na formação dos seus

trabalhadores, compra de equipamento específico…). Por conseguinte, a atribuição de um grupo

exclusivo de clientes durante o período de amortização dos investimentos efetuados pode assim justificar-se. Tudo depende do tipo de produto em questão e da classe de clientes em causa.

Como defende a Comissão Europeia a este respeito, ―em geral, o sistema é mais defensável em

relação a novos produtos ou a produtos complexos e em relação a produtos que exigem uma adaptação às necessidades do cliente individual. É mais provável que surjam necessidades diferenciadas identificáveis em relação a produtos intermédios, ou seja, produtos vendidos a diferentes categorias de compradores profissionais. É pouco provável que a atribuição de clientes

finais conduza a ganhos de eficiência‖ 328.