• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 5: ATRIBUTOS DE UM SISTEMA RESILIENTE

5.2 Atributos para a resiliência

Diversos autores têm procurado identificar quais são os atributos que conferem resiliência aos SSE e de que forma estes podem ser aplicados nas práticas de gestão. Por exemplo, Biggs et al. (2012) propuseram sete princípios de política para melhorar a resiliência dos serviços dos ecossistemas, com base na literatura e numa consulta a peritos. Kerner & Thomas (2014) conduziram uma extensa revisão bibliográfica para identificar um conjunto de atributos que poderiam ajudar os stakeholders a fazer uso prático do conceito de resiliência. A Tabela 19 sistematiza as propostas destes e de outros autores sobre as principais características ou estratégias que contribuem para a

Atributos de um sistema resiliente

resiliência dos SSE, sendo apenas apresentadas as que são mencionadas por mais de um autor.

Alguns destes atributos são propriedades gerais do SSE, que devem ser consideradas de forma apropriada nas estratégias de gestão, outros são aspetos específicos do sistema de governança (Biggs et al., 2012).

Tabela 19. Principais características que contribuem para a resiliência dos SSE, de acordo com diversos autores.

Autores

Propriedades gerais dos SSE Aspetos específicos do sistema de governança

Diversidade Reservas Modularidade

Variáveis lentas e feedbacks Variabilidade ecológica Capital social (participação, confiança e liderança) Inovação e aprendizagem Diferentes níveis de governança Walker & Salt (2006) X X X X X X X Schouten et al. (2012) X X X X X X X Carpenter et al. (2012) X X X X X X Biggs et al. (2012) X X X X X Kerner & Thomas (2014)93 X X X X

Dentro do primeiro conjunto encontra-se a diversidade que, em termos gerais, se refere ao número e variedade de opções disponíveis para realizar uma missão ou tarefa (Kerner & Thomas, 2014). A diversidade inclui os conceitos de redundância e substituibilidade; a existência de componentes com funções semelhantes mas diferentes respostas a distúrbios permite que alguns elementos do sistema compensem a perda ou falha de outros, garantindo que a função é mantida (Biggs et al., 2012; Carpenter et al., 2012). Ao fornecerem opções de resposta à mudança, a diversidade e a redundância são importantes para a resiliência dos SSE. Apesar disso, estes aspetos têm um custo associado, uma vez que reduzem a eficiência do sistema e podem contribuir para a sua estagnação (Biggs et al., 2012). Assim, as estratégias de

93

Apenas foram considerados os atributos classificados pelos autores na categoria ‘capacidade adaptativa’.

gestão devem procurar o equilíbrio entre diversidade e eficiência mais adequado ao contexto e escala do SSE.

Associado à diversidade está o conceito de reservas, ou seja, o armazenamento de recursos disponíveis que podem contribuir para a recuperação do sistema após uma perturbação (Carpenter et al., 2012). A constituição de reservas está relacionada com a abundância dos recursos em causa (Kerner & Thomas, 2014). Estes recursos podem ser organismos (plantas ou animais para repovoamento após catástrofe) ou conhecimento e competências (memória social) (Carpenter et al., 2012).

A forma como os diversos elementos de um sistema estão organizados e interligados também influencia a resiliência. Um certo grau de modularidade, isto é, a existência de módulos funcionais que se encontram conectados mas que podem funcionar e evoluir de forma independente, permite conter os efeitos de uma perturbação (impede que se propaguem rapidamente por todo o sistema) (Schouten et al., 2012). No entanto, o funcionamento do sistema como um todo também depende da conectividade entre os seus elementos (fluxo de matéria e informação) e esta é particularmente relevante na recuperação de um SSE após perturbação (manter a conexão com áreas de refúgio pode acelerar o repovoamento de áreas afetadas) (Biggs et al., 2012). Uma vez mais, o objetivo das estratégias de gestão deve ser encontrar um equilíbrio entre conectividade e modularidade que contribua para a resiliência do sistema.

A estrutura geral do SSE é definida por um conjunto limitado de variáveis

lentas. Estas variáveis não respondem diretamente a perturbações e, por isso,

apresentam taxas lentas de mudança (em relação às escalas temporais da gestão) (Biggs et al., 2012). São os limiares (thresholds) destas variáveis estruturais que determinam quando o sistema deixa de ser resiliente e passa para outro estado estável. Por exemplo, a transformação de uma estepe em matagal depende de determinados níveis de precipitação e de intensidade de pastoreio (variáveis lentas) (Walker & Salt, 2006). Embora sejam variáveis lentas é importante acompanhar a sua evolução e detetar atempadamente a aproximação dos limiares. Na dinâmica do sistema é também importante considerar os processos de feedback, através dos quais alterações numa componente originam modificações noutras partes que,

Atributos de um sistema resiliente

eventualmente, voltam a alterar a componente original (Biggs et al., 2015). Estes processos, que podem ser positivos ou negativos (conforme reforcem ou amorteçam os efeitos das alterações no sistema), influenciam a trajetória do SSE e podem conduzi- lo rapidamente para os limiares críticos (Biggs et al., 2012). Por esta razão é importante compreender e monitorizar as variáveis lentas e os feedbacks.

Walker & Salt (2006) defendem que, para fomentar a resiliência, é importante aceitar a variabilidade ecológica naturalmente existente nos SSE, permitindo que as perturbações ocorram e incentivando a adaptação às mesmas. Tentar controlar ou reduzir essa variabilidade irá conduzir a uma perda de diversidade (uma floresta que nunca é sujeita a fogo perde as suas espécies resistentes ao fogo e torna-se mais vulnerável) e, em última análise, tornará o sistema menos resiliente (Schouten et al., 2012).

Embora a componente ecológica do SSE possua características próprias que lhe permitem resistir a determinados níveis e tipos de perturbação, é óbvio que a resiliência do sistema como um todo é fortemente influenciada pela componente humana. Em primeiro lugar porque a própria necessidade de resiliência é determinada socialmente: o estado desejável do SSE é aquele que produz os benefícios mais valorizados pelas pessoas e uma parte significativa das perturbações que o deslocam desse estado derivam de atividades humanas. Por outro lado, a capacidade de resposta e adaptação às mudanças depende da ação coletiva. Neste sentido, alguns aspetos particulares do sistema de governança dos SSE são vistos como promotores da sua resiliência.

Um desses aspetos consiste na participação dos diferentes stakeholders nos processos de gestão e governança do SSE. A diversidade de atores e a forma como se organizam e interagem constituem o capital social do sistema (Schouten et al., 2012). A existência de relações de confiança e de liderança, capazes de mobilizar os atores, estimula a ação colaborativa (Carpenter et al., 2012). Um capital social ativamente envolvido na governança do SSE pode contribuir para uma melhor compreensão da dinâmica do sistema, maior capacidade de detetar perturbações e maior legitimidade nas ações de resposta (Biggs et al., 2012).

A participação, ao permitir a partilha de experiências, ideias e valores, é também promotora de processos de inovação e aprendizagem. A experimentação e a capacidade de aprendizagem (modificação ou aquisição de conhecimento, comportamentos, competências, valores ou preferências) geram novas formas de lidar com perturbações, aumentando a resiliência do sistema (Carpenter et al., 2012; Schouten et al., 2012).

Por último, diversos autores defendem que a existência de diferentes níveis de

governança aumenta a diversidade de respostas e a flexibilidade do sistema, uma vez

que confere redundância e modularidade (Ostrom, 2010; Walker & Salt, 2006). Um sistema de governança policêntrico apresenta múltiplas autoridades (ou unidades de governança) que atuam a diferentes escalas. Cada unidade tem (um certo grau de) independência dentro da sua escala geográfica e domínio de autoridade, estabelecendo relações horizontais com outras entidades em assuntos comuns e relações hierárquicas com unidades de governança de escalas superiores (Biggs et al., 2012). Um dos princípios deste tipo de sistema é que o nível de governança deve ser adequado à escala do problema que se pretende resolver (Carpenter et al., 2012). Dito de outra forma, deve respeitar o princípio da subsidiariedade, garantindo que existe uma repartição equilibrada de competências entre diversos níveis de poder. Se o nível nacional for responsável pela implementação de políticas pormenorizadas, está a suprimir-se o papel e a influência das instituições governamentais de nível inferior (Schouten et al., 2012).

Biggs et al. (2012) mencionam que os sistemas policêntricos geram mais oportunidades de experimentação e aprendizagem e promovem níveis de participação mais elevados, sobretudo através dos níveis locais, que estão mais próximos dos recursos e dos seus utilizadores. Segundo os mesmos autores, os principais desafios deste modelo residem na coordenação entre escalas e unidades, na construção de relações de confiança e no desenvolvimento de uma liderança forte.

A colaboração entre stakeholders, a importância dos processos de aprendizagem e a existência de estruturas de governança em múltiplos níveis são alguns dos aspetos defendidos na governança adaptativa (Sharma-Wallace, Velarde, & Wreford, 2018).

Atributos de um sistema resiliente